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Mordidas e picadas – Lawrence M Lewis William H Dribben Mark D Levine

Última revisão: 18/11/2015

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Lawrence M. Lewis, MD

Associate Professor of Emergency Medicine, Washington University in St. Louis and Barnes-Jewish Hospital, St. Louis, MO

 

William H. Dribben, MD

Associate Professor of Emergency Medicine, Washington University in St. Louis and Barnes-Jewish Hospital, St. Louis, MO

 

Mark D. Levine, MD

Associate Professor of Emergency Medicine, Washington University in St. Louis and Barnes-Jewish Hospital, St. Louis, MO

 

 

Artigo original: Lewis LM, Dribben WH, Levine MD. Bites and stings. ACP Medicine. 2011;1-29.

[The original English language work has been published by DECKER INTELLECTUAL PROPERTIES INC. Hamilton, Ontario, Canada. Copyright © 2011 Decker Intellectual Properties Inc. All Rights Reserved.]

Tradução: Soraya Imon de Oliveira.

Revisão técnica: Dr. Lucas Santos Zambon.

 

 

Mordidas de mamíferos

Epidemiologia

No ano de 2007, foram estimados 4,5 milhões de casos de mordidas de cães nos Estados Unidos, com 1 em cada 5 casos (ao todo, 885.000 casos) necessitando de atendimento médico.1 Estas estimativas são semelhantes a estimativas anteriores.2 Atualmente, a maioria das estatísticas mostra que quase 30% dos ferimentos produzidos por mordida tratados nos serviços de emergência dos Estados Unidos envolvem crianças na faixa etária de 0 a 9 anos. Com o avanço da idade, esta taxa cai após os 9 anos.3 Entre aqueles atendidos no serviço de emergência, a parte do corpo principalmente afetada também difere de forma significativa conforme a idade. As crianças com menos de 4 anos apresentam ferimentos por mordida na cabeça e no pescoço em quase 2/3 dos casos. Por sua vez, mais da metade das vítimas com idade a partir de 15 anos é mordida nos membros.3

 

Patofisiologia

A infecção, sendo a complicação mais comum dos ferimentos produzidos por mordida, é causada pelos micróbios presentes na pele da vítima ou na boca da pessoa ou animal que a mordeu. O risco relativo de infecção é determinado por alguns fatores, entre os quais a espécie do animal causador da ferida; a localização da mordida e a profundidade da ferida; fatores relacionados ao hospedeiro; e o tipo de tratamento dispensado à ferida.4-6 A maioria das infecções resultantes de mordida de mamífero é polimicrobiana, envolvendo espécies aeróbicas e anaeróbicas mistas.7 Mesmo assim, algumas espécies tendem a causar infecções produzidas por patógenos bacterianos característicos, vários dos quais são discutidos nesta seção [Tabela 1]. A incidência e os fatores de risco de transmissão do vírus da raiva através da mordida de um mamífero também são abordados.

 

Tabela 1. Patógenos comuns e importantes e seleção de antibióticos adequados para vários ferimentos causados por mordida humana

 

Animal

Patógenos

Antibióticos

Cachorro

Staphylococcus, Streptococcus, Capnocytophaga canimorsus, Pasteurella spp, Neisseria spp, anaeróbios

Amoxicilina-clavulanato, fluoroquinolonas (3ª geração), doxiciclina*

Gato

Pasteurella spp, Staphylococcus, Streptococcus, Corynebacterium spp, anaeróbios

Amoxicilina-clavulanato, fluoroquinolonas (3ª geração), doxiciclina*

Serhumano

Staphylococcus, Streptococcus, anaeróbios, Eikenella corrodens

Amoxicilina-clavulanato, fluoroquinolonas (3ª geração)

Roedores

Staphylococcus, Streptococcus, Streptobacillus moniliformis

Penicilina G (para S. moniliformis), amoxicilina-clavulanato, doxiciclina

Primatas não humanos

Staphylococcus, Streptococcus, vírus do macaco B

Amoxicilina-clavulanato, fluoroquinolonas (3ª geração), valaciclovir,†‡ aciclovir,† ou famciclovir†

*Considerar em pacientes alérgicos à penicilina, mas não deve ser usada no tratamento de gestantes ou crianças pequenas.

†Considerado para pacientes de alto risco de infecção pelo vírus do macaco B.

‡Agente preferido.

 

Animais domésticos e seres humanos

Cães

Os cães são responsáveis pela maior parte dos ferimentos produzidos por mordida entre os pacientes que procuram atendimento médico, em comparação a todos os outros animais juntos.8 A maioria das mordidas é infligida por animais conhecidos da vítima, sendo que apenas 10 a 30% das lesões relatadas são causadas por mordida de animais errantes.9-11 Os ferimentos são produzidos mais frequentemente nos membros, exceto nas crianças pequenas, que costumam ser mordidas na face, cabeça e pescoço.2,3 De modo específico, as feridas causadas por mordida na mão ocorrem em cerca de 1/5 a 1/2 dos casos relatados e estão associadas a um risco aumentado de infecção (em particular, de tenossinovite) e artrite séptica.5,12 Embora as mortes decorrentes de ataques de cães sejam raras, este cenário trágico ocorre em média 12 a 15 vezes/ano, nos Estados Unidos (238 mortes associadas à mordida de cães, ao longo dos últimos 20 anos). Entretanto, nos anos de 2008 e 2009, este número aumentou para 28 e 32 mortes, respectivamente. No período de 2005 a 2009, os cães das raças pit bull e rottweiler foram responsáveis por 103 e 148 do total de registros de mortes por mordida de cães.13

A flora bacteriana oral dos cães contém espécies de Pasteurella (ambas, canus e multocida), Staphylococcus spp (intermedius), Capnocytophaga canimorsus, Streptococcus e alguns organismos anaeróbios [Tabela 1]. A infecção mista, produzida por organismos aeróbios e anaeróbios, ocorre em cerca de metade das mordidas caninas infectadas.14,15 Os organismos aeróbios mais comumente isolados a partir de mordidas de cães infectadas são Pasteurella spp, Staphylococcus spp e Streptococcus spp.14,15 Uma revisão mais recente inclui diversos organismos implicados na infecção associada a mordidas caninas, entre os quais Capnocytophagia spp, Neisseria weaveri, Neisseria canis, Staphylococcus intermedius, Weeksella zoohelcum, não oxidante-1 e oxidante eugônico-2.7 Organismos anaeróbios similares são encontrados em mordidas de cães e gatos, embora os isolados anaeróbios sejam um tanto mais comuns nas mordidas de gatos e significativamente mais frequentes nas culturas de abscessos, do que em outros tipos de infecção.7,16 Entre os organismos anaeróbios mais comuns tanto nas mordidas de cães como nas mordidas de gatos, estão as espécies de Fusobacterium, Bacteroides spp, Porphyromonas spp, e Prevotella spp.14 Outros estudos também descobriram alta incidência de Peptostreptococcus spp tanto nas mordidas de animais como nas mordidas humanas.15

As mordidas de cachorro não tendem a se tornar infeccionadas, e as taxas de infecção geralmente relatadas são da ordem de 5 a 10%.17 O risco de infecção é maior entre os pacientes de idade mais avançada e para aqueles com diabetes, vasculopatia, alcoolismo crônico ou imunossupressão.12,18 O risco de infecção também é maior para os ferimentos com perfuração, feridas de espessura integral, ferimentos que requerem desbridamento, lesões por esmagamento e ferimentos localizados na mão, no pé ou sobre uma articulação.5,17

As mordidas caninas contaminadas com C. canimorsus podem causar um notável quadro semelhante à sepse, que está associado à febre alta, leucocitose, coagulação intravascular disseminada (CIVD) e falência de múltiplos órgãos. Esta complicação das lesões causadas por mordida de cachorro é mais comum em pacientes imunocomprometidos (asplenia, alcoolismo, malignidade hematológica) e está associada a uma taxa de mortalidade de 25%.19 Também há relatos de casos raros de leptospirose resultante de mordida de cães.7

É importante notar que, embora a variante do vírus da raiva canina responsável pela transmissão da raiva de um cão a outro tenha sido erradicada nos Estados Unidos,20 os cães continuam podendo contrair raiva a partir de outras espécies. Mesmo assim, os cães domésticos são cada vez menos uma fonte em potencial de transmissão de raiva e, em 2008, correspondiam a apenas 1,1% de todos os animais relatados como sendo raivosos ao Centers for Disease Control and Prevention (CDC).21

 

Gatos

As mordidas de gato estão em 2º lugar entre as mordidas de mamíferos mais comuns nos Estados Unidos, representando 5 a 15% de todas os relatos de mordida.10,22 Cerca de 2/3 de todas as mordidas de gatos ocorrem nos membros superiores. As mordidas de gato costumam produzir ferimentos com perfuração, em vez de lacerações, e muitas vezes parecem ser inicialmente inócuas. Entretanto, a taxa de infecção associada às mordidas de gato é de 20 a 50%, ou seja, quase o triplo da taxa de infecção associada às mordidas de cachorro.5,23,24 Pasteurella multocida é o principal patógeno associado às mordidas de gato, encontrado em 70% dos ferimentos produzidos por mordida de gato contaminada.9

A infecção por P. multocida evolui rápido e é acompanhada de dor, inchaço e eritema, que geralmente ocorrem dentro de 24 horas, mas com frequência emergem após 3 horas da mordida.9,25 A penetração nos tecidos mais profundos com resultante desenvolvimento de osteomielite ou artrite séptica é mais comum nas mordidas de gato do que nas mordidas caninas.26 A doença da arranhadura de gato (DAG) é uma infecção produzida por um organismo semelhante à riquétsia, Bartonella henselae. Um indivíduo pode desenvolver DAG após sofrer arranhaduras mínimas, e a condição está associada ao aparecimento de uma pápula insensível no sítio da inoculação do patógeno, seguido do desenvolvimento de linfadenopatia e febre em 1 a 2 semanas.27 A doença em geral é autolimitada em hospedeiros imunocomprometidos, mas também podem ser observadas manifestações atípicas, como a síndrome oculoglandular de Parinaud (nódulo conjuntival, conjuntivite e adenopatia pré-auricular), hepatite granulomatosa ou complicações neurológicas. A DAG sintomática e prolongada pode ser tratada com um curso de antibióticos. Os macrolídeos, fluoroquinolonas, rifampina e trimetoprim-sulfametoxazol comprovadamente produzem alguma resposta clínica.28 Uma síndrome vasoproliferativa cutânea distintiva (angiomatose bacilar) e uma síndrome visceral (peliose bacilar) podem desenvolver-se em pacientes com AIDS, particularmente naqueles com contagens de CD4 inferiores a 50 células/mcL.27,28 Também há relatos de que as mordidas de gato transmitem tularemia.29

Embora os animais domésticos correspondam a apenas 7% de todos os animais relatados como sendo raivosos ao CDC em 2008, o percentual total de gatos continua aumentado (4,4% em 2008), enquanto o percentual total de cães está em declínio (1,1% em 2008).21

 

Seres humanos

As mordidas humanas estão em 3º lugar entre as mordidas de mamíferos mais comuns, nos Estados Unidos, onde correspondem a cerca de 5 a 20% ou mais dos ferimentos produzidos por mordida tratados nos serviços de emergência urbanos.5,30 Os ferimentos causados por mordida humana em crianças pequenas são mais frequentes na face, membros superiores ou no tronco, e resultam de abuso infantil em 1 a 3% dos casos.8 As feridas causadas por mordida humana em adolescentes e adultos, em sua maioria, estão localizadas nos membros superiores e são obstrutivas ou em punho fechado (mordida de briga). Cerca de 15% das lesões decorrentes de mordida em adultos podem ocorrer durante a atividade sexual.12 Tradicionalmente, as feridas produzidas por mordida humana têm reputação de estarem associadas a complicações frequentes e graves. No entanto, dados sugerem que a taxa de infecção de ferimentos causados por mordida humana é altamente dependente do tipo e localização da mordida.31,32 Os ferimentos produzidos por mordida do tipo obstrutivo ou simples, que não ocorrem nas mãos, provavelmente apresentam o mesmo risco de infecção associado a qualquer tipo de ferida por mordida e são apenas um pouco mais propensos à infecção do que as lacerações não causadas por mordida.32 Entretanto, os ferimentos causados por mordida humana na mão estão associados a taxas de infecção de quase 50%.33 Uma lesão em punho cerrado ou fechado é considerada a mais potencialmente grave de todas feridas causadas por mordida humana [Figura 1]. Estas lesões podem parecer inocentes, mas evoluem para infecções sérias que podem envolver as articulações, tendões ou vários compartimentos da mão. Estas lesões requerem tratamento meticuloso do ferimento, instituição de uma terapia antibiótica apropriada e consulta com um cirurgião de mão.

  

 

Figura 1. Os ferimentos de mordida em punho fechado a princípio parecem ser inofensivos.

 

Os patógenos bacterianos associados aos ferimentos causados por mordida humana incluem alguns organismos anaeróbios similares àqueles isolados a partir de mordidas de cães e gatos. Entretanto, nos ferimentos produzidos por mordida humana, mais isolados são recuperados, e o percentual de organismos produtores de betalactamase é maior.7,34,35 Os organismos aeróbios predominantes são as espécies de Staphylococcus e Streptococcus. Foi demonstrado que os ferimentos causados por mordida humana contêm Eikenella corrodens, um anaeróbio facultativo, em 30% dos casos [Tabela 1].14 E. corrodens está presente em 25% das lesões em punho cerrado e pode causar infecções sérias e crônicas.36 Além da infecção bacteriana, as mordidas humanas podem transmitir o vírus da hepatite B (HBV), vírus da hepatite C (HCV),37 HIV,38 herpes simples, tuberculose e até sífilis.39 Dados limitados sugerem que a taxa de transmissão de HIV por ferimentos causados por mordida é baixa40,41 e quase sempre está associada a uma combinação de sangramento oral significativo na fonte e traumatismo cutâneo no contato exposto.41 A terapia profilática contra hepatite B deve ser administrada para as vítimas de mordida, se a integridade da pele tiver sido violada e para aqueles não imunizados previamente [Tabela 2].42 A profilaxia pós-exposição (PPE) contra a transmissão do HIV [Tabela 3] para as vítimas de mordida é mais problemática,43 mas deve ser considerada quando o perpetrador for comprovadamente soropositivo ou apresentar alto risco de infecção por HIV e o ferimento causado pela mordida romper a superfície epidérmica da pele,43 em particular se houver história de mistura de sangue com saliva, pois isto aumenta o risco de transmissão.41 Atualmente, não existe nenhuma profilaxia efetiva àqueles que são expostos a uma fonte positiva para hepatite C. Recomenda-se que os níveis de anticorpo anti-HCV e de alanina aminotransferase da vítima mordida sejam determinados no momento basal e, novamente, após 4 meses. Se o resultado for negativo aos 4 meses, uma amostra final deve ser obtida em 6 meses.42 Se a qualquer momento for detectada positividade para anticorpos anti-HCV, os títulos de RNA de HCV devem ser determinados e, caso o resultado seja positivo, o encaminhamento do paciente para tratamento deve ser considerado.42

 

Tabela 2.PPE contra hepatite B, após mordidas humanas42

 

Estado da vacinação do indivíduo exposto

Condição de HBsAg da fonte

HBsAg+

HBsAg–

Condição de HBsAg desconhecida

Não vacinado

IGHB ×1 e iniciar a série de vacinas contra o HBV

Iniciar a série de vacinas contra o HBV

Iniciar a série de vacinas contra o HBV

Vacinado: respondedor*

Sem tratamento

Sem tratamento

Sem tratamento

Vacinado: não respondedor*

IGHB, iniciar a série de vacinas contra o HBV ou

IGHB ×2‡

Sem tratamento

Em caso de alto risco de infecção por HBV comprovado, tratar considerando a fonte HBsAg+

Vacinado: condição da resposta desconhecida

Testes para anti-HBs

Se for respondedor: sem tratamento

Se for não respondedor: IGHB ×1 e reforço de vacinação‡

Sem tratamento

Testes para anti-HBs

Se for respondedor: sem tratamento

Se for não respondedor: reforço da vacinação e
reavaliação de anti-HBs em 1 a 2 meses

*Respondedor: anti-HBs = 10 mUI/mL; não respondedor: anti-HBs < 10 mUI/mL. Não repetir o anti-HBs, caso haja disponibilidade de resultados anteriores.

IGHB pode ser administrada ao mesmo tempo que a vacina contra HBV, em sítios distintos. Dose de IGHB = 0,06 mL/kg, IM.

‡Se o não respondedor tiver recebido 2 séries completas de vacinação contra HBV, então uma 2ª dose de IGHB 1 deve ser administrada após 1 mês da administração da dose inicial.

IGHB = imunoglobulina anti-hepatite B; HBsAg = antígeno de superfície da hepatite B; HBV = vírus da hepatite B; PPE = profilaxia pós-exposição.

 

Tabela 3. Exposições ao HIV e recomendações de PPE43

 

Condição da vítima

HIV+, PPE de classe 1*

HIV+, PPE de classe 2†

Condição de HIV desconhecida

Exposição de pele não intacta

Volume pequeno

Considerar 2

PPE de 2 fármacos

Em geral, sem PPE

Volume amplo

Fármacos

PPE de 2 fármacos

PPE = 3 fármacos

Considerar PPE de 2 fármacos

*Classe 1 = assintomático e/ou carga viral de HIV < 1.500 colônias/mL.

Classe 2 = sintomático para infecção por HIV, AIDS, soroconversão aguda, ou elevada carga viral.

PPE = profilaxia pós-exposição.

 

Furões

Os furões pertencem à família (Mustelidae) das martas, jaritataca e doninhas. Existem 2 espécies de furões nos Estados Unidos: o furão doméstico (Mustela putorius) e o furão de pata negra da América do Norte (Mustela negripes).

Recentemente, o furão doméstico foi relatado como estando em 3º lugar entre os animais de estimação mais populares nos Estados Unidos, perdendo apenas para os cães e gatos, com uma marca de 7 a 10 milhões.44 Os ataques de furões são considerados incomuns. Entretanto, estes animais são carnívoros dotados de dentes excepcionalmente pontiagudos, conhecidos por “explorarem o mundo com a boca”. Os ataques de furões geralmente não são provocados e podem resultar em danos graves, especialmente a bebês e crianças pequenas.45 Uma revisão da literatura sobre lesões causadas por furões sugere que a vasta maioria dos casos de lesão grave relatados envolvem bebês com menos de 1 ano de idade.44 A flora bacteriana dos furões foi pouco estudada. Um estudo mostrou a predominância de cocos gram-positivos anaeróbios facultativos, seguidos de Pasteurella spp e Corynebacterium spp, com poucos organismos anaeróbios estritos.46

Os furões são nitidamente capazes de contrair e transportar o vírus da raiva.47 Entretanto, segundo o 2008 US Rabies Surveillance Report, não há relatos de casos de raiva em furões.21 Em termos de transmissão, não se sabe por quanto tempo um furão consegue liberar vírus antes de apresentar os sinais clínicos da doença, e isto torna problemático estabelecer as recomendações de quarentena. Existe uma vacina antirrábica aprovada para uso em furões, que parece ser eficaz na prevenção da raiva.48 As atuais recomendações consistem em instituir imediatamente a PPE contra raiva aos animais com suspeita de raiva e, na ausência de suspeita, mantê-los sob observação por 10 dias e suspender a vacinação, a menos que os animais mostrem sinais de raiva [Tabela 4].49 Além da raiva, os furões podem transportar várias doenças transmissíveis, como gripe, febre por mordedura do rato (FMR), tuberculose (Mycobacterium tuberculosis, Mycobacterium bovis e Mycobacterium avium), salmonelose, toxocariose e criptosporidiose.50 Os furões também podem servir de reservatório para campilobacteriose.

