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Infecções no Trato Gastrointestinal

Última revisão: 02/06/2016

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Marcia B. Goldberg, MD

Professora Associada de Medicina, Divisão de Doenças Infecciosas da Harvard Medical School e Médica no Massachusetts General Hospital, Boston, MA

 

Luisa M. Stamm, MD, PhD

Pesquisadora na Divisão de Doenças Infecciosas da Harvard Medical School e Clínica no Massachusetts General Hospital, Boston, MA

 

Artigo original: Goldberg MB, MD, Stamm LM, PhD. Gastrointestinal Tract Infections. ACP Medicine.

[The original English language work has been published by DECKER INTELLECTUAL PROPERTIES INC. Hamilton, Ontario, Canada. Copyright © 2015 Decker Intellectual Properties Inc. All Rights Reserved.]

Tradução: Paulo Henrique Machado

Revisão técnica: Dr. Lucas Santos Zambon

 

Os sintomas mais notórios associados a infecções no trato gastrointestinal são vômito e diarreia. Nos Estados Unidos, diarreia aguda usualmente definida como mais de três fezes soltas em um dia por um período inferior a 2 semanas é uma queixa médica comum cuja prevalência anual é 0,6 enfermidade por pessoa.1 Em todo o mundo, estima-se que 2 bilhões de casos de doença diarreica ocorram em cada ano, sendo que a doença diarreica é a segunda causa mais importante de morte em crianças.2 Nos Estados Unidos, estima-se que os patógenos conhecidos sejam responsáveis por 14 milhões de enfermidades causadas por alimentos, 60.000 hospitalizações e 1.800 óbitos em termos anuais.3 A transmissão pode ocorrer de animais para pessoas, entre pessoas ou pela ingestão de alimentos contaminados.

A maior parte das formas de gastroenterite aguda causada por infecções é autolimitada. Com base nos relatórios sobre as frequências das causas bacterianas identificadas de gastroenterite aguda, mais de 90% dos casos provavelmente sejam produzidos por vírus.4,5 Entre todos os tipos de gastroenterite viral, o Norovirus é de longe o agente etiológico mais comum, sendo responsável por mais de 90% dos surtos de gastroenterite não bacteriana e por muitos casos de doença esporádica em pessoas de todas as idades.6-8 As etiologias dos casos não virais de gastroenterite aguda incluem uma grande variedade de bactérias, protozoários e helmintos [ver a Tabela 1], sendo que as doenças mais graves são causadas por patógenos bacterianos. Nos Estados Unidos, as bactérias gram-negativas Salmonella (44%), Campylobacter (38%), Shigella (12%), Escherichia coli 0157 (3%), Vibrio (1%) e Yersinia (1%) estão entre as causas bacterianas mais comuns de diarreia.2

Tipicamente, a apresentação clínica da doença reflete o sítio da infecção [ver a Figura 1]. De maneira geral, condições como náusea, vômito e diarreia de grande volume ocorrem com as infecções no intestino delgado, enquanto que cólicas abdominais e fezes frequentes de pequeno volume ocorrem com infecções no intestino grosso. Para cada patógeno, além do sítio da infecção, o mecanismo da patogênese se correlaciona com os sinais clínicos típicos daquela doença [ver a Tabela 2]: os patógenos que produzem enterotoxinas causam diarreia aquosa interrompendo a secreção ou a troca iônica de enterócitos; os patógenos que produzem citotoxinas destroem a barreira de enterócitos, induzindo, consequentemente, diarreia inflamatória que inclui sintomas sistêmicos (p.ex., febre); os patógenos que invadem a mucosa provocam um tipo semelhante de diarreia inflamatória; e vários patógenos que aderem na mucosa (conhecidos por patógenos enteroaderentes) alteram a função dos enterócitos, desencadeando, consequentemente, diarreia inflamatória.

 

 

*Os autores e os editores agradecem a contribuição dos autores  Lawrence R. Schiller, MD, FACP, do capítulo anterior “Doenças Diarreicas”, Nino Khetsuriani, MD, PhD e Umesh D. Parashar, MD, MBBS, MPH, do capítulo anterior “Infecções Virais Entéricas”, no desenvolvimento e na redação deste capítulo.

 

 

As informações financeiras estão no final deste capítulo, antes das referências.

 

Este capítulo apresenta uma abordagem geral à enfermidade diarreica e abordagens específicas às infecções gastrointestinais causadas pela Salmonella spp, Campylobacter spp, Shigella spp, Yersinia spp, Clostridium difficile e Norovirus. As infecções gastrointestinais causadas por E. coli patogênico e por parasitas são mencionadas apenas brevemente, tendo em vista que são discutidas com mais detalhes em algum outro artigo [procurar na ACP Medicine informações sobre infecções causadas por Escherichia coli e outros bacilos entéricos gram-negativos e infecções causadas por protozoários].

 

Abordagem Geral às Enfermidades Diarreicas

Avaliação Inicial

Avaliações clínicas e epidemiológicas cuidadosas são as chaves para o diagnóstico e tratamento de diarreia aguda. A presença de sangue ou de leucócitos nas fezes é consistente com diarreia inflamatória e com diarreias causadas por citotoxinas, por bactérias enteroinvasivas ou por colite hemorrágica [ver a Tabela 2]. As fezes aquosas são mais indicativas de processos secretores causados por enterotoxinas. A duração dos sintomas separa diarreia aguda (< 14 dias) de diarreia persistente (> 14 dias) e de diarreia crônica (> 30 dias); a diarreia aguda tem mais probabilidade de ser infecciosa. Febre indica a presença de infecção que envolve a invasão bacteriana no epitélio intestinal (p.ex., Salmonella spp, Campylobacter jejuni, Yersinia enterocolitica ou Shigella spp) ou citotoxicidade induzida por toxinas (p.ex., Clostridium difficile); a exceção a essa regra é o microrganismo E. coli enterohemorrágico que produz citotoxicidade sem febre. Os pacientes com perda líquida significativa, em especial aqueles com infecção no intestino grosso causada por patógenos que liberam toxinas secretoras, como a bactéria Vibrio, provavelmente apresentem sinais e sintomas de desidratação.

A epidemiologia da diarreia infecciosa aguda depende das circunstâncias da infecção e da natureza da exposição.

 

Tabela 1: Infecções Gastrointestinais

Organismo

Transmissão

Mecanismo

Características Clássicas

Complicações

Salmonella

Alimentos (aves, ovos, frutos do mar); de animal para seres humanos.

 

Invasão; inflamação

Gastroenterite, ileíte, colite, febre entérica (S. typhi e S. paratyphi).

Infecção endovascular; osteomielite; sepse.

 

Campylobacter

Alimentos (aves); de animal para seres humanos.

 

Invasão; inflamação

Diarreia aquosa ou sangrenta; ileíte e/ou colite; ulceração.

 

Síndrome de Guillain-Barré; artrite reativa.

Shigella

Pessoa a pessoa; ocasionalmente alimentos ou água; creches.

Invasão; citotoxicidade; inflamação.

Duas fases: enterite (febre, cólicas, diarreia), seguida por colite (úlceras, inflamação).

 

Convulsões, encefalopatia: artrite reativa.

Escherichia. coli enterohemorrágica

Alimentação (carne bovina); frutas frescas ou não pasteurizadas ou produtos vegetais.

 

Citotoxina; adesão e interrupção na função dos enterócitos.

Colite hemorrágica.

Síndrome hemolítica-urêmica.

Escherichia. coli enteroinvasiva

Alimentos (diversos); água.

 

Invasão; inflamação

Colite

 

Escherichia. Coli enterotoxigênica

Alimentos (diversos); água.

 

Enterotoxina

Diarreia aquosa.

Desidratação; choque.

Escherichia. Coli enteropatogênica e enteroaderente (enteroagregativa e difusa-aderente).

Alimentos (diversos); água.

 

Contato com bordas de escovas; adesão e interrupção na função dos enterócitos.

 

Diarreia aquosa que pode ser prolongada.

Desidratação

Yersinia

Leite cru

Invasão; inflamação

Diarreia aguda ou ileocolite crônica, imitando a doença de Crohn.

Artrite reativa, infecção intestinal,

Síndrome de Guillain-Barré.

 

Vibrio cholerae

Alimentos, frutos do mar.

Enterotoxina

Diarreia aquosa volumosa.

Desidratação; choque.

 

Clostridium difficile

Nosocomial; associação com antibióticos; de pessoa a pessoa; esporos do ambiente.

 

Citotoxinas

Citotoxiidade; inflamação; colite.

Megacólon tóxico; enteropatia com perda de proteínas.

Bacillus cereus

Arroz refogado

Exotoxina

Gastroenterite aguda.

Insuficiência hepática fulminante.

 

 

 

Tabela 1: Infecções Gastrointestinais – Cont.

Organismo

Transmissão

Mecanismo

Características Clássicas

Complicações

Staphylococcus

Alimentos gordurosos

Exotoxina

Gastroenterite aguda.

 

 

Clostridium perfringens

Alimentos gordurosos

Exotoxina

Gastroenterite aguda.

 

 

Norovírus

Pessoa a pessoa; água.

Inflamação

Gastroenterite aguda; diarreia aquosa.

 

 

Giardia

Pessoa a pessoa; de animais para seres humanos; água, creches.

 

Contato

Diarreia aquosa; dispepsia.

 

 

Cryptosporidium

Água; creches;

de animais para seres humanos.

Contato

Diarreia aquosa que pode ser prolongada, epidemias.

 

 

Cyclospora

Frutas importadas.

Inflamação

Diarreia aquosa, flatulência, dor, fadiga; pode ser prolongada.

 

 

Entamoeba histolytica

Pessoa a pessoa

Invasão; inflamação

Variável: assintomático a disenteria; pode imitar a síndrome do intestino irritável, doença intestinal inflamatória.

Abscesso hepático.

 

O histórico dos pacientes deve incluir presença ou ausência de diarreia entre os membros da família ou em outras pessoas de contato, atendimento médico diário, viagem recente, principalmente aos países em desenvolvimento, fontes de abastecimento de água, ocupação, atividade sexual e, o fator mais importante, dieta do paciente levando-se em conta que o consumo de alimentos e de líquidos potencialmente contaminados é um fator de risco para diarreia infecciosa. Fatos como uso anterior de antibióticos, hospitalização recente e residência em instituições onde o uso de antibióticos seja comum, são fatores de risco para infecções causadas por Clostridium difficile. Pacientes imunocomprometidos por doenças como HIV ou por medicações usadas nos casos de rejeição de transplantes ou doenças inflamatórias poderão ser infectados por patógenos oportunistas, incluindo vírus (p.ex., citomegalovírus e herpesvírus), por bactérias (p.ex., complexo da Mycobacterium avium) e por parasitas (p.ex., Cryptosporidium, Microsporidium e Strongyloides).

 

 

 

 

 

Figura 1 - A apresentação clínica das doenças no trato gastrointestinal reflete o sítio anatômico da infecção. Tipicamente, os patógenos que infectam o intestino delgado provocam dilatação abdominal, náusea, vômito, indigestão e diarreia volumosa, enquanto que os patógenos que infectam o intestino grosso geralmente causam cólicas abdominais, tenesmo e fezes frequentes com pequeno volume.

 

Avaliação Diagnóstica

A gravidade de uma enfermidade pode ser avaliada através de históricos e pelos exames físicos. No caso de portadores de doença leve não é necessário fazer avaliações adicionais, sendo que o foco da terapia é evitar ou tratar a desidratação. No caso de pacientes com doença grave, com aparência toxemiada ou desidratada, que se apresentarem com dor abdominal grave e com presença de sangue nas fezes, ou que tiverem fatores de risco epidemiológico específico, exames físicos completos adicionais são imprescindíveis [ver a Figura 2]. O hemograma completo avalia condições como hemoconcentração, distúrbios eletrolíticos, anemia e leucocitose. Tipicamente, os pacientes com diarreia viral apresentam contagem normal de leucócitos, embora a linfocitose seja observada em alguns casos. De maneira geral, as infecções bacterianas invasivas produzem leucocitose com formas imaturas de leucócitos, a não ser nos casos de febre entérica causada por Salmonella typhi ou Salmonella paratyphi, que induz leucopenia com bastante frequência. Os testes de eletrólitos séricos e da função renal ajudam a definir o impacto metabólico da diarreia.

As culturas de fezes são sensíveis e específicas. Os laboratórios de microbiologia clínica geralmente fazem testes rotineiros de Salmonella spp, Shigella spp, Campylobacter spp e do sorotipo 0157:H7 da Escherichia Coli. Possivelmente sejam necessárias culturas especiais para tuberculose ou Yersinia spp para pacientes específicos. Os ensaios para detectar a presença da toxina Shiga também estão disponíveis no mercado. O exame de fezes para verificar a presença de ovos e de parasitas tem diversas utilidades, dependendo da probabilidade de se fazer um pré-teste de determinadas infecções parasitárias. Por exemplo, esses testes são muito úteis em pessoas que trabalham em creches, embora tenham pouca utilidade em pacientes com diarreia adquirida em hospitais. Os pacientes com diarreia sangrenta e aqueles que foram tratados com antibióticos durante um período de três meses antes do início da diarreia ou pacientes que desenvolvem diarreia em ambientes institucionais devem fazer exame de fezes para facilitar a detecção de eventuais toxinas produzidas por C. difficile. De maneira geral, esses exames são feitos por meio de imunoensaios enzimáticos no sobrenadante fecal.

 

Tabela 2: Correlações da Patogênese com Sinais de Doença

 

Enterotoxinas que Induzem Secreção ou que Interrompem Troca Iônica

Toxinas que Causam Citotoxicidade

Patógenos Invasivos

Patógenos Não Invasivos que Causam Colite Hemorrágica

Enterite Viral

Patógenos

Vibrio cholerae enterotoxigênico

Escherichia coli

Toxinas A e B e toxina binária do Clostridium difficile

Salmonella spp, Shigella spp, Yersinia spp

 

E. coli enterohemorrágica

Norovirusd

Febre

Não

Sim

Sim

Rara

Esporadicamente

 

Leucocitose

Não

Sim

Sim

Sim

Rara

 

PMNs nas fezes

 

Não

Sim

Sim

Sim

Não

Sangue nas fezes

Não

Sim

Com frequência

Sim

Não

PMN (polymorphonuclear neutrophil) = neutrófilo polimorfonuclear.

 

Tratamento

Considerando que a maior parte dos casos de diarreia aguda é autolimitada, a maioria dos pacientes não precisa se submeter a terapias específicas. Em vez disso, basta fazer a reposição da perda de líquidos e de eletrólitos com administração intravenosa de líquidos ou com soluções orais para reidratação. A terapia antibiótica empírica para diarreia aguda possivelmente seja apropriada em determinadas circunstâncias, incluindo diarreia em pessoas que estiverem viajando, surtos de diarreia bacteriana ou protozoária e em pacientes particularmente frágeis ou com aparência toxemiada. Nos casos em que forem indicadas, as fluoroquinolonas ou a trimetoprima+sulfametoxazol são terapias empíricas apropriadas. Sempre que houver suspeita de infecção por Campylobacter, a azitromicina é o medicamento de escolha como terapia empírica. O metronidazol é o medicamento mais adequado nos casos em que a infecção por protozoários ou por C. difficile for mais provável. Possivelmente, a terapia sintomática com loperamida seja segura somente para aplicação em pacientes sem febre ou sangue nas fezes.

