Autor:
Rodrigo Díaz Olmos
Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de são Paulo (FMUSP). Diretor da Divisão de Clínica Médica do Hospital Universitário da USP. Docente da FMUSP.
Última revisão: 08/09/2008
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Insegurança clínica, acurácia diagnóstica e prognóstico em pacientes que se apresentam com dispnéia no departamento de emergências.
Clinical Uncertainty, Diagnostic Accuracy, and Outcomes in Emergency Department Patients Presenting With Dyspnea. Arch Intern Med. 2008;168(7):741-7481 [link para o abstract].
dispnéia é uma queixa muito freqüente no pronto-socorro (PS) e seu diagnóstico diferencial pode ser difícil quando a apresentação não é típica. O estudo parte da hipótese de que a incerteza no diagnóstico etiológico de dispnéia no pronto-socorro pode estar associada a pior prognóstico, e que os peptídeos natriuréticos associados ao julgamento clínico aumentariam a chance de um diagnóstico correto de insuficiência cardíaca (IC) em pacientes que chegam ao PS com dispnéia, reduzindo a incerteza diagnóstica e melhorando o prognóstico.
Um total de 592 pacientes dispnéicos que participaram do estudo PRIDE (ProBNP Investigation of Dyspnea in the Emergency Department) foram incluídos no presente estudo. Os autores solicitaram aos emergencistas que estimassem a probabilidade (de
Em 185 participantes (31% dos casos) os emergencistas estimaram uma probabilidade de IC descompensada que se encontrava no intervalo de incerteza clínica (21 – 79%). Dentre estes, 56% tinham IC descompensada. Os participantes que suscitaram mais dificuldade diagnóstica eram geralmente mais velhos, tinham fração de ejeção mais baixa e se apresentaram com fibrilação atrial mais frequentemente que os participantes cujos emergencistas tinham certeza diagnóstica. Os participantes no grupo de incerteza diagnóstica também apresentaram maior tempo de internação e maior morbidade e mortalidade em 1 ano, particularmente os que apresentavam IC descompensada. A área sob a curva (AUC) ROC (ver dicas de medicina baseada em evid6encias) para a avaliação clínica habitual foi de 0,88 no grupo de certeza clínica e 0,76 no grupo de incerteza clínica. A área sob a curva para o BNP foi de 0,96 e 0,91, respectivamente para os grupos de certeza e incerteza diagnóstica. A associação da avaliação clínica com o BNP produziu aumento na AUC. Os autores concluem que a incerteza quanto ao diagnóstico etiológico da causa da dispnéia em pacientes no pronto-socorro está associada a um pior prognóstico (aumento da morbidade e da mortalidade), especialmente entre os pacientes com IC descompensada. A associação do BNP à avaliação clínico-laboratorial tradicional pode reduzir a incerteza diagnóstica neste cenário.
O diagnóstico diferencial de pacientes dispnéicos na emergência pode ser um desafio. Não é incomum nos depararmos com indivíduos dispnéicos cuja etiologia não fica clara após a avaliação inicial. Este estudo mostrou que nos casos em que persistem dúvidas sobre a etiologia da dispnéia após uma avaliação clínico-laboratorial básica, a associação do BNP pode aumentar a acurácia diagnóstica. Entretanto tais resultados devem ser encarados com cautela, pois o teste de BNP não está disponível na maioria dos serviços e é caro. Sua introdução na prática clínica não deveria substituir uma avaliação clínica e laboratorial básica. Sua solicitação deveria seguir critérios clínicos rigorosos sob risco de se transformar numa panacéia para pacientes com dispnéia aumentando os custos sem contribuir de forma significativa para reduzir morbi-mortalidade.
A curva ROC (receiver operating characteristics curve) é a melhor maneira de se estabelecer um ponto de corte para um teste diagnóstico, otimizando-se a sensibilidade e a especificidade do teste. Muitos testes diagnósticos produzem resultados contínuos (como os valores do BNP por exemplo) ao invés de resultados dicotômicos (positivo vs negativo). Com testes de caráter contínuo muitos valores de sensibilidade e especificidade são possíveis, dependendo do valor de corte escolhido para definir um teste positivo. Esta troca entre sensibilidade e especificidade pode ser descrita graficamente utilizando-se as curvas ROC. O investigador seleciona vários valores de corte (“cutoff points”) e determina a sensibilidade e a especificidade para cada valor. Coloca, então, o valor da sensibilidade (taxa de verdadeiros-positivos) nas ordenadas (eixo Y) e as taxas de falsos-positivos (1-especificidade) nas abscissas (eixo X). Um teste ideal é aquele que alcança o canto superior esquerdo do gráfico (100% de verdadeiros-positivos e nenhum falso-positivo). Um teste inútil estaria sobre a diagonal que vai do canto inferior esquerdo ao canto superior direito (nesta linha, em qualquer ponto a taxa de verdadeiros-positivos é igual à de falsos-positivos). A área sob a curva ROC, que vai de 0,5 para um teste inútil até 1,0 para um teste perfeito, é uma medida útil da acurácia geral do teste e pode ser usada para comparar testes. Entretanto, a acurácia de um teste (que mescla sensibilidade e especificidade) pode não ser um parâmetro útil a depender da finalidade do teste. Um teste utilizado para descartar doenças deve ter uma alta sensibilidade, mas não precisa ter uma alta especifidade, enquanto que um teste para confirmar um diagnóstico deve ter alta especificidade. Por último vale mencionar que os dados fornecidos pela curva ROC só serão de utilidade se o estudo que os produziu foi conduzido de forma metodologicamente adequada, sem viéses. Caso contrário os resultados não serão válidos.
1. Green SM, Martinez-Rumayor A, Gregory SA, Baggish AL, O'Donoghue ML, Green JA, Lewandrowski KB, Januzzi JL Jr.Clinical Uncertainty, Diagnostic Accuracy, and Outcomes in Emergency Department Patients Presenting With Dyspnea. Arch Intern Med. 2008;168(7):741-748.
2. Hatanaka, VMA; Benseñor, IM. Avaliação de testes diagnósticos. In “Epidemiologia. Abordagem Prática”. Sarvier, 1ª Edição, 2005.
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