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Abuso de drogas e dependência

Última revisão: 25/03/2014

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F. Gerard Moeller, MD

Director, Center for Neurobehavioral Research on Addictions, Professor, Department of Psychiatry, University of Texas Health Science Center at Houston, Houston, TX

 

Artigo original: Moeller FG. Drug abuse and dependence. ACP Medicine. 2011;1-16.

[The original English language work has been published by DECKER INTELLECTUAL PROPERTIES INC. Hamilton, Ontario, Canada. Copyright © 2011 Decker Intellectual Properties Inc. All Rights Reserved.]

Tradução: Soraya Imon de Oliveira.

Revisão técnica: Dr. Lucas Santos Zambon

 

Ao longo da última década, tem havido uma conscientização crescente por parte da comunidade científica de que os distúrbios relacionados ao uso de substâncias são distúrbios médicos com fundamentos biológicos e ambientais.1 Nos casos em que, no passado, o uso abusivo de substâncias e a dependência eram considerados transtornos comportamentais, há, hoje, um corpo crescente de evidências apontando que estes distúrbios podem piorar as condições médicas preexistentes e mimetizar temporariamente os distúrbios médicos e psiquiátricos, além de poderem causar por si só outros problemas médicos, como no caso das superdosagens prejudiciais à vida. Além disso, os distúrbios associados ao uso de substâncias são comuns: a prevalência destas síndromes ao longo da vida, inclusive do alcoolismo, é superior a 20% entre os homens e de cerca de 15% entre as mulheres, sendo que os jovens e indivíduos de meia-idade são mais seriamente afetados. Em um dia qualquer, é provável que um clínico típico atenda pacientes que apresentam distúrbios associados ao uso de drogas e problemas correlatos.

Felizmente, as habilidades necessárias para diagnosticar e tratar os distúrbios associados ao uso de substâncias estão devidamente incluídas na gama de habilidades apresentadas pelos médicos em geral. O tratamento bem-sucedido requer que o clínico esteja alerta para o fato de que muitos indivíduos com distúrbios por uso de substância apresentarão outras queixas não relacionadas a drogas. Além disso, os médicos de todos os ramos da medicina precisam entender que esses distúrbios podem ser tratados de forma médica, e, assim como outras condições crônicas (p. ex., diabetes e hipertensão), a obtenção de resultados ideais por pacientes com distúrbios relacionados ao uso de substâncias requer alterações a longo prazo no estilo de vida.2 A terapia deve incluir intervenções destinadas a intensificar o compromisso com tais alterações do estilo de vida. Além disso, é necessário um trabalho contínuo para ajudar o paciente a evitar a retomada dos comportamentos antigos (isto é, prevenção de recidiva). Tanto para o paciente individual quanto para a sociedade em geral, o nível de envolvimento para um tratamento bem-sucedido é alto. A cada ano, os distúrbios associados ao uso de substâncias custam aos Estados Unidos até US$ 300 bilhões e são responsáveis por mais de 20.000 mortes decorrentes apenas de acidentes de carro relacionados ao uso de substâncias. De um modo geral, estima-se que as condições relacionadas ao uso de substâncias diminuem a expectativa de vida dos dependentes em pelo menos 10 anos.3,4

 

Definições

 

As drogas de abuso são substâncias que afetam o encéfalo e alteram o humor, modificam a forma como as estimulações sensoriais são interpretadas e afetam outros aspectos do funcionamento encefálico.4 A intoxicação ocorre quando a ingesta produz diretamente alterações comportamentais, fisiológicas e psicológicas que comprometem a função. A ingesta repetida pode causar tolerância, que resulta das adaptações físicas e psicológicas produtoras da necessidade de doses mais altas de substância para produção do efeito desejado (p. ex., intoxicação).

Quando os problemas relacionados a estas substâncias ocorrem repetidamente e se agrupam com o passar do tempo, o indivíduo é considerado como tendo um distúrbio de uso de substância. Dentre os distúrbios deste tipo, os mais clinicamente relevantes são a dependência, o abuso e os distúrbios induzidos por substância. Há controvérsias quanto à terminologia dos distúrbios associados ao uso de substância. O termo “vício” é considerado depreciador por alguns autores, que preferem usar os termos “abuso” e “dependência”. Entretanto, argumenta-se que o termo “vício” captura um aspecto essencial do distúrbio clínico: o uso continuado da substância, apesar dos sérios problemas por ela causados.5 Do mesmo modo, os critérios determinantes da dependência, conforme descritos adiante, enfocam a tolerância e os sintomas de abstinência. Para algumas drogas de abuso, como os opiáceos e o álcool, estes sintomas são importantes. Para outras drogas de abuso, como os estimulantes, estes sintomas são menos críticos. As definições de distúrbios por uso de substância atualmente aceitas pela American Psychiatric Association são apresentadas na quarta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders–Text Revision: DSM-IV-TR) [Tabela 1].6

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Tabela 1. DSM-IV e critérios DSM-V propostos para distúrbios por uso de substância6

Abuso

Um padrão mal adaptativo de uso de substância, que leva a um sofrimento ou comprometimento clinicamente significativo, manifestado por um ou mais dos seguintes eventos ocorrendo a qualquer momento durante o mesmo período de 12 meses:

1. Uso recorrente de substância com consequente falha em cumprir todas as obrigações importantes no trabalho, na escola ou em casa (p. ex., relato de faltas ou desempenho insatisfatório no trabalho relacionados ao uso de substância; faltas, suspensões ou expulsões da escola relacionadas ao uso de substância; negligência a crianças ou à família)

2. Uso recorrente de substância em situações em que há perigo físico (p. ex., dirigir um carro ou operar uma máquina estando comprometido pelo uso de substância)

3. Problemas legais recorrentes, relacionados ao uso de substância (p. ex., prisões por conduta desordenada associada ao uso de substância)

4. Uso continuado da substância, apesar dos problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes

 

O paciente jamais deve ter atendido aos critérios de dependência de substância para esta classe de substâncias

Dependência*

Padrão mal adaptativo de uso de substância, com consequente sofrimento ou comprometimento clinicamente significativo, manifestado por pelo menos 3 dos seguintes eventos ocorrendo a qualquer momento, no mesmo período de 12 meses:

1. Tolerância, definida por qualquer uma das seguintes observações:

a. Necessidade de quantidades acentuadamente aumentadas de substância para alcançar a intoxicação ou o efeito desejado;

b. Efeito drasticamente reduzido com o uso continuado da mesma quantidade de substância

2. Abstinência, manifestada por qualquer um dos seguintes achados:

a. Síndrome de abstinência característica para a substância;

b. Uso da mesma substância (ou de outra estreitamente relacionada) para aliviar ou evitar os sintomas de abstinência

3. Uso frequente da substância em quantidades maiores ou por um período maior do que o pretendido

4. Desejo persistente ou tentativas fracassadas de parar ou controlar o uso da substância

5. Gastar tempo demais dedicando-se a atividades necessárias à obtenção da substância (p. ex., visitando múltiplos médicos ou dirigindo a longas distâncias), uso da substância (p. ex., fumando continuamente) ou recuperação dos efeitos da substância

6. Desistir ou descontinuar atividades recreativas, ocupacionais ou sociais importantes, em decorrência do uso de substância

7. Usar a substância continuadamente, tendo conhecimento dos problemas psicológicos ou físicos recorrentes ou persistentes provavelmente causados ou exacerbados por ela (p. ex., usar cocaína continuamente, apesar da depressão induzida pela droga; ou continuar a beber, mesmo sabendo que o consumo de bebida alcoólica piorou uma úlcera péptica)  

Critérios propostos para DSM-V

Distúrbio por uso de substância

A. Padrão mal adaptativo de uso de substância, com consequente sofrimento ou comprometimento clinicamente significativo, manifestado por pelo menos 2 dos seguintes eventos ocorrendo em um período de 12 meses:

1. Uso recorrente de substância, resultando na falha em cumprir obrigações importantes no trabalho, na escola ou em casa (p. ex., relato de faltas ou desempenho insatisfatório no trabalho relacionados ao uso de substância; faltas, suspensões ou expulsões da escola relacionadas ao uso de substância; negligência a crianças ou à família)

2. Uso recorrente de substância em situações em que há perigo físico (p. ex., dirigir um carro ou operar uma máquina estando comprometido pelo uso de substância)

3. Uso continuado da substância, apesar dos problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou exacerbados pelos efeitos da substância (p. ex., discutir com o cônjuge acerca das consequências da intoxicação, agressões físicas)

4. Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes achados:

a. Necessidade de quantidades acentuadamente altas de substância para alcançar a intoxicação ou o efeito desejado;

b. Efeito drasticamente reduzido com o uso continuado da mesma quantidade de substância

5. Abstinência, manifestada por qualquer um dos seguintes achados:

a. Síndrome de abstinência característica para a substância (consultar os critérios A e B dos conjuntos de critérios para abstinência de substâncias específicas);

b. Uso da mesma substância (ou de outra estreitamente relacionada) para aliviar ou evitar os sintomas de abstinência

6. Uso frequente da substância em quantidades maiores ou por um período maior do que o pretendido

7. Desejo persistente ou tentativas fracassadas de parar ou controlar o uso da substância

8. Gastar tempo demais dedicando-se a atividades necessárias à obtenção da substância, ao uso da substância ou à recuperação dos efeitos da substância

9. Desistir ou descontinuar atividades recreativas, ocupacionais ou sociais importantes, em decorrência do uso de substância

10. Usar a substância continuadamente, tendo conhecimento dos problemas psicológicos ou físicos recorrentes ou persistentes provavelmente causados ou exacerbados pela substância

11. Necessitar, desejar fortemente ou ter urgência em usar uma substância específica    

 

Especificadores de gravidade:

     Moderada: 2 a 3 critérios positivos

     Grave: 4 ou mais critérios positivos

*Se tolerância, abstinência ou ambas tiverem sido comprovadas como sendo parte da síndrome de dependência, o diagnóstico correto é o de dependência com componente fisiológico.

†A tolerância não é considerada para indivíduos que tomam medicações sob supervisão médica, como analgésicos, antidepressivos, medicações ansiolíticas ou betabloqueadores.

‡A abstinência não é considerada para indivíduos que tomam medicações sob supervisão médica, como analgésicos, antidepressivos, medicações ansiolíticas ou betabloqueadores.

DSM-IV-TR = Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders–Text Revision; DSM-V = Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders – 5th Edition.