 

 

 

 

Figura 2 - Avaliação de diarreia aguda. A avaliação clínica inicial distingue doença leve de doença grave. Nos casos de doença grave é necessário fazer um hemograma completo, painel químico e exames de fezes. A escolha do exame de fezes depende das características epidemiológicas de cada caso, incluindo se a infecção foi adquirida na comunidade ou por meios nosocomiais, para onde o paciente viajou recentemente e se o paciente é imunocomprometido. Adaptação de Guerrant RL, Van Gilder T, Steiner TS et al. Orientações práticas para o tratamento de diarreia infecciosa. Clin Infect Dis 2001;32:331-5.

 

Infecções por Salmonella

Epidemiologia

Os organismos conhecidos por Salmonella produzem uma ampla gama de infecções, incluindo gastroenterite, bacteremia, infecções vasculares e febre entérica (a ser discutida separadamente mais adiante) e, em geral, se dividem em duas categorias: não tifoide e tifoide. Nos Estados Unidos, a Salmonella não tifoide, que é responsável por aproximadamente 1,4 milhões de casos, 15.000 hospitalizações e 400 mortes por ano, é a causa isolada mais frequente de diarreia bacteriana.2,4 Mais de 95% das infecções por Salmonella não tifoide são causadas por alimentos; o restante são nosocomiais ou são adquiridas de animais domésticos (répteis e pássaros), de pessoas infectadas ou de substâncias contaminadas como água, medicamentos ou soluções. Os surtos diarreicos foram associados à ingestão de ovos, queijos, vegetais e frutas frescas, sucos, cereais secos e sorvete pré-misturado.9 Os organismos Salmonella podem passar da galinha para o ovo através do ovário; a maior parte dos casos de Salmonella enteriditis é rastreada em ovos mal passados ou mal cozidos.9 De maneira geral, os portadores dos organismos Salmonella são animais de fazendas e têm resistência antibiótica – principalmente da Salmonella typhimurium – e foram associados ao uso de antibióticos em ração animal.10

Nos Estados Unidos, a Salmonella tifoide causa menos de 1.000 infecções por ano e quase todas as infecções são adquiridas no exterior,3 sendo que aproximadamente 70% de casos registrados pelo Centers for Disease Control and Prevention no período de 1999 a 2006 foram adquiridos no subcontinente indiano.11 Os seres humanos são os únicos hospedeiros da Salmonella tifoide; a disseminação ocorre de pessoa a pessoa ou através da ingestão de água ou de alimentos contaminados.

O número de inóculos para infecções por Salmonella gira em torno de 105 a 109 organismos [ver a Tabela 3], embora o número seja mais baixo em indivíduos excessivamente jovens, pessoas idosas ou HIV positivo que apresentem alteração na flora intestinal endógena (p.ex., terapia antimicrobiana recente), em quem faz imunossupressão terapêutica, em quem tem alteração no sistema reticuloendotelial (p.ex., malária ou infecção por Bartonella), naqueles com doença da célula falciforme, anemia perniciosa, estado pós-esplenectomia, diabetes mellitus, malignidades e distúrbios reumatológicos, tais como lúpus. Embora o risco de infecções por Salmonella tenha diminuído desde a introdução da terapia antirretroviral altamente ativa (HAART, do inglês highly active antiretroviral therapy), ele ainda permanece elevado na população em geral. Uma metanálise recente sugere que a incidência de gastroenterite causada por Salmonella aumenta no contexto de medicações que reduzem a secreção ácida gástrica.12

 

Tabela 3: Inóculos Infecciosos de Patógenos Gastrointestinais Selecionados

 

Patógeno

Inóculo Infeccioso

 

Salmonella spp

105 - 109

 

Campylobacter jejuni

102 – 106

 

Shigella spp

101 – 102

 

Escherichia coli patogênica

108

 

Yersinia spp

109

 

Vibrio cholerae

108

 

Norovirus

101 – 103

 

Giardia lamblia

101 – 102

 

Entamoeba histolytica

101 – 102

 

 

Etiologia/Genética

A Salmonella é um bacilo gram-negativo anaeróbico e facultativo. Enquanto as doenças tifoides podem ser causadas somente por Salmonella typhi ou Salmonella paratyphi, as doenças não tifoides podem ser causadas por quaisquer outros sorovariantes que infectam os seres humanos, sendo que o S.typhimurium e o S. enteriditis são os mais comuns. A classificação dos organismos Salmonella é um pouco confusa, tendo em vista que as doenças poderão ser causadas por mais de 2.500 sorovariantes, sendo que todos pertencem a uma única espécie designada Salmonella choleraesuis ou Salmonella enterica. Entretanto, nos ambientes clínicos os sorovariantes são conhecidos por espécies (p.ex., o sorovariante S. entérica denomina-se S.enteriditis), sendo que o mesmo critério será adotado neste capítulo.

 

Patogênese

Os organismos Salmonella são adquiridos por ingestão. Eles internalizam, no interior das células epiteliais intestinais, células M intestinais, que são células epiteliais especializadas que se sobrepõem às placas de Peyer e são abundantes no íleo e em macrófagos. O recrutamento de células inflamatórias, incluindo macrófagos, nas placas de Peyer pode produzir condições como infecção e aumento de volume, seguidas de necrose. No caso de S.enteritis não tifoide provavelmente os organismos internalizem de forma mais difusa no interior dos enterócitos e induzam respostas inflamatórias na lâmina própria, resultando em diarreia. Por outro lado, os organismos Salmonella tifoides causam inflamação e diarreia locais mínimas e se disseminam a partir do tecido linfoide das placas de Peyer na circulação sistêmica. Os organismos Salmonella tifoides replicam no sistema reticuloendotelial e produzem esplenomegalia. Com frequência, a bacteremia causada por Salmonella tifoide leva à germinação no fígado e na árvore biliar. Os organismos Salmonella possuem fatores de virulência e mecanismos especializados para internalização nas células e sobrevivência dentro de macrófagos.

 

Gastroenterite

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

Tipicamente, o período de incubação nos casos de gastroenterite causada por Salmonella não tifoide varia de 6 a 72 horas. Os sintomas incluem náusea, vômito, febre, diarreia e cólicas abdominais. De maneira geral, as fezes são soltas e de volume moderado, sem presença de sangue. Em geral a diarreia é autolimitada e dura entre 3 e 7 dias.

 

Exame Físico

Os achados de exame físico são inespecíficos. É comum a presença de temperaturas até 39°C (102,2°F) por 1 a 2 dias, leve sensibilidade abdominal e sons intestinais hiperativos. Padrões febris mais prolongados ou mais agitados sugerem a presença de bacteremia, focos metastáticos ou ambos.

 

Testes Laboratoriais

Os organismos Salmonella são cultivados imediatamente a partir de fezes em meios seletivos usados rotineiramente nos laboratórios de microbiologia clínica. O isolamento dos organismos Salmonella a partir de líquidos corporais estéreis também utiliza meios rotineiros. A Salmonella tem um padrão de crescimento característico; as colônias apresentam a cor branca no agar de MacConkey, levando-se em consideração que esse tipo de organismo não fermenta lactose, e a cor preta no agar entérico de Hektoen, considerando que produz sulfeto de hidrogênio (H2S) [ver a Figura 3, a e c]. A duração média do transporte fecal após a resolução da diarreia por Salmonella não tifoide é de 1 mês em adultos e de 7 semanas em crianças mais novas.13

 

Diagnóstico Diferencial

A apresentação de gastroenterite causada por Salmonella se assemelha à apresentação de outras síndromes diarreicas febris, tais como infecções causadas pelos organismos Campylobacter spp, Shigella spp ou Y. enterocolitica e doenças intestinais inflamatórias. Diarreia sangrenta manifesta sugere mais a presença de infecção produzida por Shigella ou por E. coli enterohemorrágica do que de infecção causada por Salmonella. Em casos raros, a apresentação pode imitar apendicite.

 

Tratamento

Não se recomenda o uso de antibióticos em pacientes imunocompetentes com gastroenterite sem complicações, tendo em vista que a enfermidade geralmente é autolimitada e a terapia antibiótica poderá prolongar o transporte intestinal.14 Para esses pacientes, o foco do tratamento deve ser a reposição de líquidos e de eletrólitos.

Os antibióticos devem ser administrados em pacientes gravemente enfermos ou com risco de disseminação extraintestinal da infecção; este último grupo inclui lactentes; pessoas com idade acima de 65 anos; indivíduos com anormalidades cardíacas valvulares ou murais ou com enxertos vasculares protéticos; indivíduos com doença da célula falciforme com insuficiência ou que estiverem fazendo hemodiálise e indivíduos com imunossupressão. Os agentes terapêuticos mais eficazes incluem fluoroquinolonas, trimetoprima + sulfametoxazol, amoxilina e a terceira geração de cefalosporinas [ver a Tabela 4]. Considerando que é comum a resistência à ampicilina e à amoxilina e o crescente aumento na resistência à trimetoprima + sulfametoxazol [ver a Tabela 5], nas situações em que se desconhecerem as suscetibilidades do isolado, a opção mais apropriada é iniciar o tratamento com uma fluoroquinolona ou com uma terceira geração de cefalosporinas. Nos casos de pacientes imunocompetentes gravemente enfermos, o tempo de duração da terapia deve ser de apenas 48 a 72 horas ou até o momento em que o paciente se tornar afebril, porém no caso de pacientes imunocomprometidos, incluindo indivíduos portadores de AIDS, a duração da terapia deve ser de 2 semanas.

 

 

 

 

Figura 3 - Crescimento de patógenos entéricos em agar seletivo. (a) agar de MacConkey: os não fermentados de lactose formam colônias brancas e os fermentados de lactose formam colônias rosas. (b) agar de MacConkey suplementado com sorbitol: a E. coli enterohemorrágica (EHEC) forma colônias brancas, enquanto que a E. coli não patogênica forma colônias rosas. (c) Agar entérico de Hektoen: a Salmonella forma colônias negras como decorrência da produção de H2S (sulfeto de hidrogênio), a Shigella forma colônias verdes, e as bactérias que fermentam a lactose, como a EHEC, formam colônias de cor alaranjada. (d) Agar de Yersinia seletiva (CIN: Cefsulodina, Irgasan, Novobiocina): meio seletivo que permite o crescimento de Yersinia enterocolítica e de Yersinia pseudotuberculosis. (e) Agar de tiossulfato, citrato, sal de bile e sucrose (TCBS): meio seletivo que permite o crescimento das espécies Vibrio.

 

Complicações

Em alguns pacientes, os organismos Salmonella invadem o epitélio intestinal, penetram na corrente sanguínea e produzem bacteremia que, por sua vez, provoca infecções metastáticas de outros órgãos, incluindo os sítios endovasculares, o trato hepatobiliar, o baço, os ossos e, com menos frequência, o cérebro (ver discussão abaixo).

 

Prognóstico

Em pacientes imunocompetentes portadores de doenças variando de leves a moderadas, a gastroenterite causada por Salmonella não tifoide é autolimitada.

 

Bacteremia e Infecção Vascular

Aproximadamente 1% das infecções gastrointestinais causadas por Salmonella não tifoide resultam em bacteremia. Logo após a penetração na corrente sanguínea, esses organismos têm propensão para colonizar sítios de anormalidades vasculares, tais como enxertos vasculares protéticos, placas ateroescleróticas e aneurismas.15

 

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

Tipicamente, os pacientes com infecção endovascular têm febre alta, que persiste mesmo vários dias após a terapia.

 

Exame Físico

O exame físico pode revelar a presença de sensibilidade no sítio da infecção, embora também produza resultados normais.

 

Testes Laboratoriais

A bacteremia de alto grau (i.e., crescimento bacteriano em mais de 50% em três ou mais culturas de sangue) se caracteriza pela presença de infecção endovascular. A ecocardiografia e outros estudos de imagens, incluindo a tomografia computadorizada (TC) e as imagens por ressonância magnética (IRM) com contraste, revelam a presença de lesões endovasculares. Nas situações em que não for encontrada nenhuma lesão, uma das opções a ser considerada é a varredura de leucócitos marcados com o radioisótopo índio-111.

 

Tabela 4: Terapias Selecionadas para Patógenos Entéricos

 

Patógeno

Medicamento (Nome Comercial)

 

Dose

Eficácia Relativa

Comentários

Salmonella enteritis

Ciprofloxacina

500 mg VO duas vezes ao dia por 2-3 dias ou até o paciente ficar afebril.

Medicamento de escolha.

Terapia antibiótica para indivíduos com risco de disseminação extraintestinal da infecção.

 

 

Trimetoprima + sulfametoxazol

1 comprimido com potência dupla VO 2x/dia por 2-3 dias ou até o paciente ficar afebril.

Somente para isolados suscetíveis.

Terapia antibiótica para indivíduos com risco de disseminação extraintestinal da infecção.

 

 

Amoxilina

500 mg VO três vezes ao dia por 2-3 dias ou até o paciente ficar afebril.

Somente para isolados suscetíveis.

Terapia antibiótica para indivíduos com risco de disseminação extraintestinal da infecção.

 

 

Ceftriaxona

2 g IV todos os dias por 2-3 dias ou até o paciente ficar afebril.

Medicamento de escolha para isolados resistentes à amoxilina e à trimetoprima + sulfametoxazol.

Terapia antibiótica para indivíduos com risco de disseminação extraintestinal da infecção.

 

 

Salmonella com bacteremia e infecção vascular

Ciprofloxacina + Ceftriaxona

400 mg IV a cada 12 horas

 

1-2 g IV diariamente

Terapia empírica para bacteremia ou infecção vascular com risco de vida.

 

 

 

Ampicilina

2 g IV a cada 4 horas por 6 semanas no caso de infecção endovascular; 7-14 dias no caso de bacteremia de baixo grau.

 

Terapia sugerida.

Para portadores de AIDS com bacteremia; a seguir 14 dias de terapia IV com 500 mg de ciprofloxacina VO 2x/dia por 4 semanas.

 

Ceftriaxona

1-2 g IV diariamente por 6 semanas no caso de infecção endovascular; 7-14 dias no caso de bacteremia de baixo grau.

 

Terapia sugerida.

Para portadores de AIDS com bacteremia; a seguir 14 dias de terapia IV com 500 mg de ciprofloxacina VO 2x/dia por 4 semanas.

Febre causada por Salmonella entérica

Ciprofloxacina

500 mg VO 2x/dia por 5-7 dias (doença sem complicações) ou 10-14 dias (doença grave).

Medicamento de escolha.

