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Aspectos éticos e sociais na medicina

Última revisão: 01/02/2012

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Aspectos éticos e sociais na medicina

 

Roberta Springer Loewy, PhD (Phil, Ethics)

Professor and Bioethics Education Consultant, VCF, University of California, Davis, Sacramento, CA

 

Erich H. Loewy, MD, FACP

Professor and Founding Chair of the Bioethics Program (Emeritus), University of California, Davis, Sacramento, CA

 

Faith T. Fitzgerald, MD, MACP

Professor of Internal Medicine, University of California, Davis, Sacramento, CA

 

 

Artigo original: Loewy RS, Loewy EH, Fitzgerald FT. Ethical and social issues in medicine. ACP Medicine. 2008;1-5.

[The original English language work has been published by DECKER INTELLECTUAL PROPERTIES INC. Hamilton, Ontario, Canada. Copyright © 2011 Decker Intellectual Properties Inc. All Rights Reserved.]

Tradução: Soraya Imon de Oliveira

Revisão Técnica: Dr. Euclides Furtado de Albuquerque Cavalcanti

 

 

O campo da ética biomédica tem crescido tão rapidamente que, ao realizar a busca rápida do termo isolado na internet (biomedical ethics), serão encontrados quase 4,2 milhões de resultados. A nossa pequena tarefa, nesse espaço tão restrito, consiste em tratar dos Aspectos éticos e sociais na medicina. É tarefa impossível apresentar mais do que simples discussão superficial de qualquer um desses assuntos. Assim como a boa medicina, a boa ética não pode ser praticada por meio de algoritmos. Dessa forma, em vez de tentar o impossível – que representaria um desserviço para todos – optamos, então, por fornecer um guia operacional para ajudar os clínicos a classificarem os dilemas éticos e sociais com os quais se deparam diariamente. Para tanto, optamos por dividir o presente capítulo nas seguintes seções:

 

1.   Uma breve descrição da ética e de sua ramificação relativamente recente – a ética biomédica – além do modo como se diferencia da moralidade pessoal.

2.   Um método para identificar e lidar com questões ou casos de ética biomédica.

3.   Uma discussão do papel do bioeticista e dos comitês de ética na assessoria dos casos.

4.   A melhor forma de preservar o papel de confiança exercido pelo clínico na relação paciente-médico em situações nas quais a moralidade pessoal do médico clínico é colocada em risco.

5.   Uma lista de termos-chave comuns de bioética e legais, que possa ser acessada on line.

6.   Uma breve discussão on line dos termos citados na referida lista.

 

Esperamos fornecer um conjunto de ferramentas fundamentais, informativas e efetivas, que atenda a um amplo espectro de profissionais da prática médica.

 

O que é um aspecto ético?

Um aspecto essencial da condição de ser humano consiste em até que ponto somos dotados de capacidade de reflexão. Essa capacidade é responsável pela formulação de hábitos físicos e algoritmos mentais elaborados que, então, nos guiam por entre os aspectos rotineiros e mundanos do nosso dia a dia. Como resultado, temos mais tempo para apreciar e refletir de forma mais crítica, profunda, criativa e inovadora acerca das questões, aspectos e problemas menos imediatos – porém não menos substanciais – da vida.

Esse traço nos permite reconhecer não apenas que “estamos vivos” mas também, e ainda mais significativamente, que nós – e os outros, semelhantes em maior ou menor grau a nós mesmos – “temos vidas”. Ter uma vida implica ser dotado de consciência suficiente (no mínimo, uma memória e senso rudimentar) para distinguir entre o próprio e o ambiente, formular planos e metas, pensar em meios (caminhos) efetivos para realizá-los e perceber que os outros indivíduos também podem ter planos, objetivos e modos de alcançá-los bastante diferentes dos nossos.