 

Tabela 4. Guia de PPE à raiva, Estados Unidos, 200849

 

Tipo de animal

Avaliação e disposição do animal

Recomendações de PPE

Cães, gatos e furões

Sadio e disponível para observação por 10 dias

Sem PPE para raiva, a menos que o animal desenvolva os sinais clínicos da raiva*

Raivoso ou com suspeita de raiva

Iniciar a profilaxia imediatamente

Desconhecido (p. ex., fugiu)

Consultar as autoridades de saúde pública

Jaritataca, raccoon, raposas e a maioria dos demais carnívoros; morcegos†

Considerado raivoso, a menos que a negatividade do animal seja comprovada por exames laboratoriais‡

Considerar a profilaxia imediata

Gado, pequenos roedores (coelhos e lebres), grandes roedores (marmotas e castores), além de outros mamíferos

Considerar individualmente

Consultar as autoridades de saúde pública. Mordidas de esquilos, hamsters, cobaias, gerbos, tâmias, ratos, camundongos, outros pequenos roedores, coelhos e lebres quase nunca requerem PPE para raiva

*Durante o período de observação de 10 dias, iniciar a PPE ao 1º sinal de raiva apresentado por um cachorro, gato ou furão. Se o animal apresentar sinais clínicos de raiva, deve ser eutanasiado imediatamente e examinado.

A PPE deve ser iniciada o quanto antes, após a exposição a estes animais selvagens, a menos que o animal agressor esteja disponível para exames e as autoridades de saúde pública facilitem a realização dos exames laboratoriais onerosos, ou já tenha sido comprovado que o material cerebral do animal resultou negativo nos exames. Os fatores que poderiam influenciar a urgência da PPE antes da obtenção dos resultados diagnósticos incluem a espécie do animal, sua aparência geral e comportamento, se o encontro foi provocado, e a severidade e localização da mordidas. A vacinação deve ser descontinuada, caso os exames laboratoriais diagnósticos apropriados (teste de imunofluorescência direto) resultem negativos.

‡O animal deve ser eutanasiado e examinado o quanto antes. Manter o animal para observação não é recomendável.

PPE = profilaxia pós-exposição.

 

Animais não domésticos

Ratos

As mordidas de rato são incomuns. Entretanto, nas aéreas urbanas, em particular nas populações que vivem na pobreza, a incidência das mordidas de rato pode se aproximar ou até exceder a incidência das mordidas de outros animais.51 Embora a lista de potenciais patógenos que podem ser transmitidos pela mordida de rato seja assustadora, na verdade, as infecções causadas pela mordida de rato, inclusive a raiva, são bastante infrequentes.52 Uma doença incomum, porém importante e que pode ser transmitida via mordida de ratos é a FMR. Esta é uma condição causada por Streptobacillus moniliformis, um bastonete gram-negativo. A FMR é caracterizada pela tríade de febre, erupção cutânea e artrite. Apesar dos relatos de resolução espontânea, a infecção não tratada pode resultar em pneumonia, endocardite e sepse, além de estar associada a uma mortalidade geral aproximada de 10%.53 A FMR deve ser considerada no diagnóstico diferencial de doenças febris ou sepse envolvendo pacientes com exposição a ratos comprovada. Contudo, até 30% dos pacientes com FMR não relatam exposição a ratos. A penicilina é o tratamento antibiótico de escolha. O sodoku é uma forma secundária de FMR causada por um bastonete gram-negativo firmemente espiralado (Spirillum minus), que ocorre com maior frequência na Ásia, embora tenha sido relatada no mundo inteiro. O sodoku muitas vezes se manifesta como uma febre recidivante, contudo difere clinicamente da FMR causada por Streptobacillus, pois apresenta um período de incubação mais longo, uma incidência menor de sintomas articulares e achados mais proeminentes no sítio da mordida.

 

Morcegos

Os morcegos são mencionados à parte por serem responsáveis pela maioria dos casos de raiva humana adquirida no ambiente doméstico, nos Estados Unidos, desde 1990, representando 17 em cada 22 casos de doença associada a mordidas registrados no período de 2000 a 2009.21 De fato, os testes moleculares que detectaram vírus da raiva isolados de 35 pacientes diagnosticados com a doença entre 1958 e 2000 mostraram que um vírus de raiva específico de morcegos insetívoros foi responsável por 32 (91,4%) dos casos.54 É importante notar que as mordidas relatadas haviam sido definidas apenas em 2 dos 24 casos de raiva humana atribuíveis a variantes de morcegos, desde 1990.55 Os 22 casos restantes foram considerados criptogênicos, ou seja, casos em que os pacientes não forneceram história de mordida de animal potencialmente raivoso. A tipagem molecular do vírus da raiva demonstrou recentemente que cerca de 90% dos casos criptogênicos de raiva humana relatados nos Estados Unidos são, de fato, atribuíveis ao vírus associado aos morcegos, sendo que a maioria dos vírus não estava associada ao morcego doméstico comum, e sim a outras 2 espécies particulares de morcegos que não costumam conviver com seres humanos (o morcego-grisalho [Lasionycteris noctivagans] e o morcego-anão [Pipistrellus pipistrellus]).54 Parece que o contato com estes morcegos, devido ao tamanho pequeno e aos dentes pequenos dos animais, pode não ser notado. Mesmo que a mordida seja percebida, pode ser confundida com a picada de uma aranha ou inseto.35

Estudos sugerem que a limpeza imediata da ferida com sabão e um agente viricida é uma ação efetiva para diminuir o risco de transmissão de raiva.48,56 A profilaxia contra a raiva é recomendada para qualquer tipo de exposição a morcegos, a menos que haja possibilidade de se realizar um exame cerebral imediatamente [Tabela 4].

 

Outros

Os animais selvagens são responsáveis por mais de 90% de todos os casos de raiva confirmados nos Estados Unidos.21 Além dos morcegos, os raccoons, jaritatacas e raposas também são animais importantes como reservatórios de raiva nesse país.21 As mordidas destes animais devem ser consideradas como possivelmente raivosas, até que se prove o contrário, e justificam o uso de imunoglobulinas antirrábicas e também da vacina antirrábica, sobretudo nas áreas endêmicas de raiva ou se o comportamento do animal envolvido for considerado anormal.57

Os ferimentos causados por mordida de animais selvagens são raros. A maioria destes ferimentos ocorre durante a exposição em zoológicos ou envolve indivíduos que compram ou abrigam animais exóticos.58 A incidência de lesões graves decorrentes de ataques de animais selvagens aos 3 milhões de visitantes do Yellowstone National Park foi relatada como sendo inferior à probabilidade de ser atingido por um raio.58

Enfim, os ferimentos produzidos por mordida de primatas não humanos, embora sejam incomuns nos Estados Unidos, constituem um risco em potencial aos tratadores de animais, veterinários e funcionários de laboratório. Além de imporem um risco de infecção bacteriana, as mordidas de macaco também impõem a ameaça da transmissão de vírus símios específicos. Foi constatado que os seguintes vírus eram endêmicos entre macacos amestrados: vírus linfotrópico de célula T (STLV), retrovírus símio, vírus da imunodeficiência símia (SIV), vírus espumoso símio (SFV) e herpesvírus B (herpesvírus Cercopithecine 1).59

Há evidências sólidas da ocorrência de transmissão de STLV e SIV para seres humanos no passado, que serviram de precursores evolutivos para o vírus linfotrópico de célula T humano e para o HIV.60 Entretanto, faltam evidências, atualmente, da ocorrência de transmissão interespécies ativa nos dias hoje. O SFV é comprovadamente transmitido para seres humanos, mas não está associado a nenhuma doença.61

O herpes vírus símio ou vírus B é enzoótico entre os macacos norte-africanos e asiáticos, incluindo os macacos do gênero Macaca e o macaco Rhezus. Este vírus é transmissível e frequentemente causa encefalite no hospedeiro humano. Quando não tratada, a infecção pelo vírus B está associada a uma taxa de mortalidade relatada de até 70 a 80% e muitas vezes causa comprometimento neurológico permanente nos sobreviventes.62 Os sintomas iniciais em geral se desenvolvem em 1 a 3 semanas após a exposição (apesar dos relatos de manifestações bem mais tardias) e manifestam-se como uma condição semelhante à gripe, embora possam surgir lesões vesiculares no sítio da mordida. A disseminação do vírus ocorre através dos nervos até atingir a medula espinal e o cérebro. Embora a sorologia seja a base do diagnóstico, o exame requer pelo menos cerca de 1 semana para que os anticorpos sejam produzidos. Além disso, este exame é inespecífico, devido à reatividade cruzada entre o vírus B e o herpesvírus simples humano.62 O tratamento com agentes antivirais (aciclovir ou ganciclovir) iniciado o quanto antes durante o curso da doença foi associado à recuperação total.63 Devido à alta morbidade e mortalidade associada a estas infecções, recomenda-se iniciar uma PPE que consista em esfregação minuciosa com sabão ou detergente (povidona-iodo ou cloro-hexidina) e irrigação do ferimento produzido pela mordida, durante pelo menos 15 minutos, para diminuir o inóculo viral, bem como instituir uma terapia antiviral oral.64,65

 

Tratamento

Embora o tratamento do ferimento envolva alguns aspectos específicos do animal agressor, os princípios abrangentes são sempre os mesmos, independentemente da espécie do animal envolvido. Os objetivos do tratamento da ferida consistem em identificar e tratar lesões graves (como a laceração de nervo ou tendão e o envolvimento articular), evitar infecções (locais e sistêmicas) e obter um resultado estético satisfatório. O tratamento dos ferimentos causados por mordidas de mamíferos começa pela obtenção de uma história abrangente e realização do exame físico. A história deve incluir quando e onde ocorreu a mordida, os eventos que levaram à mordida, qual foi o tipo de animal responsável pela mordida e se a mordida foi provocada, além de qualquer história disponível sobre o animal envolvido, incluindo algum comportamento anormal e o estado de vacinação. Qualquer tipo de tratamento instituído antes da chegada ao hospital, a história de imunização antitetânica do paciente e quaisquer alergias farmacológicas devem ser registradas. Finalmente, a história deve inclui todos os fatores relacionados ao hospedeiro que possam aumentar o risco de infecção local ou sistêmica, como diabetes, vasculopatia periférica, abuso de álcool, doença hepática, esplenectomia, mastectomia, próteses de articulações ou valvas, e quaisquer condições distintas que possam estar associadas a um estado de imunodeficiência.

É necessário realizar e documentar um exame físico detalhado, para avaliar o paciente quanto à existência de lesões significativas em artérias ou veias e quanto ao envolvimento de nervos, articulações ou tendões. Para tanto, deve-se documentar a localização anatômica da lesão, bem como quaisquer desvios em relação à posição anatômica em repouso normal, sensação, força motora, amplitude de movimento, cor da pele e enchimento capilar. O ferimento deve ser explorado em busca de corpos estranhos, incluindo dentes ou fragmentos de dente. A obtenção de radiografias pode ajudar a detectar o envolvimento ósseo ou articular, bem como a presença de fragmentos de dente que não sejam clinicamente evidentes. A exploração da ferida também é essencial para detectar lesões ocultas em estruturas vitais (p. ex., ducto parotídeo, ducto lacrimal ou nervo facial em casos de ferimento facial). A exploração da ferida torna-se mais eficiente com a utilização de um torniquete, o qual permite a visualização de um campo sem sangue, desde que se tome cuidado para minimizar o tempo de isquemia.66

Após a realização do exame e o fornecimento de uma anestesia adequada, o ferimento deve ser meticulosamente limpo e irrigado. A ferida não deve ser encharcada nem esfregada. A irrigação com cerca de 250 a 300 mL de solução salina normal ou solução de betadina diluída com aplicação de pressão moderada (20 psi, equivalente à pressão gerada com auxílio de uma seringa com agulha 19 G) comprovadamente diminui o inóculo bacteriano67 e reduz em 5 vezes a infecção.68 A quantidade exata de irrigante deve ser baseada no tamanho da ferida.69 Um estudo que comparou o uso de solução salina normal para diluição de povidona-iodo (a 1%) e Pluronic F-68 (um agente de limpeza de ferimentos não tóxico, que consiste em um copolímero de etileno e óxido de propileno) mostrou que não há diferenças significativas em termos de taxa infecção.70 Entretanto, por suas propriedades viricidas, a solução de povidona-iodo pode ser mais apropriada para limpar ferimentos que apresentam risco moderado a alto de raiva.71 O tecido inviável ou grosseiramente contaminado deve ser cuidadosamente desbridado, pois está comprovado que o desbridamento diminui em cerca de 1/3 a incidência de infecção de feridas.68,72 Embora o cloreto de benzalcônio também seja recomendado para a limpeza de feridas consideradas de alto risco de raiva, esta substância tem menor disponibilidade e é mais tóxica do que uma solução de betadina diluída. A esfregação com solução de betadina não diluída deve ser evitada, pois pode retardar a cicatrização do ferimento e é tóxica para o tecido subjacente.71,74

Ainda é discutível se o ferimento deve ser primariamente fechado, contudo dados recentes mostram que esta decisão pode ser tomada com base na localização e no tipo de ferida, bem como na existência ou não de alguma evidência de infecção no momento da apresentação.17,72,75,76 Os ferimentos produzidos por mordida nas mãos ou pés raramente devem ser fechados por intenção primária.75,77 Entretanto, as mordidas de cachorro que resultam em lacerações (e não em ferimentos com perfuração) na região da cabeça ou face, produzidas há menos de 10 horas e submetidas a uma limpeza e irrigação cuidadosas aparentemente podem ser fechadas por intenção primária, sem que haja aumento significativo da incidência de infecção.75 De modo significativo, alguns estudos realizados com animais sugeriram um risco aumentado de infecção associado ao uso de vasoconstritor (adrenalina) com lidocaína, em vez de apenas lidocaína.78

 

Profilaxia antibiótica

Em geral, o uso profilático de antibióticos no tratamento de ferimentos causados por mordidas de mamífero é discutível. Uma revisão sistemática demonstrou uma redução significativa da incidência de infecção associada ao uso profilático de antibióticos para tratar mordidas de cães.79 Contudo, uma revisão que considerou os mesmos estudos (com exceção de 1) em sua análise não constatou a ocorrência desta redução.80 Todavia, uma subanálise deste último estudo sustentou o uso de antibióticos profiláticos no tratamento de mordidas na mão. Existe um consenso geral de que certas feridas em todos os pacientes e a maioria das feridas em alguns pacientes merecem tratamento profilático antibiótico [Tabela 5]. A escolha do antibiótico é tão importante quanto o horário de sua administração. Os antibióticos profiláticos devem ser administrados o quanto antes, de preferência dentro de 3 horas.81,82 A duração da terapia também é discutível, mas em geral um período de 5 dias é considerado adequado.5,83 A escolha do antibiótico é baseada nos patógenos conhecidos mais comuns, de acordo com a espécie. A profilaxia para mordidas de cães e gatos deve fornecer cobertura contra Pasteurella, Staphylococcus, Streptococcus e espécies anaeróbicas. Também é importante considerar a flora da pele. Com base nestas considerações, o antibiótico de escolha inicial para fins de profilaxia da maioria das feridas causadas por mordida de mamíferos é a amoxicilina-ácido clavulânico.7 Para o paciente alérgico à penicilina, a doxiciclina ou uma fluoroquinolona de 3ª geração (p. ex., gatifloxacina ou moxifloxacina) são alternativas satisfatórias.7,64,84 Os ferimentos de mordida infeccionados costumam ser tratados inicialmente com uma combinação de antibióticos intravenosos que inclua cobertura contra produtores de betalactamase, anaeróbios, Pasteurella e até Staphylococcus aureus resistente à meticilina. Uma combinação deste tipo poderia incluir vancomicina e moxifloxacina. É importante rever seu antibiograma mais atualizado, bem como consultar seus colegas cirurgiões e especialistas em doenças infecciosas com o intuito de determinar a melhor combinação de antibióticos para infecções de ferimentos graves causados por mordida. Muitas vezes, após a terapia intravenosa, os pacientes são liberados sob tratamento com os mesmos antibióticos usados na profilaxia, porém a duração da terapia de uma ferida infeccionada deve ser de 10 a 14 dias ou mais, caso haja envolvimento de articulações ou ossos.4,7,83

 

Tabela 5. Ferimentos de mordida que requerem profilaxia antibiótica

 

Características do ferimento de mordida

Ferimentos com perfuração

Ferimentos de espessura integral

Ferimentos na mão ou pé

Ferimentos que requerem reparo cirúrgico

Atraso na instituição do tratamento (> 12 horas)

Mordidas potencialmente danosas aos ossos, articulações ou tendões

Mordidas humanas ou de gato que se estenderam pela derme*

Características do hospedeiro

Idade > 50 anos

Imunossuprimido (asplenia, alcoolismo, corticosteroide)

Diabetes melito

Vasculopatia periférica

*Embora seja discutível, muitos autores sugerem que, devido à alta taxa de infecção, a maioria das mordidas de gato e de seres humanos deve ser tratada com antibióticos profiláticos.

 

Outras profilaxias pós-exposição

Tétano. A profilaxia contra o tétano deve ser fornecida aos pacientes que, nos últimos 10 anos, não receberam imunização em decorrência de ferimentos limpos ou pequenos [Tabela 6]. Se o ferimento for extenso (contendo uma quantidade significativa de tecido desvitalizado) ou estiver infeccionado, recomenda-se administrar a profilaxia antitetânica aos pacientes que não foram imunizados nos últimos 5 anos [Tabela 6]. A dose-padrão para o adulto é 0,5 cc de dT (toxoides do tétano e difteria reduzidos) administrada por via intramuscular (IM). A imunoglobulina antitetânica (IGAT) é necessária àqueles com história desconhecida de recebimento de uma série primária inteira (3 doses) de imunização antitetânica. As séries primárias devem ser iniciadas ao mesmo tempo, mas devem ser administradas em sítios distintos. A IGAT geralmente é administrada em uma dose única de 250 unidades, por via IM, no braço oposto àquele que recebeu o toxoide tetânico. Segundo a recomendação atual, os adultos devem tomar uma única dose de dTPA (a vacina anticoqueluche acelular combinada) entre 19 e 64 anos de idade.85

 

Tabela 6. Guia resumido para a profilaxia antitetânica no tratamento de rotina de ferimentos85

 

História de imunização antitetânica (Doses)

Ferimentos menores e limpos

Todos os outros ferimentos

dT*

IGAT

dT*

IGAT

Incerta ou < 3 doses

Sim

Não

Sim

Sim

Pelo menos 3 doses

Não

Não

Não‡

Não

 

*Para crianças com idade < 7 anos, difteria/tétano/coqueluche acelular ou difteria/tétano/coqueluche (difteria/tétano, em caso de contraindicação da vacina contra coqueluche) são preferíveis ao toxoide tetânico isolado. Para crianças com idade = 7 anos, os dT são preferíveis ao toxoide tetânico isolado. Para adolescentes e adultos com idade até 64 anos, uma dose única de tétano/difteria reduzida/coqueluche acelular (a vacina acelular contra coqueluche combinada) é preferível, se o paciente não tiver sido previamente vacinado com tétano/difteria reduzida/coqueluche acelular.