Terapia antimicrobiana para febre sem complicações causada por Salmonella entérica; é necessário confirmar a suscetibilidade do organismo ao ácido

 

Tabela 4: Terapias Selecionadas para Patógenos Entéricos

Patógeno

Medicamento (Nome Comercial)

Dose

Eficácia Relativa

Comentários

 

 

 

 

nalidíxico e à ciprofloxacina; caso seja resistente ao ácido nalidíxico, deve-se usar doses mais elevadas de ciprofloxacina (750 mg VO 2x/dia) ou azitromicina.

 

 

Amoxilina

1 g VO 3x/dia por 14 dias.

Somente para isolados suscetíveis.

 

 

 

Trimetoprima + sulfametoxazol

1 comprimido com potência dupla VO 2x/dia por 7 dias.

 

Somente para isolados suscetíveis.

 

 

Azitromicina

1 g VO por dia durante 7 dias

Somente para isolados suscetíveis.

Alternativa para viajantes que retornam da Ásia com febre entérica, nos casos em que as suscetibilidades não forem conhecidas.

 

 

Ceftriaxona

2 g IV diariamente por 10-14 dias para doença sem complicações; 2 g IV a cada 12 horas por 10-14 dias no caso de doença grave.

 

Medicamento de escolha para doença grave em que o isolado for resistente às quinolonas.

Alternativa para viajantes que retornam da Ásia com febre entérica, nos casos em que as suscetibilidades não forem conhecidas.

 

 

Dexametasona

3 mg/kg IV uma vez; em seguida, 1 mg/kg IV a cada 6 horas por 48 horas.

Adjuvante da terapia antimicrobiana nos casos em que a doença for acompanhada de choque, coma, estupor, embotamento ou delirium.

Terapia com glicocorticosteroides para febre entérica causada por Salmonella; a continuação da terapia por mais de 48 horas pode aumentar o risco de recidiva.

 

Estado do transportador de Salmonella

Ciprofloxacina

500 mg VO 2x/dia por 4 semanas

Somente para isolados suscetíveis.

Elimina o estado do transportador em 80% dos pacientes com isolado suscetível.

 

 

Amoxilina

1 g VO 3x/dia por 3 meses

Somente para isolados suscetíveis.

 

 

 

Trimetoprima + sulfametoxazol

1 comprimido com potência dupla VO 2x/dia por 3 meses.

Somente para isolados suscetíveis.

 

 

 

Tabela 4: Continuação

 

Patógeno

Medicamento (Nome Comercial)

 

Dose

Eficácia Relativa

Comentários

Campylobacter enteritis

Azitromicina

500 mg VO por dia durante 3 dias

Medicamento de escolha.

 

 

 

Eritromicina

500 mg VO ou 2x/dia por 5-7 dias.

Medicamento de escolha.

 

Cepas de campylobacter enteritis resistentes à eritromicina e medicamentos relacionados foram isoladas, porém não são muito frequentes.

 

 

Ciprofloxacina

500 mg VO 2x/dia por 3 dias

Este medicamento foi usado com sucesso.

A resistência à ciprofloxacina ocorreu em 23% de isolados da Campylobacter em 2008.

 

Shigella

Ciprofloxacina

500 mg VO 2x/dia por 3 dias

Tratamento de escolha.

Terapia antibiótica para Shigella enteritis adquirida usada nos Estados Unidos; a resistência à fluoroquinolona ocorre ocasionalmente no subcontinente asiático e no Sudeste Asiático.

 

 

Azitromicina

500 mg VO por dia durante 3 dias

Tratamento alternativo.

 

 

 

Trimetoprima + sulfametoxazol

1 comprimido com potência dupla VO 2x/dia por 3-5 dias..

Tratamento alternativo para isolados que, sabidamente, são suscetíveis à trimetoprima + sulfametoxazol

 

 

Yersinia

Ceftriaxona + gentamicina

2 g IV diariamente por 21 dias

 

5 mg/kg/dia em doses divididas.

Terapia sugerida.

Terapia antibiótica para septicemia causada por Y. enterocolitica ou Y. pseudotuberculosis; o curso pode ser completado com agentes orais depois que o paciente apresentar alguma melhora clínica.

 

 

Tabela 4: Continuação

 

Patógeno

Medicamento (Nome Comercial)

 

Dose

Eficácia Relativa

Comentários

 

Ciprofloxacina + gentamicina

200-400 mg IV a cada 12 horas por 21 dias.

Terapia sugerida.

Terapia antibiótica para septicemia causada por Y. enterocolitica.

 

Para cepas suscetíveis, a ciprofloxacina pode ser substituída por ceftriaxona.

 

Vibrio cholerae

Doxiciclina

300 mg VO uma vez

Tratamento de escolha para adultos.

Terapia antibiótica para Vibrio cholerae; pacientes com diarreia leve não precisam de tratamento com antibióticos.

 

 

Ciprofloxacina

1 g VO uma vez

Terapia alternativa; tratamento de escolha para mulheres grávidas.

Terapia antibiótica para Vibrio cholerae; pacientes com diarreia leve não precisam de tratamento com antibióticos.

 

 

Azitromicina

1 g VO uma vez

Tratamento alternativo de escolha para mulheres grávidas.

 

Terapia antibiótica para Vibrio cholerae.

Vibrio parahaemolyticus e Vibrio vulnificus

Doxiciclina + cefotaxima

2 g IV VO a cada 8 horas.

Terapia sugerida para septicemia.

 

 

Diagnóstico Diferencial

O diagnóstico diferencial inclui bacteremia causada por focos infectados ou por linhas permanentes e endocardite bacteriana.

 

Tratamento

Condições como bacteremia, infecção endovascular ou infecção metastática focal que coloquem em risco a vida dos pacientes devem ser tratadas empiricamente com uma fluoroquinolona e com uma cefalosporina de terceira geração, até que as suscetibilidades antibióticas sejam conhecidas [ver a Tabela 4]. Nos casos de infecção suspeita ou documentada, a melhor opção talvez seja a administração de uma terapia antibiótica por 6 semanas com um antibiótico beta-lactâmico como a ampicilina ou com uma terceira geração de cefalosporinas. Recomenda-se fazer o acompanhamento das culturas de sangue após o tratamento com antibióticos para confirmar a eliminação. Um período de 7 a 14 dias de terapia intravenosa é suficiente nos casos de bacteremia de baixo grau. As infecções endovasculares possivelmente exijam intervenção cirúrgica. A terapia oral supressiva teve bastante êxito nas situações em que a ressecção cirúrgica de enxertos infectados não foi viável.16

Em pacientes com AIDS os primeiros episódios de bacteremia por Salmonella devem ser tratados com administração intravenosa de antibióticos por 7 a 14 dias, seguida de uma fluoroquinolona oral por 4 semanas. Aparentemente, desde a introdução da terapia antirretroviral altamente ativa (HAART, do inglês highly active antiretroviral therapy), não é frequente a ocorrência de recidivas após um curso de 6 semanas com antibióticos.17 Pacientes com AIDS que apresentarem recidivas de bacteremia por Salmonella devem ser tratados novamente e, em seguida, receber supressão de longo prazo com uma fluoroquinolona oral ou trimetoprima + sulfametoxazol.

 

Complicações

Após a bacteremia, os pacientes podem desenvolver infecções focais causadas pelos organismos Salmonella, incluindo abscessos, osteomielite e infecções no trato urinário e no trato biliar. Essas condições possivelmente exijam tratamento terapêutico prolongado e/ou drenagem por meios cirúrgicos. Depois de infecções endovasculares existe a possibilidade de perfuração valvular e de rompimento de aneurismas.

 

Prognóstico

A taxa de mortalidade de bacteremia não tifoide é de aproximadamente 25%. Nos casos de infecções endovasculares, a mortalidade varia de 14 a 60%, sendo mais baixa com diagnósticos precoces em combinação com terapias médicas e cirúrgicas.

 

Tabela 5: Percentual de Isolados de Salmonella e de Shigella Resistentes a Antibióticos Selecionados nos Estados Unidos20

 

Antibiótico

Salmonella Não Tifoide

 

Salmonella Tifoide

Shigella

Amicacina

0

0

0

 

Amoxicilina-clavulanato

3,0

0

3,4

 

Ampicilina

9,6

13,2

62,5

 

Cefoxitina

2,9

0

0

 

Ceftriaxona

2,9

0

0,2

 

Cloranfenicol

6,1

12,9

7,2

 

Ciprofloxacina

<1

0

0,9

 

Gentamicina

1,5

0

0,5

 

Canamicina

2,1

0

0,5

 

Ácido nalidixico

2

59

2,2

 

Estreptomicina

10

11,5

80,6

 

Sulfametoxazol

10

13,2

28,8

 

Tetraciclina

11,5

4,6

24,3

 

Trimetroprima + Sulfametoxazol

1,6

12,7

41,1

 

 

Febre Entérica

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

De maneira geral, durante o período de incubação (semana 0 a 1), após a ingestão de organismos Salmonella tifoide, os indivíduos permanecem assintomáticos na primeira semana [ver a Tabela 6]. Há a possibilidade de diarreia, principalmente em crianças e em pessoas infectadas pelo HIV; no entanto, em adultos saudáveis, é mais comum a presença de constipação ou de padrões intestinais normais. No decorrer da fase seguinte da doença, com duração de 1 a 2 semanas [ver a Tabela 6], as bactérias invadem ativamente os tecidos do hospedeiro, fazendo com que os pacientes desenvolvam febre e sintomas que se assemelham a influenza, incluindo cefaleia, indisposição, anorexia, náusea, dor abdominal, mialgia, artralgia, tosse e dor de garganta.18 Tipicamente, a febre é baixa no início, embora, durante a segunda semana, a temperatura do paciente chegue a atingir até 39° a 40°C (102° a 104°F). Na fase seguinte da enfermidade (semanas 2 a 4) [ver a Tabela 6], a febre poderá persistir e ser acompanhada de confusão intermitente, afeto apático e convulsões em crianças.18 Os sintomas desaparecem espontaneamente depois de 2 a 4 semanas [ver a Tabela 6], embora 5 a 10% dos pacientes tenham recidiva 2 a 3 semanas mais tarde [ver a Tabela 6], ocasião em que poderão ocorrer complicações focais tardias.

 

Exame Físico

Há uma grande variedade de descobertas que surge no exame físico, dependendo do estágio da enfermidade. Em 30% de pacientes, pintas cor de rosa (manchas rosas esbranquiçadas de 2 a 4 mm, ligeiramente erguidas, discretas e irregulares) surgem na parte anterior do tórax em culturas de 5 a 15 ao final da primeira semana; as pintas duram entre 3 a 4 dias e desaparecem sem deixar cicatrizes. Aproximadamente 50% de todos os pacientes desenvolvem esplenomegalia e hepatomegalia. Raramente, na fase final da enfermidade, os pacientes podem desenvolver dor abdominal grave e súbita, sugerindo a hipótese de perfuração intestinal. Observa-se uma dissociação entre pulso e temperatura que, entretanto, não é específica.

 

Testes Laboratoriais

Exames de sangue. Os testes de leucopenia, anemia, função hepática moderadamente elevada e níveis moderadamente elevados de enzimas musculares são comuns. Os testes de leucocitose, trombocitopenia transitória e anormalidades de coagulação são menos comuns.

Testes de outros líquidos corporais. A probabilidade de obter culturas bem sucedidas de organismos varia de acordo com o sítio e com o tempo de duração da enfermidade [ver a Tabela 6].19

Biópsia. As culturas de medula óssea e as biópsias por punção de pontos cor de rosa possivelmente sejam positivas nas situações em que outros tipos de cultura forem negativos, principalmente durante ou depois de terapias antibióticas.

 

Diagnóstico Diferencial

Os organismos Yersinia spp e Campylobacter spp podem causar síndromes de febre entérica que se assemelham àquelas causadas por Salmonella tifoide, com febre, dor abdominal e cefaleia. Deve-se também considerar a hipótese de malária no caso de indivíduos que retornam de viagens a regiões tropicais.

 

Tratamento

Tendências recentes indicam que nos Estados Unidos a resistência aos antibióticos está aumentando entre os isolados de Salmonella [ver a Tabela 5].11,20 Fluoroquinolonas, como a ciprofloxacina, são os medicamentos de escolha para o tratamento de febre entérica causada por cepas suscetíveis [ver a Tabela 4].18 Nos casos sem complicações o tratamento deve durar entre 5 a 7 dias; o tratamento de doenças graves deve durar de 10 a 14 dias. Atualmente, a resistência total do organismo S. typhi às fluoroquinolonas é rara nos Estados Unidos, embora ocorra um aumento crescente na resistência ao ácido nalidíxico, que é utilizado como marcador para respostas às fluoroquinolonas; nas situações em que um isolado for resistente ao ácido nalidíxico, mas for suscetível à ciprofloxacina ou a outras fluoroquinolonas, a melhor opção é aumentar a dose de ciprofloxacina [ver a Tabela 5]. Devido à alta prevalência de Salmonella com resistência a diversos medicamentos, definida como resistência à ampicilina, trimetroprima+sulfametoxazol e cloranfenicol, assim como ao aumento na resistência de isolados às fluoroquinolonas na Ásia,21 os indivíduos que tenham contraído qualquer enfermidade nessa região devem ser tratados com uma terceira geração de cefalosporina ou azitromicina, até que as suscebilidades antibióticas sejam conhecidas. Nas situações em que o isolado for resistente às fluoroquinolonas e a doença não tiver nenhuma complicação, a melhor alternativa é a administração de amoxilina, trimetroprima+sulfametoxazol ou azitromicina [ver a Tabela 4]. Se o isolado for resistente às fluoroquinolonas e doença for grave, a terceira geração de cefalosporinas são os medicamentos de escolha [ver a Tabela 4]. Pacientes com delirium, embotamento, estupor, coma ou choque deveriam receber tratamento imediato à base de dexametasona [ver a Tabela 4]; a administração de dexametasona por 48 horas foi associada a uma redução de 50% para 10% no índice de mortalidade, embora a continuação da terapia com esteroides além de 48 horas possivelmente aumente a taxa de recidiva.18,22

 

Prevenção

Há duas vacinas contra S. typhi disponíveis no mercado: vacina viva atenuada e uma vacina polissacarídea capsular injetável [ver a Tabela 7]. As vacinas protegem 50 a 80% das pessoas que as recebem.23 A vacinação é recomendada nos seguintes casos: (1) pessoas em viagem a países em desenvolvimento com exposição prolongada a alimentos e bebidas potencialmente contaminadas, (2) contatos domiciliares de portadores de S. Typhi e (3) determinadas pessoas que trabalham em laboratórios. No caso de viajantes a vacinação é um adjuvante e não um substituto para a ingestão cuidadosa de alimentos e de bebidas.

 

Tabela 6: Descobertas Clínicas e Laboratoriais nos Casos de Febre Entérica Não Tratada19

 

Fase da Enfermidade

Manifestações da Doença

Eventos Patogênicos

Cultura de Sangue

Cultura de Fezes

Cultura de Urina

Cultura de Medula Óssea

Cultura de Manchas Rosas

 

Período de incubação

(sem.0-1)

Diarreia em 10-20%; constipação em algumas.