Nossa capacidade de refletir também nos permite aprender tanto com nossas próprias experiências como com as experiências das outras pessoas e, assim, nos transforma em indivíduos prontos para desenvolver meios particulares de encarar o mundo. A hierarquia particular de valores, perspectivas, princípios e papéis que sustenta a visão de mundo de qualquer pessoa transmite a moralidade pessoal desse indivíduo, ou seja, suas crenças quanto ao que é “certo”, “errado”, “bom”, “ruim”, “obrigação” e assim por diante. Entretanto, a moralidade pessoal de alguém surge de fontes variadas, que incluem pais, colegas, cultura, religião (ou falta dela) e grupos organizados seletos. Assim, uma parte considerável dessa moralidade é (ou pode ser) adquirida de forma relativamente passiva – na verdade, muitas vezes é adquirida e firmemente inculcada bem antes de sermos maduros o suficiente para escrutiná-la de modo crítico; e quando finalmente conseguimos fazê-lo, a moralidade já se tornou tão gravada em nossas mentes que nos sentimos muito desconfortáveis se e quando ela é contrariada ou desafiada diretamente.

Quando a moralidade pessoal é defendida, muitas vezes o é pelo recurso de uma “autoridade” reconhecida e aceita junto a um enclave particular de alguém (p. ex., instituições, religião, pais, cultura e textos e/ou figuras autoritárias). Em outras palavras, a moralidade pessoal costuma ser tácita, reflexiva e/ou uniperspectiva junto a um dado enclave moral. O motivo de os conflitos morais serem tão intratáveis é primariamente a inabilidade de encontrar uma autoridade moral que possa ser aceita pelas partes díspares.

Ao contrário do uso padrão, distintivamente, a ética não é o mesmo que moralidade pessoal. Em vez disso, é uma apreciação – e uma tentativa de compreender e explicar – do “certo”, “errado”, “bom”, “ruim”, “obrigação” e assim por diante, no que se refere ao comportamento em relação aos outros indivíduos, os quais podem ou não compartilhar a própria moralidade pessoal de alguém. Como a ética lida com comportamentos que afetam diretamente os outros, precisa, enfim, ser persuasiva para aqueles que não reconhecem a mesma “autoridade moral” (p. ex., religião, pais, cultura, textos e/ou figuras autoritárias). Em consequência, a ética requer – em princípio e de fato – que qualquer queixa moral seja submetida ao escrutínio crítico e conte com uma defesa significativamente mais ampla, ou seja, uma defesa admissível por todas as partes como estando fundamentada na moral, mesmo não sendo aquela que desejariam reclamar para si mesmos.

Dessa forma, o objetivo da ética é propositalmente ser uma atividade explícita, criticamente reflexiva e de múltiplas perspectivas – uma atividade na qual nos engajamos quando as moralidades pessoais e/ou grupais entram em conflito (real ou percebido). Trata-se de uma atividade inclusiva e respeitosa, que requer a admissão de nossa parte de que os outros indivíduos podem ter valores e crenças diferentes tão profundamente arraigados quanto os nossos. Como tal, exige nosso engajamento em uma investigação articulada: a saber, estabelecer nossas posições favorecidas, apoiá-las, dar-lhes razão, procurar motivos que poderiam justificar as posições daqueles dos quais discordamos e permitir que nós mesmos, todos juntos, sejamos conduzidos pela dinâmica da investigação, em vez das nossas próprias expectativas ou preconceitos preexistentes. Em resumo, a ética não deveria ser vista simplesmente como uma lista de regras ou um conjunto de algoritmos ou diretrizes autoritárias.

