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Meningite Bacteriana Aguda

Última revisão: 18/04/2018

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Artigo original: Roos, K, MD. Acute Bacterial Meningitis, SAM.

            [The original English language work has been published by DECKER INTELLECTUAL PROPERTIES INC. Hamilton, Ontario, Canada. Copyright © 2015 Decker Intellectual Properties Inc. All Rights Reserved.]

                             Tradução: Paulo Henrique Machado.

            Revisão técnica: Dr. Lucas Santos Zambon.

 

Karen L. Roos, MD

 

Professora de Neurologia na Organização John and Nancy Nelson. Professora de Neurocirurgia na Indiana University School of Medicine (Indianapolis, IN).

 

Resumo

 

A meningite bacteriana aguda é uma infecção letal. Por definição, meningite é uma infecção nas meninges e no espaço subaracnóideo. A meningite bacteriana está associada às respostas inflamatórias que envolvem as meninges, o espaço subaracnóideo, o parênquima cerebral e as artérias e veias do cérebro. Portanto, a meningoencefalite bacteriana é um termo descritivo mais abrangente. Este artigo apresenta discussões sobre a epidemiologia, a etiologia, a fisiopatologia e a patogênese, o diagnóstico, o diagnóstico diferencial, o tratamento, as complicações e o prognóstico da doença. A seção sobre diagnóstico envolve manifestações clínicas, descobertas feitas em exames clínicos, testes laboratoriais e estudos de imagens. A seção sobre tratamento aborda temas como terapia empírica, terapia antimicrobiana específica e terapia com dexametasona. Os gráficos comparam organismos causadores e manifestações clínicas de meningite adquirida na comunidade. As ilustrações descrevem o posicionamento correto dos pacientes para detecção de rigidez nucal, sinal de Kernig, sinal de Brudzinski e punção lombar, assim como a visão sagital de uma agulha de punção lombar na medida em que ela avança no interior do espaço subaracnóideo. Um algoritmo ilustra a abordagem a um paciente com sintomas e sinais de meningite bacteriana. Os quadros descrevem patógenos bacterianos com fundamento em condições predisponentes e associadas, estudos diagnósticos do líquido cefalorraquidiano (LCR) para meningite, aparência do organismo em uma coloração de Gram, terapia antimicrobiana empírica com base em condições predisponentes e associadas, recomendações para terapia antibiótica específica em casos de meningite bacteriana e doses recomendadas dos antibióticos geralmente utilizados no tratamento de meningite bacteriana.

 

meningite bacteriana aguda

                                   

Karen L. Roos, MD

A meningite bacteriana aguda é uma infecção letal. Por definição, meningite é uma infecção nas meninges e no espaço subaracnóideo. A meningite bacteriana está associada a respostas inflamatórias que envolvem as meninges, o espaço subaracnóideo, o parênquima cerebral e as artérias e veias do cérebro. Portanto, a meningoencefalite bacteriana é um termo descritivo mais abrangente.

 

Epidemiologia

 

Os organismos causadores mais comuns de meningite bacteriana adquirida na comunidade são Streptococcus pneumoniae e Neisseria meningitidis.1 Em termos mundiais, ocorrem 500 mil casos de meningite bacteriana por ano, envolvendo 170 mil mortes e uma quantidade semelhante de sobreviventes com incapacitação neurológica.2

Ocorrem grandes epidemias de meningite meningogócica no cinturão africano de meningite, uma área que se estende desde a Etiópia até o leste do Senegal na África Ocidental. No cinturão de meningite, a incidência se aproxima de 1 mil casos a cada 100 mil pessoas.3,4

 

Etiologia

 

As vacinas mudaram a etiologia da meningite bacteriana. O uso generalizado da vacinação contra o Haemophilus influenzae tipo b diminuiu drasticamente a incidência de meningite causada por esse organismo. O Haemophilus influenzae ainda é um organismo etiológico importante de meningite em crianças e adultos mais velhos em países com limitação de recursos onde a disponibilidade de vacinas é extremamente limitada.