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Dependência

 

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais Revisado – DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders–Text Revision: DSM-IV-TR) define a dependência como sendo uma condição de uso repetitivo e intenso de uma substância, que resulta em problemas repetidos em pelo menos 3 dentre 7 áreas preocupantes. Tais problemas devem ocorrer todos dentro do mesmo período de 12 meses. As categorias de problemas incluem tolerância e abstinência (em que uma está presente e justifica um diagnóstico de dependência com componente fisiológico); dificuldade de controlar o uso; incapacidade de cessar o uso quando necessário; passar tempo demais consumindo a substância; perder eventos importantes por causa do uso da substância; e continuar a usar a substância apesar dos problemas. Em termos de efeito, este último indica que a substância é mais importante para a pessoa do que os problemas decorrentes de seu uso.

 

Abuso

 

Se alguém nunca atendeu aos critérios determinantes de dependência de uma droga, mas continua apresentando problemas interpessoais, ocupacionais ou legais repetitivos associados ao uso da droga, ou se um indivíduo se expõe repetidamente a perigos potencialmente sérios enquanto está sob efeito da droga (p. ex., dirigir um carro quando está intoxicado), cabe estabelecer um diagnóstico de abuso. Os problemas devem ser clinicamente relevantes (isto é, não apenas triviais) e terem ocorrido de maneira repetitiva, sendo que o diagnóstico somente deve ser estabelecido na ausência de evidências de dependência da droga em questão.

 

Distúrbio do uso de substância

 

Mais recentemente, tem havido uma discussão significativa acerca da importância da tolerância e abstinência nos distúrbios do uso de substância. Alguns autores argumentam que a tolerância se desenvolve em relação a fármacos que são historicamente considerados de baixo risco para distúrbios de uso de substância, como a cafeína. Do mesmo modo, os sintomas de abstinência podem se manifestar com o uso de medicações sem propensão comprovada à dependência, como os agentes beta-adrenérgicos e os antidepressivos.5 Com base, em parte, nestes aspectos, na quinta versão do DSM, atualmente sob revisão, foi proposta a eliminação dos diagnósticos de abuso e dependência que seriam englobados em um diagnóstico de distúrbio por uso de substância. Os critérios propostos para este tipo de distúrbio são listados na Tabela 1.

 

Distúrbio induzido por substância

 

Os distúrbios induzidos por substância abrangem estados psiquiátricos semelhantes às síndromes psiquiátricas primárias (p. ex., transtornos da ansiedade, depressão significativa ou esquizofrenia), mas que somente ocorrem durante os períodos de intoxicação ou abstinência de um substância. Os distúrbios induzidos por substância melhoram rápido e são totalmente resolvidos em questão de dias ou em 1 mês após a cessação do uso da substância, e, em geral, podem ser tratados com orientação, restabelecimento da confiança e uma abordagem cognitivo-comportamental.

 

Categorias de drogas de abuso

 

Em vez de tentar se lembrar de todas as numerosas drogas individuais que podem ser usadas de modo indevido, a abordagem mais conveniente a ser adotada pelo clínico consiste em classificar estas drogas com base nos efeitos geralmente produzidos com as doses habituais. As categorias: são depressores, estimulantes, opiáceos, canabinoides, alucinógenos e inalantes [Tabela 2].4

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Tabela 2. Substâncias frequentemente usadas de modo indevido4

Classe

Exemplos

Depressores

Álcool, hipnóticos, benzodiazepínicos, barbitúricos

Estimulantes

Anfetamina, metilfenidato, todas as formas de cocaína, redutores de peso

Opiáceos

Heroína, morfina, metadona, quase todos os analgésicos vendidos sob prescrição

Canabinoides

Maconha, haxixe, dronabinol (Marinol)

Alucinógenos

LSD, mescalina, psilocibina, MDMA (Ecstasy)

Bloqueadores de canal do receptor de NMDA

Fenciclidina (PCP), quetamina

Inalantes

Aerossóis em spray, cola, tolueno, gasolina, solventes de tinta

LSD = dietilamida do ácido lisérgico; MDMA = 3,4-metilenodioximetanfetamina; NMDA = N-metil-D-aspartato.

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Depressores

 

Os depressores são substâncias que, nas doses habituais, fazem o indivíduo se sentir relaxado e desinibido, induzem o sono, diminuem a ansiedade e produzem ações anticonvulsivas. A ingesta aguda tende a diminuir as frequências respiratória e de pulsação, abaixa a pressão arterial e diminui a temperatura corporal. Assim como para as drogas de qualquer categoria, depressores diferentes produzem sensações semelhantes de intoxicação e apresentam padrões similares de problemas associados. Estas drogas incluem o álcool, os benzodiazepínicos (p. ex., diazepam, flunitrazepam), os barbitúricos e seus análogos (p. ex., secobarbital), além de outros agentes similares. Outro fármaco relevante é o ácido gama-hidroxibutírico (GHB), uma substância popular nas conhecidas festas rave. Os problemas associados aos depressores incluem uma superdosagem potencialmente letal, com rebaixamento dos sinais vitais essenciais; uma síndrome de abstinência fisiologicamente exigente, com insônia e ansiedade proeminentes; e síndromes do humor substância-induzidas. Os sintomas de abstinência associados a alguns agentes depressores, como álcool, barbitúricos e benzodiazepínicos de ação breve, em usuários regulares e intensivos, podem incluir tremores, convulsões e morte, na ausência de tratamento.

 

Estimulantes

 

Os estimulantes incluem drogas que, de forma aguda, produzem sensações de energia e euforia, diminuem a necessidade de dormir, intensificam a capacidade de concentração, diminuem o apetite e produzem efeitos similares aos da adrenalina sobre a pulsação, respiração e temperatura corporal. Estes agentes englobam todas as formas de cocaína (cujas diferentes formas refletem principalmente o grau de pureza, pontos de fusão e outros atributos físicos), todas as formas de anfetamina, a maioria dos comprimidos de redução de peso vendidos com prescrição médica (e muitos comprimidos vendidos sem prescrição), e os fármacos estimulantes prescritos para tratamento do transtorno de hiperatividade com déficit de atenção (p. ex., metilfenidato). Os problemas associados aos estimulantes incluem as superdosagens potencialmente mortais, arritmias, hiperpirexia e convulsões; psicoses graves e ansiedade durante a intoxicação; e estados de abstinência física, caracterizados por dormir em excesso, comer em excesso e depressão.

Embora a nicotina e a cafeína tenham propriedades estimulantes, são consideradas à parte dos estimulantes clássicos por apresentarem diferentes mecanismos neuroquímicos. Além disso, seus usos não estão associados ao padrão agudo de superdosagem e transtornos psiquiátricos substância-induzidos temporários observado com o uso dos outros estimulantes. O “vício” na nicotina, porém, em que a substância é usada de modo contínuo apesar das sérias consequências médicas não psiquiátricas, está comprovado.

 

Opiáceos

 

A categoria dos opiáceos inclui a heroína, a metadona, a codeína e quase todos os comprimidos prescritos para alívio da dor. A intoxicação por opiáceos é caracterizada por uma diminuição acentuada da dor; diminuição do reflexo da tosse; inibição da motilidade intestinal, com subsequente constipação; e sensação de estar “flutuando” semiacordado, por vezes descrita como semelhante a ser envolvido por um cobertor aveludado e quente. Doses altas de opiáceos produzem diminuição dos sinais vitais, enquanto as superdosagens podem ser letais. A abstinência dos opiáceos é caracterizada por dor, tosse e corrimento nasal, diarreia e sensação de tristeza. O risco de uma superdosagem potencialmente fatal de opiáceos é potencializado pela combinação com outros compostos sedativos, como álcool e benzodiazepínicos. Recentemente, um coquetel potencialmente letal de hidrocodona (Vicodin), alprazolam (Xanax) e carisoprodol (Soma) tornou-se popular entre os viciados em opiáceos prescritos. Estes fármacos estão desproporcionalmente associados às solicitações de identificação de substâncias junto aos centros de controle de venenos, nos Estados Unidos.7

 

Canabinoides

 

Os canabinoides englobam a maconha e drogas correlatas. Estas incluem todas as formas de planta de maconha (Cannabis sativa), cujo principal componente ativo é o delta-9-tetra-hidrocanabinol. Um agente farmacológico, o dronabinol (Marinol), também pertence a este grupo. A intoxicação inclui tontura, euforia, sensação suave de relaxamento, fome, diminuição das interações sociais e problemas para acompanhar o tempo. As diferenças de intoxicação entre a folha da maconha, o haxixe e outros canabinoides refletem uma potência variável.

Os canabinoides não tendem a produzir superdosagem. Entretanto, os estados de abstinência clinicamente relevantes (se não prejudiciais à vida) ocorrem após o uso maciço ou prolongado. A intoxicação por canabinoides compromete a concentração, o julgamento e o desempenho motor, aumentando, assim, o risco de acidentes com veículos motorizados. Além disso, o uso regular está associado a dificuldades de desenvolvimento e execução de comportamentos dirigidos por metas, em uma condição referida como síndrome amotivacional.

 

Alucinógenos

 

Os alucinógenos incluem drogas como a dietilamida do ácido lisérgico (LSD), mescalina, psilocibina e 3,4-metilenodioximetanfetamina (MDMA), popularmente conhecido como Ecstasy. Estas substâncias produzem uma intoxicação caracterizada por uma intensidade acentuadamente aumentada da estimulação sensorial. O uso de doses mais altas faz o indivíduo ver luzes piscando, cores e formas geométricas, que podem ser visíveis com os olhos fechados ou abertos. Os problemas incluem a possível precipitação de um episódio psicótico do tipo esquizofrênico em indivíduos predispostos e uma ansiedade associada à intoxicação com os alucinógenos mais similares aos estimulantes, como MDMA e LSD. As psicoses permanentes em indivíduos não predispostos são consideradas raras, mas diante da falta de dados experimentalmente controlados, isto não pode ser afirmado com certeza.

 

Bloqueador do canal do receptor de n-metil-d-aspartato (NMDA)

 

O uso indevido dos bloqueadores de canal do receptor de N-metil-D-aspartato (NMDA), que incluem a fenciclidina (PCP) e a quetamina (um anestésico de uso veterinário), é observado de forma relativamente rara no contexto clínico geral, embora não seja incomum entre os indivíduos que fazem uso abusivo de outras substâncias. Estes agentes não tendem a produzir superdosagem e não estão associados à síndrome da abstinência, porém a intoxicação pode produzir uma severa confusão com agitação acompanhada de alucinações e violência. Diferente do estado substância-induzido habitual, este delírio, em alguns casos, persiste por vários meses após a abstinência.