A ética na assistência de saúde constitui um subgrupo geral da ética, que lida com conflitos nessa área na medicina. Tais conflitos não surgem apenas entre médicos, pacientes e indivíduos próximos aos pacientes. Esses conflitos também ocorrem nos níveis profissional, institucional e social (p. ex., conflitos referentes às esferas de autoridade ou hierarquia; natureza e distribuição do tratamento; saúde pública; necessidades reais ou percebidas para racionamento da assistência de saúde; limites ou demandas de intervenção aceitável, experimentação, pesquisa genética e suas aplicações). Entretanto, considerando que comumente o paciente individual é afetado de forma mais imediata e direta pelas consequências da(s) resolução(ões) proposta(s) para tais conflitos, essa ética é, a princípio, centrada no paciente – ou seja, o pressuposto padrão é o de que os valores e interesses do paciente (mantidos por ideais, autodeterminados de modo reflexivo e estáveis) devem ser priorizados. Falando eticamente, justificaríamos esse pressuposto com base no respeito pelas pessoas em geral e nas obrigações profissionais de beneficência (procurar ou maximizar o bem biomédico) e não maleficência (evitar ou minimizar danos) para com os pacientes, em particular. Esse pressuposto prima facie de centralização no paciente às vezes pode ser ignorado (como ocorre, por exemplo, diante de interesses de saúde pública, que são essenciais, ao final das contas, para o bem-estar de cada indivíduo), contudo isso requer obrigatoriamente tipos persuasivos de justificativas que, muitas vezes, são analisadas em termos de justiça ou integridade.

O papel do médico é único na ética da assistência de saúde. Ao serem graduados nas faculdades de medicina, os estudantes formados são admitidos na profissão e assumem todos os direitos e deveres tradicionais do cargo de “médico”. Esses direitos e deveres sofreram alterações consideráveis ao longo dos séculos; por exemplo, médicos que determinavam unilateralmente a que o paciente deveria ser submetido são algo do passado. Mesmo assim, esses direitos e deveres permaneceram surpreendentemente constantes – a saber, o dever dos médicos de prestar a melhor assistência possível àqueles que necessitam de seus conhecimentos particulares. Isso é conseguido de duas formas:

 

1.   Continuando a professar (o juramento conectado à “profissão” tradicional) a existência de finalidades ou metas éticas que estão acima e além dos objetivos materiais associados à reputação pessoal ou à recompensa particular.

2.   Mantendo e, quando possível, aprimorando a estrutura, os padrões de prática e as exigências educacionais, de licença e regulatórias da profissão.

 

Entretanto, esse papel tem sido ameaçado, sobretudo nos Estados Unidos, uma vez que tem sido cada vez mais permitido às partes tradicionalmente tratadas como externas à relação médico-paciente ditar as condições materiais sob as quais essa relação atua. Trata-se de um arranjo social, ou seja, escolhido, que certamente demanda mais escrutínio ético, caso se pretenda que a relação de confiança existente entre o paciente e o médico sobreviva.

 

Como estamos em relação à solução das questões éticas?

Se fôssemos todos exatamente iguais, raramente teríamos aspectos éticos para resolver. Contudo, além de nos tornarem seres interessantes e únicos, nossas diferenças são o motivo pelo qual sempre teremos dilemas éticos. Assim, a investigação ética se torna essencial sempre que valores centrais importantes forem colocados em risco ou em conflito, diante da falta de respostas que protejam cada um dos valores centrais importantes envolvidos e nas ocasiões em que somos forçados a escolher, dentro de uma gama de alternativas não ideais, a que melhor se aplicar.

Dito isto, embora a investigação e a análise éticas sejam pouco diferenciadas do método científico aprendido pelos médicos no início de suas carreiras, essa diferença é bastante significativa. Seria possível afirmar que, na ciência, trabalha-se a partir do que é compartilhado como tendo elevado grau de probabilidade no sentido de um único desconhecido. Na investigação ética, por outro lado, geralmente é preciso trabalhar a partir de certo número de personalidades únicas e valores conflitantes no sentido de um objetivo comum – ainda que, por vezes, negociado. Além disso, enquanto a discordância fundamental existente entre as “ciências exatas” pode ser resolvida por meio da apelação junto a uma autoridade reconhecida por ambas as partes, a discordância fundamental existente na ética frequentemente ocorre porque não compartilhamos e, assim, não nos sentimos compelidos a aceitar a autoridade moral do outro.