Proliferação de organismos no interior do intestino e invasão da mucosa intestinal.

 

Negativa

Transitoriamente positiva

Negativa

Negativa

 

Invasão ativa

(sem. 1-2)

Febre, cefaleia, indisposição, anorexia, mialgia, artralgia, tosse, dor de garganta, manchas rosas.

Proliferação de organismos no interior do tecido linfoide intestinal com subsequente disseminação para o tecido linfoide regional e outros órgãos linfoides.

 

80-90% positiva

Negativa

Negativa

Negativa

60% positiva

Doença estabelecida

(sem. 2-4)

Toxemia sistêmica, manifestações neuropsiquiátricas (psicose e confusão), coriza, tosse, dor de garganta, dor torácica, náusea, vômito, dor abdominal.

 

Proliferação reticuloendotelial em resposta à bacteremia sustentada; possível estabelecimento de focos metastáticos de infecção; necrose focal e ulceração no intestino em sítios de proliferação linfoide prévia.

 

80-90% positiva

80% positiva

25% positiva

90% positiva

 

Período de convalescença

Possibilidade de recidiva.

Reparo e recuperação de danos teciduais.

Negativa, exceto com doença em curso ou recidiva.

 

50% positiva

10% positiva

Positiva decrescente

 

Complicações focais tardias

(sem. 5 +)

Colecistite, osteomielite, abscessos em tecidos moles.

Possível desenvolvimento de alguns focos metastáticos.

Negativa, exceto com doença em curso ou recidiva.

 

Positiva decrescente

Positiva decrescente

 

 

 

 

Complicações

Tipicamente, as complicações não metastáticas das infecções por Salmonella tifoide, tais como pneumonia (5% de casos), hemorragia intestinal (3 a 20% de casos), perfuração intestinal (2 a 3% de casos), colecistite aguda (2% de casos) e miocardite (1 a 2% de casos) ocorrem entre 2 a 4 semanas após o início dos sintomas. Ocorrências menos comuns são: endocardite, pericardite, orquite e abscessos esplênicos ou hepáticos. No quadro de perfuração intestinal é necessário repetir a coleta de culturas de sangue e ampliar a terapia antibiótica para cobrir a flora intestinal aeróbica e anaeróbica. A recidiva ocorre em 5 a 10% dos pacientes infectados; o tratamento de recidivas é o mesmo que o das infecções iniciais.

 

Tabela 7: Vacinas para Febre Entérica

 

Vacina

Dose

Horário

Eficácia Relativa

Reforço

Comentários

Ty21a (Vivotif Berna)

Uma cápsula entérica revestida em dias alternados por 4 dias.

Tomar 1 hora antes de uma refeição; completar 1 semana antes da exposição potencial.

43-96%; 48% de eficácia cumulativa nos anos 1-3.23

5 anos

Vacina viva atenuada (manter sob refrigeração); não é recomendada para crianças imunossupressivas ou com idade inferior a 6 anos; poucos efeitos colaterais.

 

Vacina de polissacarídeo capsular Vi [ViCPS] (Typhim Vi)

 

25 µg em 0,5 mL IM uma vez.

Completar 2 semanas antes da exposição potencial.

68% no primeiro ano; 60% no segundo ano.

2 anos

Não é recomendada para crianças com idade inferior a 2 anos; os efeitos colaterais incluem febre (1%), cefaleia (1,5-3%), eritema local ou endurecimento (7%).

 

 

Prognóstico

Nos Estados Unidos, a partir dos dados coletados no período de 1999 a 2006, a proporção entre caso e fatalidade para febre entérica era de 0,2%.

 

Estado de Portador

Estado de portador, definido como portador de organismos Salmonella nas fezes por mais de 1 ano após a infecção inicial, ocorre em 0,3% de pessoas infectadas por S. typhi e em 0,6 a 2% de pessoas infectadas por Salmonella não tifoide.24 O sítio de infecção crônica quase sempre é árvore biliar. A presença de cálculos biliares ou de cicatrizes dificulta a erradicação. Raramente, no longo prazo, a transmissão ocorre no trato urinário, em especial nos quadros de uropatia obstrutiva, tuberculose ou esquistossomose.

 

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

De maneira geral, o estado de portador é assintomático. Quando forem acompanhadas de uropatia obstrutiva ou de cálculos biliares, possivelmente ocorra manifestação de sintomas associados ao estado de portador.

 

Exame Físico

O exame físico de pacientes no estado de portador não apresenta nada excepcional.

 

Testes Laboratoriais

Demonstra-se o estado de portador através de culturas de organismos Salmonella usando-se as técnicas rotineiras usuais de culturas de fezes.

 

Tratamento

O tratamento antibiótico recomendado é um curso prolongado de ciprofloxacina, amoxilina ou trimetroprima+sulfametoxazol [ver a Tabela 4]. Como alternativa de longo prazo, a transmissão pela vesícula biliar poderá ser eliminada efetivamente por colecistectomia, acompanhada de qualquer um dos regimes recomendados para tratamento de bacteremia por um período de 10 a 14 dias; no entanto, essa abordagem deve ser reservada para pacientes nos quais a terapia antibiótica de longo prazo não tenha sido bem sucedida e nos quais a erradicação seja imprescindível por questões de saúde pública (p.ex., manuseadores de alimentos e pessoas que trabalham na saúde pública).

 

Complicações

As complicações são apenas aquelas associadas às intervenções cirúrgicas.

 

Prognóstico

O prognóstico é excelente, sendo que o curso prolongado de antibióticos apropriados poderá erradicar os organismos Salmonella em 80% das pessoas com estado de portador.

 

Infecções por Campylobacter

Epidemiologia

As espécies de Campylobacter são a segunda causa mais comum de gastroenterite bacteriana nos Estados Unidos, com uma estimativa anual de 2,4 milhões de casos, sendo que os registros indicam que ocorrem aproximadamente 13 casos por 100.000 pessoas.2 Esse tipo de doença é mais comum em crianças e em pessoas infectadas pelo HIV em comparação com a população em geral, embora a frequência e a gravidade das infecções em pessoas HIV positivas tenha diminuído significativamente desde a introdução da terapia antirretroviral altamente ativa (HAART, do inglês highly active antiretroviral therapy).25

As espécies de Campylobacter são organismos comensais de animais selvagens e domésticos, principalmente aves. Em 80% dos casos em seres humanos, as infecções por Campylobacter são adquiridas pela ingestão de alimentos contaminados. O manuseio inadequado de frangos crus ou o consumo de frangos mal cozidos é a causa mais comum de causas relacionadas aos alimentos. As exposições a cães infectados, leite não pasteurizado, água contaminada sem tratamento com cloro e pessoas infectadas também são fontes documentadas de infecção. Os neonatos de mães infectadas correm um risco extremamente elevado de infecção, que poderá colocar os bebês em risco de vida. Os inóculos infecciosos podem atingir uma quantidade mínima de aproximadamente 800 organismos [ver a Tabela 3]26; consequentemente, as infecções secundárias poderão ocorrer em até dois terços de contatos domésticos.

 

Etiologia/Genética

Os organismos Campylobacter são bacilos gram-negativos pequenos e curvos. A espécie que causa enterite com mais frequência é a C. jejuni. Em pessoas HIV positivas outras espécies de Campylobacter, principalmente a Campylobacter coli e a Campylobacter upsaliensis (que tem os cachorros como principais hospedeiros), também são causas comuns de enterite. As infecções sistêmicas por Campylobacter são causadas com mais frequência pela espécie Campylobacter fetus. Dois terços dos pacientes com infecção sistêmica causada por Campylobacte são homens. Muitos desses indivíduos são homens na faixa etária dos 50 anos; mais de 2% são trabalhadores rurais, açougueiros ou pessoas que trabalham em abatedores; a maior parte desses indivíduos tem alguma enfermidade crônica subjacente como alcoolismo, cirrose, diabetes, distúrbio linfoproliferativo ou doença cardíaca valvular ou aterosclerótica. Portanto, as infecções por C. fetus em pacientes sem fatores predisponentes conhecidos devem incentivar a busca de alguma doença subjacente.

 

Patogênese

Os sinais e sintomas de enterite são o resultado da invasão bacteriana do epitélio intestinal, da elaboração de citotoxinas (toxina distensora citoletal) pelas bactérias e indução bacteriana de citocinas inflamatórias.27 As lesões intestinais se assemelham às lesões de colite ulcerativa granulomatosa ou idiopática. A síndrome de Guillain-Barré, uma complicação importante da infecção por Campylobacter que ocorre em 1 entre 1.000 casos de diarreia causada por esse organismo,28 se desenvolve nas situações em que os anticorpos contra determinados polissacarídeos superficiais do organismo Campylobacter entram em reação cruzada com os gangliosídeos dos hospedeiros.29 Acredita-se que a artrite reativa (anteriormente conhecida por síndrome de Reiter), que ocorre em aproximadamente 1% de casos de diarreia causada por Campylobacter, também seja um processo autoimune.

 

Diagnóstico

De maneira geral, o período de incubação do organismo Campylobacter enteritis varia entre 2 e 5 dias. Tipicamente, a doença inicia com uma dor periumbilical grave e com cólicas e febre, que é seguida de uma diarreia com fezes profusas, aquosas e com mau odor. A dor abdominal varia de leve a moderada, imitando apendicite aguda, perfuração intestinal ou intussuscepção. Observa-se a presença de sangue nas fezes em 15% de pacientes. Em pacientes imunocompetentes a diarreia é autolimitada e dura em torno de uma semana. A dor abdominal desaparece após a diarreia.

A bacteremia ocorre em menos de 0,5% de pacientes, usualmente no contexto de idade avançada, imunossupressão, HIV ou alcoolismo.30 Os pacientes com bacteremia se apresentam com sintomas comuns a muitos tipos de bacteremia: febre, indisposição, cefaleia, arrepios, sudorese noturna, anorexia e dor abdominal. Letargia e confusão são ocorrências comuns, mesmo na ausência de descobertas neurológicas focais, havendo ainda a possibilidade de ocorrerem tosses improdutivas sem descobertas pulmonares focais.

 

Exame Físico

As descobertas físicas nas infecções causadas por Campylobacter enteritis e infecções sistêmicas por Campylobacter são inespecíficas.

 

Testes Laboratoriais

Exames de sangue. Pacientes com infecção por Campylobacter possivelmente tenham leucocitose com desvio à esquerda. A presença de formas de bandas é uma ocorrência provável.

Testes de outros líquidos corporais. Em geral obtém-se o diagnóstico por meio de culturas de fezes. Entretanto, os organismos Campylobacter não crescem nos meios padrões utilizados na detecção de patógenos entéricos e, por isso, exigem meios específicos e condições ambientais específicas.31 Nas situações em que não puder ser enviada imediatamente ao laboratório, as amostras acondicionadas em recipientes hermeticamente fechados a 4°C ou a inoculação do meio de transporte (p.ex., Cary-Blair) melhoram a recuperação dos organismos.

A análise direta das fezes possivelmente revele o diagnóstico em pelo menos dois terços dos casos. Nas fezes frescas, os organismos Campylobacter têm dimensões pequenas e móveis na forma de vírgula ou de sacarrolhas. Nas cepas de Gram eles aparecem como organismos gram-negativos curvos em forma de asas de gaivota. Os leucócitos estão presentes nas fezes em aproximadamente 75% dos casos.

O diagnóstico de infecção sistêmica por Campylobacter se fundamenta no isolamento do organismo em culturas de sangue. O crescimento dos organismos Campylobacter pode ser lento, de modo que as culturas devem ser incubadas por duas semanas ou mais.

 

Diagnóstico Diferencial

As infecções por Campylobacter devem ser consideradas nos casos de início agudo de diarreia aquosa, febre e dor abdominal. O diagnóstico diferencial de doença diarreica acompanhada de febre é enterite causada por Campylobacter, Salmonella spp, Shigella spp, Y. enterocolitica, E. coli patogênica, ou doença intestinal inflamatória. A ocorrência de infecções por Salmonella e Yersinia é menos provável nas situações em que a presença de sangue nas fezes for gritante. Não é fácil fazer a distinção de infecções por Campylobacter de outros tipos de bacteremia. Na fase inicial da doença, antes do desenvolvimento de diarreia, a apresentação de infecções por Campylobacter pode ser confundida com apendicite aguda.

 

Tratamento

Usualmente, a Campylobacter enteritis é autolimitada, o que torna desnecessária a aplicação de terapias específicas. Comprovadamente os antibióticos diminuem o tempo de duração dos sintomas intestinais em apenas 1,3 dias.32 Entretanto, talvez seja prudente administrar antibióticos em pacientes com doença moderadamente grave (p.ex., pacientes com febre alta, diarreia sangrenta ou bacteremia, ou em pacientes que produzem mais de oito fezes por dia), pacientes HIV positivos ou imunocomprometidos, mulheres grávidas ou pacientes com sintomas que se agravam ou persistem por mais de 7 dias após do diagnóstico. O tratamento sintomático de Campylobacter enteritis consiste basicamente da reposição de líquidos de acordo com a necessidade. Com base nos dados existentes sobre Shigella e Campylobacter enteritis, provavelmente seja conveniente evitar o uso de agentes antimotilidade.

Para os casos de Campylobacter enteritis em que seja administrada terapia antibiótica, o tratamento de escolha é à base de azitromicina ou de eritromicina [ver a Tabela 4]. Atualmente, nos Estados Unidos a resistência do organismo Campylobacter à eritromicina é de 3%.20 As fluoroquinolonas geralmente são utilizadas no tratamento de diarreia, incluindo diarreias causadas por Campylobacter. Entretanto, esse tipo de medicamento não é recomendado para o tratamento de Campylobacter, tendo em vista que sua resistência às fluoroquinolonas está aumentando rapidamente em todo o mundo; nos Estados Unidos, essa resistência aumentou  menos de 1% no período de 1989 a 1990 para 23% dos isolados em 2008.20 Em 2005, a Food and Drug Administration suspendeu o uso da fluoroquinolona enrofloxacina usada no tratamento de infecções em aves devido à preocupação de que o uso de fluoroquinolonas em aves estivesse contribuindo para aumentar a resistência. A terapia com imipenem ou gentamicina é o tratamento de escolha de infecções por Campylobacter.

 

Complicações

Reconhecidamente, as infecções por Campylobacter levam a duas complicações com início tardio: síndrome de Guillain-Barré, que acomete aproximadamente 0,1% de pacientes,28 e artrite reativa (anteriormente conhecida por síndrome de Reiter), que ocorre em cerca de 1% dos pacientes. Evidências de infecções recentes por Campylobacter são encontradas em até 40% de pacientes com a síndrome de Guillain-Barré.33 Nos pacientes em que a síndrome de Guillain-Barré estiver associada a infecções por Campylobacter, 20% apresentam algum tipo de incapacitação no longo prazo e 5% morrem em decorrência da síndrome ou de suas complicações.