 

Inalantes

 

Os inalantes, como drogas de uso indevido, abrangem a cola, o tolueno e os hidrofluorocarbonos, inclusive o “ar comprimido”. A intoxicação por estas substâncias envolve a dificuldade de raciocínio e as sensações de energia, muitas vezes acompanhada de uma forte cefaleia. Os perigos associados ao uso dos inalantes incluem as arritmias cardíacas e os danos hepáticos e renais. Os efeitos neurotóxicos do solvente tolueno foram extensivamente estudados. A atrofia cerebelar, hipocampal e cerebral foi comprovada em indivíduos que fazem uso abusivo crônico de tolueno. Além disso, o abuso desta substância durante a gestação pode levar à síndrome fetal do solvente.8

 

Epidemiologia

 

O uso abusivo de substâncias e distúrbios relacionados são encontrados entre pacientes de todos os níveis socioeconômicos e de instrução, em todas as áreas residenciais e em todos os grupos raciais. Dados relevantes sobre a epidemiologia nos Estados Unidos são disponibilizados por um levantamento anual feito por alunos de 2º grau e estudantes universitários,9 intitulado National Longitudinal Alcohol Epidemiologic Survey (NLAES),10 e também por dois amplos levantamentos nacionais sobre problemas mentais e distúrbios associados ao uso de substâncias.11,12 Estes levantamentos constataram que até 60% dos homens e mulheres na faixa etária de 19 a 32 anos usaram drogas ilícitas em algum momento de suas vidas. Este percentual diminui com o avanço da idade, chegando a aproximadamente 30% entre os indivíduos de meia-idade e a 10 a 15% em indivíduos com idade em torno de 55 anos. Uma avaliação de adultos jovens constatou que, ao longo de suas vidas, 56% dos indivíduos haviam usado canabinoides, 18% usaram alucinógenos e cerca de 12 a 15% consumiram cocaína, inalantes, anfetaminas e opiáceos (embora apenas 2% tenham usado heroína). Estes números foram quase iguais na maioria das regiões dos Estados Unidos, embora tenham sido discretamente mais baixos no Sul do país.

O uso foi substancial tanto nas áreas urbanas como na zona rural, embora tenha sido um pouco maior nas grandes cidades. Em geral, a taxa mais alta de uso de drogas em algum momento da vida foi encontrada entre os brancos (com números da ordem de 32% para qualquer droga ilícita, dependendo dos métodos de estudo e da população incluída no levantamento) e entre indivíduos que tinham cursado pelo menos um ano do ensino superior.

Os levantamentos sobre problemas de saúde mental e relacionados ao uso de substâncias relataram um risco vitalício de dependência de qualquer droga ilícita da ordem de 9,2% para homens e 5,9% para mulheres. O risco de uso abusivo foi relatado como sendo de 5,4% e 3,5%, respectivamente. Estes resultados refletem taxas de dependência aproximadas de 15% para os usuários. Por meio dos estudos, os riscos mais altos foram observados em indivíduos na faixa etária que vai do fim da adolescência até cerca de 40 anos. Nesta faixa etária, até 10% dos homens e mulheres atenderam aos critérios determinantes de dependência. Em geral, as taxas de dependência foram maiores entre os brancos, discretamente menores entre os afro-americanos e um pouco menores (mas ainda substanciais) entre os hispânicos.

Com relação a substâncias específicas, a prevalência vitalícia mais alta (talvez, 15 a 20% para abuso e dependência) foi observada para o álcool, embora números significativos tenham sido relatados para as drogas ilícitas. Estima-se que a prevalência vitalícia da dependência de canabinoides nos Estados Unidos seja de cerca de 5%. No caso das anfetaminas e da cocaína, as taxas estimadas são de cerca de 2 a 3% para cada uma. As taxas de problemas repetitivos com as drogas remanescentes giram em torno de 1% para cada uma, com exceção da heroína e dos inalantes, para os quais as taxas são inferiores a 0,5%. Ao longo dos últimos 10 anos, houve um aumento significativo do uso indevido de prescrições de opiáceos, com alguns relatos de que os opiáceos prescritos foram as drogas ilícitas mais comumente iniciadas no ano anterior ao da publicação dos dados. Houve, ainda, um surto de atendimentos no departamento de emergência relacionados ao uso de opiáceos.13 Em um recente levantamento conduzido nos Estados Unidos, envolvendo 55.279 indivíduos com idades a partir de 12 anos, 13,6% dos entrevistados relataram o uso não médico de opiáceos vendidos sob prescrição em algum momento da vida, com 5,1% relatando uso não médico em curso.14

 

Etiologia

 

Os distúrbios associados ao uso de substâncias constituem um grupo heterogêneo de condições que frequentemente se desenvolvem após alguns anos da 1ª exposição à substância. Os clínicos precisam conhecer os numerosos fatores distintos que contribuem para estes distúrbios a fim de serem capazes de ensinar seus pacientes sobre como a condição se desenvolveu e de identificarem os indivíduos que apresentam risco mais alto de futuros problemas.

Assim como para a maioria dos distúrbios médicos significativos, tanto os genes como o meio ambiente contribuem para a vulnerabilidade aos distúrbios de uso de substância.15 Embora os dados mais significativos sejam sobre as influências genéricas que contribuem para a dependência do álcool, a maioria das hipóteses acerca do alcoolismo também parece se aplicar às dependências de outras drogas. Estas generalidades incluem: genes, que provavelmente conferem 40 a 60% da vulnerabilidade à dependência; a provável existência de vários tipos de características geneticamente influenciadas que aumentam ou diminuem o risco de dependência de substâncias; e múltiplos genes (isto é, não apenas um gene dominante ou recessivo) que podem contribuir para a vulnerabilidade na maioria dos casos.16-18 A decisão de usar estas substâncias e o desenvolvimento de problemas temporários menos sérios com determinadas substâncias são igualmente afetados pelos genes, embora as influências ambientais exerçam um impacto maior.19,20

Várias linhas de evidência sustentam a probabilidade de que as influências genéticas contribuem para vários tipos de dependência de drogas. Primeira, no modelo de roedores, foram identificadas diferenças genéticas relacionadas ao padrão e intensidade do uso de substância.21 Segunda, o risco de distúrbio por uso de substância é elevado entre os parentes próximos de indivíduos dependentes de drogas.19,22 Terceira, gêmeos fraternos de indivíduos dependentes (que compartilham 50% dos genes) apresentam o mesmo risco elevado encontrado para qualquer irmão(ã), enquanto gêmeos idênticos (que compartilham 100% dos genes) apresentam taxas de dependência 2 vezes maiores.20,23 Finalmente, o risco elevado de abuso de drogas e dependência apresentado pela prole de pais dependentes de drogas permanece alto, mesmo que as crianças sejam dadas para adoção e criadas sem o conhecimento do problema dos pais biológicos.24

Uma parte da tendência hereditária à dependência parece aumentar o risco de dependência de qualquer substância. Isto talvez reflita as similaridades existentes entre as drogas, em termos de alguns efeitos sobre o encéfalo, especialmente sobre um sistema essencial de dopamina junto ao tegumento ventral,25,26 ainda que também existam diferenças importantes entre as drogas quanto a seus efeitos neuroquímicos.27 Os genes que contribuem para a impulsividade severa também aumentam a vulnerabilidade aos problemas relacionados a todas as drogas de abuso.28 Outros indivíduos trazem um risco aumentado de dependência a uma gama de drogas, em consequência de padrões familiares de esquizofrenia e transtorno bipolar.16 É possível que o risco aumentado em relação a drogas de categorias específicas esteja relacionado aos genes codificadores dos sistemas neurotransmissores afetados por estas drogas. Exemplificando, a composição do sistema de opiáceos endógenos de um indivíduo pode conferir um risco aumentado de desenvolvimento de dependência de opiáceos a esta pessoa. O mesmo pode ser aplicável ao sistema da serotonina e em relação ao risco de dependência de alucinógenos, ao sistema do ácido gama-aminobutírico (GABA) e ao risco de dependência de depressores, bem como ao sistema da acetilcolina e ao risco de dependência da nicotina.16,18

Múltiplos fatores ambientais também afetam este risco.16 Tais fatores provavelmente incluem a disponibilidade geral de substâncias; as atitudes pessoais e sociais em relação ao uso destas drogas e as expectativas com relação a seus efeitos; níveis de estresse ao longo da vida; formas de lidar com os problemas; exemplos antigos de uso de substância em casa e entre pessoas próximas; estresses associados à pobreza; e o impacto de crenças religiosas.29,30

 

Fisiopatologia

 

Todas as drogas de abuso se ligam a uma ou mais proteínas encefálicas, alteram o funcionamento de receptores ou neurotransmissores e, subsequentemente, modificam sensações e comportamento.26,31 O usuário percebe estas alterações como sendo agradáveis (ou, pelo menos, diferentes da sobriedade), e isto reforça o uso tanto em termos cognitivos como em termos emocionais. Estes efeitos recompensadores atuam, ao menos em parte, por meio de um circuito de estruturas encefálicas junto à área tegumentar ventral (ATV) do mesencéfalo, nucleus accumbens (NAC), no estriado ventral e nas radiações subsequentes para o córtex cerebral.31,32 A exposição repetitiva a uma droga com propriedades recompensadoras resulta em diversas alterações que produzem um efeito particularmente marcante sobre a dopamina, o principal neurotransmissor deste sistema, além de contribuírem para o desenvolvimento de um futuro comportamento de procura pela droga. Em modelos experimentais de vício induzido em animais, foi comprovada a ocorrência de um processo de sensibilização – aumento progressivo do efeito da droga com a administração repetida. Em seres humanos, porém, a sensibilização está menos clara.