Conforme argumentou o filósofo americano John Dewey, embora os assuntos subjetivos sejam amplamente distintos, nosso método de investigação não o é. Como resultado, alguns pontos em comum em termos de atitude e abordagem são essenciais a qualquer investigação efetiva. Algumas delas foram aludidas a outras anteriores. Existe uma pequena lista a ser lembrada:

 

       curiosidade;

       honestidade;

       paciência;

       pensamento aberto;

       sensibilidade, respeito e compreensão das diferenças mútuas de opinião ou perspectiva;

       atenção a contexto, perspectivas, argumento e raciocínio persuasivo;

       disposição para discutir uma situação ou aspecto com opositores razoavelmente racionais;

       comprometer-se a ser guiado pela dinâmica da investigação, e não por crenças pessoais predeterminadas.

 

Tal como a boa ciência, a boa investigação de ética começa com bons fatos:

 

       algum dado biopsicossocial pertinente foi ignorado?

       temos informações biomédicas adequadas, ou seja, temos consultado, quando necessário, os especialistas ou subespecialistas apropriados?

       o paciente tem capacidade de decisão (que difere de competência legal)? Se não, temos identificado o(s) tomador(es) de decisão legítimo(s)?

       conhecemos todas as diferentes perspectivas das pessoas afetadas? Até que as conheçamos, não podemos identificar todos os valores centrais colocados em risco;

       quais as circunstâncias sociais devem ser consideradas e tratadas? Ocasionalmente, é até mesmo adequado perguntar quem está sendo tratado, pois isso nem sempre é óbvio, como também nem sempre é o paciente; caso não o seja, existem motivos éticos constrangedoramente persuasivos para tanto?

 

Em seguida:

 

       identificamos as maiores metas do paciente?

       essas metas são realistas?

       essas metas são consistentes com ou discordam dos objetivos biomédicos? Constatamos que muitos conflitos intratáveis de cabeceira têm um motivo comum: todas as partes declaram “estar do mesmo lado”, quando, na verdade, as metas (e de quem são essas metas) nunca foram discutidas de forma explícita e abrangente.

 

Por fim:

 

       revelamos cuidadosamente e discutimos de modo adequado todas as alternativas disponíveis – incluindo não só os encargos e benefícios previsíveis de cada um, como também aqueles raros e potencialmente letais ou severamente debilitantes?

       se o paciente perdeu a capacidade de decisão, o procurador legal do paciente, encarregado de tomar decisões, está ciente do fato de que qualquer decisão deve ser tomada na defesa dos “melhores interesses do paciente”, com base não no seu próprio ponto de vista, mas segundo a vontade do paciente? Quando desconhecemos a vontade do paciente, muitas vezes é instrutivo começar perguntando a alguém o que esse paciente teria desejado e, então, agir a partir dessa premissa.

 

A essa altura, o leitor provavelmente deve estar pensando que, apesar disso tudo ser bom e benéfico, simplesmemte não há tempo para acessar toda essa informação. E estamos de acordo com isso. Contudo, você se lembra de um dito antigo que diz: “um grama de prevenção vale um quilo de cura”? Assim como todos os demais aspectos da medicina, as questões éticas são consideravelmente mais bem tratadas de modo prospectivo. Assim como a “medicina de resgate” é onerosa (tanto em termos materiais como não materiais), a ética “de regaste” ou post hoc também o é. Enquanto não desenvolvermos sensibilidade para detectar aquilo que pode desencadear um aspecto, nem fornecermos os requisitos de tempo e espaço para atendê-lo antes de sua transformação em problemas plenamente estabelecidos, permaneceremos de mãos atadas – seja na medicina, na ética ou em qualquer cenário – para lidar com as consequências danosas e tentar remendar a relação médico-paciente, talvez sem jamais conseguir restaurar os elos de confiança anteriormente forjados. E isso, de fato, é oneroso e demorado.

 

Qual é o papel dos bioeticistas e comitês de bioética no assessoramento dos casos?