Artrite reativa se refere à tríade formada por artrite pós-infecciosa, conjuntivite e uretrite. Esse tipo de doença é causado por Campylobacter spp, Shigella spp, Salmonella spp, Yersinia spp, C. difficile e Chlamidia spp. A síndrome se apresenta como artrite monoarticular estéril ou como artrite poliarticular migratória, cujo início ocorre dentro de 7 a 10 dias após o início da diarreia, podendo persistir por vários meses ou se tornar crônica. O joelho é a articulação envolvida com mais frequência. Em torno de 60% dos pacientes são portadores do haplotipo HLA-B27, que também está associado a um aumento na prevalência de espondilite anquilosante e de espondiloartropatias relacionadas.

 

Prognóstico

A recorrência ou recidiva de infecções por Campylobacter não é comum em hospedeiros normais, embora condições como enterite grave, persistente ou associada à bacteremia possam ocorrer em pacientes HIV positivos gravemente imunocomprometidos.

 

Infecções por Shigella

Epidemiologia

Estima-se que nos Estados Unidos os organismos Shigella sejam responsáveis por 450.000 casos de diarreia por ano,3 sendo que são relatados aproximadamente 4 casos por uma população de 1.000 pessoas a cada ano,2 e esse organismo é um agente importante de diarreia e de morte em todo o mundo, produzindo 165 milhões de casos anualmente.34 Os seres humanos são os únicos hospedeiros naturais dos organismos Shigella, que se disseminam por contato oral, contato fecal ou, em 20% de casos, através de alimentos contaminados ou de água contaminada. A quantidade de inóculos infecciosos varia de 10 a 100 organismos [ver a Tabela 3].35 Consequentemente, a disseminação dos surtos é imediata e as recorrências são comuns em creches, instituições para tratamento mental e outros ambientes com grandes aglomerações de pessoas. A incidência da doença é mais comum nas crianças mais novas, sendo que as taxas de infecção secundária nas famílias chegam a atingir o nível de 20%.

 

Etiologia/Genética

Os organismos Shigella são bacilos gram-negativos sem motilidade. O gênero Shigella inclui quatro espécies: Shigella dysenteriae, Shigella sonnei, Shigella boydii e Shigella flexneri. Nos Estados Unidos e em outros países industrializados, a Shigella sonnei é a espécie mais comum (90%) e, basicamente, a Shigella flexneri é responsável por todos os outros casos (9%).20 A espécie Shigella dysenteriae também é muito comum nos países em desenvolvimento.

 

Patogênese

Inicialmente, os organismos Shigella colonizam a região proximal do intestino delgado, onde provavelmente a secreção de enterotoxinas seja responsável pelos sintomas iniciais. Em seguida, os organismos passam pelo cólon e pelo reto, onde invadem e se disseminam pela camada epitelial. Os genes exigidos por esses processos se localizam em uma virulência plasmídea. Os organismos Shigella induzem a liberação de citocinas inflamatórias. A disseminação bacteriana com respostas inflamatórias agudas muito intensas leva à formação de ulcerações e de microabscessos no epitélio colônico e retal. Raramente os organismos Shigella têm acesso na corrente sanguínea ou nos tecidos mais profundos infectados.

Entre as espécies Shigella, a toxina Stx (anteriormente conhecida por toxina de Shiga) é produzida somente pela S. dysenteriae; essa toxina contribui para os casos mais graves de diarreia que acompanham as infecções por S. dysenteriae e é a causa da síndrome hemolítica e urêmica, uma das complicações desses tipos de infecção. Outras enteroxinas são produzidas por outras espécies de Shigella.

 

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

Tipicamente, o período de incubação dos organismos Shigella é de 3 dias, dentro de uma faixa que varia de 1 a 7 dias. Os sintomas iniciais, que ocorrem durante as infecções no intestino delgado, geralmente incluem febre, cólicas abdominais e grandes volumes de diarreia aquosa. Esses sintomas são seguidos de cólicas abdominais, tenesmo, urgência retal e diarreia com pequeno volume, que ocorre durante as infecções no intestino grosso. A diarreia é frequente nesse estágio tardio (8 a 10 episódios por dia), sendo que as fezes poderão conter sangue e muco. Caso não seja tratada, a doença geralmente é autolimitada e dura 7 dias ou menos.

 

Exame Físico

As descobertas físicas não são específicas. Os pacientes possivelmente aparentem estar intoxicados e apresentem temperaturas elevadas (de até 41°C [106°F]). Sensibilidade abdominal, principalmente no quadrante inferior esquerdo, e sons intestinais hiperativos são ocorrências comuns. No exame retal observa-se a presença de mucosa friável hiperêmica e ulcerações.

 

Testes Laboratoriais

Exames de sangue. A contagem de leucócitos possivelmente seja elevada, com um eventual aumento no percentual de formas imaturas e de anormalidades metabólicas.

Testes de Outros Líquidos Corporais. De maneira geral, as culturas de fezes são positivas durante enfermidades agudas. Mais tarde, os organismos Shigella poderão ser isolados por meio de culturas diretas de materiais das ulcerações retais. Da mesma forma como ocorre nos organismos Salmonella, as colônias apresentam cor branca no agar de MacCorkey, levando-se em consideração que os organismos Shigella não fermentam lactose. Os organismos Shigella podem ser diferenciados dos organismos Salmonella no agar entérico de Hektoen, onde a Shigella apresenta cor verde, tendo em vista que não produz H2S, ao passo que a Salmonella apresenta cor preta porque produz H2S [ver a Figura 3, a e c]. Em ambientes clínicos apropriados, a abundância de leucócitos nas fezes sugere a presença de infecção por Shigella, Salmonella, Campylobacter, Y. enterocolitica ou E.Coli invasiva ou a presença de doença intestinal inflamatória.

 

Diagnóstico Diferencial

Quadros de febre alta, tenesmo, urgência retal e diarreia com fezes contendo sangue e muco, sugerem a presença de infecção por Shigella. Entretanto, as infecções por Shigella poderão se assemelhar a quaisquer síndromes de diarreia febril, incluindo as síndromes causadas pelos organismos Campylobacter, Y. enterocolitica e Salmonella ou por alguma doença intestinal inflamatória.

 

Tratamento

Os pacientes com desidratação significativa, principalmente as crianças mais novas e os idosos, devem receber terapia de reidratação. Os casos mais graves possivelmente exijam administração intravenosa de líquidos. Levando-se em consideração que os seres humanos são os únicos reservatórios naturais de Shigella, muitos especialistas recomendam que, por razões de saúde pública, qualquer paciente com cultura de fezes positiva para Shigella seja tratado com antibióticos. Além disso, considerando a facilidade da transmissão de Shigella entre pessoas e a mortalidade elevada associada às infecções bacterêmicas, o tratamento é definitivamente indicado para pessoas que manuseiam alimentos, pessoas que trabalham na saúde, crianças que frequentam creches, idosos, indivíduos HIV positivos, indivíduos malnutridos e pacientes que aparentam estar intoxicados ou bacterêmicos. Comprovadamente, a administração de antibióticos para os quais o organismo seja suscetível diminui o curso das enfermidades clínicas.36 Nos Estados Unidos, a ciprofloxacina [ver a Tabela 4] é o tratamento preferido para infecções por Shigella com um padrão conhecido de suscetibilidade aos antibióticos. Uma das terapias alternativas para esses tipos de infecção é a azitromicina ou a trimetroprima+sulfametoxazol [ver a Tabela 4]. Há uma resistência cada vez maior a medicamentos como ciprofloxacina, ampicilina e trimetroprima+sulfametoxazol em todo o mundo [a Tabela 5 apresenta as taxas de resistência nos Estados Unidos]; portanto, a avaliação dos padrões de sensibilidade antibiótica local é imprescindível para orientar terapias empíricas para os casos adquiridos no exterior.36

 

Complicações

De maneira geral, embora sejam raras, as complicações incluem bacteremia (4% de casos), obstrução intestinal nos casos de doença colônica grave (2,5% de casos), perfuração colônica (1,7% de casos fatais), megacólon tóxico (3% das infecções por S. dysenteriae), proctite e, em crianças, prolapso retal. Os distúrbios metabólicos são relativamente comuns, embora os casos de desidratação grave não sejam tão comuns, tenho em vista que o volume fecal geralmente é baixo. Convulsões ocorrem em aproximadamente 5% das crianças infectadas, geralmente em quadros de febre alta e de anormalidades metabólicas.37

Artrite reativa (anteriormente conhecida como síndrome de Reiter) pode ocorrer dentro de 1 a 2 semanas após o início da diarreia, isoladamente ou acompanhada de conjuntivite e uretrite; 70% desses pacientes têm o haplótipo HLA-B27. Embora seja causada com mais frequência por infecções enterohemorrágicas por E. coli, a síndrome hemolítica-urêmica, que é mediada por Stx, poderá ocorrer após as infecções causadas por S. dysenteriae.

 

Prognóstico

Em geral o prognóstico é excelente. Os ambientes que predispõem para a recorrência da doença são aqueles com condições de higiene abaixo do ideal, tais como creches ou locais onde vivem grandes aglomerações de pessoas.

 

Infecções Gastrointestinais por E. coli

Seis fenótipos de E. coli são os grandes responsáveis pelas infecções gastrointestinais: enterohemorrágico (0157:H7 é o mais comum), enterotoxicogênico, enteropatogênico, enteroaderente (incluindo as espécies aderentes difusas e enteroagregadoras, cada uma das quais é um tipo patogênico) e enteroinvasivo [ver a Tabela 1]. As características clínicas, patogênicas e epidemiológicas do organismo E. coli enteroinvasivo são bastante semelhantes às do organismo Shigella spp (ver acima). Nos laboratórios, o organismo E. coli forma colônias cor de rosa no agar de MacConkey, tendo em vista que fermenta lactose; o organismo E. coli distingue-se dos tipos não patogênicos porque forma colônias de cor branca no agar de MacConkey, suplementado com sorbitol [ver a Figura 3, a e b]. Gastroenterite causada pelo fenótico patogênico de E. coli é descrita com detalhes em algum outro artigo [procurar na ACP Medicine informações sobre infecções causadas por E. coli e outros bacilos entéricos gram-negativos].

 

Infecções por Yersinia

Epidemiologia

Cada uma das três espécies de Yersinia – Y. enterocolitica, Yersinia pseudotuberculosis e Yersinia pestis – é patogênica para os seres humanos. As espécies Y. enterocolitica e Y. pseudotuberculosis são amplamente distribuídas na natureza e produzem uma grande variedade de zoonoses. Estima-se que nos Estados Unidos a espécie Y. enterocolitica seja responsável por aproximadamente 100.000 casos de diarreia por ano (ou três casos em cada 100.000 pessoas), predominantemente em crianças.2,3 A espécie Y. pseudotuberculosis é uma causa esporádica de adenite mesentérica purulenta. A espécie Y. pestis, que em seres humanos causa peste bubônica e, com menos frequência, peste pneumônica, se tornou o foco de uma atenção cada vez maior por seu potencial como agente de bioterrorismo; como não causa doenças intestinais, essa espécie de Yersinia não será discutida neste capítulo.

Usualmente, a transmissão da espécie Y. enterocolitica ocorre por meio da ingestão de alimentos contaminados, incluindo carne (principalmente carne de porco), leite e outros tipos de laticínios, mexilhões, tofu, ostras e alface americana. Há também relatos de transmissão entre pessoas, com uma taxa significativa de casos secundários nas famílias.38 A transfusão de hemácias contaminadas com Y. enterocolitica tem sido a causa de infecções graves com um índice elevado de mortalidade.39 As pessoas com hemocromatose ou cirrose subjacente, principalmente se estiverem sendo tratadas com desferroxamina, correm um alto risco de contrair bacteremia e doença metastática. Estima-se que são necessários 109 organismos para provocar uma infecção [ver a Tabela 3].

 

Etiologia/Genética

As espécies de Yersinia são bacilos gram-negativos. Entre os mais de 60 grupos séricos de Y. enterocolitica, três (0:3; 0:5.27 e 0.9) são responsáveis pela maior parte das doenças humanas. Entre os seis sorotipos de Y. pseudotuberculosis, o grupo 0 é a causa da maioria das doenças.

 

Patogênese

Os organismos Y. enterocolitica e Y. pseudotuberculosis transitam pelo estômago, invadem a mucosa do íleo terminal nas placas de Peyer, resultando em respostas inflamatórias e necrose, e infectam os nodos linfáticos mesentéricos, produzindo inflamação e aumentando seu volume [ver a Figura 4]. Os organismos Yersinia modulam as respostas celulares e as defesas imunes inatas e adaptativas, permitindo que os organismos repliquem intracelularmente e se liguem a macrófagos, sem serem fagocitados.40

 

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

Em crianças mais velhas e em adultos, a espécie Y. enterocolitica produz um tipo de síndrome diarreica febril em que o sintoma mais proeminente é uma dor abdominal com cólica que se localiza predominantemente no quadrante inferior direito. A presença de náusea, vômito e fezes sangrentas é bastante comum. Há também relatos de faringite aguda. Os indivíduos infectados por Y. pseudotuberculosis desenvolvem adenite mesentérica e se apresentam com febre e com dor no quadrante inferior direito.

 

 

 

Figura 4 - Patologia em infecção causada por Y. pseudotuberculosis. (a) A biópsia do intestino delgado colorida com hematoxilina e eosina mostra a presença de um granuloma epitelioide com uma célula gigante multinucleada (setas) e um infiltrado linfoide denso. (b) O nodo linfático colorido com hematoxilina e eosina mostra a presença de uma inflamação granulomatosa necrozante, com um infiltrado neutrofílico central (setas) e uma borda granulomatosa (pontas de setas). Cortesia do Dr. Richard L. Kradin.

 

Exame Fisico

Tipicamente, no exame físico os pacientes com infecção por Yersinia têm febre e sensibilidade no quadrante inferior direito.

 

Testes Laboratoriais

Exames de sangue. A presença de leucocitose é comum. A sorologia de Yersinia se torna positiva dentro de 1 a 2 semanas após a infecção; embora a diarreia desapareça nesse período de tempo, a identificação positiva do agente causativo pode ser bastante útil, principalmente nos casos em que o paciente desenvolver uma das síndromes autoimunes que possam complicar a infecção.

Testes de outros líquidos corporais. Enquanto o isolamento dos organismos Yersinia de líquidos corporais normalmente estéreis seja direto, o isolamento das fezes é muito difícil porque os organismos parecem iguais e crescem mais lentamente que outros organismos enterobacteriáceos. Embora ainda não tenha sido desenvolvido um meio seletivo para os organismos Yersinia, nas situações em que houver suspeita de sua presença eles poderão ser identificados pela cor da colônia em meios especiais como o agar CIN (Cefsulodina, Irgasan, Novobiocina) [ver a Figura 3, d]. Em média, a espécie Y. enterocolitica é transportada nas fezes por 1 mês após a resolução dos sintomas. Em pacientes aparentemente intoxicados ou febris, é imprescindível obter culturas de sangue.