Nas crianças e adolescentes na faixa etária de 2 a 18 anos, a bactéria N. meningitidis é o patógeno mais comum, embora a incidência de meningite causada por esse tipo de organismo tenha diminuído com o uso rotineiro da vacina meningogócica. Nos EUA, recomenda-se o uso de uma vacina meningogócica glicoconjugada quadrivalente (sorotipos A, C, W-135 e Y) em indivíduos na faixa etária de 11 a 18 anos.5

Essa vacina não contém soro do grupo B, que é o sorotipo causador da doença predominante nos países industrializados e responsável por um terço dos casos de doença meningogócica.3,6 No Reino Unido e no Canadá, os bebês são imunizados com a vacina MenACWY a partir da idade de 2 meses.5

A doença meningogócica do soro do grupo A é importante no cinturão de meningite da África; esse organismo é responsável pela maior parte dos surtos epidêmicos da doença. Os soros dos grupos B e C são responsáveis pela maioria dos casos na Europa e nos Estados Unidos; a incidência da doença meningogócica do soro do grupo Y está aumentando sensivelmente nos EUA.4,7

S. pneumoniae é o organismo causador mais comum de meningite adquirida na comunidade.8 As enfermidades antecedentes mais comuns nos casos de meningite pneumocócica são pneumonia, otite média aguda e sinusite aguda. Ao contrário da vacina meningocócica, a vacina pneumocócica não é uma “vacina contra meningite”.

Existem duas vacinas para prevenir a incidência de doença pneumocócica: vacina pneumocócica polissacarídea conjugada, cujos focos são sete sorotipos pneumocócicos, e vacina polissacarídea 23-valente.9 Entretanto, existem, pelo menos, 98 sorotipos diferentes de S. pneumoniae. Embora essas vacinas tenham sido eficazes para reduzir a incidência de doença pneumocócica com base em sorotipos de vacina, as cepas não vacinadas de S. pneumoniae as substituíram como organismos etiológicos de meningite e pneumonia.

Embora o S. pneumoniae seja o organismo causador mais comum de meningite adquirida na comunidade, algumas condições predisponentes e associadas colocam os indivíduos em risco de meningite causada por outros organismos. Os organismos causadores de meningite associados a condições como otite média, mastoidite ou sinusite são os seguintes: Streptococci spp. (incluindo S. pneumoniae), anaeróbios gram-negativos, Staphylococcus aureus, Haemophilus sp. ou Enterobacteriaceae.

O Listeria monocytogenes é um organismo etiológico importante de meningite em adultos mais velhos, em indivíduos com alguma enfermidade crônica (diabetes melito, alcoolismo), em indivíduos imunocomprometidos e em mulheres grávidas. Os pacientes com alguma deficiência congênita ou adquirida na via terminal comum do sistema complemento (C3 e C5 a C9), deficiência de imunoglobulina ou asplênia correm risco de incidência de meningite por causa dos organismos encapsulados, especificamente o N. meningitidis e S. pneumoniae.

Há casos em que a meningite produz complicações na endocardite, possivelmente causadas por organismos como Streptococci viridans, S. aureus, Streptococcus bovis e pelo grupo HACEK (Haemophilus sp., Actinobacillus actinomycetemcomitans, Cardiobacterium hominis, Eikenella corrodens e Kingella kingae) ou por enterococos. Organismos como estafilococos, bacilos gram-negativos e anaeróbios são os causadores mais comuns de meningite em pacientes que estiverem no período neurocirúgico pós-operatório.

Pacientes que tenham sofrido fratura no crânio ou tenham desenvolvido vazamento dural de líquido cefalorraquidiano (LCR), pacientes que tenham feito esplenectomia, indivíduos com defeitos congênitos como meningomielocele e aqueles com focos de infecção parameníngea correm grande risco de recorrência de meningite bacteriana.10

 

Fisiopatologia e Patogênese

 

Os organismos N. meningitidis e S. pneumoniae são transmitidos por gotículas aerossolizadas de secreções respiratórias, em geral de transmissores assintomáticos que colonizam inicialmente a nasofaringe. Após a colonização da nasofaringe, as bactérias atravessam as barreiras mucosas e penetram na corrente sanguínea.11

Na corrente sanguínea, têm acesso ao LCR através do plexo coroide dos ventrículos laterais. A lise das bactérias, com liberação subsequente dos componentes da parede da célula bacteriana no interior do espaço subaracnóideo, é a etapa inicial na indução de respostas inflamatórias e da formação de um exsudato purulento no espaço subaracnóideo.