Vez ou outra, os três autores deste capítulo repetem aos estudantes e residentes de medicina – e apenas parcialmente por brincadeira – para irem por outro caminho se em algum momento forem confrontados por um bioeticista ou por comitês de ética inclinados em lhes dizer qual é a “resposta” ou o que se “espera” que façam. Os bioeticistas ou membros de comitês de ética muitas vezes são solicitados a manifestar suas opiniões ou são cegamente indagados sobre o que deve ser feito. Argumentamos que é quase eticamente inadequado para os bioeticistas e comitês de ética atuar desse modo, pelos seguintes motivos:

 

       aquilo que é considerado apropriado em termos biomédicos pode ser determinado apenas pelos especialistas biomédicos envolvidos no caso em particular, naquele momento;

       mesmo que um membro do comitê de ética também seja um biomédico especialista, seu papel como membro do comitê não é biomédico e sim bioético;

       só o paciente (ou procurador do paciente e, se o paciente desejar, seus entes próximos) pode aceitar ou rejeitar as alternativas biomédicas oferecidas pelos especialistas.

 

Um bioeticista ou comitê de ética pode ser capaz de ajudar um paciente ou equipe de assistência de saúde a reconhecer conceitos e argumentos falhos, a fim de melhor destrinchar queixas, valores, interesses e metas concorrentes de uma situação problemática em particular. Todavia, esses profissionais não possuem formação médica (no caso do bioeticista que não é médico) ou não é sua função atual (no caso dos profissionais da saúde atuantes em comitês de ética); portanto, é eticamente inadequado para eles prescrever ou proscrever aos pacientes e a seus médicos aquilo que pode representar escolhas modificadoras para os que arcarão diretamente com as consequências de tais escolhas. Explicando de maneira simplificada, quando solicitados a atuar como consultores de ética em casos problemáticos, o bioeticista ou o comitê de ética têm como papel adequado ajudar a descobrir a gama mais ampla de alternativas consideradas eticamente apropriadas, diante das particularidades do caso em questão, considerando ainda os interesses, os valores e as metas do paciente.

 

A relação paciente-médico: quando os médicos são objetos

Médicos não são máquinas de venda automática. Os médicos são indivíduos que possuem suas próprias moralidades pessoais. Então, como esses profissionais respondem quando suas próprias moralidades pessoais entram em conflito com as solicitações ou demandas legalmente válidas de um paciente ou instituição? Sem dúvida, nenhum profissional de assistência de saúde (exceto em circunstâncias inusitadas) pode ser forçado a agir de modo conflitante com suas próprias convicções morais. Entretanto, na situação em que um paciente solicita um procedimento legal, porém conflitante com o código moral de um médico em particular, nenhum profissional da saúde pode abandonar nem mentir – seja por concessão ou omissão – para esse paciente. Como alternativa, esses profissionais podem fornecer aos pacientes uma lista de médicos competentes que podem ser mais receptivos às suas expectativas ou interferir no sistema para garantir seu atendimento.

De certo modo, é claro, enviar os pacientes a esses médicos também pode ser considerado uma medida conivente com aquilo que o código de moral do médico o proíbe de fazer. Não obstante, assim como na maioria dos problemas éticos, não há uma escolha que alguém possa considerar “boa” – existem apenas opções de escolha mais ou menos problemáticas. Contudo, como é mais provável que a situação futura do paciente seja a mais significativamente afetada, aprisionar esse paciente ao ponto de vista idiossincrático de um único médico em particular é uma conduta sem dúvida eticamente problemática.

Em termos gerais, existem duas razões principais para justificar uma objeção conscienciosa: ética e política. A razão ética demanda apenas que o indivíduo evite comportamentos contrários a sua moralidade pessoal. A razão política exige o comportamento de fazer uma declaração pública. Em virtude do papel de confiança único exercido pelos clínicos, uma objeção conscienciosa por motivos éticos exige o respeito à privacidade do paciente e o alívio concomitante do clínico em relação às atividades que lhe são moralmente custosas.