Um modelo humano de vício foi recentemente proposto por Koob e Volkow. Neste modelo, o distúrbio é considerado uma condição crônica recidivante, caracterizada por: “(1) compulsão pela procura e uso da droga, (2) perda do controle na limitação da ingesta, e (3) emergência de um estado emocional negativo (p. ex., disforia, ansiedade, irritabilidade), que refletem uma síndrome de abstinência motivacional quando o acesso à droga é impedido.”1 Neste modelo, a compulsividade e impulsividade são os construtos comportamentais centrais que levam ao vício. A impulsividade foi definida como sendo uma “predisposição a reações rápidas e não planejadas a estímulos internos e externos, sem consideração das consequências”,33 em oposição à compulsividade, que pode ser clinicamente definida como um comportamento dirigido e repetitivo sem função adaptativa evidente. No modelo de Koob e Volkow,1 ciclos de impulsividade e compulsividade levam ao vício por meio de três estágios de uso: bebedeira ou intoxicação; abstinência ou afeto negativo; e preocupação ou antecipação. A impulsividade domina o padrão de uso nos estágios iniciais, enquanto os estágios tardios são mais compulsivos. O neurocircuito destes 3 estágios do vício é representado na Figura 1. A bebedeira ou intoxicação está associada à ocorrência de mudanças envolvendo a dopamina no estriado ventral, que levam ao reforço, bem como à ocorrência de alterações no estriado dorsal, que levam à formação do hábito. O estágio da abstinência ou afeto negativo está associado à ativação da amígdala estendida via alterações envolvendo o fator liberador de corticotropina (CRF), noradrenalina e dinorfina. Enfim, o estágio de preocupação ou antecipação está associado à amígdala basolateral e ao hipocampo. Em todos os estágios, o controle executivo depende do córtex pré-frontal. O comprometimento da função cortical pré-frontal está associado à impulsividade e à compulsividade.

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Figura 1. Neurocircuito do vício.   

ATV = área tegumentar ventral; CRF = fator liberador de corticotropina; DA = dopamina; GLUT = glutamato; NA = noradrenalina; NCA = núcleo central da amígdala; NLET = núcleos do leito da estria terminal; GPV = globo pálido ventral; SNc = parte compacta da substância negra; Acb: nucleus accumbens.1

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Alguns processos neuroquímicos tendem a estar relacionados a uma droga mais do que a outra [Tabela 3]. Os opiáceos, canabinoides, nicotina, benzodiazepínicos e alucinógenos produzem seus efeitos mais proeminentes por meio de ações diretas em receptores específicos. Outros fármacos atuam especialmente alterando os níveis de neurotransmissores na sinapse, por meio da intensificação da liberação ou inibição da recaptação destas moléculas para dentro da célula pré-sináptica. Outras drogas (p. ex., fenciclidina [PCP] e quetamina) parecem exercer impacto principalmente sobre os canais iônicos. Exemplificando, a cocaína atua sobretudo inibindo o transportador de dopamina, promovendo o aumento subsequente da quantidade de dopamina presente na sinapse e afetando ambos os receptores de dopamina, D1 e D2. Entretanto, a cocaína também bloqueia a recaptação da serotonina e da noradrenalina, que também foram implicadas nos efeitos comportamentais da cocaína.34,35 As anfetaminas produzem efeitos similares sobre os níveis de dopamina, mas operam em especial intensificando sua liberação a partir da célula pré-sináptica. Os opiáceos ligam-se diretamente aos receptores de opiáceos e, desta forma, mimetizam as ações das substâncias opiáceos-símile endógenas, como as encefalinas e endorfinas, com produção subsequente de ações dopamina-reguladas junto ao sistema da ATV e NAC.36 Os opiáceos também afetam os receptores de canabinoides.37 A maconha e as drogas análogas a ela atuam principalmente via ligação a um receptor canabinoide específico (CB1). Esta ligação afeta as alterações mediadas pela proteína G no transporte de íons e no funcionamento do monofosfato de adenosina cíclico.38 Estas atividades, que também afetam os receptores de dopamina e opiáceos, bem como os sistemas CRF e GABA, mimetizam as ações dos canabinoides endógenos derivados do ácido araquidônico. Os efeitos são ao menos parcialmente revertidos pelos antagonistas de CB1.39 A maioria dos alucinógenos opera via alterações no sistema da serotonina, especialmente nos receptores de 5-hidroxitriptamina do subtipo 2 (HT2), embora também exerçam impacto sobre os sistemas glutamina-mediados.40 Os depressores exercem seus efeitos mais proeminentes sobre o GABA. A nicotina atua especificamente sobre os receptores nicotínicos da acetilcolina. A fenciclidina (PCP)  e drogas similares são inibidores não competitivos dos receptores de glutamato NMDA, que causam alterações funcionais em canais iônicos.27

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Tabela 3. Efeitos neurais de substâncias comumente usadas de forma indevida

Substância

Neurotransmissor

Alvo molecular

Cocaína, anfetaminas

Dopamina, serotonina, noradrenalina

Dopamina, serotonina, transportador de noradrenalina

Opiáceos

Opiáceos endógenos

Receptor de opiáceo-mu (agonista)

Nicotina

Acetilcolina

Receptor de acetilcolina nicotínico (agonista)

Álcool etílico

GABA, glutamato

Receptor de GABAA (facilitação); receptor de glutamato NMDA (inibição)

Maconha (delta-9-tetra-hidrocanabinol)

Canabinoides endógenos

Agonista de receptor de canabinoide CB1

Fenciclidina (PCP), quetamina

Glutamato

Bloqueio do canal do receptor de glutamato NMDA

LSD e outros alucinógenos

Serotonina

Receptor de serotonina (5-HT2) (agonista parcial)

 

Em cada caso, o composto indicador de cada grupo foi derivado de um produto de origem vegetal natural. Todas as substâncias listadas são potencialmente viciantes, com exceção do LSD e dos alucinógenos.

5-HT2 = 5-hidroxitriptamina do subtipo 2; GABA = ácido gama-aminobutírico; GABAA = ácido gama-aminobutírico A; LSD = dietilamida do ácido lisérgico; NMDA = N-metil-1-D-aspartato.

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Curso clínico habitual

 

Apesar das diferenças entre os tipos de drogas e entre os usuários, há mais similaridades do que diferenças em termos de curso de distúrbios por uso de substâncias [Tabela 4]. Primeiro, costuma existir um retardo substancial entre a 1ª exposição a uma substância e o desenvolvimento subsequente de abuso ou dependência – especialmente para substâncias cujos efeitos iniciais são menos intensos, como os canabinoides. O “período de graça” costuma ser mais breve para drogas com propriedades imediatamente recompensadoras mais potentes, como os opiáceos e estimulantes. Em segundo lugar, uma transição mais rápida para a dependência está associada aos modos de administração que proporcionam o maior reforço no menor período, como ocorre no tabagismo e com o uso intravenoso (IV). Em terceiro lugar, como a faixa etária em que há maior probabilidade de experimentação de substâncias se estende do meio da adolescência até o final desta fase e metade da fase dos 20 anos, o aparecimento de dependência muitas vezes acontece em indivíduos que estão no início até a metade da fase dos 20 anos.

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Tabela 4. Generalizações sobre a história natural de dependência de droga4

Idade no momento em que a droga foi tomada pela 1ª vez: 12 a 14 anos

Idade no momento da 1ª intoxicação: 14 a 18 anos

Idade em que problemas menores são vivenciados: 18 a 25 anos

Idade habitual no momento do aparecimento (problemas 3+ DSM-IV): 23 a 33 anos

Em qualquer ano, alternação de abstinência com uso ativo

Idade habitual ao iniciar o tratamento: 40 anos

Idade habitual do momento da morte: 55 a 60 anos

Principais causas de morte: problemas médicos não psiquiátricos, acidentes, suicídio, violência

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Outra generalização que tende a ser aplicável a todas as drogas causadoras de dependência é a tendência de flutuação da intensidade da dependência com o passar do tempo.4,41 Esta flutuação geralmente envolve um ciclo de uso em escalada até o ponto em que surgem problemas e uma crise se desenvolve, convencendo o usuário da necessidade de parar. A isto, então, segue-se um período de abstinência que dura dias ou meses. Contudo, estes indivíduos com frequência cometem o deslize de assumir uma atitude de negação de quaisquer problemas significativos associados à substância e recomeçam o ciclo novamente, com um período de uso controlado, uma ingesta em escalada e a reemergência dos problemas, seguida de outra crise, e assim por diante.

Mesmo sem tratamento, muitos pacientes com distúrbios por uso de substância conseguem se sair bem. Aproximadamente, 20% dos indivíduos dependentes param de usar a substância e mantêm uma abstinência prolongada e potencialmente permanente sem se vincularem nitidamente a um programa de tratamento ou grupo de autoajuda.41,42 Estas remissões espontâneas com frequência se desenvolvem no contexto de uma crise de vida, problemas médicos, mudança dos companheiros de vida ou diante de um novo interesse por religião. Este fenômeno subestima a crença de que há sempre esperança de recuperação, até mesmo para indivíduos que a princípio recusam o tratamento. Naturalmente, as intervenções terapêuticas melhoram drasticamente as chances de recuperação.

A maioria dos distúrbios por uso de substância traz um risco aumentado de morte precoce relacionado a problemas médicos, acidentes, suicídio e violência. O uso regular de múltiplos tipos de drogas aumenta de modo significativo a probabilidade de morte precoce.43,44 O uso de agulhas não estéreis e o compartilhamento de agulhas para injeção IV de drogas aumentam perigos como a transmissão da infecção pelo HIV e o desenvolvimento de endocardite e abscessos. Fumar as drogas aumenta a incidência de bronquite e doença pulmonar obstrutiva crônica, bem como o risco de desenvolvimento de câncer de pulmão. As superdosagens constituem um risco em particular associado ao uso de depressores, estimulantes e opiáceos, podendo ser letais ou deixar os sobreviventes com sequelas médicas duradouras.44 As superdosagens podem ser deliberadas ou acidentais. As superdosagens deliberadas podem ocorrer durante os episódios de ansiedade ou depressão induzidos pela droga, que podem mimetizar transtornos primários do humor ou da ansiedade. Estima-se que o índice de suicídio entre indivíduos com distúrbios por uso de substância seja, no mínimo, 5 vezes maior do que o observado na população geral.