Estudos de imagens. Nos casos de adenite mesentérica causada por infecções por Yersinia, as varreduras por TC mostram aumento de volume nos nodos linfáticos mesentéricos e inflamação no íleo terminal, embora o apêndice seja normal. Levando-se em consideração que a apresentação clínica poderá ser confundida com apendicite aguda, o exame cuidadoso do apêndice por imagens é importante para evitar laparatomias exploratórias desnecessárias.

 

Diagnóstico Diferencial

O diagnóstico diferencial de febre e diarreia com leucócitos nas fezes é de enterite produzida por infecção por Campylobacter, Salmonella, Shigella, Y. enterocolitica ou C. difficile, ou causada por alguma doença intestinal inflamatória. Eventualmente, a adenite mesentérica causada por infecção por Yersinia poderá imitar apendicite.

 

Tratamento

De um modo geral, a enterite e a adenite mesentérica causada por Y. enterocolitica e Y. pseudotuberculosis é autolimitada, sendo que ainda não foi definido um papel muito claro para a terapia antibiótica. Em princípio, embora não existam provas diretas, recomenda-se evitar o uso de agentes antiperistálticos.

A septicemia causada por Y. enterocolitica e Y. pseudotuberculosis deve receber tratamento agressivo com antibióticos, tendo em vista que a taxa de mortalidade é bastante elevada. Embora haja poucos testes clínicos envolvendo o tratamento de infecções causadas pelos organismos Yersinia, o tratamento recomendado é usar uma terceira geração de cefalosporinas, como a ceftriaxona, em combinação com gentamicina; nos casos em que o isolado for suscetível às fluoroquinolonas, talvez a melhor opção seja a administração de ciprofloxacina ao invés de cefalosporina [ver a Tabela 4]. A maioria dos isolados clínicos de Y. enterocolitica produz um tipo de ß-lactamase que torna esses organismos resistentes à primeira geração de penicilinas e à primeira geração de cefalosporinas. Os pacientes com suspeita de septicemia devem iniciar o tratamento com antibióticos, independente dos resultados das culturas. Os pacientes com infecção por Y. enterocolitica ou Y. pseudotuberculosis devem ter muito cuidado com contatos pessoais.

 

Complicações

Com frequência, a septicemia, condição que ocorre em pessoas com sobrecarga de ferro ou com outras doenças crônicas, é complicada pela formação de abscessos metastáticos, principalmente no fígado e no baço.

Condições como poliartrite reativa ou eritema nodoso complicam entre 1 a 5% das infecções por Y. enterocolitica e Y. pseudotuberculosis nos Estados Unidos e 10 a 30% desse mesmo tipo de infecção nos países escandinavos. Ocasionalmente, uma dessas síndromes poderá complicar infecções causadas pelo organismo Y. pseudotuberculosis em adultos. Além disso, os pacientes que se apresentam com qualquer um desses distúrbios são portadores potenciais de infecção por Yersinia, o que justifica a realização de sorologia e de culturas.

A poliartrite reativa se desenvolve dentro do período de 2 dias a 1 mês após o início dos sintomas gastrointestinais. Se persistir por mais de um mês em dois terços dos pacientes e por mais de 4 meses em um terço de pacientes, provavelmente há envolvimento dos joelhos, tornozelos, dedos dos pés, dedos das mãos e dos punhos. Usualmente, o líquido sinovial contém menos de 25.000 leucócitos/mL, com preponderância de leucócitos polimorfonucleares e, em geral, as culturas são negativas. Esse tipo de distúrbio pode ser mais comum e particularmente grave em pessoas com o haplótipo HLA-B27, que se apresenta como espondilite anquilosante totalmente desenvolvida ou como a tríade formada por artrite reativa, conjuntivite e uretrite (anteriormente conhecida por síndrome de Reiter).

Eritema nodoso se desenvolve entre 2 e 20 dias após o início dos sintomas gastrointestinais e, tipicamente, desaparece espontaneamente dentro de um mês. Essa condição é duas vezes mais comum em mulheres do que em homens. Usualmente as lesões cutâneas surgem nas pernas ou no tronco.

 

Prognóstico

De maneira geral, o prognóstico de enterite produzida por Y. enterocolitica é excelente; geralmente a diarreia desaparece dentro de 1 a 3 semanas. Por outro lado, a septicemia causada pelo organismo Y. enterocolitica é fatal em 50% dos casos e a septicemia causada pelo organismo Y. pseudotuberculosis é fatal em 75% dos casos, a despeito da administração de uma terapia antimicrobiana apropriada.

 

Infecções por Vibrio Cholerae

Epidemiologia

Os invertebrados aquáticos que vivem em ambientes salubres e marinhos são os reservatórios naturais do organismo V. Cholerae (cólera). A disseminação de cólera ocorre principalmente através da ingestão de água e alimentos com contaminação fecal – especialmente, mas não exclusivamente, os frutos do mar. As consequências de acidentes naturais ou domésticos que provocam o rompimento no suprimento de água limpa e no saneamento, assim como a movimentação de pessoas em áreas superpovoadas, aumentam o risco de transmissão. Anualmente, nos Estados Unidos a cólera se desenvolve em aproximadamente 50 indivíduos, 3 sendo que a maior parte dessas pessoas adquire a doença em viagens para áreas endêmicas. Dois casos foram registrados no outono de 2005 durante o rescaldo dos tufões Katrina e Rita.41 Cinco casos foram registrados na Flórida no final de 2010 em indivíduos que retornavam de uma visita ao Haiti durante um surto grave de cólera que havia ocorrido naquele país.42 A taxa de infecção secundária em famílias é muito elevada, sugerindo a possibilidade de transmissão entre pessoas. Os organismos excretados de pessoas infectadas são mais infecciosos do que os organismos que estão no ambiente,43 e provavelmente contribuam para a alta taxa de infecção secundária nas famílias. Levando-se em consideração que a V. Cholerae é sensível aos ácidos gástricos, os inóculos infecciosos em hospedeiros normais chegam a atingir 108 organismos [ver a Tabela 3], porém provavelmente sejam de 106 organismos ou menos em pessoas que estiverem tomando antiácidos ou que tenham acloridria.

 

Etiologia/Genética

Existem mais de 190 sorotipos de V. Cholerae definidos pelo antígeno superficial 0. Atualmente, somente a espécie V. Cholerae dos sorotipos O1 e O139 produz cólera epidêmica. O sorotipo O1 é classificado em dois biótipos: clássico e EI Tor. O sétimo pandêmico atual é causado pela cepa do O1 EI Tor que iniciou na região Sul da Ásia em 1961, atingiu a África em 1971 e as Américas em 1991. As análises genômicas demonstraram que a cepa que provocou o surto no Haiti em 2010 e 2011 está relacionada mais intimamente com a cepa do O1 EI Tor da Ásia do que com as cepas em circulação na América do Sul.44 O sorotipo O139, que surgiu em Bangladesh em 1992, atualmente está confinado no Sul da Ásia.45 As cepas não-O1 e não-O139 produzem diarreia leve e não epidêmicas (ver abaixo).

A imunidade natural à cólera tem um longo período de duração, com especificidade para o antígeno O1. Consequentemente, em áreas endêmicas, a doença é mais comum em crianças, enquanto que os adultos não imunes que estiverem em viagem pela região também são suscetíveis. Além disso, a alteração no antígeno O, conforme foi observada com o surgimento do O139 em 1992, levou a uma suscetibilidade generalizada em indivíduos de todas as idades.

 

Patogênese

O organismo V. Cholerae coloniza o intestino delgado proximal e segrega uma enterotoxina importante, a toxina da cólera (CTX). A CTX é uma proteína heterodimérica composta de uma subunidade A (ativa) e de cinco subunidades B (de ligação). A toxina liga-se ao gangliosídeo GM no epitélio intestinal, em seguida é transportada para o interior da célula e ativa a adenilato ciclase que, por sua vez, provoca o acúmulo de monofosfato cíclico de adenosina (cAMP, do inglês cyclic adenosine monophosphate). A elevação nos níveis de cAMP provoca a secreção de cloreto e inibe a absorção de sódio, resultando na típica diarreia aquosa isotônica profusa.

O organismo V. Cholerae é minimamente invasivo no tecido intestinal e, da mesma forma, a resposta inflamatória tecidual é mínima. Os processos absorvedores que não são afetados pelo cAMP, incluindo a absorção do sal facilitada pela glicose e a absorção de água, permanecem inalterados permitindo a reidratação oral com soluções de glicose e eletrólitos.

 

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

A marca registrada da cólera é a presença de diarreia aquosa maciça consistindo de um líquido ralo contendo muco, de cor marrom acinzentada (conhecido por fezes de água de arroz cozido), que pode ser acompanhada de vômito sem ânsia. Tipicamente, o período de incubação varia de 1 a 3 dias. Em torno de 1 litro de líquidos por hora é excretado juntamente com as fezes. Observa-se a ausência de febre (que ocorre em apenas 5% de casos), dor abdominal e tenesmo. Os desvios eletrolíticos provavelmente provoquem cãibras musculares. A desidratação varia de leve a grave. A cólera sicca é uma variante rara em que ocorrem distensão e íleo abdominal, com ausência de diarreia. Caso não sejam tratados, os sintomas de cólera desaparecem dentro de 1 a 7 dias.

 

Exame Físico

Os pacientes aparentam estar ansiosos e inquietos, com olhos fundos, membranas mucosas secas, turgor cutâneo fraco, sons intestinais hiperativos, hipotensão e taquicardia. Embotamento é uma ocorrência comum em pacientes com desidratação grave.

 

Testes Laboratoriais

Exames de sangue. Em pacientes com desidratação variando de moderada a grave, os exames de sangue mostram elevações no volume de concentrado de células, na gravidade específica do soro e nos níveis proteicos totais. As doenças graves se caracterizam por azotemia pré-renal; acidose metabólica com hiato aniônico elevado por causa da acidose láctica causada pela hipoperfusão; níveis séricos baixos de potássio, sódio e cloreto; e leucocitose.

Testes de outros líquidos corporais. O exame microscópico de colorações de Gram das fezes revela a presença de organismos gram-negativos pequenos (comprimento de 1 a 3 µm), em forma de vírgula. O organismo V. Cholerae cresce satisfatoriamente em uma grande variedade de meios seletivos. Em geral, os laboratórios de microbiologia clínica utilizam agar de tiossulfato-citrato-sais biliares-sacarose (TCBS, do inglês thiosulfate-citrate-bile salts) [ver a Figura 3, e]

 

Diagnóstico Diferencial

Em pacientes com desidratação grave, a cólera se assemelha um pouco mais. Em pacientes com desidratação variando de leve a moderada, a apresentação da doença se assemelha à de infecções por E. coli enterotoxigênica ou por retrovírus.

 

Tratamento

A reposição imediata de líquidos e eletrólitos perdidos é o grande pilar do tratamento. A reposição de líquidos e eletrólitos deve ser feita por via intravenosa nos casos de pacientes com desidratação grave, em pacientes com desidratação moderada que não tolerarem a ingestão oral, e em pacientes que estiverem perdendo grandes quantidades de líquido (10 a 20 mL/kg/hora). Inicialmente, a reposição hídrica deve consistir da solução lactada de Ringer ou de uma solução contendo 5 gramas de NaCl, 4 gramas de NaHCO3 e 1 grama de KCl para cada litro de água destilada estéril. A meta principal é que o paciente retorne ao estado normal de hidratação dentro de 4 horas, considerando que, pessoas gravemente desidratadas, possivelmente necessitem da administração de 50 a 100 mL/kg/hora de líquidos. Logo após a reidratação, a hidratação normal deverá ser mantida por meio da reposição de perdas hídricas contínuas, de acordo com o estado hemodinâmico e com a produção de urina. Para pacientes com doença grave, a reidratação poderá ser feita por meio da administração oral de uma solução contendo glicose e eletrólitos, consistindo de 20 gramas de glicose, 3,5 gramas de NaCl, 2,5 gramas de NaHCO3 e 1 grama de KCl para cada litro de água.

Os antibióticos são adjuvantes para as terapias de reidratação e são recomendados para pacientes com doença suficientemente grave para produzir desidratação; os antibióticos podem diminuir o tempo de duração dos sintomas e a infecção, assim como a necessidade global de líquidos. A doxiciclina é o medicamento de escolha para aplicação em adultos [ver a Tabela 4]; a ciprofloxacina é uma das alternativas, sendo que a azitromicina (categoria B do risco de gravidez) ou a ciprofloxacina (categoria C do risco de gravidez) é recomendada para mulheres grávidas. Os isolados resistentes à tetraciclina foram identificados na América Latina, Bangladesh, Tanzânia e Laos; a resistência à trimetroprima+sulfametoxazol é comum em Bangladesh, Índia, Moçambique e Laos; a terapia com ciprofloxacina, eritromicina ou azitromicina é a mais apropriada para combater esses isolados. A resistência às fluoroquinolonas foi observada na Ásia e na África, situações em que a administração de uma dose única de azitromicina é suficiente. Nos dias atuais não há nenhuma vacina contra cólera nos Estados Unidos; as vacinas orais disponíveis em outros países não protegem completamente por períodos de tempo muito curtos, embora sejam apropriadas nos casos de surtos.

 

Complicações

Em pacientes com desidratação grave, insuficiência renal aguda ou complicações secundárias a hipocaliemia, incluindo arritmia, é uma ocorrência provável.

 

Prognóstico

A mortalidade é de aproximadamente 50% em pacientes com desidratação grave que não recebem nenhum tipo de tratamento.

Outras Infecções Causadas por Vibrio Além do Vibrio Cholerae Toxigênico: Vibrio parahaemolyticus, V. vulnificus e V. Cholerae Não-O1, Não-O139.

Nos Estados Unidos, estima-se que outras espécies de Vibrio, tais como Vibrio parahaemolyticus, V. vulnificus e cepas não toxigênicas de Vibrio Cholerae sejam responsáveis por aproximadamente 8.000 casos de doença por ano.3

A espécie Vibrio parahaemolyticus é uma causa comum de diarreia na área de Chesapeake Bay, na região da costa do golfo e na região Noroeste do Pacífico; três casos foram registrados durante o outono de 2005 em pessoas que moravam em estados atingidos pelo Tufão Katrina.41 O organismo é amplamente distribuído nas águas costeiras e, tipicamente, é adquirido por ingestão de mariscos crus ou mau cozidos. De maneira geral, a enfermidade clínica consiste de diarreia aquosa explosiva, dor abdominal com cólicas e febre baixa. Esse tipo de organismo pode ser cultivado a partir de amostras de fezes em meios seletivos como o TCBS e a partir de líquidos corporais estéreis em culturas de sangue de rotina ou em placas de agar sanguíneas. A enfermidade é autolimitada e dura menos de 7 dias. O tratamento antibiótico aparentemente não encurta o curso da gastroenterite por causa do Vibrio parahaemolyticus, sendo que, provavelmente, a administração de doxiciclina ou ciprofloxacina seja a melhor escolha, por causa da eficácia documentada contra a Vibrio Cholerae. A espécie Vibrio parahaemolyticus é responsável por infecções nas feridas que entram em contato com a água do mar. Tipicamente, nos casos de indivíduos com doença hepática subjacente ou com diabetes essas infecções são graves e estão associadas à septicemia e a um índice elevado de mortalidade. O tratamento de infecções em feridas causadas por V. parahaemolyticus é o mesmo que para as infecções causadas pela espécie V. vulnificus (ver abaixo).