Sim, se tiverem decorridos mais de 10 anos desde a última dose.

‡Sim, se tiverem decorridos mais de 5 anos desde a última dose. Os reforços mais frequentes são desnecessários e podem acentuar os efeitos colaterais.

IGAT = imunoglobulina antitetânica; dT = toxoides do tétano e diftéricos reduzidos.

 

Raiva. A PPE à raiva consiste primeira e principalmente no tratamento apropriado do ferimento. O uso da imunoglobulina antirrábica e a administração da vacina dependem da epidemiologia local, do animal envolvido (espécie e comportamento) e do tipo de exposição.49 O uso da PPE à raiva para mordidas de animais domésticos é justificado nos seguintes casos: (1) o animal que parecia previamente saudável mostra sinais clínicos de raiva; (2) o animal agressor não está disponível para observação e a taxa de raiva endêmica entre animais domésticos na região não é baixa demais; ou (3) o animal agressor apresentava comportamento anômalo, incluindo ataques não provocados [Tabela 4].49 As recomendações para PPE à raiva foram recentemente modificadas.86 A recomendação atual é diminuir o número de vacinações pós-exposição com vacinas de célula diploide humana, em relação à recomendação anterior de 4 a 5 vacinações [Tabela 7].

 

Tabela 7. Esquema de PPE à raiva, Estados Unidos, 2010

 

Estado da vacinação

Intervenção

Regime*

Sem vacinação prévia

Limpeza do ferimento

Lavagem imediata e completa de todos os ferimentos, com água e sabão. Havendo disponibilidade, um agente viricida (p. ex., solução de povidina-iodo) deve ser usado para irrigar os ferimentos

IGRH

Administrar 20 UI/kg de peso corporal. Infiltrar a quantidade conveniente de IGRH ao redor e dentro do(s) ferimento(s). Administrar o volume restante por via IM, em um sítio distante do sítio de aplicação da vacina. A IGRH não deve ser administrada com a mesma seringa usada na aplicação da vacina. A IGAR pode causar supressão parcial da produção ativa de anticorpos antivírus da raiva, por isso deve ser administrada mais de uma dose recomendada

Vacina

VCDH ou vcegp: 1 mL, IM (área do deltoide), uma de cada nos dias 0,‡ 3, 7 e 14§

Previamente vacinadoïï

Limpeza do ferimento

Idem ao anterior

IGRH

A IGRH não deve ser administrada

Vacina

VCDH ou VCEGP: 1 mL, IM (área do deltoide†), uma de cada nos dias 0‡ e 3

*Estes regimes são aplicáveis a indivíduos de todas as faixas etárias, inclusive crianças.

A área do deltoide é o único sítio aceitável de vacinação para adultos e crianças maiores. Em crianças pequenas, é possível usar o lado externo da coxa. A vacina jamais deve ser administrada na área glútea.

‡O dia 0 é quando a dose 1 de vacina é administrada.

§Para indivíduos imunossuprimidos, a PPE para raiva deve ser administrada empregando todas as 5 doses de vacina nos dias 0, 3, 7, 14 e 28.

||Qualquer pessoa com história de vacinação de pré-exposição com VCDH, VCEGP ou VARA; PPE prévia com VCDH, VCEGP ou VARA; ou vacinação prévia com qualquer tipo de vacina antirrábica e história comprovada de resposta de anticorpos à vacinação anterior.

IGRH = imunoglobulina antirrábica humana; IM = via intramuscular; PPE = profilaxia pós-exposição; VARA = vacina antirrábica adsorvida; VCDH = vacina de célula diploide humana; vcegp = vacina de célula embrionária de galinha purificada.

 

Profilaxia pós-exposição (PPE) subsequente a mordidas humanas

Como já mencionado, as mordidas humanas podem transmitir HBV, HCV e HIV. As últimas recomendações do CDC para a PPE contra transmissão de HBV e HIV são descritas nas Tabelas 2 e 3. Atualmente, não há nenhuma PPE contra a transmissão de HCV. As recomendações para o seguimento do paciente quanto à infecção por HCV já foram discutidas, na seção sobre mordidas humanas.

 

Picadas de cobra

Epidemiologia

Existem mais de 3 mil espécies de cobras em todo o mundo. As cobras são encontradas em qualquer parte da Terra, exceto nos pólos ártico e antártico, Nova Zelândia, Madagascar e em algumas ilhas pequenas. As cobras vivem em quase todos os ambientes terrestres, bem como na água salgada e em água doce.

Cerca de 10% das cobras são venenosas. Dentre as 14 famílias de cobras existentes, apenas 5 incluem espécies venenosas: Colubridae, Hydrophidae (cobra-do-mar), Elapidae (najas, kraits, mambas e cobras-coral), Viperidae (víbora de Russell, víbora sopradora [puff adder], víbora do Gabão/Gaboon, víbora de escamas serrilhadas e víbora europeia) e Crotalidae (cascavel, mocassim d’água, copperhead, surucucu e caiçaca [fer-de-lance]). As cobras são carnívoras, e as cobras venenosas usam seu veneno para imobilizar suas presas e possibilitar a digestão.

Nos Estados Unidos, estima-se que o número de picadas de cobra seja de aproximadamente 8 mil ao ano. Muitas picadas ocorrem enquanto as vítimas estão fazendo trilhas, andando ou manipulando uma cobra. O paciente frequentemente é intoxicado no momento da picada.87 A maioria das picadas de cobra não resulta em envenenamento, mas a cada ano ocorrem 9 a 15 mortes por picadas que resultaram em envenenamento.88 Nos Estados Unidos, as picadas de cascavel mais frequentemente resultam em envenenamento significativo e morte. As cobras podem aplicar sucessivas picadas, e o envenenamento pode ocorrer em uma picada subsequente, ainda que a 1ª picada tenha sido “seca”.89

As cobras são mais ativas durante a primavera, quando começam a acasalar e deixam de hibernar.90 Entretanto, a incidência de picadas de cobras é maior nos meses de verão. As cobras permanecem ativas o dia inteiro e também à noite. No entanto, por serem poiquilotérmicas, precisam restringir sua atividade a uma faixa de temperatura estreita de aproximadamente 25 a 35oC.

 

Cobras-coral

A extensão geográfica das cobras-coral na costa leste estende-se do sul e oeste da Carolina do Norte até o Texas, nos Estados Unidos. A cobra-coral na costa oeste é encontrada principalmente no Arizona e no Novo México. As cobras-coral são noturnas e fogem do contato com seres humanos.

As cobras-coral são identificadas pela cor, padrão e dentes inoculares permanentemente eretos. O nariz da cobra-coral é preto, enquanto seu corpo exibe listras negras, vermelhas e amarelas. As listras negras não se separam das listras vermelhas e amarelas, assim como na kingsnake similarmente listrada e não venenosa. Nos Estados Unidos, este padrão é comumente lembrado com a rima “red on black, venom lack; red on yellow, kills a fellow” (“vermelho e preto, veneno não há; vermelho e amarelo, morte haverá”) [Figura 2]. As cobras-coral liberam seu veneno devagar, para que possam se fixar à presa e envenená-la com um movimento de mastigação. Em vez das feridas por punção típicas da maioria das picadas de cobra, a mastigação deixa marcas que parecem arranhões na pele.90,91

 

 

 

Figura 2. O nariz da cobra-coral é preto e seu corpo exibe listras pretas, vermelhas e amarelas. As listras negras nunca separam as listas vermelhas das amarelas, como ocorre na kingsnake não venenosa e similarmente listrada. A cobra da foto é uma coral do da costa leste, Micrurus fulvius.

 

A picada da cobra-coral da costa leste pode ser fatal. Não há fatalidades confirmadas que tenham sido causadas por envenenamento pela cobra-coral da costa oeste.

 

Víboras com fosseta

Nos Estados Unidos, as víboras com fosseta (Crotalidae) são encontradas em todos os estados, com exceção do Maine, Alasca e Hawaí. Na América do Sul, existem 9 subespécies de cascavel, enquanto no México e na América Central há 4 subespécies de cascavel. Estas cobras podem ser encontradas em vários habitats e locais elevados (até 4.267 m). As cascavéis diamondblack do ocidente e do oriente (Crotalus strox e Crotalus adamanteus) [Figura 3] são as maiores e mais perigosas nos Estados Unidos, encontradas nos estados do sudoeste dos EUA, Nevada, Califórnia e Oklahoma.92,93 A cascavel da madeira (Crotalus horridus) está em 2º lugar entre as cascavéis mais perigosas comumente encontradas no leste dos Estados Unidos, embora seja rara em Delaware, Maine, Michigan ou Washington, DC. As cascavéis -anã (Sistrurus catenatus e Sistrurus miliarius) são encontradas em áreas que variam de Nova York a Michigan e do Texas ao Arizona. Seu veneno é o menos tóxico de todas as cascavéis.88 Em geral, as cascavéis são responsáveis por 65% dos casos de envenenamento registrados nos Estados Unidos. Seu veneno é 2,5 a 3 vezes mais tóxico do que o veneno de outras espécies norte-americanas de cobras venenosas.87 As cobras boca-de-algodão (Agkistrodon piscivorus), também conhecidas como mocassins d’água, vivem nos estados norte-americanos do Sul e Sudeste, ao longo de córregos e em árvores baixas. As copperheads (Agkistrodon contortix) [Figura 4] são encontradas nas montanhas, pilhas de rochas e montes de serragem. Sua extensão geográfica vai da região sudoeste de Massachusetts até o Texas. As cobras boca-de-algodão têm veneno apenas moderadamente tóxico. Sua picada é dolorosa, mas raramente fatal. Em um estudo sobre 400 picadas de copperhead (32 das quais tratadas com soro anti-veneno), 88% das picadas responderam à soro anti-veneno, conforme evidenciado pela cessação da progressão da lesão tecidual local.94

 

 

 

Figura 3. As cascavéis diamondblack são as maiores e mais perigosas dentre as cobras encontradas nos Estados Unidos. A cobra fotografada é uma cascavel diamondblack do oriente, Crotalus adamanteus.

 

  

 

 

Figura 4. A copperhead (Agkistrodon contortix) apresenta uma distribuição geográfica que se estende da região sudoeste de Massachusetts até o Texas, nos Estados Unidos. As picadas destas cobras são dolorosas e raramente fatais.

 

As víboras com fosseta são identificadas pela presença de uma pequena depressão (fosseta) entre os olhos e pelas narinas bilaterais. A cabeça destas cobras é triangular. Sua pupilas são elípticas. Os dentes inoculadores ficam dobrados para trás quando a boca está fechada e desdobram-se através de um mecanismo do tipo dobradiça quando a boca é aberta. A fosseta é um órgão sensível ao calor, que permite à cobra localizar presas vivas e de sangue quente. As cobras conseguem detectar movimentos a uma distância aproximada de 12 m e são capazes de dar golpes a uma distância aproximada que equivale à metade do comprimento de seu corpo. As cascavéis usam seus chocalhos ao se sentirem ameaçadas ou em situação de perigo e não necessariamente quando estão a ponto de atacar. A víbora com fosseta é agressiva e defende seu território ao ser provocada ou encurralada.92,93 O veneno fica armazenado em glândulas localizadas em cada lado da cabeça, acima da maxilas e atrás dos olhos. Estas glândulas são funcionalmente semelhantes às glândulas submaxilares humanas. A cobra pode liberar 25 a 75% de seu veneno ao picar um ser humano. Os dentes inoculadores podem ser vazados ou sulcados. As cobras jovens também são venenosas, e seu veneno chega a ser 12 vezes mais forte do que o veneno das cobras adultas.

 

Envenenamento

Toxicologia

O veneno de cobra possui propriedades neurotóxicas e hematotóxicas. Um veneno consiste em uma mistura complexa de hidrolases, polipeptídeos, glicoproteínas e compostos de baixo peso molecular. O veneno de cobra, especialmente das cobras das famílias Elapidae e Hydrophidae, contém polipeptídeos que produzem bloqueio neuromuscular junto às terminações pré ou pós-sinápticas, ou em ambas, causando paralisia flácida. A composição do veneno varia bastante tanto entre as espécies como individualmente, de uma cobra para outra. O veneno de víbora é sobretudo citotóxico. O veneno de Elapidae (serpentes, corais) geralmente é neurotóxico, e o veneno de Hydrophidae (serpentes marinhas) é principalmente miotóxico.95

O veneno de cobra produz efeitos profundos sobre as vias da coagulação, causando um estado hipercoagulável. Nas primeiras horas subsequentes à picada, o indivíduo desenvolve trombocitopenia e suas contagens plaquetárias caem para menos de 10.000/mcL; há diminuição dos níveis de fibrinogênio e aumento da concentração de produtos da degradação da fibrina. As proteínas contidas no veneno podem induzir distensão da membrana basal vascular e matriz capilar.96 O tempo de protrombina e o tempo parcial de tromboplastina aumentam, em casos de envenenamento grave. Geralmente, estes aumentos ocorrem porque o consumo de fatores de coagulação resulta em anticoagulação clínica. Em experimentos realizados com cães, a ativação da fibrinólise pode ser precedida pela formação de trombos, sendo que a coagulação em vasos importantes junto à vasculatura coronariana pode acarretar parada cardíaca e morte. Isto também pode explicar a embolia pulmonar, uma vez que a formação de trombos pode ocorrer nas pernas e causar trombose venosa profunda.97 Também pode haver quedas no hematócrito, acompanhadas da conhecida rebarbação de eritrócitos.92 Cerca de 53% dos pacientes desenvolvem coagulopatia em 2 a 14 dias após o envenenamento. Em um estudo, 76% dos pacientes envenenados por víboras com fosseta desenvolveram coagulopatia durante o curso de internação hospitalar.98 A coagulopatia pode durar até 26 dias.97

 

Manifestações clínicas

De 30 a 50% das picadas de cobra não resultam em envenenamento. Uma cobra consegue controlar a quantidade de veneno injetada e pode inocular até 90% de seu veneno para imobilizar a presa. Outros fatores envolvidos na injeção do veneno incluem a saúde da cobra, seu grau de saciedade, a condição dos dentes inoculadores, a toxicidade do veneno, a existência de lesões na cobra, e o tamanho, idade e condição de saúde da vítima.

Um envenenamento mínimo por uma víbora com fosseta causa dor e inchaço locais (edema com diâmetro aproximado de 2,5 a 12,7 cm), sem sinais nem sintomas sistêmicos. O envenenamento moderado é caracterizado por um edema maior (diâmetro de 15,2 a 30,4 cm), enfraquecimento, sudorese, náusea, desmaio, tontura, equimoses e adenopatia sensível.88 Conforme o envenenamento se torna mais grave, os sintomas aumentam e passam a incluir taquicardia, taquipneia, hipotermia, hipotensão, equimoses, parestesias, fasciculações, sangramento gengival, hematêmese, hematúria, melena, oligúria, epistaxe, hemorragia intracerebral ou coma.96 As fasciculações constituem uma manifestação característica das picadas de cascavel diamondblack da costa leste .99 A pele ao redor e sobre o sítio de picada da cobra evolui para uma bolha esticada e descolorida, contendo líquido seroso ou hemorrágico. A morte geralmente resulta da hemorragia, permeabilidade vascular aumentada e eventos de tromboembolia secundários à interrupção das vias de coagulação.

O envenenamento por cobra-coral é doloroso e sua aparência é semelhante a marcas de arranhadura sem edema circundante. Os sintomas sistêmicos surgem tardiamente, após cerca de 1 a 6 horas. Em primeiro lugar, o indivíduo apresenta parestesias em torno das margens da ferida, seguidas de enfraquecimento, apreensão, tontura, náusea, vômito e sensação de euforia. A salivação excessiva quase sempre está presente.99 O indivíduo pode desenvolver paralisia de nervo craniano e bulbar, além de ptose. A ptose é bastante comum e costuma ser o 1º sinal de envenenamento por cobra-coral. Pode haver diplopia, dilatação papilar, salivação, disfagia e insuficiência respiratória. A paralisia pode durar até 14 horas e a força em sua totalidade pode ser perdida por 6 a 8 semanas. Nos casos fatais, a causa habitual de morte é a insuficiência respiratória.

O veneno dos viperídeos pode causar aumento da permeabilidade vascular, com consequente sangramento para dentro do trato gastrintestinal (GI) ou geniturinário. Além dos sinais e sintomas evidentes, a insuficiência renal pode ser secundária à hemorragia, coagulopatia ou choque secundário. A hemorragia intracraniana, especialmente no interior da glândula adeno-hipófise (que resulta na síndrome de Sheehan), é observada no envenenamento produzido pela víbora de Russell. A síndrome nefrótica, glomerulonefrite, síndrome hemolítica-urêmica e CIVD apresentam uma incidência de 1,4 a 28%, sobretudo nos envenenamentos causados pela víbora de Russell, víbora sopradora e serpentes marinhas.97,100

Os pacientes picados por certas cascavéis da madeira, diamondblack do ocidente, de Mojave e do Pacífico do Sul podem apresentar fasciculações no tronco, face e orofaringe, além de outros efeitos sistêmicos. Estas ocorrências podem estar associadas ao risco de rabdomiólise. Nestes casos, a soro anti-veneno aparentemente não alivia tais sintomas. Os benzodiazepínicos, a paralisia muscular e o controle das vias aéreas são importantes para a prevenção do dano muscular. Considera-se que o veneno da cascavel norte-americana pode não ter uma compatibilidade imunogênica com a cascavel do Pacífico do Sul que seja suficiente para promover a desejada reatividade cruzada com a soro anti-veneno Fab.101

Os elapídeos cuspidores podem atirar seu veneno dentro dos olhos da vítima, causando conjuntivite, risco de ulceração corneal, uveíte ou infecção adicional. Nesta situação, os olhos devem ser irrigados imediatamente e durante o transporte da vítima até o hospital.102

 

Tratamento

Primeiros socorros

O tratamento prestado em campo deve enfocar a prevenção da absorção sistêmica da toxina. Para tanto, pode ser feita a aplicação de curativos compressivos e imobilização do membro picado. A estabilização pode ser realizada com auxílio de um imobilizador inflável. Recomenda-se não administrar nada por via oral à vítima.