Drogas específicas também trazem perigos de tipos específicos de neurotoxicidade. Exemplificando, dados fornecidos por estudos realizados com animais indicaram que o alucinógeno MDMA (Ecstasy) pode produzir alterações envolvendo os sistemas da serotonina. Há evidências de que algumas alterações causadas pelo Ecstasy podem ser permanentes, apesar da falta de achados consistentes obtidos em seres humanos.45,46 Pesquisas recentes realizadas com usuários de cocaína também apontaram os potenciais efeitos neurotóxicos da cocaína. Vários estudos que usaram imagem de difusão de tensor apresentaram evidências de alteração da substância branca em usuários crônicos de cocaína,47-50 sendo que um estudo mais recente, realizado com animais, apresentou encontrou achados similares em roedores submetidos ao tratamento crônico com cocaína.51 Estes estudos sugerem que o uso indevido e crônico da cocaína diminui a integridade da substância branca e isto, ao mesmo em parte, poderia ser responsável pelos déficits cognitivos associados ao uso crônico da cocaína.

Igualmente relevante para o curso clínico é determinar se a pessoa usa uma substância ou várias. A tendência a usar múltiplas drogas reflete em parte a alta prevalência do uso de drogas na população geral. Em alguns indivíduos, esta tendência reflete uma alta impulsividade e faz parte de um padrão geral de engajamento em comportamentos de risco. Um terceiro fator pode ser o uso de uma droga para minimização dos efeitos colaterais produzidos por outra. Um exemplo comum é a combinação de agentes depressores (p. ex., benzodiazepínicos) com opiáceos (p. ex., heroína ou metadona). O agente depressor não só intensifica a intoxicação como modera os sintomas de queda dos níveis sanguíneos de opiáceos, entre os quais a ansiedade ou outros problemas relacionados ao sono.52 A heroína frequentemente é tomada com estimulantes, como cocaína ou anfetamina, em uma mistura conhecida como speedball, talvez para diminuir os efeitos colaterais similares à ansiedade produzidos pelo estimulante e, ao mesmo tempo, diminuir a sonolência e o pensamento enevoado causados pelo opiáceo.53 A droga de abuso mais comum – o álcool – costuma ser usada com estimulantes, opiáceos e outras drogas, talvez para intensificar a intoxicação ou diminuir os efeitos colaterais.54

Os usuários de múltiplas drogas tipicamente começam usando aquelas mais prontamente disponíveis (p. ex., nicotina e álcool) e, em seguida, mudam para as drogas relativamente econômicas e também para os canabinoides de pronta disponibilidade. Subsequentemente, estes indivíduos progridem para os estimulantes ou alucinógenos e, por fim, passam a usar opiáceos.55,56 Uma explicação para esta progressão é a conhecida teoria da porta de entrada. Segundo esta teoria, a experiência com uma droga aumenta as chances de o indivíduo procurar outra droga, potencialmente mais perigosa, seja mudando o modo de encarar as drogas ou, talvez, em decorrência de alterações neuroquímicas induzidas pela droga anterior.

Por que alguns usuários de depressores, opiáceos ou estimulantes evoluem para o uso IV, enquanto outros retornam da aplicação IV para o fumo ou uso oral?57,58 Alguns pesquisadores especularam que a progressão pode refletir tentativas de aumentar a intensidade do efeito da droga (talvez, em consequência de tolerância) e obter o máximo de intoxicação possível a partir da quantidade de droga tomada (um tipo de custo-efetividade). Foi sugerido que aqueles que abandonam a administração IV provavelmente o fazem por temerem a infecção pelo HIV ou uma superdosagem.

 

Curso clínico com drogas específicas

 

Um estudo com seguimento de 12 anos de mais de 500 homens dependentes de opiáceos (originalmente identificados por meio de problemas legais) constatou que 14% dos indivíduos morreram e 38% estavam aparentemente livres dos opiáceos.41 Passados mais  de 12 anos, quando os indivíduos do estudo atingiram em média 48 anos de idade, 28% morreram e 41% estavam livres de opiáceos. Aos 33 anos de seguimento (quando os indivíduos estavam com cerca de 57 anos de idade), 49% morreram e 56% estavam livres dos opiáceos. Desta forma, 22% dos participantes se abstiveram totalmente no decorrer do período de seguimento, enquanto apenas 7% usaram opiáceos diariamente, durante o seguimento. Estes achados sustentam as observações de que a dependência de opiáceos está associada a uma alta mortalidade e, igualmente, a taxas elevadas de abstinência. Padrões similares de alternâncias de gravidade do uso e taxas substanciais de remissão a longo prazo também foram relatados para indivíduos dependentes de estimulantes ou canabinoides.59,60 

 

Diagnóstico

 

Avaliação clínica

 

Ao decidir quais pacientes devem ser submetidos a uma avaliação formal para distúrbios por uso de substância, é importante que o clínico evite o estereótipo equivocado do indivíduo dependente de drogas como alguém que vive nas ruas. Muitos indivíduos com dependência de drogas levam, na verdade, vidas estáveis e produtivas.

A avaliação começa com o clínico enfocando o padrão de dificuldades da vida e, ao mesmo tempo, sondando para descobrir se alguma substância pode ter contribuído para o caso.4 Para estabelecer o diagnóstico, é essencial comprovar a existência de um padrão de problemas associados ao uso de substância, conforme os critérios do DSM-IV-TR [Tabela 1]. É melhor começar com as perguntas globais sobre problemas de relacionamento (p. ex., perguntando quais seriam as queixas que familiares ou outras pessoas que convivem com o paciente poderiam fazer sobre ele(a); sobre o comprometimento funcional na escola ou no trabalho (p. ex., buscar atrasos e faltas que possam refletir o uso de substância); sobre acidentes repetidos (especialmente a altas horas da noite ou nos fins de semana); e problemas legais (incluindo dificuldades relacionadas à condução de veículos). Em seguida, o clínico deve avaliar o padrão de sinais e sintomas médicos e psiquiátricos, prestando atenção aos padrões patológicos que parecem flutuar no decorrer do tempo, e tendo em mente os sintomas clássicos de abstinência de depressores, opiáceos e estimulantes (ver adiante).

Vários questionários autoaplicados podem ajudar a realizar uma triagem de distúrbios relacionados ao uso de substâncias, pois enfocam os padrões de problemas que caracterizam estas condições. O Drug Abuse Screening Test (DAST), que é baseado no Michigan Alcohol Screening Test (MAST), apresenta uma das melhores razões de facilidade de uso por sensibilidade e especificidade.61 Este conjunto simples de 20 perguntas com respostas do tipo “sim ou não” sobre problemas relacionados a drogas demora apenas 5 minutos para ser aplicado. O médico também precisa reunir informações adicionais obtidas diretamente do paciente e, quando apropriado, de alguém próximo ao paciente (p. ex., cônjuge ou pai/mãe).

 

Exames laboratoriais

 

Os exames laboratoriais para substâncias ilícitas exercem papel limitado na avaliação. A maioria das triagens de drogas usa amostras de urina, devido à facilidade de avaliação e à presença de concentrações de droga relativamente altas encontradas na urina. Entretanto, um resultado somente será positivo, quando o paciente tiver consumido a substância muito recentemente [Tabela 5].62 Assim, um indivíduo com problemas graves e recorrentes associados ao uso de substância, mas que tenha feito abstinência nos últimos dias, possivelmente apresentará resultado negativo na triagem toxicológica. Além disso, um exame de urina indica apenas a presença ou ausência de uma substância ou de seus metabólitos, sem revelar a quantidade nem o padrão de uso da droga.

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Tabela 5. Resultados positivos e falso-positivos em testes de detecção de drogas na urina4,62

Droga

Duração dos resultados positivos após o uso

Fontes de resultado falso-positivo

Anfetaminas

2 a 3 dias

Descongestionantes, efedra, alguns antidepressivos, amantadina (Symmetrel)

Benzodiazepínicos

˜ 7 dias; 4 a 6 semanas com o uso crônico de benzodiazepínicos de meia-vida longa (p. ex., diazepam)

Alguns fármacos anti-inflamatórios não hormonais, como a oxaprozina (Daypro)

Canabinoides

˜ 5 dias; até 1 mês com o uso intenso

Dronabinol (Marinol), alguns fármacos anti-inflamatórios não hormonais

Cocaína

2 a 3 dias; até 1 semana, com o uso intenso

Anestésicos contendo cocaína

Opiáceos

1 a 3 dias; mais prolongada com meias-vidas mais longas (p. ex., metadona)

Sementes de papoula, quinina

Fenciclidina (PCP) /quetamina

1 a 2 semanas

Dextrometorfano

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Os exames laboratoriais em geral consistem em um procedimento de 2 etapas, em que um teste mais sensível e menos específico é realizado primeiro (p. ex., radioimunoensaio), seguido da confirmação dos resultados positivos por um método significativamente mais oneroso e específico (p. ex., cromatografia líquida de alto desempenho ou espectrometria de massa). Vários alimentos e medicações (vendidas sob prescrição ou não) podem produzir resultados falso-positivos no teste preliminar. Os testes de drogas que usam amostras de saliva, sangue e cabelo tendem a ser mais caros. Estes testes possuem seus próprios pontos fracos e não são usados com tanta frequência quanto os exames de urina.

 

Tratamento

 

Diretrizes para intervenção

 

Não existe uma forma perfeita de compartilhar com o paciente o diagnóstico de um distúrbio por uso de substância, e cada clínico é propenso a ter um estilo próprio, que,na maioria das vezes, é modificado para se adequar a cada paciente. No entanto, é possível propor algumas diretrizes gerais. A informação diagnóstica deve ser compartilhada de um modo empático, enfatizando eventos específicos, achados laboratoriais e aspectos preocupantes expressos pelo paciente ou por um familiar. As afirmativas globais devem ser evitadas. Como estes pacientes nem sempre estão prontos para admitir o diagnóstico logo de início, o clínico deve estar preparado para fazer múltiplas tentativas de convencer o paciente da necessidade da intervenção. Quando um paciente falha em adotar uma ação positiva, faz sentido para o clínico solicitar permissão para rever as evidências diagnósticas com alguém que seja importante em sua vida.

Muitas das diretrizes para intervenção se ajustam à abordagem sistemática de uma técnica denominada entrevista motivacional. A meta desta abordagem é aumentar a probabilidade de o paciente vir a reconhecer um problema, tornar-se motivado a fazer algo a respeito e aderir ao tratamento.63 Os elementos decisivos desta abordagem consistem em ajudar os pacientes a verbalizarem suas preocupações com o uso de substância, otimizar a motivação descrevendo as potenciais consequências do uso continuado, e oferecer o restabelecimento da certeza de que o resultado final pode ser bom, desde que o paciente esteja disposto a trabalhar para isto. A resistência não deve ser tratada com argumentação direta, e sim argumentando-se que os passos necessários à melhora da situação devem ser dados pelo paciente.