A espécie V. vulnificus, causa importante de doenças sérias, pode ser isolada nas águas das costas Leste e Oeste dos Estados Unidos, no extremo Norte em Cape Cod e na costa Norte do Oceano Pacífico, principalmente durante os meses de verão. Vários casos foram registrados no outono de 2005, no rescaldo do Tufão Katrina.41 Em indivíduos imunocomprometidos, particularmente aqueles com doença hepática crônica ou com estado de sobrecarga de ferro, mas também em outros indivíduos imunocomprometidos, o organismo V. vulnificus pode causar um tipo devastador de sepse devido à septicemia primária; essa síndrome é fatal em aproximadamente 40% de casos por causa da insuficiência sistêmica em múltiplos órgãos. Três quartos dos casos são acompanhados de lesões cutâneas metastáticas sob a forma de bolhas ou de vesículas hemorrágicas. No espaço de uma semana, antes do início da enfermidade, mais de 90% dos pacientes havia consumido ostras cruas, que provavelmente era a fonte do organismo. A terapia consiste de debridamento adequado e rápido e de antibióticos parenterais; a proporção entre caso e fatalidade aumenta significativamente nas situações em que houver algum retardo no início da terapia.47 Recomenda-se o uso de qualquer combinação de antibióticos que inclua a tetraciclina, como a doxiciclina, por exemplo, mais cefotaxima; a ciprofloxacina é uma alternativa (ver a Tabela 4). Tanto em hospedeiros imunocomprometidos como em hospedeiros saudáveis, o organismo V. vulnificus pode causar uma segunda síndrome: celulite de progressão rápida, fasciite ou miosite que acompanha a infecção de feridas superficiais, principalmente depois de limpar mariscos. Além do tratamento antimicrobiano, com frequência esses pacientes precisam de incisão e drenagem com debridamento.

As cepas de V. Cholerae (não-O1, não-O139) que não produzirem toxinas de cólera poderão causar gastroenterite febril aguda. As V. Cholerae não-O1 e não-O139 são distribuídas em todo o mundo em água salgada e em água doce. De maneira geral, a exposição ocorre por ingestão de frutos do mar crus, principalmente as ostras. A diarreia varia de leve a grave. Usualmente não é necessário fazer nenhum tipo de tratamento, embora nos casos de doenças graves seja recomendável a administração de terapia de reidratação e com ciprofloxacina ou doxiciclina.

 

Clostridium difficile

Epidemiologia

O organismo Clostridium difficile é o patógeno causativo em 10 a 30% de casos de diarreia nosocomial associada ao uso de antibióticos, sendo responsável pela grande maioria de casos de colite associada ao uso de antibióticos.48 Em 2003, no caso de pacientes com permanência hospitalar curta, a taxa de infecção por C. difficile era de 6 em cada 10.000 pacientes de todas as idades, porém era várias vezes mais elevada em pacientes com idade acima de 65 anos.49 A taxa de colonização assintomática varia amplamente e depende do ambiente, mas mesmo assim estima-se que seja em torno de 50% nas instituições de tratamento de longo prazo.50

 

Etiologia/Genética

Acredita-se que dois fatores sejam importantes no desenvolvimento de infecção por C. difficile: exposição ao organismo e alteração na flora intestinal normal. De maneira geral, a transmissão ocorre entre pessoas através das vias oral e fecal, embora a capacidade de as bactérias formarem esporos também facilite a aquisição direta no ambiente. A taxa de infecção aumenta de acordo com o tempo de permanência hospitalar e com a residência em instituições como clínicas de tratamento de longo prazo onde a colonização é endêmica.

Tipicamente, as alterações na flora intestinal que predispõem os indivíduos a infecções por C. difficile resultam do uso de antibióticos e permitem o desenvolvimento desse tipo de organismo. O uso de antibióticos dentro de um período de 8 semanas antes da exposição é um fator de risco para infecção por C. difficile. Embora muitos antibióticos estejam envolvidos nesse processo, aqueles que geralmente estão mais intimamente associados às infecções por C. difficile são os seguintes: clindamicina, penicilinas, cefalosporinas e fluoroquinolonas. Para um pequeno número de indivíduos, um terceiro fator importante para o desenvolvimento de infecção por C. difficile é a presença de polimorfismos na citocina interleucina-8, que foi associada a um aumento na suscetibilidade para a doença.51

 

Patogênese

O organismo C. difficile produz infecções por meio da elaboração de toxinas que danificam as células epiteliais do cólon. Essencialmente, todos os isolados clínicos de C. difficile produzem uma ou ambas as toxinas A e B, sendo que alguns isolados também produzem uma terceira toxina conhecida por toxina binária. As toxinas A e B desativam as guanosina trifosfatases das células dos mamíferos provocando a morte celular. A morte das células colônicas produz inflamação e diarreia. Nos anos 2000, os dados da vigilância sanitária mostram que houve um aumento na incidência e na gravidade das infecções causadas pelo organismo C. difficile que levou à identificação de uma cepa hipervirulenta de C. difficile designada NAP1/B1/027.50 Os fatores que aumentam a virulência das cepas são os seguintes: mutações em genes reguladores que resultam no aumento da secreção das toxinas A e B; presença de toxinas binárias; e aumento na resistência às fluoroquinolonas.

 

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

As manifestações clínicas das infecções causadas pelo organismo C. difficile variam de diarreia leve a diarreia grave complicada por colite com risco de vida [ver a Tabela 8]. As fezes são soltas e frequentes com até 12 ou mais ocorrências por dia. Cabe observar que, nos casos mais graves de pacientes com íleo colônico, a ocorrência de diarreia pode ser mínima ou mesmo ausente. As fezes podem conter sangue, sendo que, mesmo assim, os casos de melena e hematoquezia são raros. Os sintomas associados incluem dor na parte inferior do abdome e febre, sendo que a presença de febre é um sinal de doença mais grave. Usualmente, o início dos sintomas ocorre dentro de um período de 2 a 3 dias após a exposição aos esporos, e de 5 a 10 dias depois da administração de terapia antibiótica. Além disso, os pacientes costumam se queixar de náusea, anorexia e fadiga, além de se tornarem desidratados.

 

Exame Físico

Os pacientes possivelmente tenham febre e apresentem evidências de desidratação, sensibilidade e distensão abdominal. Enquanto os pacientes com infecções leves geralmente apresentem sons intestinais hiperativos, os pacientes com doença grave provavelmente não apresentem sons intestinais, que é uma situação consistente com íleo e/ou sinais peritoneais preocupantes de perfuração, incluindo sensibilidade protetora e de rebote. A presença de íleo ou de descobertas peritoneais levanta preocupações sobre a possibilidade de megacólon tóxico, condição que poderá ser diagnosticada com imagens radiográficas (ver abaixo). Os pacientes com doença grave podem apresentar também instabilidade hemodinâmica, alteração no estado mental ou evidências de sepse, exigindo tratamento em unidades de terapia intensiva.

 

Testes Laboratoriais

Exames de sangue. Com frequência, os pacientes com infecção por C. difficile têm leucocitose que poderá preceder o desenvolvimento de diarreia. A extensão da leucocitose se correlaciona com a gravidade da doença, sendo que o nível de 50.000 células/µL é uma indicação de aumento na mortalidade de 30 dias.52 A elevação no nível de ácido láctico é um indicador da ocorrência de danos em órgãos terminais e de doença grave, sendo que níveis de 5 mmol/L se correlacionam com aumento na taxa de mortalidade.52 Marcadores inespecíficos de inflamação como a taxa de sedimentação de eritrócitos e a proteína C-reativa provavelmente também sejam elevados. Alguns pacientes poderão desenvolver hipoalbuminemia devido às perdas proteicas através do cólon. A presença de distúrbios eletrolíticos é comum em pacientes com megacólon tóxico.

Testes de outros líquidos corporais. De maneira geral, obtém-se o diagnóstico por meio de imunoensaios enzimáticos de toxinas que têm a vantagem de apresentar respostas rápidas. Embora a cultura de fezes seguida de um ensaio de citotoxinas celulares, que é o padrão de ouro, seja mais sensível, o tempo de duração é 48 horas.53 O ensaio mais sensível é a cultura de fezes em condições anaeróbicas, que é lento e exige mão de obra intensiva.

 

Tabela 8: Categorias Clínicas e Recomendações para Tratamento de Infecção por Clostridium difficile53

Categoria

Dados Clínicos

Tratamento

 

Leve

Todos entre os seguintes critérios:

Leucocitose (WBC <= 15.000 células/µL)

Creatinina sérica <= 1,5 do normal

Sem febre

Movimentos intestinais < 6 por dia

 

500 mg de metronidazol, por via oral, três vezes ao dia.

Moderada

Pelo menos um entre os seguintes critérios:

Leucocitose (WBC >25.000 células/µL)

Creatinina sérica >1,5 do normal

Temperatura de 37,5-38,5°C

Movimentos intestinais: 2-12 por dia

 

125 mg de vancomicina, por via oral, quatro vezes ao dia.

Grave

Pelo menos um entre os seguintes critérios:

Leucocitose (WBC <= 15.000-25.000 células/µL)

Creatinina sérica = 1,5 do normal

Temperatura > 38,5°C

Movimentos intestinais >12 por dia

 

125 mg de vancomicina, por via oral, quatro vezes ao dia.

500 mg de metronidazol IV três vezes ao dia.

Grave com complicações

O mesmo que para a condição grave, mais uma entre as seguintes condições:

Hipotensão

Choque

Íleo

Megacólon

 

125 mg de vancomicina, por via oral, quatro vezes ao dia.

500 mg de metronidazol IV três vezes ao dia.

Na presença de íleo, considerar a adição de 500 mg de vancomicina em 500 mL de solução salina a cada 6 horas como enema de retenção.

WBC (white blood cell count) = contagem de leucócitos.

 

Os exames de fezes para toxinas como testes de cura depois do tratamento não têm muita utilidade levando-se em consideração que a toxina poderá vazar por algum tempo após um tratamento com resposta clínica apropriada. Embora tenham sido desenvolvidos ensaios mais modernos e mais sensíveis - que detectam a presença de glutamato desidrogenase em todas as cepas toxigênicas ou detectam genes de toxinas usando a reação em cadeia da polimerase - geralmente esses testes não estão disponíveis na prática clínica.

Estudos de imagens. As radiografias simples mostram a presença de alças intestinais dilatadas consistentes com íleo. As varreduras por TC mostram dilatação, espessamento e entupimento das paredes intestinais, consistentes com colite na área afetada [ver a Figura 5]. Define-se megacólon tóxico como uma dilatação colônica maior que 7 cm; esse tipo de complicação, e a colite, com menos frequência, possivelmente esteja associado à perfuração intestinal; nos casos de perfuração intestinal é necessário observar o ar livre.

Biópsia. A colonoscopia é uma opção nos casos em que houver dúvidas sobre o diagnóstico. De uma forma grosseira, pode-se afirmar que as pseudomembranas clássicas têm uma aparência amarelada. Sob o ponto de vista patológico, nos casos de doenças mais leves observa-se a presença de um infiltrado polinuclear no epitélio superficial e na lâmina própria adjacente. Nas doenças moderadas é comum a presença de inflamação na lâmina basal. Nas doenças graves a ocorrência de necrose de espessura total na mucosa é comum.

 

 

 

Figura 5 - Imagens de uma infecção causada por Clostridium difficile. As seções coronais da tomografia computadorizada do abdome ilustram o seguinte: colite por C. difficile (a) moderada e (b) grave. Observa-se que as descobertas (setas amarelas) incluem espessamento da parede do cólon e formação de filamentos de gordura abdominal, que é um sinal de colite.

 

Diagnóstico Diferencial

Outras causas de diarreia associada ao uso de antibióticos incluem infecções causadas pelos organismos Staphylococcus aureus, Clostridium perfringens, Candida spp e Salmonella spp.48 Os antibióticos propriamente ditos podem causar diarreia através de mecanismos osmóticos; no entanto, geralmente os pacientes não têm febre ou leucocitose. Após o tratamento de C. difficile, a síndrome pós-infecciosa do intestino irritável é uma ocorrência provável que, eventualmente, poderá se confundir com alguma doença recorrente.

 

Tratamento

Em 2010, a organização Infectious Diseases Society of America atualizou as orientações sobre as práticas clínicas para o tratamento de infecções por C. difficile em adultos.53 A base do tratamento de diarreia causada por C. difficile combina descontinuação no uso de antibióticos, que possivelmente tenha predisposto para a infecção, e administração de antibióticos específicos que ataquem a infecção. Sempre que for possível, recomenda-se descontinuar o uso de todos os antibióticos, além daqueles discutidos abaixo, levando-se em consideração que o uso continuado aumenta o risco de recorrência. Com base nos dados clínicos existentes,53,54 os tratamentos antibióticos de infecções por C. difficile são estratificados de acordo com a gravidade da doença [ver a Tabela 8]. Nos testes prospectivos randomizados que não fazem a estratificação conforme a gravidade da doença, a administração oral de metronidazol e a administração de vancomicina apresentam a mesma eficácia.55,56 Entretanto, em um teste prospectivo randomizado que estratificou a gravidade da doença, a vancomicina oral foi superior ao metronidazol nos casos mais graves.57 O metronidazol deve ser administrado como medicamento de primeira linha nos casos de infecções leves, tendo em vista que possui a mesma eficácia e é mais econômico. A administração de vancomicina é uma opção para o tratamento de infecções moderadas ou leves que não apresentarem nenhuma melhora com o metronidazol. Para os casos graves e complicados de infecção, talvez a melhor opção seja a administração retal de vancomicina e/ou a administração intravenosa de metronidazol, assim como a administração de vancomicina por via oral. A colectomia é uma alternativa a ser considerada nos casos de pacientes gravemente enfermos ou em pacientes com megacólon tóxico, perfuração ou outras complicações graves. Recomenda-se evitar o uso de medicamentos antimotilidade, tendo em vista que podem ocultar os sintomas e precipitar megacólon tóxico.

A recorrência da doença após a interrupção do tratamento ocorre em 15 a 65% dos pacientes.54 A primeira recorrência deverá ser tratada com a mesma medicação que foi utilizada no episódio inicial. Para a segunda recorrência, deve-se adicionar ao regime vancomicina gradual ou pulsada. Nos casos de pacientes com histórico de infecção por C. difficile que exijam um curso de antibióticos é razoável administrar profilaxia com metronidazol oral durante o curso de antibióticos e por 10 dias após a conclusão do regime antibiótico.