Se os sinais de envenenamento começarem a ser observados, uma faixa compressora deve ser colocada na região proximal à picada, para impedir o fluxo linfático.103 A técnica do Commonwealth Serum Laboratories (Austrália) emprega uma faixa elástica ou um imobilizador de ar para envolver o membro. O método Monash consiste na colocação de um coxim espesso e de uma bandagem apertada sobre o sítio da ferida, para impedir o fluxo do veneno. Estes 2 métodos apresentam eficácia comprovada apenas em casos de picada de Elapidae. O transporte até um hospital deve ser feito imediatamente, pois a absorção dos venenos neurotóxicos pode resultar em comprometimento ou parada respiratória. Em pacientes com envenenamento facial, o edema pode causar obstrução das vias aéreas e, por este motivo, a equipe de atendimento de emergência talvez tenha de estabelecer o controle imediato das vias respiratórias.104

Com o passar do tempo, o uso de torniquetes caiu em desuso. Existem aspectos preocupantes relacionados ao confinamento de venenos citotóxicos no sítio de picada, e isto pode aumentar a morbidade em certos casos de envenenamento. Contudo, as evidências clínicas de uso bem-sucedido do torniquete são pouco confiáveis ou limitadas a apenas alguns relatos de caso de envenenamento em seres humanos. Na Austrália, um estudo demonstrou a existência de ampla variabilidade em termos de aplicação correta de bandagens compressoras ou colocação de torniquetes. Neste estudo, houve uma tendência maior ao uso correto das bandagens elásticas (quantidade certa de pressão sob a bandagem) do que das bandagens de crepe.105 A imobilização e o transporte rápido podem ser os primeiros socorros mais eficientes disponíveis.

O local da picada deve ser esfregado com um pano e limpo. A prática antiga de fazer uma incisão no sítio da picada e sugar o local para remover o veneno da cobra não é recomendada. Esta prática, que data da década de 1920, foi testada em modelos de experimentação animal e comprovadamente não aumenta a sobrevida. Na verdade, a incisão seguida de sucção do sítio da ferida impõe mais perigos do que benefícios. A incisão pode agravar o sangramento, dano aos nervos e tendões, introduzir infecções e atrasar a cura. A crioterapia (p. ex., colocar gelo no sítio da picada), que no passado era considerada útil por diminuir a atividade enzimática do veneno e sua absorção pela circulação sistêmica, comprovadamente também não proporciona benefícios significativos. Em vez disto, a crioterapia causa perda de tecido, lesão por frio e possível incapacitação permanente.

A terapia por extração também caiu em desuso. Neste procedimento, um dispositivo de sucção é colocado sobre as feridas produzidas pelos dentes inoculadores e uma sucção é aplicada para remover o veneno do sítio da picada e dos tecidos circundantes, sem produção de incisão. Ao chegar no cenário, se a equipe de atendimento pré-hospitalar encontrar um dispositivo de sucção já instalado, deve removê-lo se não houver líquido acumulado no receptáculo.104 O emprego de métodos de primeiros socorros em campo, como a incisão e sucção, os torniquetes e a crioterapia, tem sido associado a um aumento de 3 vezes da probabilidade de necessidade de intervenção cirúrgica.87

Embora a crença popular seja a de que as picadas de cobra matam em questão de minutos, na verdade, a toxicidade do veneno de cobra geralmente nem começa a afetar o corpo decorridas várias horas da picada. Segundo uma revisão, 64% das mortes por picada de cobra ocorreram entre 6 e 48 horas depois de o paciente ter sido picado.106

 

Tratamento no serviço de emergência

História. Quando a vítima de picada de cobra chega ao hospital, é necessário obter a história da picada. Esta história deve incluir (1) uma descrição completa da cobra; (2) o tempo decorrido desde a picada; (3) as circunstâncias em torno da picada; (4) o número de picadas; (5) a localização da picada; (6) o tipo de primeiros socorros administrado; e (7) quaisquer sintomas que a vítima possa ter manifestado desde a picada. A história médica pregressa do paciente, bem como sua história de alergias devem ser brevemente checadas. Em particular, o clínico deve perguntar se o paciente já manifestou sintomas de alergia ao se aproximar de cavalos ou durante a exposição ao soro de cavalo, se o paciente tem asma, febre do feno ou urticária.

Exame físico. É preciso atentar especialmente para a área localizada em torno da picada de cobra. A ferida deve ser examinada quanto às marcas de dentes inoculadores, edema, petéquias, equimoses e bolhas. É indicado que sejam realizados exames cardiovasculares e neurológicos abrangentes. Se o paciente foi picado em um membro, é necessário tomar as medidas de circunferência do membro ao nível do sítio de lesão e também a uma distância de 12,7 cm proximalmente ao sítio. Os pulsos distais e a condição neurológica devem ser avaliados e anotados, pois o edema causado pelas picadas de cobra pode resultar em elevação das pressões dos compartimentos do membro, com consequente desenvolvimento da síndrome compartimental.87,104 O paciente deve ser monitorado na unidade de terapia intensiva (UTI).

Exames laboratoriais. Todos os pacientes devem ser submetidos aos exames laboratoriais basais, incluindo um hemograma completo, análise de urina tipo 1, eletrocardiograma, tempo de protrombina, tempo de tromboplastina parcial, níveis de fibrinogênio, produtos da quebra da fibrina, eletrólitos séricos, ureia e creatinina sérica. É preciso realizar a tipagem e avaliação do sangue. Nos casos de envenenamento grave, as determinações de gasometria arterial também são indicadas. Em pacientes com edema em membro, pode ser necessário realizar uma avaliação arterial com Doppler e, em certos casos, determinar a pressão nos compartimentos.

 

Terapia com soro anti-veneno

Os soros são disponibilizadas para tratamento das picadas de víboras com fosseta norte-americanas e de cobras-coral da cota leste. As picadas de mocassin d’água e copperhead são tipicamente tratadas sem uso de soro anti-veneno. A escolha de quando usar o soro anti-veneno é feita com base em muitos fatores, incluindo os sinais e sintomas clínicos de envenenamento, além da condição fisiológica da vítima. O soro anti-veneno é indicada apenas para os casos de envenenamento grave.107

Nos Estados Unidos, o soro anti-veneno pode ser obtida por meio das farmácias hospitalares, veterinários, zoológicos locais e centros de controle de venenos. o soro anti-veneno é mais terapêutico quando administrado dentro de 4 horas após a picada. Entretanto, quando o soro anti-veneno é administrado após 12 horas da picada, seu valor se torna limitado.90

Classificação do envenenamento. Os envenenamentos são classificados de acordo com um sistema de 5 níveis. A quantidade de soro anti-veneno administrada está correlacionada com o grau de envenenamento.

Nos envenenamentos de grau 0 (zero), o paciente pode apresentar marcas de dentes inoculadores ou abrasões superficiais na pele no sítio da picada, mas apresenta dor ou edema local mínimo e ausência de manifestações sistêmicas associadas. Os envenenamentos de grau 1 envolvem um pouco de dor ou latejamento no sítio da picada, com um edema que atinge 1,5 a 12,7 cm e eritema circundante. Não há manifestações sistêmicas. Os envenenamentos de grau 2 produzem área maior de dor mais severa. O edema dissemina-se na direção do tronco. A área de eritematose apresenta petéquias e equimoses. Pode haver envolvimento sistêmico, que consiste em náusea, vômitos e elevação da temperatura. O envenenamento de grau 3 é considerado severo. O edema dissemina-se até o membro e pode deslocar-se para o tronco. Pode haver equimose e petéquias generalizadas. O paciente pode apresentar taquicardia, hipotensão e hipotermia, evoluindo para o choque. O envenenamento de grau 4 é muito grave e geralmente resulta da picada de uma cobra grande ou da inoculação de uma carga muito alta de veneno. O edema, as petéquias, as equimoses e a necrose rapidamente atingem o membro e uma grande parte do tronco. Pode haver fasciculações musculares, sudorese, náusea, vômitos, câimbras, palidez, pulsação fraca, incontinência, convulsões e coma.

Soros. Existem múltiplos tipos de soro anti-veneno comercializados. O 1ª soro anti-veneno a ser comercializada (soro anti-veneno [Crotalidae] polivalente [ACP]) foi uma preparação de anticorpo integral à base de soro de cavalo. A dosagem para esta preparação era de 3 a 5 ampolas de soro anti-veneno diluídas em 500 mL de líquido intravenoso. Até 54% dos pacientes tratados nos estudos apresentaram alergia à ACP. Erupções cutâneas, hipotensão, sibilos e flebite ocorreram em 20% dos pacientes.108 Mesmo assim, os clínicos frequentemente deixam de fazer o teste cutâneo para alergia à ACP, para não atrasar a administração da soro anti-veneno.

A ACP foi descontinuada em 2001, por causa de seus efeitos colaterais negativos.109 Entretanto, a ACP ainda pode ser encontrada em algumas regiões. Em 2000, um soro anti-veneno Fab (ovina) anticrotalídeo polivalente (CroFab) foi introduzida no mercado. Este soro anti-veneno minimiza o risco de hipersensibilidade imediata e previne a doença do soro tardia (o risco de reações de hipersensibilidade imediata com soro anti-veneno Fab é significativamente menor do que com a ACP, mas ainda pode estimular reações adversas).109 Baseia-se no soro de carneiro e é 4 a 5 vezes mais potente do que a ACP.98 A CroFab é produzida via imunização de carneiros com veneno de cobra crotalina e digestão do soro imune com papaína para produzir fragmentos de anticorpo (Fab e Fc). O segmento Fc antigênico é removido durante a purificação.107 Em um estudo envolvendo 1.000 pacientes tratados, nenhum apresentou evidências de anafilaxia verdadeira.110 Cada frasco de CroFab contém 750 mg de Fab e é reconstituído em 10 mL de solução salina normal (são diluídos 4 frascos de em 250 mL de solução salina normal). Os estudos demonstraram que houve melhora na marca de 4 horas em todos os pacientes submetidos a este regime, embora alguns posteriormente tenham piorado.110 A meia-vida do soro anti-veneno Fab é inferior a 12 horas, em comparação à meia-vida de 61 a 194 horas da ACP,111,112 por isso pode ser necessário repetir a dosagem de Fab para manter os níveis séricos terapêuticos.113 Nos estudos, apenas 16% dos pacientes apresentaram doença do soro após a administração do soro anti-veneno Fab, sendo que a severidade desta condição foi classificada como apenas leve a moderada. Em um estudo, a única reação observada em 64 dos 65 pacientes tratados com soro anti-veneno foi uma urticária simples.114

O soro anti-veneno Fab é administrado em doses intervaladas, com a 1ª dose administrada para obtenção do controle inicial (definida como a cessação de todos os sintomas – locais, sistêmicos e de coagulopatia) e as doses subsequentes administradas em 6, 12 e 18 horas após a 1ª dose. Presume-se que, em certos casos, a coagulopatia possa recorrer após a neutralização inicial do veneno. A recorrência pode resultar da deposição de um veneno não neutralizado no sítio de picada, que é liberado na circulação após a depuração dos complexos de veneno-soro anti-veneno. Uma combinação de edema, lesão circulatória e quantidades menores de tecido subcutâneo no sítio da picada pode impedir o soro anti-veneno de alcançar o depósito de veneno.98,115

A meia-vida do soro anti-veneno Fab é inferior à meia-vida dos componentes do veneno. O Fab não ligado é metabolizado mais rapidamente do que os componentes de veneno não ligados, e isto permite a circulação e absorção contínua do veneno ao nível sistêmico. É possível que no veneno também existam componentes promotores de efeito tardio ou componentes diferentes dos componentes originalmente ativos. Existe a possibilidade de que os complexos de soro anti-veneno-veneno possam se dissociar após a neutralização inicial. O hospedeiro também pode ser capaz de desenvolver uma resposta imune contra a própria soro anti-veneno.116 Como alternativa, os complexos não depurados podem se dissociar, deixando o veneno livre para recircular.98,110

 

Terapia auxiliar

Algumas terapias auxiliares foram propostas para os casos de envenenamento por picada de cobra. A excisão do tecido adjacente à picada de cobra para remoção da deposição de veneno foi proposta uma única vez, contudo esta abordagem foi abandonada. A estratégia de remover apenas o tecido com aspecto necrótico também se mostrou comprovadamente desaconselhável, pois o exame histológico do tecido excisado revelou a presença de fibras musculares entrelaçadas ao tecido macroscopicamente necrosado. O desbridamento agressivo e a terapia antibiótica podem ser indicados no evento de complicação da infecção. Isto pode ocorrer na fasciite necrotizante por Vibrio vulnificans ou Aeromonas hydrophila.117

O edema de membros decorrente da picada de cobra pode mimetizar a síndrome compartimental, no entanto a síndrome compartimental verdadeira raramente ocorre nestes casos. O envolvimento do tecido subcutâneo (e não do espaço compartimental profundo) ocorre com maior frequência. Quando um envenenamento profundo ocorre e há desenvolvimento de uma síndrome compartimental verdadeira, o tratamento de 1ª linha consiste na administração de soro anti-veneno, que diminui a pressão compartimental e o inchaço. As pressões de compartimento superiores a 30 mmHg podem indicar a necessidade de fasciotomia. Entretanto, uma fasciotomia e o desbridamento devem ser evitados sempre que possível, porque estes procedimentos estão associados à obtenção de resultados funcionais ruins. A fasciotomia é perigosa antes do restabelecimento do funcionamento homeostático normal. Se o músculo permanecer intacto, algumas miofibrilas são regeneradas. O tecido injuriado não deve ser confundido com o músculo necrótico.102 A fasciotomia é recomendada para os casos em que somente a ponta de um dedo da mão foi picada e está inchada, apresentando perda de atividade neurovascular ou funcional. Estes pacientes são candidatos à conhecida dermotomia digital. A incisão deve ser feita junto ao aspecto lateral ou medial do dedo da mão, atravessando somente a pele, e deve estender-se da membrana interdigital até a porção medial da falange distal.99,118

 

Tratamento geral

Um centro de controle de venenos regional ou o zoológico local devem ser usados como fonte, quando se lida com uma picada de cobra venenosa. Isto é especialmente válido quando a cobra não é considerada nativa da área, como pode acontecer com aqueles que, por hobby, criam cobras exóticas como animais de estimação. Diante da indisponibilidade de um especialista, o departamento de cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia em San Diego nos EUA criou um website no qual estão listados protocolos (incluindo a disponibilidade de soro anti-veneno) para tratamento das picadas de cobra de espécies venenosas existentes ao redor do mundo. Esta informação pode ser acessada on-line: www.surgery.ucsd.edu.

Outras intervenções terapêuticas são ajustadas a sintomas específicos. A reposição com líquido isotônico deve ser instituída em casos de pacientes hipotensivos. As anormalidades dos mecanismos de coagulação devem ser corrigidas com reposição de produtos do sangue, quando necessário, embora isto somente seja feito depois que a terapia com soro anti-veneno tenha sido iniciada. De fato, os tratamentos comuns para coagulopatias-padrão são inefetivos ou perigosos em casos de coagulopatia induzida por picada de cobra. Estudos conduzidos na Austrália demonstraram que o soro anti-veneno não parece ser efetivo para fins de reversão da coagulopatia em casos de envenenamento por cobras australianas.119 No entanto, se um curso de plasma fresco congelado for iniciado em 4 horas de envenenamento, observa-se uma associação com o retorno precoce da função de coagulação nas vítimas de picada de elapídeos australianos.120 Em vez disso, os efeitos do veneno devem ser tratados (com soro anti-veneno) antes do início do tratamento habitual da coagulopatia.97 Os corticosteroides são contraindicados durante os estágios agudos de envenenamento, mas podem ser usados se o paciente desenvolver doença do soro com o uso do soro anti-veneno. Estudos conduzidos na Costa Rica demonstraram que, nas picadas de víbora, a liberação de citocinas inflamatórias acarreta alterações clínicas e patológicas similares àquelas encontradas em pacientes de traumatismo.121 Há indicação para a realização de pesquisas adicionais sobre esta reação e o potencial uso de esteroides. Os pacientes devem ser colocados na oxigenação e devem receber suporte mecânico, se necessário, para os sinais de trismo, espasmo laríngeo ou salivação excessiva. A terapia antitetânica deve ser instituída quando houver indicação [Tabela 6]. Os antibióticos são recomendados apenas para os pacientes que manifestarem sinais de infecção. Em um estudo, os pacientes picados por cobra sem envenenamento não apresentaram infecção da ferida.122 A necrose tecidual pode ocorrer no sítio da picada, e o paciente pode adquirir uma infecção secundária causada por bactérias presentes na boca da cobra. Quando há sinais de infecção, as bactérias geralmente encontradas são S. aureus, Streptococcus spp, Pseudomonas spp e Acinetobacter spp. Deve ser considerado o fornecimento de uma cobertura como aquela proporcionada pela ciprofloxacina ou outro tratamento antibiótico de amplo espectro.123

As feridas devem ser examinadas diariamente. A necrose superficial e os brotamentos hemorrágicos devem ser desbridados a partir do 3º até o 10º dia. É possível que este desbridamento tenha de ser feito em etapas.

 

Considerações especiais

Picada de cobra na gestação

Em gestantes picadas por cobras, aquilo que for melhor para a mãe costuma ser melhor para o feto. O resultado fetal pode depender da idade gestacional do feto e, assim, a menor idade gestacional está associada a um resultado negativo. A incidência de aborto pós-envenenamento por cobra pode chegar a 43%.124 O aborto pode resultar de choque, contrações uterinas, pirexia ou sangramento de placenta ou útero. O veneno pode atravessar a barreira placentária e causar algum grau de envenenamento sistêmico no feto, ainda que a mãe permaneça assintomática.124

Nas gestantes que são vítimas de picada de cobra, o comprometimento das vias aéreas e os estados de choque devem ser corrigidos para garantir a perfusão da placenta e do útero e, desta forma, prevenir a hipóxia fetal. O suporte circulatório com agentes vasopressores deve ser evitado, pois a ação destes fármacos diminui o fluxo sanguíneo uterino e é prejudicial para o feto. As gestantes já estão em estado hipercoagulável e, portanto, são ainda mais suscetíveis à CIVD.124 Há relatos de descolamento de placenta decorrente de hipercoagulabilidade subsequente à picada de cobra.