A aplicação desta abordagem aos pacientes com problemas relacionados ao uso de substância pode envolver 1 a 2 sessões educativas e diagnósticas de 15 a 20 minutos de duração. Estas sessões podem incorporar informações obtidas a partir da revisão de um diário, no qual o paciente tenha registrado o padrão de uso de substância. Estes diários podem ajudar a identificar indícios ambientais associados à ingesta de drogas.64 Também pode ser útil usar material de leitura sobre o uso de substâncias, como aqueles listados nos websites do National Institute on Drug Abuse (www.nida.nih.gov) e do National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (www.niaaa.nih.gov) (Nota do Revisor Técnico: no Brasil citamos o website do Centro Brasileiro de Informação sobre Drogas Psicotrópicas – CEBRID http://200.144.91.102/sitenovo/default.aspx ). De modo ideal, estas sessões são seguidas de 1 a 2 sessões de 5 minutos de chamadas telefônicas, que podem ser feitas por outros profissionais (p. ex., um enfermeiro) do consultório do médico. Uma avaliação recente estimou que para cada US$ 10 investidos em uma intervenção rápida, são poupados US$ 43 de despesas com tratamento.65

A entrevista motivacional e as intervenções rápidas podem ser suficientes para os pacientes que usam substâncias ilícitas e não são dependentes. Até mesmo para aqueles com problemas mais graves de dependência, estas abordagens podem motivar o paciente a se submeter a um tratamento mais formal voltado para a abstinência.

 

Problemas agudos

 

Intoxicação

 

A intoxicação envolve alterações nos sinais vitais, bem como mudanças de humor e alteração da função cognitiva causadas por uma droga. Contanto que os sinais vitais estejam relativamente normais, o tratamento da intoxicação consiste em controlar o comportamento transferindo o paciente para um recinto tranquilo, se possível na companhia de um amigo ou parente; restabelecendo a confiança; e, em casos raros, fazendo uso judicioso de doses baixas de medicações apropriadas (p. ex., benzodiazepínicos ou antipsicóticos). A administração de um benzodiazepínico a um paciente já intoxicado com um sedativo-hipnótico pode acarretar um nível potencialmente perigoso de sedação e, sempre que possível, deve ser evitada. O clínico deve excluir a hipótese de desenvolvimento de superdosagem e avaliar o paciente quanto à ocorrência de abuso ou dependência, e, ao mesmo tempo, ajudá-lo a evitar as sequelas sociais, interpessoais ou físicas da intoxicação. Frequentemente, é possível tratar esses pacientes no consultório, no serviço de emergência ou, com a ajuda da família, em casa. É preciso atentar para que alguém leve o paciente para casa.

 

Superdosagens e reações tóxicas

 

As superdosagens são intoxicações de tal gravidade que produzem alterações prejudiciais à vida envolvendo os sinais vitais.66 Como tais, as superdosagens devem ser tratadas no serviço de emergência ou no contexto de internação. O tratamento começa com o fornecimento de suporte médico e psicológico geral, enfatizando a normalização dos sinais vitais e permitindo que o corpo do paciente metabolize a droga. Dependendo da categoria da droga e das manifestações clínicas, pode haver indicação para um tratamento farmacológico específico [Tabela 6]. Discussões mais detalhadas sobre tratamento de superdosagem são disponibilizadas na literatura.4

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Tabela 6. Tratamento farmacológico da superdosagem de substância

Superdosagem de substância

Fármaco de tratamento

Dosagem

Comentários

Opiáceo

Naloxona

0,4 a 2 mg IV ou IM; pode ser repetida em 2 a 3 min, se necessário

Pacientes responsivos devem ter a terapia alterada para naltrexona de ação prolongada, pelo tempo que a droga de superdosagem estiver ativa

Estimulante

Diazepam

Infusão de 5 a 20 mg IV, por 1 a 2 min

Controlar convulsões

 

Fentolamina

2 a 5 mg IV

Controlar a pressão arterial

 

Nitroprussiato

0,25 mcg/kg/min

Controlar a pressão arterial

IM = via intramuscular; IV = via intravenosa.

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Estimulantes. As superdosagens de estimulantes, como as anfetaminas ou cocaína, tipicamente produzem taquicardia, arritmias cardíacas e elevações da pressão arterial e temperatura corporal potencialmente prejudiciais à vida. Também pode haver convulsões. O tratamento inclui a administração de líquidos IV, com velocidades de infusão tituladas de acordo com o débito urinário. Outras medidas são adotadas conforme a necessidade, para controlar os sintomas – como a administração IV de benzodiazepínicos (p. ex., infusão lenta de 5 a 20 mg de diazepam, durante 1 a 2 minutos) para tratar convulsões; cobertores frios para controlar a hipertermia; e fentolamina IV (2 a 5 mg) ou nitroprussiato (0,25 mcg/kg/min) para controlar a pressão arterial.

Opiáceos. Doses altas de opiáceos produzem quedas de frequência respiratória, frequência cardíaca e pressão arterial prejudiciais à vida. Outra possibilidade é o desenvolvimento de edema pulmonar ou coma. Além das medidas de suporte adicionais, os efeitos dos opiáceos podem ser especificamente revertidos pela naloxona (0,4 a 2 mg, IV ou via intramuscular [IM]), sendo que a dose pode ser repetida em 2 a 3 minutos, conforme a necessidade. Uma vantagem da naloxona está na tendência do paciente a responder em questão de minutos, contudo a desvantagem está no fato de o fármaco precipitar a retirada imediata do opiáceo, caso o paciente seja fisicamente dependente. A ação da naloxona tem curta duração, por isso os pacientes que respondem a este fármaco devem ter a medicação alterada para naltrexona (ReVia) de ação mais duradoura, a uma dosagem diária de 25 ou 50 mg ou mais. A naltrexona deve ser continuada por um período correspondente à duração da ação da droga envolvida na superdosagem (p. ex., até vários dias para os opiáceos de ação mais prolongada, como a metadona). Os pacientes com edema pulmonar devem ser tratados com ventilação de pressão positiva e outro tipo de suporte apropriado.

Benzodiazepínicos. Os pacientes com superdosagem de benzodiazepínicos são tratados com medidas de suporte gerais. Embora a reversão da sedação via infusão IV do antagonista flumazenil (Romazicon) seja possível, não costuma ser recomendada por poder precipitar convulsões. Uma abordagem similar pode funcionar para alguns dos outros agentes análogos aos benzodiazepínicos, como GHB.66,67

Superdosagens de outras substâncias. É improvável que as superdosagens de drogas de outras categorias produzam um estado fisicamente perigoso (entre estas drogas, estariam os canabinoides) ou que seus tratamentos físicos sejam diretos e sintomáticos. Exemplificando, os desequilíbrios eletrolíticos associados aos inalantes, disfunção renal ou arritmias cardíacas são corrigidos em etapas suportivas adequadas.66,68 O tratamento sintomático é usado para sinais vitais acentuadamente aumentados, arritmias ou convulsões, que podem ocorrer com a aplicação de doses altas demais de alguns alucinógenos estimulantes (p. ex., MDMA), fenciclidina (PCP) e quetamina. Outras etapas do tratamento destes casos incluem as medidas de suporte gerais, estabilização dos sinais vitais e controle do comportamento com antipsicóticos, como haloperidol, se necessário.

 

Psicose, ansiedade e depressão induzidas por substância

 

Todas as substâncias de abuso podem causar alterações do humor e dos processos de raciocínio. Os aspectos clínicos destas síndromes relacionadas à intoxicação ou à abstinência por vezes são idênticos àqueles das condições psiquiátricas primárias, como transtornos do humor (p. ex., síndromes depressivas significativas), síndromes psicóticas (p. ex., esquizofrenia) e transtornos da ansiedade (p. ex., transtorno do pânico). Os sintomas relacionados ao uso de substância, todavia, são temporários e tendem a desaparecer em questão de horas, dias ou semanas de abstinência.69

Doses altas de estimulantes produzem alucinações auditivas e ilusões. Sintomas similares são observados em cerca de 5% dos indivíduos dependentes de substâncias depressoras. Os pacientes que apresentam estas psicoses substância-induzidas podem ser beneficiados por um curso de vários dias de medicação antipsicótica (p. ex., 5 a 20 mg de haloperidol/dia). Embora a intoxicação com fenciclidina (PCP) ou alucinógenos possa produzir intensa confusão e agitação, acompanhadas de alucinações visuais, estas drogas raramente causam alucinações auditivas ou ilusões paranoides semelhantes à esquizofrenia.

A intoxicação por depressores e a abstinência de estimulantes tendem a produzir estados de depressão grave e, em alguns caos, suicida. A depressão relacionada à intoxicação pode persistir enquanto a droga for usada e, então, melhorar drasticamente em alguns dias a 1 mês após a cessação da droga. A depressão relacionada à abstinência de estimulantes igualmente melhora dentro de um período de dias a 1 mês.70 Estas condições substância-induzidas devem ser tratadas com as abordagens suportivas habituais, incluindo a terapia cognitivo-comportamental (ver adiante). Os pacientes que apresentam alto risco de suicídio também passam por um breve período de internação. O tratamento destes pacientes com medicação antidepressiva em geral é inapropriado, por vários motivos: primeiro, o uso simultâneo destas medicações com o uso indevido de substância pode ser perigoso; em segundo lugar, estas medicações tipicamente requerem pelo menos 3 semanas para produzirem efeito, enquanto a síndrome psiquiátrica relacionada ao uso de substância provavelmente já terá sido resolvida após este período; e em terceiro lugar, há poucos dados que sustentam a utilidade dos antidepressores nas síndromes do humor substância-induzidas.71

A abstinência de depressores e a intoxicação com estimulantes são frequentemente caracterizadas por síndromes de ansiedade graves e temporárias, as quais podem incluir os ataques de pânico, ansiedade generalizada e condições fóbicas. Estas síndromes, ainda, devem ser tratadas com abordagens cognitivas e comportamentais. O papel das medicações nestas síndromes é, na melhor das possibilidades, limitado.