Assim como no caso da objeção conscienciosa do tipo político, os médicos devem garantir que essa objeção ocorra estritamente fora de suas relações profissionais fiduciárias – mais uma vez, para proteger a privacidade e o bem-estar biopsicossocial dos pacientes individuais. Exemplificando, se os médicos se preocupam (como pensamos que acontece) com os aspectos de justiça social, como o acesso universal a uma assistência básica minimamente decente, eles devem protestar, porém sem deixar de atender os pacientes, talvez apenas ameaçando publicamente a se recusarem a preencher os formulários. Se os médicos desejam fazer objeções políticas conscienciosas sobre, por exemplo, a questão do aborto ou suicídio auxiliado por médicos, existem numerosos caminhos públicos apropriados além da privacidade da cabeceira de um paciente.

 

Conclusões

De acordo com John Dewey, a essência da educação consiste em ensinar a como pensar, e não o quê pensar. Seguindo esse espírito, esperamos ter oferecido ao leitor ferramentas que sejam suficientes para auxiliar a tarefa sempre difícil de lidar com os conflitos éticos e sociais da prática diária [ver, a seguir, o item Informação sobre ética na assistência de saúde disponível na internet, e também o Apêndice].  

 

Os autores não possuem relações comerciais com os fabricantes de produtos ou prestadores de serviços mencionados neste capítulo.

 

Agradecimentos

Os autores desejam agradecer a Christine K. Cassel, MD, e Ruth T. Purtilo, PhD, por suas contribuições à versão anterior deste capítulo, que serviu de base para esta atualização.

 

Informação sobre ética na assistência de saúde disponível na internet

Governo federal dos EUA

National Institutes of Health, Bioethics Resources on the Web

http://bioethics.od.nih.gov/

Banco de dados da National Library of Medicine para literatura sobre bioética revisada por pares.

National Human Genome Research Institute

www.genome.gov/PolicyEthics/

A página sobre Política e Ética apresenta links para os aspectos críticos e a legislação em torno da pesquisa genética.

Human Genome Project

www.ornl.gov/sci/techresources/Human_Genome/elsi/elsi.shtml

Fornece links para assuntos éticos, legais e sociais relacionados à pesquisa genética.

President’s Council on Bioethics

www.bioethics.gov/

Fornece acesso a tópicos abordados por conselhos no passado – o conselho do ex-presidente Bush, que foi dispersado em junho de 2009; o conselho do atual presidente Obama ainda não havia sido criado quando essa publicação foi lançada.

Organizações profissionais

American College of Physicians

www.acponline.org/running_practice/ethics/

Fornece links para edições, documentos de orientação e materiais relacionados a ética e profissionalismo, incluindo o conhecido Ethics Manual (atualmente em sua 5ª edição).

American Medical Association

www.ama-assn.org/ama/pub/physician-resources/medical-ethics.shtml

Fornece links para o Council on Ethical and Judicial Affairs, que estabelece a política da associação, e também para o centro de recursos em ética.

American Society for Bioethics and Humanities

www.asbh.org/

Fornece links para materiais, recursos, reuniões etc. relacionados às áreas de bioética clínica e acadêmica, e de humanidades.

American Society of Law, Medicine and Ethics

www.aslme.org/

Fornece links para recursos que enfocam a interseção legal, de assistência de saúde e ética.

Association for Practical and Professional Ethics

www.indiana.edu/~appe/

Fornece links para o Responsible Conduct of Research Education Committee da associação, materiais/oportunidades educacionais, oportunidades de financiamento etc.

Sites educativos sobre bioética

American Journal of Bioethics

www.bioethics.net/

Fornece links para periódicos, recursos, fóruns, blogs etc.

Bioethics Council

www.bioethics.org.nz/about-bioethics/internationallinks.html

Guia abrangente de recursos de bioética internacional.

Georgetown University, Kennedy Institute of Ethics

http://bioethics.georgetown.edu/

Fornece links para diversos recursos, entre os quais o National Reference Center for Bioethics Literature

University of Chicago MacLean Center for Clinical Medical Ethics

http://medicine.uchicago.edu/centers/ccme/links.htm

Fundado em 1984, o centro fornece links abrangentes para institutos e universidades, tanto norte-americanos como de outros países, que oferecem programas em bioética.