O soro anti-veneno é a terapia de escolha para pacientes gestantes, contudo falta informação confiável sobre os riscos associados à administração de soro anti-veneno durante a gestação. A doença do soro e as reações anafiláticas continuam sendo os maiores riscos associados à administração de soro anti-veneno.125

 

Picadas de cobra em crianças

As picadas de cobra em crianças frequentemente ocorrem nos membros inferiores – nos casos em que a criança manipula a cobra – ou nas mãos. Os sinais e sintomas são tipicamente similares àqueles manifestados pelos adultos.126 O resultado pode depender do tamanho da criança, sítio da picada, grau de envenenamento, tipo de cobra e efetividade do tratamento.89 Entretanto, por apresentarem um volume de sangue menor, as crianças podem desenvolver uma síndrome de envenenamento mais severa.127 Em um estudo envolvendo 67 crianças com envenenamento severo, 72% apresentavam envolvimento sistêmico e 50% desenvolveram coagulopatia; 61% receberam soro anti-veneno e 36% das crianças tratadas desenvolveram reações adversas.128 Em outro estudo de caso envolvendo 12 crianças envenenadas por cascavel e tratadas com CroFab, não foram encontradas evidências de hipersensibilidade aguda ou tardia.129 A recorrência do inchaço local foi observada em um paciente, apesar do tratamento repetido com soro anti-veneno. Em crianças, a dosagem de soro anti-veneno deve ser estabelecida com base na carga de veneno e severidade dos sinais e sintomas, em vez da idade ou peso do paciente.128 Embora o envenenamento possa acarretar falência de múltiplos órgãos em crianças, a maioria dos sintomas é localizada e limita-se a eritema, edema e bolhas no sítio da picada.129 Embora a maioria dos pacientes seja internada na UTI, somente os pacientes hemodinamicamente instáveis devem ser submetidos a este tipo de internação. Os sintomas leves e moderados podem ser tratados no serviço de emergência ou no contexto dos pavimentos do hospital.129 Muitas crianças picadas por víboras com fosseta também podem ser tratadas de maneira conservativa, por meio do tratamento da dor e elevação do membro lesado. O tratamento com soro anti-veneno, antibióticos ou fasciotomia é raro. Existe um risco relativamente baixo de infecção subsequente ao envenenamento por Crotalidae. Além disso, é preciso notar que o veneno das cascavéis é cerca de 10 vezes mais tóxico do que os veneno das copperheads. Entretanto, os efeitos sistêmicos ou as evidências de síndrome compartimental devem ser tratados com soro anti-veneno.130

Seguir as recomendações para administração de CroFab em crianças pode expor as crianças com menos de 10 kg ao risco de sobrecarga líquida, especialmente nos casos em que há necessidade de administrar bolos de líquido ou sangue. Uma abordagem razoável para administração de soro anti-veneno Fab é a constituição com metade do volume de líquido recomendado para cada dose destinada a crianças que pesam menos de 10 kg.131

 

Disposição

Todos os pacientes com suspeita de picada de cobra devem permanecer sob observação durante pelo menos 4 a 6 horas. Se nenhum sinal de envenenamento for observado após 6 horas e a cobra agressora for considerada não venenosa ou uma víbora com fosseta, o paciente pode ser liberado. O paciente deve receber instruções para voltar imediatamente ao serviço de emergência caso ocorram quaisquer sintomas de envenenamento. Um paciente com dor e edema mínimo deve permanecer sob observação durante no mínimo 12 horas. Se o inchaço começar a diminuir e a dor for resolvida, o paciente pode ser liberado com as mesmas instruções. Qualquer paciente que apresente evidências de envenenamento verdadeiro deve permanecer sob observação no hospital, durante pelo menos 24 horas.132

O envenenamento por víbora com fosseta pode resultar em uma significativa hipofibrinogenemia e trombocitopenia, com duração de até 2 semanas. Isto pode acarretar complicações cirúrgicas ou traumatismos.133 Se as anormalidades da coagulação forem resolvidas, porém, não haverá necessidade de realizar um workup adicional do sistema de coagulação. O melhor fator preditor de desenvolvimento tardio de hipofibrinogenemia é a hipofibrinogenemia.98

Qualquer paciente que tenha sido picado por uma cascavel do Mojave, cobra-coral ou outra cobra exótica deve ser internado em uma UTI com pronta disponibilidade de equipamentos cardiorrespiratórios e de diálise. O soro anti-veneno deve ser administrada a estes pacientes.90

 

Prevenção contra picadas de cobra

As cobras somente devem ser manipuladas por herpetologistas profissionais. Até mesmo quando morta, uma cobra pode envenenar quem a manuseia. As pessoas que passam o tempo ao ar livre, em áreas comprovadamente bastante povoadas por cobras, devem usar calças compridas e sapatos fechados. Devido ao tamanho variável dos dentes inoculadores das cobras, as calças largas são preferíveis às justas. Recomenda-se usar botas de couro pesadas, em vez de sandálias, calçados abertos ou tênis. Ao manusear uma cobra, mesmo que esteja morta, também é necessário usar luvas de proteção.

 

Picadas de aranha

A classe Arachnida contém o maior número de espécies venenosas conhecidas, incluindo 20 mil aranhas venenosas. Nos Estados Unidos, apenas 50 espécies são capazes de envenenar seres humanos, em parte porque a maioria das presas inoculadoras é curta demais para penetrar a pele humana. Todas as aranhas são carnívoras. Elas capturam suas vítimas caçando-as ou prendendo-as em armadilhas. As aranhas armam teias de captura e esperam até que suas vítimas sejam apanhadas. Sua visão é limitada e elas usam as mandíbulas, capazes de detectar movimentos, para perceber as vítimas que ficam presas em suas teias. A visão das aranhas caçadoras é mais aguçada do que a visão daquelas que usam armadilhas, sendo que a maioria das caçadoras come suas vítimas no local da captura. O diagnóstico verdadeiro de uma picada de aranha com possível envenenamento requer evidências de uma picada acompanhada de dor ou desconforto (exceto no caso das picadas de aranhas da espécie Loxosceles, que são consideradas indolores), coleta da aranha no momento da picada e identificação da aranha por um especialista em aracnologia. Outros sinais seriam o aparecimento de marcas de presas inoculadoras, vermelhidão no sítio de lesão, prurido imediato ou tardio e presença de espinhas e inchaço (que nem sempre são observadas).134

 

Viúvas-negras

A aranha viúva-negra, Latrodectus mactans [Figura 5], é encontrada em todo o território dos Estados Unidos e Sul do Canadá, com outras espécies estreitamente relacionadas encontradas sobretudo na região Oeste dos Estados Unidos. Não há registros de achados desta aranha no Alasca. O tamanho da fêmea equivale ao dobro do tamanho do macho, e somente a fêmea é capaz de envenenar suas vítimas. Embora o macho tenha veneno, seu tamanho menor e as presas inoculadoras mais modestas impedem-no de picar e envenenar um ser humano. A fêmea exibe uma coloração negra reluzente e tem uma marca vermelho-vivo no abdome que pode parecer 2 manchas ou ter formato de ampulheta. Ocasionalmente, esta aranha exibe 2 listras vermelhas. As fêmeas imaturas são vermelhas, marrons e cor-de-creme. O corpo da aranha mede cerca de 1,3 cm de comprimento. Suas pernas são compridas e medem cerca de 3,8 cm. Esta aranha costuma ser encontrada em pilhas de lenha, alpendres e estábulos e somente é agressiva se estiver protegendo seus ovos. A viúva-negra é uma emboscadeira, ou seja, usa armadilhas para capturar suas vítimas. As teias são armadas perto do chão, de modo a alcançar os insetos rastejantes, e geralmente em áreas afastadas e escuras.

  

 

 

Figura 5. A fêmea madura da aranha viúva-negra exibe uma cor negra reluzente e possui marcas vermelho-vivo no abdome que parecem ser 2 manchas ou ter formato de ampulheta.

 

Envenenamento

Toxicologia. O veneno da viúva-negra contém vários compostos proteicos. Este veneno paralisa a vítima e inicia o processo digestivo via liquefação dos tecidos. A toxina depleta a acetilcolina dos terminais pré-sinápticos e, desta forma, desestabiliza as membranas celulares nervosas e abre os canais iônicos. A toxina da viúva-negra é considerada causadora de liberação maciça de acetilcolina e promotora do bloqueio subsequente de sua recaptação, levando à consequente estimulação simpática e parassimpática.135 Observa-se uma paralisia irregular da musculatura esquelética com várias alterações no sistema nervoso autônomo. Esta síndrome paralítica foi associada à poliomielite.136

Manifestações clínicas. Ao ser picado por uma viúva-negra, o indivíduo pode sentir uma sensação de alfinetada, seguida de inchaço e eritema mínimos. Podem ser observadas 2 marcas pequenas de presas inoculadoras. A porção central do sítio de picada pode ser branca, cercada por eritema e com uma borda vermelho-azulada. Em 1 hora, o paciente pode sentir uma dor entorpecente ou dor de câimbra na área envenenada. Esta sensação pode espalhar-se por todo o corpo, logo em seguida. A dor aumenta no decorrer da 1ª hora, em cerca de metade dos casos.134 Quando a picada é localizada nos membros superiores, a dor é disseminada para o tórax. Ademais, se a picada ocorrer em um membro inferior, a dor dissemina-se para o abdome. Esta dor pode mimetizar a pancreatite, apendicite ou uma úlcera péptica. O abdome pode apresentar uma rigidez do tipo placa, mas não necessariamente estar dolorido à palpação. Além disso, pode haver outros sinais miopáticos, como trismo facial, fibrilação muscular, contrações tônicas ou a conhecida fácies latrodectísmica – uma conhecida constelação de sintomas que incluem a blefaroconjuntivite, rubor e contorções.137 Outros sintomas sistêmicos podem incluir tontura, náusea, vômito, cefaleia, prurido, conjuntivite, diaforese, piloereção, priapismo, ansiedade e dispneia. Existe uma ampla variabilidade em termos de percentual de cada sintoma apresentado por aqueles que são picados por esta aranha.134 Os sintomas podem durar 2 a 3 dias e enfraquecer levemente após algumas horas. Os pacientes com hipertensão preexistente, doença cerebrovascular ou doença cardiovascular apresentam risco de sofrerem piora das condições. Entre as raras complicações das picadas, estão também a síndrome compartimental, rabdomiólise e obstrução do fluxo de saída do veneno no membro afetado.138 No sul da Europa, foram registrados 3 casos de miocardite secundária à picada de viúva-negra.139

 

Tratamento

Primeiros socorros. Em casos de picada por aranha viúva-negra, devem ser aplicadas compressas frias no sítio da picada e o paciente deve ser levado para um hospital. Experimentos realizados em laboratório mostraram que o dispositivo extrator de Sawyer pode ser útil para remover o veneno, se for aplicado à pele em 3 minutos após a picada.137 O suporte vital básico ou avançado deve ser fornecido a caminho do hospital. Quando possível, a aranha agressora deve ser levada com o paciente, pois existem muitas espécies não venenosas parecidas com a viúva-negra.

Tratamento no serviço de emergência. É necessário obter uma história completa e realizar exame físico, atentando para as circunstâncias em torno da picada, obtendo uma descrição da aranha e descobrindo as alergias a outros tipos de picada ou ao soro de cavalo. O sítio deve ser inspecionado e limpo. Se necessário, a imunização contra o tétano deve ser atualizada. Devem ser realizados exames laboratoriais, incluindo um hemograma completo, eletrólitos séricos, ensaios de coagulação, análise de urina tipo 1, eletrocardiograma, ureia e creatinina sérica. Os pacientes envenenados devem ser tratados de maneira sintomática. O nitroprussiato pode ser usado para tratar os episódios hipertensivos relacionados ao envenenamento. As câimbras abdominais podem ser aliviadas com gluconato de cálcio (10 mL de solução a 10% administrada por via endovenosa [IV], durante 20 min). Os níveis séricos de cálcio devem ser acompanhados. O paciente pode receber diazepam para alívio dos espasmos musculares.140 O dantrolene também exerce uma ação relaxante muscular comprovada nestes pacientes.141

Terapia com soro anti-veneno. O soro anti-veneno para Latrodectus existe e é indicado para pacientes com cardiopatia hipertensiva, doença respiratória subjacente ou envenenamento severo. Os pacientes na faixa etária de 16 a 65 anos podem receber soro anti-veneno. O soro anti-veneno deriva do soro de cavalo e pode causar reações alérgicas. A via de administração IV é a preferida. O conteúdo do frasco é diluído em 50 mL de solução salina normal e administrado ao longo de 15 minutos. A dose típica é 1 a 2 frascos. O soro anti-veneno para viúva-negra é disponibilizada na Austrália, África do Sul e Estados Unidos, que são as localizações primárias desta aranha. A administração por via IM, em estudos realizados na Austrália, apresentou algumas reações adversas. Entretanto, o soro anti-veneno para viúva-negra está associada a uma incidência mais alta de reações alérgicas iniciais.142 Existem algumas pesquisas sobre a possibilidade de administrar soro anti-veneno para picadas de viúva-negra pelas vias IM e IV. Na Austrália e no Brasil, o soro anti-veneno geralmente é administrada por via IM, que está associada somente a uma absorção tardia e parcial. Quando administrada por via IM, o soro anti-veneno é encontrado no soro em cerca de 5 horas. Na administração por via IV, o soro anti-veneno é encontrado no soro em 30 minutos.143 Um dos motivos que mais comumente leva à escolha da via IM para administração do soro anti-veneno, em oposição à via IV, é uma incidência maior de reação de hipersensibilidade, inclusive de anafilaxia. Entretanto, pelo menos um estudo comentou a existência de evidências pouco confiáveis de que a diluição do soro anti-veneno administrado por via IV está associado à diminuição da incidência de reações de hipersensibilidade. Disto isto, aparentemente não há diferença entre a administração de soro anti-veneno pelas vias IM ou IV.144 Se o paciente não apresentar melhora ou sofrer recaída dos sintomas, deve receber outro frasco de soro anti-veneno, independentemente do tempo decorrido desde o envenenamento ou da última administração de antiveneno.145

 

Considerações especiais

Picadas de aranha em crianças. As crianças que são picadas por uma viúva-negra podem apresentar sintomas graves capazes de levar à morte. Possivelmente devido ao menor volume em que o veneno circula, uma dose que seria tolerável em um adulto pode causar descompensação cardiovascular ou respiratória fatal em uma criança. Um estudo retrospectivo australiano sobre picadas de aranha de dorso vermelho demonstrou a manifestação de sintomas sistêmicos de diaforese, irritabilidade e hipertensão em 85% dos pacientes pediátricos internados no hospital.146

Picadas de aranha na gestação. Uma gestante que seja picada por uma aranha viúva-negra apresentará sinais e sintomas aparentemente típicos, embora talvez não apresente rigidez abdominal devido ao estiramento e frouxidão da parede abdominal durante a gestação. No entanto, a câimbra pode ser severa o bastante para induzir aborto. A toxina aparentemente não exerce efeito sobre o feto, talvez por não conseguir atravessar a barreira hematoencefálica. O soro anti-veneno é indicado para gestantes sintomáticas.124

 

Disposição

Os pacientes com sinais e sintomas de envenenamento por viúva-negra devem ser internados no hospital. Estes paciente devem permanecer sob observação por no mínimo 2 horas e podem ser liberados se estiverem totalmente assintomáticos, sendo orientados a voltarem diante da manifestação de quaisquer sintomas.

 

Aranha-marrom

A aranha-marrom, Loxosceles reclusa [Figura 6], mede cerca de 2,5 cm de comprimento e exibe cores que variam do bronze ao marrom-escuro. A fêmea possui no abdome uma mancha em forma de violino e de cor marrom-escura. Os machos e as aranhas jovens também podem apresentar um padrão de manchas em forma de violino marrom-escuro no tórax.147 A marrom possui 3 conjuntos de olhos dispostos em pares, que são denominados díades. A aranha-marrom é encontrada com frequência em roupas, lençóis e cobertores guardados em armários, pilhas de lenha armazenadas em galpão, ou embaixo de rochas. A marrom caça para conseguir alimento, mas pode viver por 6 meses sem comer nem beber água.148 Ela se alimenta à noite, mas somente é agressiva quando ameaçada – daí a denominação “reclusa”.148

 

 

Figura 6. A aranha-marrom (7 a 12 mm de comprimento corporal) é um aracnídeo tímido, que pode ser encontrado em porões, armários e pilhas de lenha.

 

A aranha-marrom é encontrada na região Centro-Sul dos Estados Unidos, especialmente nos estados de Missouri, Kansas, Arkansas, Louisiana, Texas (Leste) e Oklahoma. Ocasionalmente, pode ser encontrada em outros estados, mas nestes casos é provável que se trate de aranhas que foram desarraigadas e transportadas a partir de áreas endêmicas.147 O número de diagnósticos de picada de aranha Loxosceles verdadeira, nos Estados Unidos, é considerado significativamente menor do que o número de pacientes submetidos ao tratamento para envenenamento por aranha-marrom.148 Os critérios de inclusão estritos para envenenamento por aranha-marrom incluem a descoberta da aranha no momento da picada e a identificação da aranha específica. Em estudos conduzidos em áreas endêmicas de Loxosceles, os pacientes envolvidos praticamente não apresentaram picadas ou envenenamento por Loxosceles verdadeiras, apesar da exposição a dúzias a centenas de aranhas. Estes resultados sugerem que, nas áreas não endêmicas, deve haver um número mínimo ou nulo de picadas por Loxosceles verdadeiras.134,149

As aranhas Loxosceles também são encontradas fora da América do Norte, mais notavelmente no Brasil e em outras partes da América do Sul. A espécie Loxosceles laeta é a mais tóxica do gênero.150

 

Envenenamento

Toxicologia. O veneno da aranha-marrom é proteico e dotado de propriedades antigênicas e localmente destrutivas. Esterases, hialuronidases e proteases foram isoladas do veneno da aranha-marrom.148 Os componentes do veneno são citotóxicos para as células endoteliais e hemácias. A esfingomielinase-D atua diretamente sobre as hemácias e causa lise.151 Diferente do veneno da viúva-negra, o veneno da aranha-marrom não produz efeitos neurotóxicos comprovados.

Manifestações clínicas. O veneno da aranha-marrom produz sintomas localizados e sistêmicos. Estes sintomas são referidos como sendo cutâneos e viscerocutâneos.134 O loxoscelismo cutâneo manifesta-se inicialmente como uma dor na área da picada, mas esta dor a princípio pode estar ausente e somente vir a se desenvolver nas próximas 3 a 4 horas. Logo em seguida, um anel de palidez decorrente da vasoconstrição surge ao redor da picada, com uma área circundante de eritema. Há formação de um brotamento no centro que, após alguns dias, se torna necrótico. O brotamento pode ser disseminado com o fluxo dependente da gravidade. Esta área necrótica é ampliada no decorrer dos próximos dias, envolvendo tecidos superficiais e profundos. Uma escara geralmente se forma após vários dias e talvez demore meses para que a ferida seja cicatrizada, depois que a escara se solta.152,153 A aparência inicial da lesão consiste no clássico “sinal vermelho-branco-azul” do envenenamento por Loxosceles.154 O tecido adiposo subcutâneo é liquefeito sob a escara e deixa uma cicatriz deprimida. Isto ocorre em áreas mais ricas em tecido subcutâneo, como a coxa. A cicatrização da escara demora 5 a 17 semanas.155 O loxoscelismo viscerocutâneo pode manifestar-se como efeitos sistêmicos que incluem febre, calafrios, erupção cutânea (erupção morbiliforme fina, com disseminação sobre o tronco, braços, pernas e mãos [o envolvimento das palmas das mãos ocorreu em apenas um caso]),154 náusea, vômito, choque, insuficiência renal, hemorragia, CIVD ou edema pulmonar. Há relatos de caso de mielite transversa e paralisia causadas pela picada da aranha-marrom. Estas condições parecem resultar de microtrombose junto à artéria vertebral anterior.156 Do mesmo modo, a perda da sensibilidade cutânea pode ser causada pelo dano ou destruição de um nervo ou seus ramos pelo próprio veneno em si, ou pela isquemia produzida pelo edema.151 Existem 4 categorias de loxoscelismo: sem efeitos; lesão mínima com edema e eritema (que é cicatrizada sem tratamento adicional); lesão dermonecrótica (que cicatriza após a eliminação da úlcera, deixando uma cicatriz); e envenenamento sistêmico (hemólise, CIVD, rabdomiólise e insuficiência renal).157

O diagnóstico diferencial das alterações cutâneas decorrentes do envenenamento pela aranha-marrom inclui a síndrome de Stevens-Johnson, necrólise epidérmica tóxica, eritema nodoso, púrpura fulminante, úlcera diabética, dermatite alérgica, doença de Lyme e pioderma gangrenoso.137 Os pacientes que sofrem numerosas picadas de aranha-marrom desenvolvem uma resposta de anticorpo e podem apresentar resposta diminuída a picadas subsequentes.148

Nos escassos casos de picadas fatais, a morte geralmente resulta de CIVD e insuficiência renal. Nos Estados Unidos, porém, os envenenamentos por aranha-marrom com frequência resultam em pouco mais do que uma reação inflamatória.147

Picadas de aranha em crianças. As picadas de aranha-marrom em crianças podem provocar reações sistêmicas severas, entre as quais a anemia hemolítica, hipotensão e anemia.158 Considera-se que a esfingomielinase D presente no veneno cause hemólise, agregação plaquetária, trombose e vasoconstrição em crianças. A severidade de qualquer reação é uma função da quantidade de veneno injetada e da localização da picada. O inchaço do pescoço e a subsequente obstrução das vias aéreas foram descritos em crianças.159 A morte, ainda que rara, é uma complicação comprovada.