 

Prevenção

A prevenção da transmissão entre pacientes em hospitais ou em centros de saúde em que houver infecção documentada pelos organismos C. difficile é extremamente importante.53 A estratégia mais eficaz é o uso de luvas e higiene apropriada das mãos por todos os membros da equipe que entrarem em contato com pacientes. Um estudo prospectivo controlado chegou à conclusão que o uso de luvas de vinil descartáveis pelas equipes médicas dos hospitais em todos os pacientes diminuiu a incidência de diarreia por C. difficile de 7,5 em 1.000 pacientes para 1,5 em 1.000 pacientes dentro de um período de 6 meses.58 Cabe observar que os esporos de C. difficile não são removidos completamente por produtos à base de álcool,58 de modo que é imprescindível lavar as mãos com sabão e água. Em um estudo observacional, realizado após a implantação hospitalar de produtos à base de álcool, a incidência de novos isolados de bactérias resistentes que haviam sido adquiridas nosocomialmente foi reduzida em mais de 20%, embora não tenha havido nenhuma alteração na incidência de novos isolados de C. difficile.60 A limitação no uso de antibióticos ou de antibióticos de espectro amplo possivelmente diminua o risco da incidência de infecções por C. difficile, sendo que uma revisão recente da Cochrane Database Systematic Review descobriu que as intervenções que melhoram a prescrição de antibióticos nos hospitais, a exemplo dos programas de gestão de antibióticos, poderão resultar em uma redução significativa na incidência de infecções causadas por C. difficile.61 Existem poucas evidências que dão suporte ao uso de probióticos e, em face do risco potencial de infecções na corrente sanguínea, recomenda-se que não sejam usados para prevenir a incidência de infecções causadas por C. difficile.53,62

 

Complicações

Nos casos de doença grave, as complicações incluem desidratação, distúrbios eletrolíticos, megacólon tóxico, perfuração intestinal, hipotensão, insuficiência renal, sepse e morte.

 

Prognóstico

A maioria dos pacientes com doença leve e moderada responde bem à terapia médica. Entretanto, ocorrem recorrências em 15 a 35% de pacientes depois do primeiro episódio e em 33 a 65% de pacientes que apresentarem mais de dois episódios.54 Uma metanálise de 12 estudos identificou que idade avançada e uso contínuo de antibióticos não-C. difficile depois do diagnóstico são fatores de risco significativos para recorrências.63 Pacientes com doença grave e complicada apresentam resultados variáveis. Condições pré-existentes que se correlacionam com resultados fatais incluem insuficiência renal e uso de esteroides.

 

Causas de Diarreia Mediadas por Enterotoxinas

Várias espécies de bactérias, sendo as mais comuns S.aureus, C. perfringens e Bacillus cereus produzem enterotoxinas que causam envenenamento por alimentos; define-se esse tipo de envenenamento como vômito e diarreia dentro de um período de 4 horas após a ingestão. Em particular, o organismo B. cereus foi associado principalmente aos pratos com arroz. Nesses casos, as bactérias não precisam estabelecer uma infecção intraluminal; a simples ingestão de toxinas pré-formadas poderá produzir a doença. O diagnóstico se fundamenta na apresentação clínica. Os sintomas regridem após a eliminação da toxina, usualmente no dia seguinte, sendo que são mínimas as evidências de toxicidade sistêmica como febre.

 

Infecções Causadas pelo Norovírus

Epidemiologia

O agente de Norwalk, protótipo do Norovírus, foi o primeiro vírus a causar gastroenterite em seres humanos. Nos Estados Unidos, o Norovírus é responsável por mais de 90% dos surtos de gastroenterite não bacteriana, além de ser uma causa importante de doença esporádica em pessoas de todas as idades,6-8 cuja estimativa anual é de 23 milhões de casos por ano.3 O Norovirus é também a segunda causa mais comum de diarreia em viajantes64 e foi associado aos surtos em navios de cruzeiro.65 A Tabela 9 mostra os critérios epidemiológicos para determinar o Norovírus como causa de algum surto.66,67

Idosos, crianças mais novas, viajantes, militares e indivíduos imunocomprometidos, incluindo os receptores de transplante de órgãos, formam o grupo de maior risco. Em indivíduos gravemente imunocomprometidos, como aqueles na fase pós-transplante de células-tronco hematopoiéticas alogênicas, o Norovírus poderá causar diarreia prolongada e incapacitante,68 embora seja muito difícil fazer a distinção entre diarreia autêntica por Norovírus e derramamento assintomático de Norovírus no contexto de outra etiologia de diarreia.

 

Tabela 9: Critérios de Kaplan para Determinar o Norovírus como Causa de Surtos de Gastroenterite66*

 

Vômito em mais de 50% de indivíduos afetados.

 

Período de incubação médio (ou mediano) de 24 a 48 horas.

 

Tempo médio (ou mediano) de duração dos sintomas de 12 a 60 horas.

 

Nenhum patógeno bacteriano tenha sido identificado por culturas de fezes.

*Os critérios de Kaplan apresentaram sensibilidade de 99% e especificidade de 68%.67

 

Embora os Norovírus tenham sido identificados em animais, aparentemente os seres humanos são os únicos hospedeiros para as cepas que afetam a espécie humana. A transmissão ocorre predominantemente pela via oral, sendo que os vômitos também são altamente infecciosos. Todavia, como a dose infecciosa é baixa (18 a 1.000 partículas virais) [ver a Tabela 3],69 a transmissão ocorre também através de gotículas, entre pessoas, fômites e outros tipos de contaminação ambiental, incluindo exposição a alimentos contaminados ou natação em águas abertas.70-72 Na realidade, nos Estados Unidos dois terços das enfermidades relacionadas à ingestão de alimentos são causadas pelo Norovírus,73 e o rastreamento dos surtos levou a uma grande variedade de alimentos contaminados, tais como saladas, sanduiches, produtos de padarias e confeitarias, ostras, amêijoas, aipo, melão e framboesa. Os filamentos virais durante o período de incubação, que varia de 10 a 50 horas em quase um terço de indivíduos,74-76 contribuem para a transmissão e para altas taxas de infecção secundária entre os membros das famílias.

 

Etiologia/Genética

O organismo Norovírus é um gênero da família Caliciviridae. O Norovírus é classificado em três genogrupos que contêm mais de 25 genótipos e inúmeros subgrupos, com cepas no genogrupo II, sendo que o genótipo 4 é a causa mais comum de doenças humanas. Aparentemente, novas cepas resultaram da deriva genética em genes de capsídeos, que alteram as interações com os receptores de hospedeiros; comprovadamente, essas cepas se disseminam globalmente,77,78 exatamente como as novas cepas de influenza que surgiram a partir de derivas genéticas. Novas cepas pandêmicas surgem em intervalos de 2 a 4 anos.8 O surgimento de cepas distintas ao longo do tempo, em combinação com a imunidade de curta duração depois de infecções, provavelmente explique porque determinados indivíduos adquirem infecção por Norovírus diversas vezes.

O Norovírus é um vírus de RNA de cadeia positiva inserido em um revestimento proteico sem envoltório. Os organismos Norovírus ligam-se como cepas aos antígenos do grupo sanguíneo (histo-HBGAs), complexo de moléculas de carboidrato que se localizam na superfície das células humanas, incluindo as células intestinais.79 A presença desses determinantes da suscetibilidade de hospedeiros explica a razão pela qual determinados indivíduos expostos não contraem doenças.

 

Patogênese

No intestino delgado, a infecção está associada ao enfraquecimento e alargamento das vilosidades intestinais e à mistura de infiltração de células inflamatórias na lâmina própria, mas não na mucosa.80 Há um retardo no esvaziamento gástrico,81 possivelmente mediando a náusea e o vômito em associação com a doença. Não se conhece o sítio da replicação viral.

 

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

O Norovírus provoca vômito seguido de cólicas abdominais, diarreia aquosa, febre (em 37 a 45% dos indivíduos), cefaleia, calafrios e mialgias, sendo que o diagnóstico se fundamenta apenas em bases clínicas. Tipicamente, os sintomas duram de 2 a 3 dias, com possibilidade de persistirem por 4 a 6 dias, principalmente nos ambientes hospitalares e em crianças.74,82 Aproximadamente um terço dos indivíduos infectados é assintomático.75

 

Exame Físico

Febre, sons intestinais hiperativos e abdome levemente sensível são ocorrências comuns. Caso contrário, o exame físico geralmente é normal.

 

Testes Laboratoriais

Exames de sangue. O vômito poderá produzir uma leve alcalose metabólica hipoclorêmica.

Testes de outros líquidos corporais. A maior parte dos médicos não tem à sua disposição métodos diagnósticos rotineiros e sensíveis. Embora seja útil para a identificação de surtos, o imunoensaio comercial disponível na Europa e no Japão é específico e não é suficientemente sensível para uso rotineiro no diagnóstico de pacientes individuais.83 De maneira geral, o diagnóstico se fundamenta em históricos de exposição e na exclusão de outros diagnósticos compatíveis.

 

Diagnóstico Diferencial

O diagnóstico diferencial para infecção por Norovírus inclui gastroenterite aguda mediada por toxinas, principalmente devido à ingestão de toxinas pré-formadas, como a toxina produzida por organismos como S. aureus, B. cereus ou C. perfringens [ver acima a seção Causas de Diarreia Mediada por Enterotoxinas] e de medicamentos, ou vômito induzido por produtos químicos tóxicos. Ao contrário do vômito causado por Norovírus, o vômito provocado pela ingestão de toxinas pré-formadas, medicamentos ou produtos químicos não está associado à presença de febre. Além disso, os sintomas de vômito associados à ingestão de toxinas poderão ocorrer dentro de algumas horas após a exposição alimentar, ao passo que a gastroenterite viral ocorre 24 horas após a exposição.

 

Tratamento

O tratamento envolve reidratação oral com líquidos e eletrólitos. A reidratação intravenosa possivelmente seja necessária. A administração de antieméticos pode ser apropriada nos casos de vômito ou náusea. A ribavirina e os interferons têm atividade in vitro contra o Norovírus, embora sua eficácia ainda não tenha sido testada em ambientes clínicos.

 

Prevenção

Levando-se em consideração que 20 partículas virais são suficientes para transmitir a doença [ver a Tabela 3],69 o Norovírus pode ser imediatamente adquirido em superfícies ambientais contaminadas, entre pessoas ou em água ou alimento infectado. O controle dos surtos e da disseminação nos ambientes hospitalares tornou-se um grande desafio.

 

Tabela 10: Recomendações para Prevenção e Controle de Surtos de Norovírus84 

Higiene impecável das mãos, incluindo lavar as mãos com frequência usando sabão e água e produtos sanitários para as mãos à base de álcool (> 62% de etanol).

 

Evitar o compartilhamento de utensílios alimentares, escovas de dente, roupas de cama e outros itens de uso pessoal.

 

Não permitir que indivíduos enfermos executem atividades de preparação de comidas até pelo menos 72 horas após a resolução dos sintomas.

 

Incentivar indivíduos sintomáticos a procurar ajuda médica.

 

Incentivar indivíduos sintomáticos a limitar a participação em atividades sociais.

 

Desinfetar banheiros e quaisquer áreas com possibilidade de contaminação por pessoas enfermas, usando uma solução com cloro branqueado a uma concentração de 1.000 a 5.000 ppm (diluição de 1:50–1:10 de produtos domésticos branqueados [5,25%]) ou qualquer outro tipo de desinfetante aprovado para essa aplicação.

 

Durante eventuais surtos, deve-se considerar a hipótese de fechar instalações específicas e/ou de cancelar a realização de eventos para ajudar a limitar a transmissão.

 

Durante eventuais surtos, é necessário distribuir imediatamente recomendações de prevenção e controle, usando recursos de comunicação eletrônica (e-mail, internet e mensagens de texto), caso estejam disponíveis.

 

As transmissões virais ocorrem antes dos sintomas e podem persistir em indivíduos saudáveis por até 8 semanas e em indivíduos imunocomprometidos por até um ano após o desaparecimento dos sintomas.74-76 Ainda não está suficientemente claro se a transmissão viral crônica é imediata. A Tabela 10 apresenta algumas recomendações para o controle de surtos.84 Higiene pessoal rigorosa e descontaminação de superfícies ambientais são medidas que ajudam a reduzir as transmissões. O vírus é resistente a temperaturas de até 60°C (140°F) e à desinfecção rotineira com cloro antibacteriano.85 A organização Environmental Protection Agency apresenta uma lista de desinfetantes eficazes no combate ao Norovírus.

 

Complicações

As infecções causadas pelo Norovírus podem ser fatais, sendo que a ocorrência de óbitos é maior entre indivíduos idosos.44,71,86

 

Prognóstico

De maneira geral a doença é leve e de curta duração e a recuperação é espontânea. Em determinadas populações comprometidas, principalmente populações de indivíduos idosos ou de indivíduos muito jovens, esse tipo de doença poderá ser fatal.

 

Infecções Gastrointestinais Causadas por Outros Vírus Além do Norovírus

Nos Estados Unidos, o Norovírus é de longe a causa mais comum de gastroenterite não bacteriana entre adultos, sendo responsável por 93 a 96% dos surtos da doença.6,7 As outras causas médicas importantes de gastroenterite viral são rotavírus, adenovírus entérico (tipos 40 e 41) e astrovírus; cada um desses vírus é uma causa de doença, principalmente em lactentes e crianças. Quase todas as crianças são infectadas pelo rotavírus ou, nos últimos anos, foram vacinadas contra esse vírus. A reinfecção pode ocorrer em adultos, entre viajantes ou de forma nosocomial.87 Embora usualmente seja assintomática, a reinfecção poderá ser grave.88 Outros tipos de vírus (coronavírus, torovírus, vírus de Aichi, bocavírus, picobirnavírus, pestivírus) foram envolvidos em casos de gastroenterite, embora não existam dados que confirmem a causalidade.

 

Infecções Gatrointestinais Parasitárias

A probabilidade de ocorrência de diarreia causada por infecções parasitárias depende de fatores geográficos e epidemiológicos. Por exemplo, nos Estados Unidos as infecções por Giardia estão associadas à ingestão de água contaminada proveniente dos ribeirões e reservatórios de água fresca localizados nas montanhas e as infecções por Entamoeba estão associadas às viagens ou às imigrações de áreas endêmicas. Algumas infecções parasitárias, como as infecções produzidas pelos organismos Cryptosporidium e Cyclospora, têm mais probabilidade de causar diarreia crônica, principalmente em hospedeiros imunocomprometidos. Esses casos, assim como as doenças causadas por outros parasitas, serão discutidos com detalhes em algum outro artigo [procurar na ACP Medicine informações sobre infecções intestinais produzidas por protozoários]

 

Os autores não mantêm nenhuma relação comercial com os fabricantes dos produtos ou com os fornecedores dos serviços discutidos neste capítulo.

 

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