University of Pennsylvania, Center for Bioethics

www.bioethics.upenn.edu/

Fornece links para diversos recursos, incluindo o site ScattergoodEthics, que se destina a servir de clearinghouse de informações sobre ética de saúde mental e comportamental.

University of Wisconsin

http://medhist.wisc.edu/resources.shtml

Fornece links para diversos arquivos e coleções, incluindo o Medical Humanities Resource Database.

National Academy of Sciences / National Academy of Engineering / Institute of Medicine / National Research Council

www.nas.edu

Fornece links para diversos recursos, incluindo um link de acesso à própria política de conflito de interesses.

Periódicos relacionados da área de bioética

American Journal of Law and Medicine

www.aslme.org

Bioethics

www.blackwellpublishing.com/journal.asp?ref=0269-9702

British Medical Journal

www.bmj.com

Cambridge Quarterly of Healthcare Ethics

http://journals.cambridge.org/action/displayJournal?jid=CQH

The Hastings Center Report

www.thehastingscenter.org/publications/hcr/hcr.asp

Journal of the American Medical Association (JAMA)

http://jama.ama-assn.org

Journal of Clinical Ethics

www.clinicalethics.com

Journal of Law, Medicine, and Ethics

www.aslme.org

Journal of Medical Ethics

www.jmedethics.com

Journal of Medicine and Philosophy

http://jmp.oxfordjournals.org

Kennedy Institute of Ethics Journal

www.press.jhu.edu/journals/kennedy_institute_of_ethics_journal

The Lancet

www.thelancet.com

The New England Journal of Medicine

www.nejm.org

Yale Journal of Health Policy, Law, and Ethics

www.yale.edu/yjhple

 

Apêndice

Lista de alguns conceitos bioéticos úteis para esclarecer a discussão de questões éticas

Uma das principais dificuldades encontradas em qualquer discussão, seja ou não contenciosa, é a existência inevitável de suposições escondidas. Nossas vidas no dia a dia, obviamente, estão repletas de hipóteses e, se não pudéssemos contar com elas com certo grau de sucesso, ficaríamos sobrecarregados. O problema com as suposições é que elas podem sossegar as pessoas fazendo-as pensar que todos estão “do mesmo lado”, quando, na verdade, isso nem sempre ocorre. Vejamos um exemplo perfeito: não há concordância no que se refere à questão de ética e moralidade serem sinônimos, nem quanto ao modo de distingui-las caso, de fato, não sejam sinônimos. A maioria das pessoas – incluindo filósofos e bioeticistas – continua empregando os termos “ética” e “moralidade” de forma intercambiável, o que tem gerado uma infindável e – há muito temos argumentado – desnecessária confusão. Para evitar essa confusão, é importante reconhecer (e, espera-se, reduzir) suposições escondidas e/ou conflitantes, bem como descobrir se estas são ou não genuinamente garantidas o quanto antes. Para tanto, oferecemos a seguir uma lista de conceitos comuns de bioética [Tabela 1], cuja utilização permite realizar, de forma mais frutífera, análises críticas, discussões, argumentações, compreensões e redefinições.

 

Tabela 1. Conceitos comuns de bioética

       “Estar vivo” versus “ter uma vida”

       Interesses

       “Melhor interesse” padrão

       Intuição

       Autonomia

       Julgamento substituto

       Beneficência

       Justiça

       Capacidade de decisão

       Libertarismo

       Códigos profissionais

       Moralidade pessoal

       Confidência

       Não maleficência

       Conflito de interesse

       Necessidade

       Consciência

       Objeção conscienciosa

       Consentimento

       Paternalismo

       Consentimento informado

       Prima facie

       Consentimento presumido

       Principialismo

       Consequencialismo

       Procurador ou substituto para tomada de decisões

       Contar a verdade

       Profissão

       Delação

       Recusa presumida

       Deontologia

       Relação paciente-médico

       Direitos

       Sistema(s) de assistência de saúde

       Efeito duplo

       Suicídio auxiliado pelo médico

       Ética na assistência

       Virtude e ética da virtude

       Eutanásia

       Vontade de viver

       Futilidade

 

 

Lista de alguns conceitos legais centrais úteis para esclarecer a discussão das questões éticas

Assim como na seção anterior, fornecemos a seguir uma lista de conceitos legais comuns [Tabela 2], com algumas definições e critérios provisionais bastante básicos, cuja utilização permite realizar de forma mais frutífera análises críticas, discussões, argumentações, compreensões e redefinições. 