 

Tratamento

O tratamento pré-hospitalar deve incluir suporte vital básico ou avançado, compressas frias e imobilização do membro. No momento em que o paciente chega ao serviço de emergência, é necessário obter uma história completa e realizar um exame físico, atentando para as circunstâncias em torno da picada, descrição da aranha e alergias a outros tipos de picada ou ao soro de cavalo. O diagnóstico inicial é mais facilmente estabelecido quando o paciente traz para o serviço de emergência a aranha que o picou. O sítio da picada deve ser inspecionado e limpo. O toxoide tetânico deve ser administrado conforme a necessidade.

Existe um soro anti-veneno para aranha-marrom. Embora em alguns estudos este soro anti-veneno tenha sido usado com sucesso para limitar a necrose, sua administração deve ser feita nas primeiras 24 horas subsequentes à picada. Entretanto, durante este período, é difícil avaliar a futura severidade da lesão cutânea.160 Um estudo realizado em 1983 encontrou evidências de que os esteroides sistêmicos devem ser usados em casos de picada por aranha-marrom, desde que o paciente seja atendido em 24 horas.161 Outros estudos demonstraram que a inoculação intralesional de esteroides pode ajudar a controlar a inflamação ou a trombose, mas não altera o tamanho da escara nem o desfecho da condição.162,163 Acreditava-se que a dapsona era útil para o tratamento dos efeitos locais do veneno. Entretanto, este fármaco somente deve ser usado no tratamento de adultos que passaram por uma avaliação de deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD). Os estudos mostraram que a dapsona era mais efetiva nas primeiras horas subsequentes à picada, porém seus efeitos colaterais geralmente superavam os benefícios proporcionados em termos de uso profilático.160 As complicações associadas ao uso da dapsona incluem hemólise, agranulocitose, anemia aplásica, metemoglobinemia, erupções cutâneas, necrólise epidérmica tóxica e reações fatais.161 Desde então, a inefetividade da dapsona ficou comprovada.157 A fentolamina não promove nenhum efeito apreciável comprovado sobre a atividade necrótica.148 Em modelos de experimentação animal, a terapia de oxigenação hiperbárica não apresentou efetividade definitivamente comprovada, embora os estudos tenham demonstrado alguns resultados positivos.164 Em um estudo, o tratamento de um indivíduo à base de choque elétrico aplicado ao sítio de envenenamento promoveu um resultado potencialmente positivo na lesão. Todavia, nenhum benefício foi observado em modelos de experimentação animal, e, em alguns casos, a cicatrização foi retardada. Desta forma, a terapia de choque elétrico não é sustentada pela literatura.147,165 Foi demonstrado que a excisão não melhora o resultado final e, na verdade, pode até ser prejudicial. Contudo, se houver necessidade de fazer uma excisão, recomenda-se esperar 6 a 8 semanas, até que o tecido adjacente já tenha começado a cicatrizar.157 Antibióticos podem ser prescritos se houver sinais de infecção. A analgesia também deve ser oferecida ao paciente.151 Os indivíduos que manifestam sinais ou sintomas de envenenamento devem ser internados. Caso haja desenvolvimento de insuficiência renal aguda, pode ser necessário realizar diálise. A necrose tecidual no sítio da ferida pode requerer intervenção cirúrgica, mas somente quando a lesão é grande, persiste há 6 a 8 semanas e parou de aumentar de tamanho.

 

Disposição

Um paciente que foi picado por uma aranha-marrom deve permanecer sob observação no serviço de emergência, durante pelo menos 6 horas. Se não houver desenvolvimento de sintomas locais ou sistêmicos, o paciente pode receber alta hospitalar e deve ser orientado a voltar caso manifeste qualquer tipo de sintoma.

 

Tarântulas

Pelo menos 30 espécies de tarântulas (Theraphosidae) vivem nos desertos do Oeste dos Estados Unidos. As tarântulas são caçadoras e alimentam-se de insetos noturnos. Devido à localização de suas presas inoculadoras, uma tarântula precisa erguer-se sobre as patas traseiras para aplicar uma picada. Além disso, ao ser manuseada, a tarântula libera pelos de seu abdome que causam reação urticária em seres humanos.

As picadas de tarântula são relativamente inócuas e resultam em uma reação histamínica de baixa intensidade. Entretanto, estas feridas devem ser limpas e, quando necessário, a imunização antitetânica deve ser atualizada.

As picadas de tarântulas da Zona do Canal do Panamá podem causar parestesias e desconforto local. A tarântula sul-americana tem uma picada mais tóxica, para a qual existe um soro anti-veneno disponível.

O tratamento de todas as picadas de tarântula deve ser de suporte, com administração de anti-histamínicos e analgésicos orais. Os pelos da tarântula, que podem ser farpados, são removíveis com fita adesiva.

 

Picadas de escorpião

Epidemiologia

Os escorpiões pertencem à classe Arachnida, ordem Scorpiones. Nesta ordem, existem mais de 1.200 espécies de escorpiões encontrados no mundo inteiro,166 cuja amplitude de habitats se estende do extremo sul da América do Sul e África até 50o ao norte da linha do Equador.167 De acordo com estudos recentes, existem 7 áreas de alto risco: norte da África saariana, África saheliana, África do Sul, Oriente Próximo e Oriente Médio, sul da Índia, México e sul da América Latina, ao leste dos Andes. Estas áreas abrangem uma população de 2,3 bilhões de pessoas.168 No mundo inteiro, o número anual de picadas de escorpiões chega em média a mais de 1,2 milhão de casos, com cerca de 3.250 mortes registradas a cada ano (0,27%).168 Embora todas as espécies usem veneno para matar ou imobilizar suas vítimas, apenas cerca de 50 espécies têm importância médica para os seres humanos.169 Em todo o mundo (e não só nos Estados Unidos), as espécies mais tóxicas pertencem à família maior, Buthidae.169 Dentre as cerca de 70 espécies encontradas na América do Norte, apenas as espécies do gênero Centruroides representam uma séria ameaça aos seres humanos. As espécies de Centruroides, assim como a maioria das outras espécies venenosas de escorpiões, podem ser reconhecidas pela placa esternal triangular [Figura 7].170

 

 

 

 

Esterno

Figura 7. Placa esternal das espécies de Centruroides.

 

Até recentemente, Centruroides sculpturatus e Centruroides exilacauda eram considerados sinônimos de uma mesma espécie, comumente chamada de escorpião da casca de árvore. Entretanto, evidências bioquímicas e genéticas recentes sugerem que estes escorpiões são de fato diferentes.171 C. exilacauda é encontrado na península da baixa Califórnia e no México, enquanto C. sculpturatus é encontrado com mais frequência no Arizona, bem como em partes de Utah, Novo México, nevada e Califórnia.170 Apesar da recente modificação taxonômica, o diagnóstico e tratamento dos casos de envenenamento são essencialmente idênticos.

Nos Estados Unidos, o envenenamento por escorpiões não é raro. Para o ano de 2008, a American Association of Poison Control Centers relatou 15.495 consultas por picada de escorpião.172 A maioria das picadas por escorpião foi registrada nos estados do Sudoeste, durante os meses de verão. Quase 2/3 destas picadas envolveram pessoas com mais de 19 anos de idade.172 Na maioria dos casos, as picadas não eram graves, e menos de 10% foram tratadas em estabelecimentos de atendimento médico. Houve 1 relato de morte. Os membros (tanto superiores como inferiores) são a localização anatômica mais comum das picadas de escorpião.168,173 Embora as crianças sejam picadas com menos frequência, a maioria dos envenenamentos severos ocorre em crianças pequenas.171,174,175 Os idosos também são mais suscetíveis ao envenenamento severo.176,177

 

Toxicologia

O veneno de escorpião consiste em uma mistura complexa de muco, compostos orgânicos de baixo peso molecular e sais, além de uma variedade de toxinas heterogêneas, incluindo neurotoxinas, cardiotoxinas, nefrotoxinas e toxinas hemolíticas. Destas, as neurotoxinas causam a maioria dos envenenamentos graves. O veneno dos escorpiões da família Buthidae é composto por várias neurotoxinas polipeptídicas distintas, que alteram a condutância axonal de sódio.176 Estas neurotoxinas alteram as propriedades dos canais de sódio nas células excitáveis, atuando de vários modos. As alfaneurotoxinas são dirigidas especificamente ao sítio receptor-3 existente na subunidade alfa do canal de sódio, onde se ligam de modo voltagem-dependente e prolongam o potencial de ação ao retardarem a inativação do canal de sódio.179 Estas neurotoxinas apresentam afinidade diferencial, tanto por receptores tecido-específicos (cérebro vs. músculo esquelético) como por receptores animal-específicos (insetos vs. mamíferos).179

As betaneurotoxinas não são voltagem-dependentes; são dirigidas especificamente ao sítio receptor-4 existente na subunidade alfa do canal de sódio e trocam a dependência de voltagem da ativação do canal de sódio por um potencial transmembrana mais negativo, que resulta em uma maior tendência a disparos espontâneos e repetitivos.180

Enfim, um 3º efeito produzido por algumas neurotoxinas é a redução das correntes iônicas (ambas as correntes, de Na e K) sem alteração da cinética de ativação e inativação.181

Os escorpiões conseguem regular a quantidade de veneno inoculada, a qual, por sua vez, também varia de acordo com o tamanho e a idade do escorpião, bem como o número de picadas. Os escorpiões típicos injetam entre 0,1 e 0,6 mg.170

 

Manifestações clínicas

O envenenamento causado pelos escorpiões pode produzir efeitos que variam de locais a prejudiciais à vida. A maioria destes efeitos depende da espécie de escorpião e da idade da vítima. Nos Estados Unidos, a maioria das picadas de escorpião não é mais grave do que a picada de Hymenoptera, a menos que a vítima desenvolva anafilaxia. As reações locais costumam se manifestar como uma sensação de queimação intensa e inchaço localizado, que podem estar associados a parestesias. Estes sinais e sintomas normalmente melhoram dentro de algumas horas.182

O escorpião da casca de árvore é o escorpião nativo mais perigoso dos Estados Unidos. Sua picada pode estar associada a uma severa reação sistêmica, que se manifesta mais frequentemente como hiperatividade neuromotora, anormalidades oculomotoras e comprometimento respiratório secundário ao aumento das secreções respiratórias.176 Estes pacientes raramente desenvolvem convulsões generalizadas e/ou coma. O edema pulmonar não constitui uma complicação frequente do envenenamento por C. sculpturatus, porém é mais comumente observado nos envenenamentos graves que ocorrem em outras partes do mundo.173,175 Os envenenamentos graves, seja qual for a espécie envolvida, podem resultar em estimulação adrenérgica ou colinérgica. A dominância do quadro clínico pelos sinais e sintomas adrenérgicos ou colinérgicos depende parcialmente da quantidade de veneno injetada.183 A inoculação de quantidades menores de veneno tende a causar ativação adrenérgica, enquanto a inoculação de quantidades maiores leva à ativação colinérgica. Isto também se aplica à idade da vítima.177

Tanto o início como a severidade dos sintomas dependem de vários fatores, incluindo a espécie, idade e saúde do escorpião; a quantidade de veneno injetada; a idade, peso e condição de saúde subjacente da vítima; e a efetividade de qualquer tratamento instituído.170

A manifestação inicial dos sintomas sistêmicos pode durar alguns minutos ou persistir por várias horas. Parece intuitivo o fato de as picadas que afetam internamente as estruturas vasculares, bem como aquelas localizadas na cabeça e tronco estarem associadas a uma manifestação inicial mais rápida dos sinais e sintomas sistêmicos, em comparação às picadas localizadas nos membros. A maioria dos estudos que descrevem o sítio da picada demonstrou que não há diferenças significativas em termos de severidade da reação, porém o tempo da reação não foi especificado.177

Diversos sistemas de gradação clínica e escores de severidade para picadas de escorpião foram criados. A distinção inicial decisiva deve ser entre as reações locais e as manifestações sistêmicas.175,177,182 A vasta maioria das picadas (na maioria dos relatos, acima de 85%) resulta apenas em reações locais. Os pacientes que desenvolvem reações locais geralmente não procuram tratamento médico e, quando finalmente o fazem, precisam permanecer sob observação durante no mínimo 2 a 3 horas, a fim de garantir que nenhum sintoma sistêmico tenha se desenvolvido.184 Os pacientes que desenvolvem quaisquer sinais sistêmicos, incluindo perturbações GI, não devem receber alta.168,173,175

Diversas tentativas foram empreendidas no sentido de promover uma classificação adicional dos sinais e sintomas sistêmicos, com o intuito de prever melhor quem necessitará de internação e tratamento extra (inclusive soro anti-veneno). Um sistema de gradação clínica foi desenvolvido há mais de 25 anos para picadas de C. sculpturatus [Tabela 8].185

 

Tabela 8. Sistema de gradação da severidade do envenenamento por Centruroides sculpturatus

 

Grau

Descrição

I

Dor local ou parestesia no sítio de envenenamento

II

Dor e/ou parestesia remota em relação ao sítio da picada, além dos achados locais

III

Disfunção de nervo craniano, neuromuscular esquelética somática ou cardíaca

1. Disfunção de nervo craniano: visão turva, movimentos oculares vagueadores, hipersalivação, deglutição problemática, fasciculação lingual, problemas com as vias respiratórias superiores, fala indistinta

2. Disfunção neuromuscular esquelética somática: espasmos nos membros, inquietação, agitação involuntária severa e espasmos (que podem ser confundidos com convulsões)

3. Disfunção cardiovascular: hipertensão moderada a severa, disritmias cardíacas, isquemia miocárdica, edema pulmonar

IV

Combinação de disfunção de nervo craniano, disfunção neuromuscular esquelética somática ou disfunção cardiovascular

 

O Ministério da Saúde da Tunísia recomenda a adoção de um sistema de gradação de 3 pontos. Neste sistema, o grau I está confinado a apenas reações locais; o grau II inclui pacientes com manifestações sistêmicas e sem comprometimento cardiorrespiratório nem sinais neurológicos severos; e o grau III inclui os pacientes com manifestações cardiorrespiratórias (choque cardiogênico e edema pulmonar) ou manifestações neurológicas severas (coma e/ou convulsões).175 Um amplo estudo conduzido na Tunísia demonstrou a existência de diversas variáveis que predizem resultados desfavoráveis [Tabela 9].175 Trabalhos adicionais levaram à derivação e validação de um sistema de escores clínicos para picadas de escorpião oriundos do norte da África, onde o escorpião Androctonus australis é responsável pela maioria das picadas de escorpião.186 Este estudo forneceu suporte adicional a diversos sinais prognósticos graves, como febre, vômito, taquicardia e hipertensão. O priapismo foi a única variável mais preditiva da necessidade de internação. É importante admitir que estes achados podem diferir em áreas que apresentam espécies distintas de escorpião. Exemplificando, embora o envenenamento grave produzido pela picada do escorpião Centuroides da América do Norte comumente se manifeste por meio de efeitos neurotóxicos, não há relatos de priapismo.176

 

Tabela 9. Fatores de risco correlacionados com um resultado desfavorável (obtidos por regressão logística) em todas as populações estudadas

 

Parâmetro

Valor p

Odds Ratio

IC de 95%

Idade < 5 anos

0,04

1,27

1,01 a 2,41

Tempo decorrido entre a picada e a internação < 2 horas

0,72

1,46

0,17 a 12,7

Febre > 38,5°C

0,06

2,79

1,33 a 5,84

Coma (escore na Glasgow Coma Scale = 8/15)

0,004

9,87

2,0 a 47,5

Edema pulmonar

0,04

8,46

1,07 a 66,7

Glicemia > 20 mmol/L

0,44

1,44

0,56 a 3,67

Ureia

0,007

4,02

1,8 a 8,96

Leucócitos = 25.000 células/mcL

0,04

2,35

1,04 a 5,32

Uso de soro anti-veneno de escorpião

0,07

1,49

0,59 a 2,69

Os valores em negrito estão associados a um resultado ruim.

Adaptado com permissão de Bouaziz M, et al.175

 

 

Prevenção e tratamento

Algumas medidas simples podem ajudar a prevenir as picadas de escorpião. Não andar descalço nem usando calçados abertos (sandálias) em áreas habitadas por escorpiões e checar os sapatos, luvas e roupas quanto à presença de escorpiões, antes de usá-los, bem como usar luvas ao manusear potenciais habitats, como pilhas de lenha ou restos de algodão são exemplos. Embora os escorpiões sejam ativos durante a noite, alguns autores relatam que as picadas são mais comuns durante o dia.168 Como os escorpiões exibem uma coloração críptica, pode ser difícil enxergá-los de dia ou de noite, sob iluminação com luz branca. Entretanto, os escorpiões adquirem uma tonalidade azul fluorescente brilhante sob luz ultravioleta (lâmpada de Wood) e isto os torna facilmente localizáveis.

Tratamento pré-hospitalar e tratamento de reação local. Estudos demonstraram que a absorção do veneno de escorpião ocorre rapidamente, após a administração por via subcutânea (SC). Dentro de 15 minutos, é possível detectar 70% da dose administrada no sangue circulante.187 O tratamento pré-hospitalar é voltado para as intervenções que tentam minimizar a absorção do veneno. Apesar das evidências indicativas da limitação destas intervenções em casos de picada de escorpião, é razoável imobilizar a parte do corpo afetada em posição dependente. A aplicação de bolsas de gelo pode diminuir a dor e a absorção do veneno. A aplicação tópica de um anestésico pode diminuir as parestesias de forma mais efetiva do que uma medicação sistêmica,170 enquanto o bloqueio nervoso com anestesia local pode ser bastante efetivo em casos de picada na porção distal dos membros.168

O tratamento da ferida local também deve incluir a limpeza da área. Podem ser aplicados antibióticos tópicos e, se houver indicação, a profilaxia antitetânica deve ser administrada.