 

Estados de abstinência

 

Com algumas drogas, a cessação abrupta após o uso prolongado tende a resultar em sinais e sintomas de rebote que são o oposto dos efeitos agudos da droga.4 Isto é similar à síndrome da abstinência observada com muitas medicações prescritas, tais como aspirina, anticoagulantes e betabloqueadores. Para evitar esta síndrome, os pacientes são desmamados destes agentes após o tratamento prolongado com doses altas. As substâncias de abuso para as quais as síndromes de abstinência são mais relevantes são os depressores, estimulantes e opiáceos. Um leve desconforto também pode advir da rápida cessação do uso de algumas drogas de abuso (p. ex., canabinoides),72 mas o mais comum é estes pacientes dispensarem o tratamento ativo.

O curso temporal da síndrome da abstinência depende principalmente da meia-vida da droga envolvida. Para as substâncias com meia-vida relativamente curta (p. ex., álcool, oxazepam, anfetaminas, cocaína, heroína), a síndrome costuma surgir em 4 a 8 horas de redução do uso, atinge o pico de intensidade no 2º dia e desaparece na maior parte dos casos no 4º ou 5º dias, embora alguns sintomas se estendam a níveis baixos por semanas a meses, caso o indivíduo permaneça em abstinência. No caso das substâncias com efeitos significativamente mais duradouros (p. ex., diazepam,metadona, oxicodona), é comum os sintomas de abstinência se tornarem evidentes após 2 a 5 dias de abstinência. Os sintomas de abstinência tendem a atingir o pico na 2ª semana e melhorar na 3ª ou 4ª semanas.

As abordagens gerais para tratamento destes estados de abstinência clássicos são bastante semelhantes. Primeiro, os pacientes devem ser passar por uma minuciosa avaliação física. É preciso prestar bastante atenção ao tipo de distúrbio médico mais propenso a estar associado ao uso repetitivo daquela categoria de substância ou via de administração (p. ex., doença infecciosa causada pelo uso de agulhas contaminadas). Isto é importante porque a abstinência tende a ser mais grave quando acompanhada de doença médica. Em segundo lugar, o paciente dependente de substância deve ser orientado quanto ao provável curso temporal e padrão de sintomas que tende a ser observado durante a abstinência. Além disso, o paciente deve receber garantias de que o clínico conhece a síndrome e sabe como tratá-la. Esta orientação e tranquilização do paciente, aliadas a um ambiente suportivo que permita ao paciente se sentir confortável e descansar, constituem a base daquilo que por vezes é referido como modelo social de desintoxicação.

 

Abstinência de estimulante

 

Os pacientes que passam pela abstinência de estimulantes (também denominada síndrome da abstinência de estimulante) requerem apenas suporte geral.4,73 As dificuldades agudas mais proeminentes incluem sonolência, fome, dificuldade de concentração e oscilações do humor, com sentimentos proeminentes de tristeza e frustração. Várias medicações foram avaliadas em estudos controlados, para uso no tratamento da abstinência de estimulantes. Os fármacos reforçadores da dopamina foram especialmente estudados. Com a possível exceção da amantadina, administrada a um dose de 200 a 300 mg/dia em doses divididas, estes fármacos aparentemente são inúteis.74

 

Abstinência de opiáceos

 

Uma síndrome de abstinência pode ocorrer após o consumo prolongado de doses altas de opiáceos ilícitos, como heroína ou qualquer narcótico analgésico prescrito. A abstinência de opiáceo é caracterizada pela intensificação da dor em todo o corpo, diarreia, corrimento nasal, tosse e sensação generalizada semelhante a um resfriado. Além da habitual abordagem suportiva de modelo social, os estados de abstinência de opiáceos podem ser tratados com a readministração de qualquer opiáceo (p. ex., metadona a uma dosagem de 20 a 40 mg/dia) em doses altas o bastante para minimizar os sintomas e, então, diminuir a dose necessária. Para os pacientes dependentes de opiáceos de ação mais breve, o desmame deve ser realizado ao longo de cerca de 5 dias. No caso dos pacientes dependentes de substâncias de ação mais prolongada, o desmame deve ser conduzido ao longo de aproximadamente 3 semanas.75

Devido às restrições legais à prescrição dos opiáceos para pacientes dependentes, uma abordagem alternativa sem uso de opiáceos frequentemente se faz necessária. Esta abordagem enfoca a promoção do alívio sintomático à base de descongestionantes e medicações antidiarreicas, como a loperamida. O alívio de alguns sintomas autonômicos pode ser promovido com o uso de um alfabloqueador, como a clonidina (0,1 mg, 3 a 4 vezes/dia, dependendo da pressão arterial e tomando cuidado para evitar a hipotensão). Para amenizar a insônia, doses hipnóticas de benzodiazepínicos administradas na hora de dormir (p. ex., 15 ou 30 mg de temazepam) e de outros fármacos similares, como zolpidem, zaleplon ou eszopiclone, são por vezes adicionadas a este regime, embora seja necessário ter o cuidado de evitar o uso indevido de hipnóticos por estes pacientes. Todo o coquetel terapêutico é reduzido no decorrer de um período de 4 ou 21 dias, especificamente apropriado para o estado de abstinência.76

Alguns clínicos sugeriram a adoção de um regime rápido de desintoxicação para pacientes dependentes de opiáceos, usando um antagonista de opiáceo como a naltrexona (50 a 150 mg) para precipitar a abstinência e, ao mesmo tempo, manter o paciente altamente sedado.77 Este regime exige supervisão intensiva em um contexto apropriado, é oneroso e está associado a alguns relatos de morte, além de não ter sido comprovada a melhora dos resultados alcançados pelo paciente.78 Portanto, este regime não é recomendado.

 

Abstinência de depressor

 

A síndrome da abstinência associada a agentes depressores, como os benzodiazepínicos ou barbitúricos, é semelhante à abstinência do álcool e engloba insônia, ansiedade e elevação da maioria dos sinais vitais. Cerca de 1 a 3% dos pacientes apresentam convulsão do tipo grande mal ou delírio. Esta complicação ocorre com maior frequência em pacientes que fazem uso concomitante de mais de uma substância de abuso, que usam doses altas de depressores ou que apresentam distúrbios médicos. Na maioria dos casos, o tratamento da abstinência de agente depressor (que não o álcool) envolve a readministração da substância específica envolvida na dependência e seu desmame ao longo de um período de 5 dias ou 3 semanas, dependendo da meia-vida da substância.4,79

 

Reabilitação

 

Em alguns pacientes, a desintoxicação isolada é suficiente para motivar o indivíduo a se abster de usar novamente uma substância, embora a participação em um programa de autoajuda, como o Cocaine Anonymous ou Narcotics Anonymous (Nota do Revisor Técnico: no Brasil temos, por exemplo, o Narcóticos Anônimos: http://www.na.org.br ), seja, em muitos casos, valiosa para a manutenção da motivação.80 Entretanto, a maioria dos pacientes necessita de esforços de reabilitação mais formais. Os pacientes que entram em programas de reabilitação tipicamente são bem-sucedidos. Isto se aplica especialmente àqueles que  têm alto nível de atuação, que podem ser identificados por realizar um grau de instrução maior e  ter uma rede social mais suportiva.81 Como o típico dependente de substância é um indivíduo com emprego e família, o prognóstico para a maioria dos pacientes costuma ser muito bom. A taxa de abstinência de 1 ano após o tratamento para indivíduos que levam uma vida com níveis mais altos de estabilidade é de 60 a 70%. Para indivíduos que vivem com níveis de estabilidade baixos a moderados, as taxas de abstinência são de 40 a 50%.82,83 De um modo geral, quanto mais um indivíduo se expõe ao tratamento, maior é a probabilidade de que venha a alcançar um resultado melhor. Sendo assim, a abordagem de internação mais intensiva parece ser superior ao tratamento ambulatorial, enquanto a exposição mais prolongada ao tratamento geralmente é melhor do que a exposição mais breve.

Um elemento central da reabilitação é a terapia cognitivo-comportamental.4,84 Os esforços são empreendidos no sentido de maximizar o comprometimento dos pacientes com abstinência, a fim de encorajá-los a verbalizar seus problemas relacionados ao uso de substância, esclarecendo-os quanto aos problemas que terão de enfrentar se continuarem a usar a substância, e oferecendo aos familiares e amigos dos pacientes a oportunidade de adquirir conhecimento e suporte semelhantes.4 A reabilitação também oferece esperança aos pacientes, disponibilizando um suporte de 24 horas e modelos de recuperação bem-sucedida via participação em grupos de autoajuda (ver adiante). Quando disponível, os próprios conselheiros que passaram pela experiência de uma recuperação estável de distúrbios por uso de substância podem servir de exemplo. A abordagem cognitivo-comportamental de reabilitação também engloba palestras e discussões em grupo que enfocam o modo como reconstruir a vida de alguém que permanece em abstinência, por meio da otimização dos relacionamentos com familiares e amigos, encontrando um contexto de trabalho onde o uso de substâncias seja desestimulado e desenvolvendo um grupo de pares livres de substância.

Por fim, um elemento importante do tratamento consiste em ajudar o paciente a identificar e aprender a evitar ou lidar com os fatores deflagradores de recidiva.85 Estes esforços envolvem grupos que intensificam o conhecimento do paciente acerca dos sinais de necessidade da substância, a evitação de situações em que o paciente costumava usar substância no passado e estabelecendo meios para recusa de drogas oferecidas. Além disso, os pacientes são alertados para a possível ocorrência de deslizes e estimulados a desenvolverem planos de retomada da abstinência o quanto antes, caso um deslize venha a ocorrer.