 

Tabela 2. Conceitos legais

       Competência

       Morte cerebral

       Consentimento

       Nutrição e líquidos artificiais

       Consentimento informado

       Objeção conscienciosa

       Diretivas avançadas

       Procuração duradoura para assistência de saúde

       Eutanásia

       Suicídio auxiliado pelo médico

       Justiça

       Vontade de viver

 

Leituras adicionais

1.         Beauchamp JF, Childress T. Principles of biomedical ethics. 4th ed. New York: Oxford University Press; 2000.

2.         Chadwick R, editor. Encyclopedia of applied ethics. San Diego: Academic Press; 1998.

3.         Damasio AR. Descartes error: emotion, reason and the human brain. New York: Avon Books; 1996.

4.         Damasio AR. The feeling of what happened: body and emotion in the making of consciousness. Fort Washington (PA): Harvest Books; 2000.

5.         Daniels N. Just health: meeting health needs fairly. New York: Cambridge University Press; 2008.

6.         Dewey J. The need for a recovery of philosophy. In: Boydston JA, editor. The middle works, 1899–1924. Vol 10. Carbondale (IL): Southern Illinois University Press; 1985. p. 3–48.

7.         Dewey J. Logic: the theory of inquiry. In: Boydston JA, editor. The later works, 1925–1953. Vol 12. Carbondale (IL): Southern Illinois University Press; 1991.

8.         Engelhardt HT Jr. The foundations of bioethics. New York: Oxford University Press; 1986.

9.         Feinberg J. Legal paternalism. Can J Phil 1971;1:105–24.

10.      Hobbes T. Leviathan. New York: WW Norton & Co.; 1997.

11.      Illes J. Neuroethics. New York: Oxford University Press; 2006.

12.      Jonsen AR, Siegler M, Winslade WJ. Clinical ethics: a practical guide to ethical decisions in clinical medicine. 6th ed. New York: McGraw-Hill; 2006.

13.      Kant I. Foundations of the metaphysics of morals. Indianapolis (IN): Bobbs-Merrill; 1980.

14.      Kuhse H, Singer P. Bioethics: an anthology. 2nd ed. Oxford: Blackwell Publishing; 2006.

15.      LeDoux W. The emotional brain: the mysterious underpinnings of emotional life. New York: Touchstone Books; 1998.

16.      Loewy EH, Fitzgerald FT. Principalism at the bedside. Wien Klin Wochenschr 2003;115:797–802.

17.      Loewy EH, Loewy RS. Textbook of healthcare ethics. 2nd ed. Boston: Kluwer Academic Publishers; 2004.

18.      Nozick R. Anarchy, state and utopia. New York: Basic Books; 1974.

19.      Pellegrino ED, Thomasma DC. For the patient’s good: the restoration of beneficence in health care. New York: Oxford University Press; 1988.

20.      Post SG, editor. Encyclopedia of bioethics. 3rd ed. New York: Macmillan Reference; 2003.

21.      Rachels J. The elements of moral philosophy. Boston: McGraw-Hill; 2003.

22.      Roth G. Dasirn und seine Wirklichkeit. Frankfurt: Suhrkamp Taschenbuch; 2000.

23.      Singer PA, Viens AM, editors. The Cambridge textbook of bioethics. New York: Cambridge University Press; 2008.

24.      Stanford encyclopedia of philosophy. Available at: http://plato.stanford.edu/entries/paternalism (accessed November 5,2009).

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