Os componentes específicos da parede das células bacterianas que induzem inflamação já foram identificados. O ácido teicoico é um dos componentes da parede celular da maioria das bactérias gram-positivas. As bactérias gram-negativas têm moléculas lipopolissacarídeas (endotoxina).

A Figura 1 mostra os organismos causadores em casos de meningite adquirida na comunidade de 1962 a 1988.75

 

 

 

Figura 1 - Organismos causadores em casos de meningite adquirida na comunidade de 1962 a 1988.

 

 

Os componentes das paredes das células bacterianas induzem inflamações meníngeas ao estimular a liberação de citocinas inflamatórias como a interleucina-1ß (IL-1 ß) e o fator a de necrose tumoral (TNF-a). As citocinas inflamatórias são mediadoras de hospedeiros endógenos de inflamação.

A IL-1 ß e o TNF-a são citocinas produzidas por monócitos e macrófagos, astrócitos cerebrais e células microgliais (células equivalentes aos macrófagos do sistema nervoso central) que são “ativados” pela exposição aos lipopolissacarídeos e aos componentes das paredes das células bacterianas. As principais evidências de indução de inflamações meníngeas pela IL-1 ß e pelo TNF-a foram documentadas por experimentos feitos em ratos e coelhos, nos quais as citocinas foram inoculadas diretamente no LCR.

A inoculação intracisternal, de forma independente, da IL-1ß recombinante em ratos e da IL-1 ß e do TNF-a em coelhos induziu inflamações meníngeas (emigração de neutrófilos para o LCR) e aumentou a permeabilidade da barreira hematoencefálica de uma forma dependente do tempo e da dose.12?14

O Quadro 1 apresenta os patógenos meníngeos com base em condições predisponentes e associadas.

 

Quadro 1

 

PATÓGENOS MENÍNGEOS COM BASE EM CONDIÇÕES PREDISPONENTES E ASSOCIADAS

Condição predisponente

Patógeno bacteriano

Neonatos

Estreptococos do Grupo B, Escherichia coli, Listeria monocytogenes.

 

Crianças e adultos ? condições adquiridas na comunidade

 

Streptococcus pneumoniae e Neisseria meningitidis.

Otite, mastoidite, sinusite

Streptococci spp. (anaeróbicos, aeróbicos e viridans).

Anaeróbios gram-negativos (Bacteroides sp., Fusobacterium sp., Enterobacteriaceae (Proteus sp., Escherichia coli, Klebsiella sp.).

Staphylococcus aureus, Haemophilus influenzae.

 

Adultos com idade acima de 55 anos e adultos com enfermidades crônicas

 

S. pneumoniae, bacilos gram-negativos, N. meningitidis, L. monocytogenes, H. influenzae.

 

Endocardite

Streptococci viridans, S. aureus, Streptococcus bovis, grupo HACEK*, enterococos.

 

Imunossuprimidos

S. pneumoniae, L. monocytogenes, H. influenzae.

 

Depois de neurocirurgia

Staphylococci, bacilos gram-negativos.

 

Dispositivo intraventricular

Staphylococci, bacilos gram-negativos, anaeróbios.

 

*O grupo HACEK inclui os organismos Haemophilus sp., Actinobacillus actinomycetemcomitans, Cardiobacterium hominis, Eikenella corrodens e Kingella kingae.

Inúmeras consequências fisiopatológicas são o resultado da presença de citocinas inflamatórias no LCR. O aumento na permeabilidade da barreira hematoencefálica contribui para a formação de edemas vasogênicos, que permite o vazamento de proteínas séricas no interior do espaço subaracnóideo, formando um exsudato purulento de material proteico e de leucócitos, que acaba obstruindo o fluxo de LCR através do sistema ventricular e diminui a capacidade de absorção das granulações aracnoides nos seios durais.

Esse processo resulta na presença de hidrocefalia obstrutiva e comunicante e de edema intersticial. A combinação de edemas vasogênicos e intersticiais eleva a pressão intracraniana (PIC) e altera o nível de consciência.1

A isquemia cerebral é o resultado de uma combinação entre estreitamento e trombose no lúmen do vaso, na medida em que as células inflamatórias infiltram nas paredes arteriais (arterite), de eventos tromboembólicos produzidos por estados de pró-coagulação (tromblofleite) e pela perda de autorregulação do cérebro.15?17 A hipotensão sistêmica criada pela sepse contribui para a hipoperfusão cerebral geral.