Durante o tratamento ativo e também após a terapia, os pacientes podem ser fortemente beneficiados pela participação em um programa de 12 etapas (isto é, Cocaine Anonymous, Narcotics Anonymous ou Alcoholics Anonymous) (Nota do Revisor Técnico: no Brasil há  os Alcoólicos Anônimos e os Narcóticos Anônimos). Estes grupos de leigos costumam ser baseados nos princípios do Alcoholics Anonymous (no Brasil, Alcoólicos Anônimos), que incentivam seus membros a assumirem a responsabilidade pelo próprio uso de substância, utilizarem os recursos disponíveis como parte da recuperação, reconstruírem relacionamentos com pessoas importantes em suas vidas e melhorarem as próprias chances de recuperação entrando em contato com outros indivíduos que tenham problemas semelhantes.42,86 Os pacientes que desejam participar de um destes programas devem procurar um grupo local em que provavelmente se sentirão mais confortáveis, com base no nível de instrução dos membros, mistura de sexos ou grau de ênfase dada à religião.87

A mesma abordagem geral de reabilitação é apropriada tanto para o contexto de internação como para o contexto ambulatorial e aplica-se a qualquer uso abusivo de substância.4 A participação intensa (isto é, como paciente internado ou via participação em grupos ambulatoriais intensivos que se reúnem com frequência) geralmente é oferecida por 2 a 4 semanas, seguidas de uma participação menos intensa por vários meses a um ano ou mais. Para os pacientes que apresentam dificuldades mais extremas para alcançar e manter a abstinência, uma alternativa importante é a residência em locais conhecidos nos Estados Unidos como comunidades terapêuticas, como a Daytop or Phoenix House 88 (Nota do Revisor Técnico: no Brasil há instituições do gênero, na maioria das vezes ligadas a igrejas ou ONGs) .Neste local, os pacientes vivem em um estabelecimento voltado para a abstinência (muitas vezes, uma casa ampla ou prédio de apartamentos convertido), onde a comunidade de indivíduos dependentes em recuperação constitui a principal rede terapêutica. Ao longo de aproximadamente 1 ano de residência nestes programas, os pacientes desenvolvem níveis aumentados de independência, à medida que transitam para a vida em comunidade em tempo integral.

Uma terapia comportamental de eficácia repetidamente comprovada na redução do uso de drogas é o tratamento de contingência (TC). O TC reforça os exames de droga na urina negativas, empregando um aumento progressivo de recompensas baseadas no número de resultados negativos consecutivos de exames de droga na urina. Diversas recompensas são concedidas, incluindo as recompensas pré-determinadas, como aparelhos de televisão e câmeras, certificados e dinheiro.89,90 Mais recentemente, embora seja mais comum uma urina limpa aumentar as chances de ganhar prêmios como certificados ou dinheiro, a entrega de um “aquário” como recompensa também se mostrou efetiva para diminuir o uso de estimulantes.91 Até o presente, o uso do TC permanece amplamente restrito à área de pesquisa, devido à dificuldade para estabelecer as recompensas no contexto clínico.

 

Medicações para reabilitação

 

Além do tratamento geral voltado para a abstinência, as medicações podem ser úteis para a reabilitação da dependência de certas drogas. Isto é especialmente válido para os opiáceos. Os dados referentes aos estimulantes são bem menos significativos. Abordagens biológicas interessantes estão sendo investigadas para a dependência de canabinoides (ver adiante), contudo poucos dados sustentam o uso de medicações para tratamento da dependência de outras substâncias ilícitas. Para qualquer síndrome de dependência, é improvável que as medicações por si só sejam eficientes, e é necessário fornecê-las apenas no contexto de uma abordagem cognitiva-comportamental.87

Naltrexona. Antagonista de opiáceo que se liga aos receptores de opiáceos, bloqueando a intoxicação produzida pelos opiáceos.77 A naltrexona e outros fármacos similares estão em uso desde a metade da década de 1980, como auxiliares no tratamento da dependência de opiáceos, após a conclusão da desintoxicação. Foi relatado que o uso de 50 a 150 mg/dia aumenta a proporção de pacientes que permanecem em abstinência e melhora o funcionamento psicossocial, sobretudo em pacientes dependentes de opiáceos altamente motivados.92,93 A retenção no tratamento tem sido o principal problema associado ao uso de antagonistas de opiáceos no tratamento do abuso de opiáceos. Uma formulação de naltrexona (Vivitrol) de ação prolongada, injetável uma vez/mês, promove comprovadamente uma melhor retenção e taxas de recidiva reduzidas, em comparação à naltrexona oral. Isto levou o Food and Drug Administration (FDA) aprovar a formulação de ação prolongada para tratamento da dependência de opiáceos. O Vivitrol também foi aprovado para uso no tratamento da dependência do álcool.

Substituição de opiáceo. A substituição de um opiáceo oral por uma droga de abuso injetada por via IV pode diminuir a necessidade, melhorar o funcionamento psicossocial e, por meio da ocupação dos receptores de opiáceos, diminuir a intoxicação e o reforço experimentados pelo paciente, caso este apresente recaída e use heroína ou drogas similares. Mudar a terapia dos pacientes por um agente oral que seja fornecido por meio de um programa diminui a exposição a agulhas contaminadas e a incidência de crimes.94 A abordagem mais frequentemente usada nos Estados Unidos envolve a metadona, um opiáceo de ação prolongada. A dosagem é lentamente aumentada de 20 mg/dia para cerca de 80 mg/dia, administrada uma vez/dia.95 Por causa das regulamentações federais norte-americanas, o tratamento com metadona da dependência de opiáceos deve ser instituído por meio de um programa de manutenção da metadona aprovado, e não tem aprovação para uso no consultório médico geral.

Uma variação do tema de manutenção de opiáceos aprovada para uso no tratamento instituído em consultório médico consiste em usar um agonista parcial de opiáceos, buprenorfina, combinado a um antagonista de opiáceos, a naloxona (Suboxone).96 Nos Estados Unidos, um médico registrado pode administrar a buprenorfina para tratamento do vício em opiáceos, após ser aprovado em um curso como aquele oferecido on-line pela American Academy of Addiction Psychiatry (http://www.aaap.org/education-and-training/physicians-clinical-support-system-buprenorphine-pcss-b).  A buprenorfina atua como agonista de opiáceo em doses menores, mas produz abstinência em doses mais altas e, por este motivo, é mais segura do que a metadona.75 A naloxona é adicionada à buprenorfina para desestimular a injeção do composto, uma vez que a administração IV da naloxona bloqueia os efeitos da buprenorfina. A mistura buprenorfina/naloxona é administrada por via sublingual a uma dose recomendada de 16/4 mg/dia. Esta mistura compartilha muitos dos efeitos colaterais da metadona, mas tende menos a produzir uma superdosagem inesperada. Entretanto, por seus efeitos de agonista parcial, não é recomendada para pacientes dependentes de opiáceos, que tomam doses altas de heroína ou metadona, pois pode induzir sintomas de abstinência nestes indivíduos.

 

Medicações para dependência de estimulante

 

Com base nos estudos experimentais realizados com animais que mostraram que a dopamina exerce papel central na promoção dos aspectos recompensadores dos estimulantes, os estudos iniciais de medicações controladas para dependência de estimulante enfocaram os antagonistas da dopamina. Contudo, os estudos não constataram que estas medicações eram significativamente melhores do que o placebo em termos de redução do uso de estimulantes.97 Estudos posteriores empregando um modelo de substituição, similar ao modelo da metadona para dependência de opiáceos, enfocaram as medicações que melhoram a função da dopamina, seja direta ou indiretamente, obtendo resultados mais satisfatórios. Dois estudos mostraram uma diminuição da incidência de resultados positivos de exames para cocaína na urina de indivíduos dependentes de cocaína tratados com d-anfetamina de liberação estendida, em comparação aos indivíduos tratados com placebo.97,98 Um destes estudos envolveu indivíduos dependentes de cocaína e opiáceos com diagnóstico duplo, igualmente tratados com metadona.97 Um terceiro estudo, envolvendo um número bem menor de indivíduos, não encontrou nenhum efeito estatisticamente significativo da d-anfetamina em relação à retenção ou à redução dos resultados positivos para cocaína nos exames de droga na urina, empregando d-anfetamina de liberação imediata.99 Estes estudos terapêuticos foram amplamente paralelos aos estudos laboratoriais comportamentais, mostrando que a administração de d-anfetamina não aumenta a autoadministração de estimulante e atenua alguns dos efeitos subjetivos da cocaína.100,101 Embora a d-anfetamina tenha apresentado alguns resultados positivos, ainda existem pontos fracos significativos que limitariam seu uso amplamente disseminado como forma de tratamento da dependência de cocaína, incluindo o potencial de abuso e desvio, bem como os potenciais efeitos colaterais cardiovasculares.102 Outras medicações que indiretamente aumentam os níveis de dopamina apresentaram alguns resultados promissores. Além de seus efeitos sobre o metabolismo do álcool, o disulfiram (Antabuse) inibe a beta-hidroxilase da dopamina, diminuindo a conversão desta em noradrenalina. Vários estudos mostraram a ocorrência de uma diminuição do uso da cocaína por pacientes dependentes de cocaína tratados com 250 mg de disulfiram/dia, que aparentemente não estava relacionada à diminuição concomitante do uso de álcool.103-105 Entretanto, doses mais baixas podem, na verdade, aumentar o uso de cocaína.105 Embora os estudos tenham constatado que o disulfiram geralmente é bem tolerado, existem vários riscos associados a seu uso por indivíduos dependentes de cocaína. Tais riscos incluem os potenciais efeitos hepáticos e o potencial de intensificar os efeitos cardiovasculares negativos da cocaína e reduzir o metabolismo da droga, com consequente aumento de seus níveis no sangue.106

Diversas medicações apresentaram alguma eficácia em termos de diminuição do uso de cocaína, quando combinadas ao TC, tais como citalopram, bupropriona e levodopa, combinadas a um inibidor de descarboxilase periférico.107-109

Como potencial tratamento da dependência de cocaína, vários laboratórios desenvolveram as conhecidas vacinas contra cocaína. Estas vacinas contêm compostos que consistem em uma molécula de cocaína fundida a uma proteína. Tais compostos estimulam a produção de anticorpos contra a cocaína e, desta forma, bloqueiam parcialmente a habilidade da droga de atravessar a barreira hemato-encefálica.110 Estudos clínicos preliminares estão sendo conduzidos, porém a segurança e eficácia desta abordagem ainda não foram estabelecidas para seres humanos.

 

Medicação para dependência de canabinoide

 

Um antagonista do receptor de canabinoide CB1 localizado no encéfalo (rimonabant) foi inicialmente aprovado para tratamento da perda de peso, além de ter despertado interesse para uso na dependência da maconha. Entretanto, devido às preocupações relacionadas ao risco de depressão e ideação suicida, o fármaco foi retirado do mercado. Alguns autores sugeriram que os agonistas de canabinoide poderiam ser usados como terapia de substituição para a dependência da maconha.111 Contudo, até o momento, não há estudos controlados empregando esta abordagem.

 

Medicação para outras categorias de substâncias

 

Ainda não foram produzidos resultados relevantes de medicações que contraponham os alucinógenos, depressores (exceto o álcool) ou inalantes.

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O autor recebeu suporte financeiro do National Institute on Drug Abuse (grant n. P50DA009262).

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Agradecimentos

 

Figura 1 – Christine Kenney.

 

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