Tratamento hospitalar. Seja qual for a espécie de escorpião, a vasta maioria das picadas não provoca toxicidade sistêmica e pode ser tratada com analgésicos e intervenções locais. As reações sistêmicas graves costumam se manifestar, predominantemente, nos sistemas neurológico ou cardiovascular. Os sinais neurológicos predominam na toxicidade severa decorrente de envenenamento por C. sculpturatus,171 enquanto os sinais cardiovasculares, incluindo a insuficiência ventricular esquerda e o edema pulmonar, são comuns no envenenamento por escorpiões na África e Oriente Médio.171,173 O tratamento geral da toxicidade sistêmica inclui o tratamento de suporte, manutenção e proteção das vias aéreas e suporte ventilatório e circulatório.

O uso de sedativos-hipnóticos é defendido para casos graves de agitação e inquietação motora associadas ao envenenamento por C. sculpturatus. É essencial realizar uma avaliação cuidadosa (para garantir a adequação das vias aéreas, respiração e circulação) e monitoramento dos pacientes tratados com sedativos-hipnóticos, pois há relatos de depressão respiratória e até de parada respiratória associadas a esta terapia.188,189

O uso de antivenenos específicos é controverso, e sua eficácia é sustentada por alguns estudos,171,174,184 mas rejeitada por outros.190-192 Um pequeno estudo recente mostrou que os pacientes tratados com antiveneno F(ab’)2 específico contra a toxina de Centuroides apresentaram uma resolução mais rápida dos sintomas e necessitaram de sedação significativamente menor do que os pacientes do grupo controle.171 Entretanto, a incidência de comprometimento respiratório ou de resultados graves foi menor e não diferiu entre ambos os grupos. O anticorpo específico usado neste estudo é disponibilizado no México, mas atualmente está indisponível nos Estados Unidos.171 O uso do soro anti-veneno à base de imunoglobina integral no tratamento de picadas produzidas por Centuroides atualmente não é defendido e tornou-se indisponível.171 A maior parte do soro antiescorpião-específico produzido e usado hoje consiste na fração F(ab’)2, que é mais segura do que o soro anti-veneno de imunoglobina integral.168 Todos os defensores da terapia com soro anti-veneno sugerem que sua instituição seja feita o quanto antes, em casos de envenenamento severo. Taquicardia e hipertensão são manifestações comuns de envenenamento por escorpião,182,193 e podem responder à analgesia e à sedação.182 Estes sinais estão associados à maior severidade do envenenamento186 e, quando não respondem a estas intervenções de suporte, costumam responder ao tratamento com prazosina194 ou captopril.195

A toxicidade cardiovascular severa é considerada secundária à tempestade autonômica e com frequência está associada à hipertensão grave, insuficiência ventricular esquerda e edema pulmonar.173 O tratamento de suporte e a redução da pós-carga com vasodilatadores, notavelmente a prazosina, podem diminuir a mortalidade neste grupo,196 embora o uso de vasodilatadores auxiliares (nitroprussiato de sódio) e agentes inotrópicos (dobutamina) possa ser necessário nos casos refratários. O uso precoce de prazosina pode diminuir a incidência de edema pulmonar entre os pacientes com tempestade autonômica.197

Dois estudos recentes sugeriram que a prazosina pode ser mais efetiva do que o soro antiescorpião-específico no tratamento da toxicidade cardiovascular severa.192,198 Não há estudos randomizados e controlados que tenham comparado a prazosina ao uso de antiveninas ou outras terapias. A taxa de mortalidade decorrente de envenenamento por escorpião está melhorando nitidamente,168 mas ainda não está claro se isto é atribuível ao uso mais temporalmente adequado da terapia de soro anti-veneno ou de um tratamento de suporte mais efetivo. As evidências atuais sugerem que o soro anti-veneno pode ser mais efetivo no tratamento das manifestações neurológicas causadas pela picada de escorpião171,176 e que a prazosina deve ser o agente de escolha em casos de toxicidade cardiovascular proeminente.196-198 Assim como ocorre com a soro anti-veneno, a prazosina é mais efetiva quando usada logo no início de um envenenamento severo.173

 

Picadas e ferroadas de insetos

As picadas de inseto são clinicamente importantes. Os insetos impõem graves problemas de saúde pública por sua habilidade de atuarem como vetores de micro-organismos patogênicos, inoculando diretamente seus hospedeiros humanos, ao mesmo tempo que se alimentam de sangue ou líquidos teciduais. Embora as picadas e ferroadas de inseto sejam uma experiência humana universal, é difícil determinar a incidência exata da morbidade e mortalidade, devido aos relatos de práticas distintas, diferenças regionais de espécies endêmicas e amplo espectro de efeitos clínicos, em particular a severidade e variabilidade das respostas individuais.

Em 2008, a American Association of Poison Control Centers relatou 29.443 casos de picadas e envenenamentos causados por inseto (com exceção das aranhas e escorpiões), representando 1,03% de todas as exposições relatadas, com 3.465 indivíduos (11,8%) tratados em estabelecimentos de atendimento médico. Apesar da possibilidade de doença grave, não há relatos de mortes que tenham ocorrido neste intervalo de tempo.199

 

Formigas-de-fogo

Duas espécies de formiga-de-fogo foram importadas para o Alabama no começo da década de 1900. Desde então, estas formigas espalharam-se por todo o Sudoeste dos Estados Unidos e Texas.200 As formigas-de-fogo tanto picam como ferroam, e autoancoram-se usando as mandíbulas como alavanca para fazer o ferrão entrar. Seu veneno é composto essencialmente por uma mistura complexa de alcaloides de piperidina, que promovem efeitos locais hemolíticos e necróticos.201,202 As formigas-de-fogo são propensas ao aglomeramento e isto resulta em múltiplas picadas. Inicialmente, as picadas produzem um vergão ou pápula eritematosa, que evolui para uma pústula estéril prurídica no decorrer de um curso de 6 a 24 horas e pode persistir por várias semanas. Devido à natureza alcaloide do veneno, as reações tipicamente permanecem locais. Podem ocorrer reações sistêmicas ou anafiláticas, embora sejam raras. As infecções secundárias são ocasionais.203

O tratamento consiste em cuidar da ferida local, aplicar compressas frias, administrar anti-histamínicos e usar esteroides tópicos. O envolvimento extensivo pode requerer estereoides orais. As reações anafiláticas são tratadas do mesmo modo que as reações produzidas por outras causas. Os indivíduos com hipersensibilidade comprovada e que desenvolvem reações anafiláticas podem ser tratados com fogo e imunoterapia.204,205 A infecção secundária requer tratamento antibiótico.

 

Barbeiros e percevejos

O barbeiro (espécies de Triatoma), também conhecido como “assassino”, “nariz em cone” ou inseto reduviídeo, é encontrado principalmente nas regiões Sul e Oeste dos Estados Unidos. Este inseto alimenta-se de sangue de vertebrados, incluindo seres humanos, tipicamente à noite. Os barbeiros possuem uma longa probóscida com a qual sugam o sangue de suas vítimas sem causar dor. As picadas geralmente ocorrem em áreas expostas, como na face de um indivíduo que está dormindo.206 Os triatomas atuam como vetores na transmissão da doença de Chagas, que é causada pelo protozoário parasita Trypanosoma cruzi. Este protozoário pode causar efeitos clínicos neurológicos, cardíacos e/ou GI severos, tipicamente em fases tardias de um curso de anos de duração. A transmissão também pode ocorrer por transfusão sanguínea, transplante de órgãos e ingesta de alimentos ou bebidas contaminadas, além de da transmissão congênita.207 Embora a doença de Chagas seja endêmica nas Américas Central e do Sul, com mais de 11 milhões de pessoas infectadas, é também um problema de saúde pública emergente na região Sudoeste dos Estados Unidos, onde está relacionada à demografia variável.208 Recentemente, triatomíneos coletados no Arizona e analisados quanto à presença de T. cruzi demonstraram uma taxa de infecção significativa. Além disso, a Cruz Vermelha norte-americana atualmente submete todas as doações de sangue à avaliação para doença de Chagas.209-211 O objetivo do tratamento é a erradicação do parasita e o enfoque nos sinais e sintomas da doença. O benzonidazol e o nifurtimox são os únicos fármacos com alguma eficácia comprovada contra a doença de Chagas.207

Os percevejos (espécies de Cimex) também são insetos sugadores de sangue noturnos que se adaptaram aos ambientes humanos e passaram por uma recente ressurgência de infestações em países industrializados. São encontrados em todas as partes dos Estados Unidos e vivem em rodapés, móveis, roupas e camas. Sua saliva contém componentes causadores de vasodilatação local, anticoagulação e inibição de plaquetas junto ao sítio da picada.212 As reações cutâneas podem não ser detectadas, mas tipicamente incluem um vergão eritematoso seguido de uma pápula pruriginosa e firme que pode persistir por mais de 1 semana e aparecer em áreas do corpo que costumam ficar expostas durante o sono.213,214 Apesar das preocupações acerca da atuação dos percevejos como vetores de propagação de doenças transmissíveis pelo sangue, nenhuma conexão comprovou que os percevejos são viáveis como vetores. Embora possa haver efeitos sistêmicos e anafilaxia, estas condições raramente são observadas. É comum as picadas seguirem um curso autolimitado, mas podem ser tratadas de maneira sintomática, à base de anti-histamínicos e esteroides tópicos.213,214 A meta primária consiste na prevenção por meio da erradicação da infestação.

 

Lagartas e mariposas

A ordem Lepidoptera inclui as borboletas e mariposas, com cerca de 150 mil espécies descritas ao redor do mundo.215 As lagartas consistem na forma larval e de maior importância médica. As lagartas apresentam um conjunto de mecanismos de defesa, incluindo cerdas semelhantes a pelos destacáveis, espinhas fixas e venenos. Os sintomas geralmente são inespecíficos e podem variar de pápulas urticariáceas locais e dermatite a reações sistêmicas de hipersensibilidade e generalizadas sistêmicas.215 A lagarta-gatinho ou lesma-lanosa, encontrada no Sudeste dos Estados Unidos e Texas, é responsável pela maioria dos envenenamentos causados por esta família de insetos, que levam os pacientes a procurarem atendimento médico. A exposição cutânea produz uma intensa dor ardente, edema, pápulas dolorosas hemorrágicas e uma erupção em forma de grade característica no sítio de contato. Até 1/3 dos indivíduos expostos pode desenvolver uma reação sistêmica, como febre, linfadenopatia, câimbras musculares, desconforto respiratório e/ou convulsões.215-217

As mariposas ciganas infestam uma parte significativa da região Leste dos Estados Unidos, mas também são encontradas em qualquer parte deste país. O contato com as lagartas da mariposa-cigana pode causar dermatite por hipersensibilidade tardia. O tratamento é sintomático, com esteroides tópicos e anti-histamínicos orais. Os analgésicos ocasionalmente são necessários para controlar a dor.206

 

Cantáridas

As cantáridas (família Meloidae) incluem um grupo de besouros que possuem uma secreção tóxica que é depositada sobre a pele após o contato e pode causar formação de uma ou várias bolhas. As cantáridas não produzem picadas tóxicas nem ferrões, mas podem secretar cantaridina, que atua como agente vesicante e provoca irritação cutânea e formação de bolhas em cerca de 2 a 5 horas após o contato.206 O diâmetro das bolhas pode variar de alguns milímetros a vários centímetros. As espécies de Epicauta são encontradas em todo o território dos Estados Unidos, sendo que a “mosca espanhola” (embora não seja nativa dos Estados Unidos) é a mais estudada, por seu uso como afrodisíaco. Os besouros são pulverizados e, quando ingeridos por via oral (VO), provocam irritação da uretra. As bolhas decorrentes do contato com as cantáridas são tratadas como queimadura química, com tratamento diligente da ferida e prevenção contra infecções secundárias.206

 

Carrapatos

Os carrapatos são encontrados no mundo inteiro e pertencem à classe Arachnida. São caracterizados como carrapatos duros (Dermacentor, Ixodes, Rhipicephalus e Amblyomma), identificados por suas partes bucais anteriores visíveis e por uma placa dorsal rígida (escudo); e como carrapatos moles (Ornithodoros), que não possuem escudo e apresentam partes bucais retrovertidas que são dorsalmente invisíveis. Sem causar dor, os carrapatos fixam-se ao hospedeiro (principalmente mamíferos) para se alimentarem de sangue.218,219 Os carrapatos têm importância médica primária como vetores de infecção.220 As doenças infecciosas transportadas pelos carrapatos são altamente regionais e incluem a doença de Lyme, febre maculosa das Montanhas Rochosas, febre maculosa, babesiose, erliquiose monocítica humana, anaplasmose humana, tularemia, febre do Colorado transmitida por carrapato, encefalite transmitida por carrapato e febre recidivante transmitida por carrapato.218,221-227

Algumas espécies de carrapatos duros produzem uma neurotoxina em sua glândula salivar, que pode induzir uma síndrome conhecida como paralisia por carrapatos.228 A toxina geralmente é transmitida por uma fêmea gravídica e ingurgitada e causa paralisia flácida ascendente em cerca de 2 a 7 dias depois de o carrapato ter começado a se alimentar. A maioria dos casos ocorre de forma esporádica e na zona rural, com uma propensão a afetar crianças. Pode haver insuficiência respiratória, e, em alguns casos, há necessidade de suporte ventilatório. O diagnóstico é confirmado pelo achado de um carrapato preso à vítima. A remoção do carrapato é essencial para fins de recuperação. Os sintomas melhoram decorridas várias horas a dias da remoção do carrapato.229,230

Os carrapatos em geral se autofixam aos seus hospedeiros após 1 a 2 horas de exposição, de tal modo que os indivíduos residentes em áreas infestadas por carrapatos devem realizar checagens frequentes das roupas e do corpo. Se houver um carrapato preso, é necessário removê-lo imediatamente, para minimizar o risco de transmissão de doença. O carrapato deve ser apertado o mais próximo possível da pele, com auxílio de fórceps cego, pinça, dispositivos comerciais de remoção de carrapatos ou dedos da mão protegidos. Então, aplica-se uma rotação ou tração direta e estável, ao mesmo tempo que o carrapato é puxado, sem pressionar indevidamente o corpo. Após a remoção, deve ser instituído o tratamento-padrão de feridas. As reações de hipersensibilidade são comuns no sítio de fixação e podem manifestar-se como pápulas eritematosas, nódulos ou vesículas. Embora estas lesões possam persistir por várias semanas, geralmente são autolimitadas e podem ser tratadas de maneira sintomática, à base de anti-histamínicos e corticosteroides tópicos. Se as partes da boca forem apenas parcialmente removidas, podem ocorrer reações a corpos estranhos, infecções secundárias e formação de granuloma. À luz de uma exposição ao carrapato comprovada e acompanhada de sintomas como febre e cefaleia (que podem ser os sintomas iniciais de muitas doenças graves transmissíveis por carrapato), quaisquer sinais de uma infecção mais sistêmica devem ser imediatamente tratados, para que uma terapia apropriada possa ser iniciada.218

 

Envenenamentos marinhos

Quase 75% da superfície a Terra é coberta por água, e aproximadamente 80% dos organismos existentes em nosso planeta vivem nesse ambiente. Apenas algumas destas criaturas marinhas ameaçam os seres humanos, contudo os perigos são conhecidos desde a Antiguidade. Significativas morbidade e mortalidade humanas, que variam de uma dermatite mínima a infecções prejudiciais à vida, envenenamentos e traumatismo, podem resultar da exposição à vida marinha.

Ao longo das últimas décadas, a exposição dos seres humanos ao ambiente aquático aumentou significativamente, como resultado dos avanços científicos e tecnológicos, bem como da intensificação da exploração, aumento da prática esportiva de mergulho e atividades aquáticas de lazer, aumento da coleta de recursos marinhos para fins de alimentação, aquários de água salgada comerciais e particulares, além da intensificação das viagens e do maior acesso a localidades exóticas. Tais fatores aumentaram o risco de exposição a organismos marinhos. Em consequência, tornou-se imperativo que os clínicos, atuantes não só nas áreas costeiras como também nas ilhas, estejam familiarizados com os perigos implicados. Em 2008, a American Association of Poison Control Centers relatou 2.144 mordidas e envenenamentos causados por organismos aquáticos, que representaram 0,08% de todas as exposições relatadas, com 1 morte atribuída a um celenterado (água-viva).199

 

Invertebrados tóxicos

Celenterados

O filo Cnidária (que inclui o antigo filo Coelenterata) é dividido em 3 classes: (1) Hydrozoa (no qual estão o caravela portuguesa, hidroides-pluma e coral-de-fogo); (2) Schyphozoa (água-viva-verdadeira, urtiga-do-mar e box jellyfish); e (3) Anthozoa (anêmonas do mar, corais rochosos e corais moles).231 Os celenterados são caracterizados pelos nematocistos, que consistem em organoides dotados de ferrão venenoso. O nematocisto é uma estrutura capsular cheia de líquido, contendo um túbulo pontiagudo, oco e firmemente espiralado que irrompe sobre a vítima ao ser detonado por contato. O veneno consiste em uma mistura complexa de proteínas, carboidratos e outras substâncias não proteináceas.232-234

Efeitos clínicos. Os aspectos clínicos associados ao envenenamento por celenterados são muito constantes, porém apresentam uma gama de severidade que vai da dermatite leve a um rápido colapso cardíaco que resulta em morte. Os fatores determinantes da severidade incluem: espécie (a box jellyfish australiana é a mais mortal de todas as espécies de vida marinha dotadas de ferrão);235,236 estação do ano; número de nematocistos detonados; tamanho e idade da vítima; localização e área da superfície afetada pela ferroada; e grau de sensibilidade da vítima ao veneno. O conhecimento das espécies de celenterados nativas da região geográfica é importante para prever a potencial gravidade do envenenamento. A maioria dos hidroides e corais hidroides (que habitam as águas temperadas e tropicais distantes das costas norte-americanas do Atlântico e do Pacífico) inicialmente produz uma sensação de ferroada, parestesias e prurido, acompanhada de edema local, formação de bolhas e formação de vergão. Ocasionalmente, a lesão pode progredir ao longo de vários dias para uma necrose local, ulceração e infecção secundária.232,237,238

A espécie Physalia physalis (caravela portuguesa) consiste em um tipo de veleiro flutuante, de cor violeta-azulada, que contém vários nematocistos com tentáculos, cujos comprimentos podem chegar a 30 metros.237,238 As caravelas apresentam distribuição ampla, mas são prevalentes nas águas tropicais e semitropicais da costa Sudeste dos Estados Unidos e no golfo do México. A ferroada da caravela produz uma dor intensa, que irradia até o membro envolvido e é acompanhada do desenvolvimento de erupções lineares, edematosas, eritematosas e cutâneas. Pode haver envolvimento sistêmico, com múltiplos sistemas orgânicos afetados, náusea, vômito, cefaleia, mialgias, sofrimento respiratório, hipotensão e colapso cardiovascular.238,239 Embora tenha sido relatada, a anafilaxia verdadeira é rara, e a toxicidade sistêmica grave não é tipicamente induzida pelo veneno produzido por este organismo.237

As águas-vivas da classe Scyphozoa exibem uma ampla variedade de cores, formatos e tamanhos, além de variarem quanto ao potencial tóxico. São os celenterados que mais comumente produzem lesões clínicas e levam as pessoas a procurarem atendimento médico. Apresentam distribuição mundial e podem ter tamanhos que variam de alguns milímetros a mais de 2 metros na região da campânula (corpo), com tentáculos que chegam a medir 36 metros de comprimento.240,241 Como os tentáculos de algumas espécies são muito longos, é possível sofrer um envenenamento significativo sem nem mesmo visualizar a campânula. Os organismos arrastados pela água e depositados em terra firme também impõem risco, pois contêm nematocistos não detonados que podem estourar se forem pisados inadvertidamente ou se alguém pegar um tentáculo ou parte dele. Os envenenamentos causados pela maioria das águas-vivas apresentam severidade leve a moderada, com sintomas clínicos similares àqueles produzidos pelos hidroides e espécies de Physalia.238,241

Tratamento. O tratamento da ferroada de celenterado inclui a adoção de medidas de suporte vital, tratamento sintomático, controle da dor e prevenção de envenenamentos adicionais via inativação dos nematocistos. No caso do envenenamento pela box jellyfish, existem antiveninas (Commonwealth Serum Laboratories, Melbourne, Austrália) disponíveis para tratamento que devem ser administradas o quanto antes.35,236,242 A anafilaxia e o broncoespasmo devem ser tratados com adrenalina, oxigênio, líquidos IV, glicocorticoides, anti-histamínicos, broncodilatadores e vasopressores, quando necessário. A área da ferroada deve ser lavada imediatamente com água salgada (e não com água doce) ou solução de ácido acético a 5% (vinagre), para inibição dos nematocistos. No caso da ferroada da caravela portuguesa, o vinagre deve ser evitado e somente água salgada deve ser usada. Os tentáculos devem então ser removidos com as mãos enluvadas, hemostatos ou com auxílio de uma toalha, a fim de se prevenir o envenenamento do manipulador.231,237 Como alternativa, o uso de álcool isopropílico (a 40 a 70%) pode ser efetivo. Para tratar as ferroadas de Chrysaora (medusa urtiga-do-mar) ou Cyanea (medusa juba-de-leão), a aplicação de uma pasta de fermento em pó na área afetada é um tratamento efetivo.232,237,241 Para tratar os pacientes com erupção do banhista – uma dermatite pruriginosa, vesicular ou morbiliforme, que é causada pelas formas larvais de alguns celenterados – a aplicação de uma solução de papaína (amaciador de carne) é efetiva.243 Os anestésicos tópicos, anti-histamínicos e corticosteroides podem ser benéficos. A profilaxia antibiótica em geral não é indicada, mas o paciente deve receber profilaxia antitetânica apropriada e tratamento da ferida.