As bactérias e as citocinas inflamatórias induzem a produção de aminoácidos excitatórios e de espécies reativas de oxigênio e hidrogênio, causando apoptose nos neurônios. O giro dentado do hipocampo é especialmente vulnerável, resultando em déficits neurocognitivos.18

Condições como inflamação cortical, isquemia cortical, hemorragia intraparenquimatosa e edema cerebral geram focos epileptogênicos. As convulsões são comuns em adultos com meningite bacteriana adquirida na comunidade.19 A sequela mais comum da meningite bacteriana é a perda da audição causada por danos diretos da inflamação no ouvido interno.15

 

Diagnóstico

Manifestações Clínicas

 

Adultos

A maioria dos adultos com meningite bacteriana adquirida na comunidade apresenta, ao menos, dois entre os quatro sintomas a seguir: febre, cefaleia, rigidez nucal e nível alterado de consciência.20?22 Em uma série envolvendo 352 episódios de meningite pneumocócica adquirida na comunidade em pacientes com idade igual ou superior a 16 anos, a tríade formada por febre, rigidez nucal e estado mental alterado estava presente em 59% (206 de 352).

A cefaleia estava presente em 84%, rigidez nucal em 81% e febre (temperatura =38°C) em 84% de casos.23 Em uma série com 493 episódios de meningite bacteriana em adultos, a febre foi a descoberta mais comum e estava presente em 95% de pacientes no momento da apresentação (temperatura =37,7ºC); 4% dos pacientes se tornaram febris nas 24 horas seguintes.24

De um modo geral, os pacientes com cefaleia tomam analgésicos, que têm propriedades antipiréticas. Consequentemente, a ausência de febre na apresentação inicial talvez seja resultado da terapia contra cefaleia; nessas circunstâncias, os médicos devem questionar os pacientes sobre esse fato.

 

Crianças

A possibilidade de meningite bacteriana deve ser considerada em todas as crianças com febre, vômito, fotofobia, letargia ou estado mental alterado. Com frequência, os sintomas de meningite são precedidos por infecções no trato respiratório superior ou otite média.25

De um modo geral, o tempo de duração da enfermidade é o mesmo de uma enfermidade fulminante ou de uma infecção subaguda que progride no período entre 1 até vários dias. O tempo da enfermidade afeta os sinais e sintomas na apresentação.

 

Descobertas Feitas no Exame Físico

 

A maioria dos pacientes com meningite bacteriana tem febre. Conforme já mencionado, a febre com temperaturas =38°C estava presente em 84% de casos em uma série de 352 pacientes com meningite bacteriana adquirida na comunidade com 16 anos de idade ou mais.23 A febre (=38ºC) estava presente em 80 a 94% de crianças com meningite bacteriana.26,27

Os sinais clássicos de irritação meníngea são rigidez nucal (meningismo), sinal de Kernig e sinal de Brudzinski. A Figura 2 mostra a rigidez nucal; a Figura 3, o sinal de Kernig; e a Figura 4, o sinal de Brudzinski.

 

 

 

Figura 2 - Rigidez nucal é o sinal clássico de irritação meníngea que surge nas situações em que a flexão passiva ou ativa produz dor.

 

 

 

 

Figura 3 - Para examinar o sinal de Kernig, é preciso flexionar a coxa e o joelho. Na presença de irritação meníngea, a extensão passiva da perna produz dor.

 

 

 

Figura 4 - O sinal de Brudzinski é positivo quando a flexão passiva do pescoço resulta na flexão espontânea dos quadris e dos joelhos.

 

A rigidez nucal surge nas situações em que o pescoço resiste à flexão passiva. Tipicamente, o sinal de Kernig ocorre com o paciente na posição em supino, embora ele possa estar na posição sentada se o nível de consciência for normal. O paciente estava na posição sentada na descrição original do sinal feita por Kernig.28

Nos dias atuais, a prática comum é manter o paciente na posição em supino. A coxa e o joelho devem permanecer flexionados. A extensão passiva das pernas provoca dor causada pela eventual presença de irritação nas meninges.28 O sinal de Brudzinski é positivo nas situações em que a flexão passiva do pescoço resulta em flexão espontânea dos quadris e joelhos. Alguns estudos recentes sugerem que o sinal de Kernig e o de Brudzinski têm baixa sensibilidade e alta especificidade.20,29

A rigidez nucal pode estar ausente no início do curso da enfermidade em lactentes e crianças; portanto, a ausência dela não é suficiente para excluir o diagnóstico de meningite bacteriana.26 A rigidez nucal e os sinais de Brudzinski e de Kernig são observados em 50% de crianças com meningite bacteriana.

A doença clínica causada pelo organismo N. meningitidis pode estar presente como um tipo de meningococemia ou de meningite. Febre e dermatoses purpúricas pigmentadas são características típicas de meningococemia.4 Os pacientes podem se apresentar com meningite meningocócica sem meningococemia; portanto, a dermatose causada pela meningococemia provavelmente não faça parte da apresentação.11 O tempo de duração da meningite meningocócica é o mesmo de uma infecção fulminante com progressão rápida.4

 

Testes Laboratoriais

Testes de Sangue

De um modo geral, os resultados de testes como contagem de leucócitos periféricos, proteína C-reativa (PCR) e taxa de sedimentação são elevados em pacientes com meningite bacteriana, com a possível exceção dos pacientes imunossuprimidos. A medição da proteína C pode ser extremamente útil em pacientes com descobertas no LCR consistentes com meningite, porém com coloração gram-negativa, com base na hipótese de que a PCR normal tem valor preditivo negativo elevado no diagnóstico de meningite bacteriana.30

A procalcitonina plasmática talvez tenha alguma utilidade no diagnóstico diferencial de meningite por causa das bactérias ou vírus,31 porém nem sempre está rotineiramente disponível no mercado. A procalcitonina é um polipeptídeo que aumenta nos pacientes com infecções bacterianas graves. Concentrações séricas elevadas de procalcitonina facilitam a distinção entre meningite bacteriana e viral em pacientes com coloração gram-negativa no LCR.

A Figura 5 mostra as manifestações clínicas de meningite adquirida na comunidade em pacientes com 16 anos de idade ou mais.23

 

 

 

Figura 5 - Manifestações clínicas de meningite adquirida na comunidade em pacientes com 16 anos de idade ou mais.23

 

Líquido Cefalorraquidiano

 

A determinação da pressão de abertura é imprescindível ao fazer a análise do LCR de pacientes com suspeita de meningite bacteriana. A pressão de abertura pode ser obtida somente com o paciente na posição lateral recumbente. O limite superior da normalidade da pressão de abertura normal do LCR é de 110mm de água em lactentes jovens, 150mm em crianças, 180mm em adultos e 250mm em adultos obesos.32,33

No LCR não infectado, a contagem normal de leucócitos em lactentes com idade acima de 8 semanas, em crianças e adultos varia de zero a cinco células mononucleares (linfócitos e monócitos) por microlitro. Não pode haver leucócitos polimorfonucleares. Nos casos em que a contagem total de leucócitos for inferior a 5 células/µL, a presença de um único leucócito polimorfonuclear pode ser considerada normal.32?34

Concentrações de glicose no LCR abaixo de 40mg/dL são anormais. Concentrações reduzidas de glicose no LCR são uma descoberta preocupante, assim como contagens elevadas de leucócitos. A concentração proteica é elevada nos casos de meningite bacteriana. A concentração proteica no LCR lombar é inferior a 50mg/dL. Concentrações proteicas elevadas no LCR são uma anormalidade inespecífica que está presente em qualquer processo que romper a permeabilidade da barreira hematoencefálica.

 

A Figura 6 mostra o posicionamento adequado de um paciente para punção lombar e a Figura 7, a visão sagital de uma agulha de punção lombar no momento em que avança no interior do espaço aracnoide.

 

 

Figura 6 - Posicionamento adequado de um paciente para punção lombar. Os joelhos e o pescoço devem permanecer flexionados. As costas devem ser mantidas retas e bem próximas da borda da mesa de exame. A agulha deve ser inserida através do interespaço 14?15. Se houver sangramento, significa que a agulha penetrou no plexo venoso. Retire a agulha e prossiga no sentido ascendente até atingir um interespaço. Mantendo o paciente na posição lateral recumbente, deve-se apontar a parte biselada da agulha no sentido ascendente.