 

Equinodermes

O filo Echinodermata engloba as espécies venenosas de estrela-do-mar, ouriço-do-mar e pepino-do-mar. Os ouriços-do-mar tóxicos (a maioria encontrada nos Oceanos Pacífico e Índico e no Mar Vermelho) possuem espinhos pontudos, frágeis e cheios de veneno, e também apresentam órgãos semelhantes a pinças pegadoras, denominados pedicelárias.238,244 Os espinhos conseguem penetrar facilmente as roupas molhadas e a pele, para então se alojarem na vítima. A reação imediata consiste em intensa dor local, eritema, edema e sangramento. É possível, ainda, observar a coloração da pele produzida pelos pigmentos existentes nos espinhos. Se múltiplos espinhos tiverem penetrado a pele, o paciente pode desenvolver sintomas de envenenamento sistêmico, como náusea, vômito, parestesias, paralisia muscular, hipotensão e desconforto respiratório. Os ouriços-do-mar não tóxicos também podem causar morbidade significativa em decorrência de reações a corpos estranhos e infecções de tecidos moles ou artrite séptica, caso um espinho entre em uma articulação.

A maioria das estrelas-do-mar não é tóxica, porém a estrela-do-mar conhecida como coroa-de-espinhos (Ancanthaster planci) possui uma cobertura cheia de espinhos que distribuem um veneno secretado por um tecido glandular especializado.238,244,245 Os pepinos-do-mar são habitantes de vida livre das águas profundas. Produzem uma toxina leve que é concentrada em seus órgãos tentaculares. O contato direto pode causar dermatite. O veneno geralmente é diluído na água do mar, e o maior risco está na exposição das córneas e da conjuntiva, que resulta em uma inflamação intensa. O tratamento consiste na imersão em água quente (43,3 a 46,1oC) por 30 a 90 minutos ou até que a dor do paciente seja significativamente aliviada. Os espinhos devem ser localizados sob visualização direta ou empregando uma técnica radiográfica apropriada, e removidos com cuidado. Os espinhos retidos podem promover uma reação granulomatosa com necessidade de excisão cirúrgica. Os antibióticos de rotina são desnecessários, mas os ferimentos devem ser tratados com diligência e a profilaxia antitetânica deve ser instituída.240,246

 

Moluscos

O mecanismo primário da toxicidade dos organismos pertencentes a este filo é a ingesta de toxinas, pois estas são bioamplificadas até a cadeia alimentar (p. ex., mexilhões levando ao envenenamento amnéstico por mariscos). As 2 classes do filo Mollusca com potenciais toxicidades secundárias a uma mordida ou ferroada são os gastrópodes (concha cônica) e cefalópodes (polvo). As conchas cônicas (coneshells) são animais univalvulares encontrados nas águas rasas dos Oceanos Índico e Pacífico. Estas conchas inoculam neurotoxinas potentes (conotoxinas) em suas vítimas, através de um dente radicular destacável e em forma de dardo. Os sintomas locais são semelhantes aos da ferroada de abelhas ou vespas, seguidos de isquemia, cianose e entorpecimento da área ao redor da ferida. Nos casos de envenenamento severo, a paralisia local pode evoluir para enfraquecimento generalizado, paralisia e insuficiência respiratória.238,247,248 As mordidas de polvo são raras, mas há relatos de morte causada pelo polvo australiano de anéis azuis. Esta criatura possui uma neurotoxina potente, com pelo menos uma fração idêntica à tetrodotoxina (também encontrada nos tecidos do baiacu), que bloqueia a condição de sódio neuronal.248 Os sintomas locais costumam ser mínimos, mas um envenenamento significativo pode acarretar parestesias generalizadas, seguidas de paralisia e insuficiência respiratória. O tratamento do envenenamento causado por polvos é principalmente de suporte, com atenção especial para a necessidade de suporte respiratório.238

 

Poríferos

O filo Porifera contém mais de 5 mil espécies de esponjas. As esponjas são os animais multicelulares mais básicos, do ponto de vista biológico. São sedentárias e fixam-se ao fundo dos oceanos ou aos leitos de corais, podendo ser colonizadas por outros animais.249 As esponjas habitam as águas distantes das costas norte-americanas do Atlântico e do Pacífico, além do Hawaí. A doença da esponja do mergulhador geralmente é causada pela colonização das esponjas por celenterados e manifesta-se como dermatite ou reação cutânea necrótica localizada. Duas síndromes primárias também podem ocorrer a partir do contato com as esponjas.238,249 A 1ª é a dermatite de contato causada por espécies de esponjas produtoras de crinitoxinas, que é clinicamente similar à condição causada pelas plantas. A 2ª síndrome é uma dermatite irritante causada pela penetração de pequenas espículas de sílica ou carbonato de cálcio na pele. Como é difícil distinguir estas 2 reações diferentes, o tratamento de ambas deve ser iniciado. A pele deve ser seca e as espículas devem ser removidas com auxílio de fita adesiva ou máscara de peeling facial. Molhos em solução de ácido acético a 5%, com duração de 10 a 30 minutos, devem ser realizados 3 a 4 vezes ao dia (o álcool isopropílico a 40 a 70% pode ser usado como substituto). A aplicação tópica de esteroides pode ser útil no tratamento da inflamação secundária, mas não deve ser usada logo no início.238,249

 

Anelídeos

O filo Annelida inclui as lagartas com cerdas ou lagartas-de-fogo (taturanas). São anelídeos marinhos bentônicos que habitam os substratos marinhos moles e duros. Estas lagartas podem enterrar-se em meio aos corais duros e algas calcárias, ou podem viver em suas próprias fendas. Apresentam distribuição mundial, contudo são mais comuns em águas rasas e tropicais, onde exercem papel importante nas comunidades de recifes. Algumas espécies são cobertas por espinhos e cerdas semelhantes a cactos que, ao tocarem a pele de um indivíduo, penetram-na facilmente e quebram-se, induzido uma inflamação intensa com sensação de queimação e eritema. As cerdas devem ser removidas com auxílio de uma fita adesiva ou máscara de peeling facial, com subsequente instituição de tratamento similar àquele usado em casos de envenenamento por esponja (ver anteriormente).238,250

 

Vertebrados tóxicos

Arraias

As arraias são ubíquas em todas as águas temperadas e tropicais do planeta, sendo encontradas até mesmo em muitos sistemas fluviais de água doce nas regiões tropicais. As arraias representam a fonte mais comum de envenenamento marinho humano por vertebrados. São armadas com 1 a 4 espinhos venenosos, que ficam guardados dentro de uma bainha tegumentar localizada na cauda em forma de chicote. Os envenenamentos geralmente ocorrem quando um banhista inadvertido pisa na arraia enterrada no chão. O peixe, agindo de maneira reflexa, chicoteia a cauda para cima e introduz seus espinhos na vítima. O espinho venenoso tem uma ponta afiada com bordas serrilhadas que costumam causar uma laceração denteada, além de um ferimento com perfuração. Ocasionalmente, um espinho se quebra e persiste dentro do ferimento.251,252 A maioria dos envenenamentos ocorre no tornozelo ou no pé, mas às vezes outras áreas do corpo são lesadas, dependendo das circunstâncias em que o encontro acontece. Entre os sintomas iniciais, estão uma dor intensa e localizada, que pode irradiar centralmente. Pode haver edema local e sangramento variável. A dor aumenta e atinge o pico após cerca de 30 a 60 minutos. O ferimento muitas vezes exibe uma tonalidade escura ou cianótica e evolui para um estágio eritematoso e hemorrágico, ocasionalmente com envolvimento de tecidos profundos e uma franca necrose. Pode haver efeitos sistêmicos, que incluem câimbras musculares, náusea, vômito, enfraquecimento, cefaleia, diaforese e tontura. Em casos raros, o paciente sofre convulsões, paralisia, colapso cardiovascular e morte. O tratamento inicial consiste na imersão do paciente em água quente por 60 minutos, para inativação do veneno lábil ao calor, e promoção do alívio da dor. Em seguida, o ferimento deve ser totalmente irrigado e desbridado, se necessário. A imersão na água quente costuma promover alívio adequado da dor. Entretanto, se a dor persistir, deve ser feita a administração de analgésicos e a instituição da profilaxia antitetânica. Este tipo de ferimento apresenta risco de infecção e frequentemente requer tratamento antibiótico aliado a cuidados diligentes e seguimento intensivo.251-253

 

Peixe-escorpião e peixe-leão

A família Scorpaenidae é constituída por mais de 80 espécies e inclui o peixe-pedra, o peixe-leão e o peixe-zebra. A maioria das espécies desta família é de peixes que habitam recifes e são encontrados nas águas tropicais dos Oceanos Pacífico e Índico, bem como no Mar Vermelho.254 O peixe-escorpião é um dos peixes mais comuns e venenosos encontrados no Oceano Atlântico, além de possuir uma potente cardiotoxina.255 Estes peixes ficam perfeitamente camuflados, e o envenenamento ocorre quando uma vítima inadvertida agarra ou pisa em um deles. O peixe-leão, por sua beleza, é mantido frequentemente em aquários de água salgada domésticos e, desta forma, pode estar envolvido em casos acidentais de envenenamento. Este peixe possui espinhos venenosos revestidos com uma bainha tegumentar. O veneno consiste em uma mistura complexa de mediadores inflamatórios e proteínas sensíveis ao calor, que é inoculada após a penetração da pele da vítima pelos espinhos. Estes também podem quebrar-se e permanecer no sítio de perfuração, provocando uma reação a corpo estranho ou atuando como ninho para uma infecção secundária.238,253,256,257

As manifestações clínicas do envenenamento variam de uma toxicidade leve (causada pelo peixe-leão) a uma toxicidade severa e prejudicial à vida (produzida pelo peixe-pedra).254 Entre os sintomas iniciais, estão uma dor intensa no sítio de entrada do espinho, que irradia centralmente e pode continuar aumentando durante várias horas. Inicialmente, o ferimento parece ser equimótico e cianótico, mas depois costuma se tornar eritematoso e inchado. Decorridos vários dias, pode haver uma necrose tecidual localizada e formação de crosta na pele. Os sintomas sistêmicos podem incluir náusea, vômito, dor abdominal, cefaleia, mialgias, enfraquecimento, tremores, síncope, hipotensão, paralisia, convulsões, arritmias cardíacas, parada cardiopulmonar e morte.238,253 O tratamento inicial consiste na imersão imediata da área afetada em água quente (43,3 a 46,1oC), por 60 a 90 minutos, em uma tentativa de desnaturar as proteínas do veneno e aliviar a dor. O tratamento de suporte para sintomas sistêmicos, o cuidado diligente do ferimento local (incluindo a avaliação em busca de espinhos retidos), a profilaxia antitetânica e a administração de analgésicos são igualmente a base da terapia. Existe uma soro anti-veneno disponível, mas seu uso é reservado para os casos mais graves de envenenamento por peixe-pedra.254

 

Bagre

As mais de 1.000 espécies de bagre existentes no mundo habitam tanto as águas doces como as águas salgadas. O bagre de água doce é tipicamente um habitante sedentário das profundezas, que se move devagar e é encontrado com frequência em águas sujas. O bagre de água salgada, por sua vez, viaja em cardumes e é comum que esteja sempre em movimento. O bagre possui uma pele macia e sem escamas. Seu nome deriva dos barbilhos periorais (que, contrariando a crença popular, são incapazes de injetar qualquer tipo de ferrão ou produzir envenenamento). No entanto, o bagre possui espinhos serrilhados dorsais e peitorais, dotados de glândulas de veneno encerradas no interior de uma bainha tegumentar. Os espinhos podem produzir uma ferida com perfuração profunda, e as glândulas liberam o veneno após sofrerem traumatismo.258,259 A maioria das ferroadas ocorre durante a manipulação do peixe, após a captura, embora alguém que esteja andando na água possa ser ferroado no pé. Nos bagres maiores, os espinhos podem ser longos o bastante para lacerar artérias ou espetar órgãos vitais. O sintoma inicial é uma dor intensa, que irradia até o membro afetado e é desproporcional ao traumatismo mecânico. A dor é seguida de uma intensa reação inflamatória, que pode incluir eritema, inchaço, hemorragia local e necrose tecidual. As reações sistêmicas são raras, mas podem incluir náusea, vômito, enfraquecimento, hipotensão, síncope e sofrimento respiratório.

O principal aspecto preocupante em relação às ferroadas do bagre, como em todos os casos de traumatismo aquático, é o risco de infecção secundária. Os espinhos do bagre podem ficar retidos no sítio de perfuração. Como os espinhos costumam ser radiopacos, é necessário obter radiografias que permitam localizá-los. Havendo evidências da presença de um espinho retido, o ferimento deve ser submetido à exploração cirúrgica, e a matéria estranha, removida. O tratamento inicial inclui a imersão do sítio afetado em água quente (37,8 a 46,1oC), por 60 a 90 minutos, seguida de cuidados meticulosos e desbridamento do ferimento, instituição da profilaxia antitetânica e administração de analgésicos.258-260

 

Peixe-aranha

O peixe-aranha é o peixe mais venenoso da zona temperada, sendo encontrado no Mar Mediterrâneo, Mar Negro e águas da costa do Atlântico Oriental, desde o norte da África até o Mar do Norte. Este peixe tem 4 a 8 espinhos dorsais pontiagudos e 2 espinhos operculares, com os quais pode causar um dos envenenamentos mais dolorosos até então conhecidos. O peixe-aranha habita as baías barrentas ou arenosas e planas, escondendo-se no fundo e deixando apenas a cabeça exposta. As lesões em geral são observadas nas mãos ou pés de pescadores ou banhistas desavisados. O peixe-aranha é tipicamente sedentário, mas pode tornar-se agressivo ao ser provocado e pode sobreviver por muitas horas após ser retirado da água.260,261

Inicialmente, os envenenamentos causados por peixe-aranha produzem uma dor intensa, que se alastra e envolve todo o membro afetado. Esta dor costuma ser tão forte que a vítima age de maneira irracional ou perde a consciência. O ferimento torna-se inchado, equimótico e quente, podendo demorar meses para sarar. Pode haver sintomas sistêmicos, e é comum haver infecção secundária. A área afetada deve ser imersa imediatamente em água quente, do mesmo modo descrito para os outros casos de envenenamento por vertebrados marinhos (ver anteriormente), ainda que esta medida não seja tão efetiva no envenenamento por peixe-aranha. O ferimento deve ser limpo e explorado cuidadosamente, embora a retenção de espinhos seja incomum. A profilaxia antitetânica deve ser instituída. A administração de analgésicos sistêmicos e, possivelmente, a infiltração de anestésicos locais ou bloqueios nervosos regionais podem ser intervenções necessárias para aliviar a dor.260,261

 

Infecções transmissíveis pela água

As lesões aquáticas ocorrem todas em um ambiente exclusivo. Embora a base do tratamento destes ferimentos seja a mesma base do tratamento das lesões terrestres, as especificidades do tratamento do ferimento aquático variam. Os ambientes de água doce e água salgada fornecem uma gama de micróbios que tipicamente estão ausentes nas lesões traumáticas não aquáticas. Apesar da variação da concentração e da diversidade destes organismos (dependendo da temperatura, incidência de luz solar, profundidade, salinidade, nutrientes, formas vivas coexistentes e poluentes), qualquer lesão significativa que ocorra na água propicia a exposição e facilita a entrada de material microbiano em toda a zona de lesão. Muitos micróbios aquáticos são bastonetes heterotróficos, móveis e gram-negativos que são anaeróbios facultativos, como as espécies de Vibrio (água salgada) e A. hydrophila (água doce). Entretanto, entre estes micróbios também são encontrados outros tipos exclusivos de bactéria (isto é, Mycobacterium marinum, Erysipelothrix rhusiopathiae).262-264 Os regimes antibióticos devem ser ajustados para que possam conferir cobertura contra organismos gram-negativos, S. aureus e espécies de Streptococcus, que ainda são os patógenos causadores da maioria das infecções secundárias de ferimentos aquáticos [Tabela 10].

 

Tabela 10. Patógenos associados a infecções aquáticas

 

Organismos de água doce

Aeromonas hydrophila

Vibrio parahaemolyticus

Escherichia coli

Agrobacterium sanguineum

Pseudomonas aeruginosa

Chromobacterium violaceum

Staphylococcus aureus

Espécies de Streptococcus

Organismos de água salgada

Espécies de Vibrio (água salgada)

Aeromonas hydrophila

Erysipelothrix rhusiopathiae

Mycobacterium marinum

Bacteroides fragilis

Clostridium perfringens

Salmonella enteritidis

Staphylococcus aureus

Espécies de Streptococcus

 

Os autores não possuem relação comercial com os fabricantes de produtos ou prestadores de serviços mencionados neste capítulo.

 

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