 

 

 

Figura 7 - Visão sagital de uma agulha de punção lombar no momento em que avança no interior do espaço aracnoide. Se o avanço for bloqueado por algum osso, a agulha deverá ser removida totalmente e inserida de novo em uma direção ligeiramente mais cefálica. Percebem-se dois estalos: o primeiro, no momento em que a agulha avança através do ligamento espinhoso; o segundo, quando ela avança através do ligamento amarelo.

 

As características das anormalidades no LCR, nos casos de meningite bacteriana, são as seguintes: pressão de abertura acima de 180mm de H2O, quantidade elevada de leucócitos com predominância de leucócitos polimorfonucleares, concentração reduzida de glicose e concentração proteica elevada.

O LCR deve ser examinado logo após a coleta, tendo em vista que os leucócitos do LCR começam a desintegrar depois de 90 minutos. Concentrações de glicose superiores a 40mg/dL ocorrem em 58% de pacientes com meningite bacteriana. A proporção normal entre LCR e glicose sérica é de 0,6.

Proporções normais entre LCR e glicose sérica inferiores a 0,31 ocorrem em, aproximadamente, 70% de pacientes com meningite bacteriana. A coloração Gram é positiva na identificação do organismo em 60 a 90% de casos de meningite bacteriana.35 Entretanto, a probabilidade de detectar bactérias em um espécime de coloração Gram depende do número de organismos.

A maioria dos esfregaços é positiva nas situações em que a concentração bacteriana no LCR é superior a 105CFU/mL. Apenas 25% dos esfregaços são positivos nos casos em que a concentração bacteriana é igual ou inferior a 103CFU/mL.36 Os testes de aglutinação de látex, que são usados para detectar antígenos de patógenos meníngeos comuns, deixaram de ser disponibilizados de forma rotineira para a determinação rápida da etiologia bacteriana da meningite.

O desenvolvimento dos ensaios da reação em cadeia da polimerase (PCR) no LCR teve como objetivo principal detectar a presença de ácido nucleico bacteriano no líquido, e eles estão disponíveis no mercado para avaliação da maioria dos patógenos meníngeos, mais notadamente os organismos N. meningitidis e S. pneumoniae. Um dos desenvolvimentos mais recentes foi a PCR bacteriana com base na sequência ampla conservada do RNA ribossomal 16s.

A maior desvantagem da PCR do LCR para DNA bacteriano é que o resultado é recebido somente depois de 48 horas. De um modo geral, a cultura e a coloração Gram do LCR são registradas antes dos resultados da PCR. Portanto, esse tipo de teste não tem nenhuma utilidade para tomar a decisão de iniciar a terapia antimicrobiana. Entretanto, a PCR pode ser útil em pacientes previamente tratados com antibióticos orais nos quais a cultura e a coloração Gram do LCR forem negativas.

A PCR não substitui as culturas, que são extremamente importantes para os testes de sensibilidade antimicrobiana. O Quadro 2 apresenta uma lista de testes recomendados no LCR para meningite bacteriana e as principais infecções no diagnóstico diferencial.

 

Quadro 2

 

ESTUDOS DIAGNÓSTICOS DO LÍQUIDO CEFALORRAQUIDIANO PARA MENINGITE

Contagem de células com diferencial.

Glicose e concentração proteica.

Coloração e culturas:

                    Coloração Gram e cultura bacteriana

                    Tinta da Índia e cultura fúngica

                    Cultura viral

                    Esfregaço resistente a ácidos e cultura do organismo Mycobacterium tuberculosis

Antígeno:

                    Antígeno polissacarídeo criptocócico

PCR:

                    PCR da transcriptase reversa para enterovírus

                    PCR para os vírus de herpes simples tipos 1 e 2

                    PCR para o vírus do Oeste do Nilo

                    PCR para o vírus de Epstein-Barr

                    PCR para o vírus varicela-zóster

                    PCR para M.tuberculosis

                    PCR para HIV RNA

Anticorpos:

                    Vírus do herpes simples (sérico e LCR IgG para calcular a proporção de anticorpos)

                    Índice dos vírus IgM e IgG para varicela-zóster

                    Vírus transmitidos por artrópodos (IgM do vírus do Oeste do Nilo)

                    Índice dos anticorpos para Borrelia burgdorferi

                    Anticorpo de fixação de complemento para Coccidioides immitis

                    HVH-6 e IgM

 

LCR: líquido cefalorraquidiano; HVH: herpes-vírus humano; IgG: imunoglobulina G; IgM: imunoglobulina M; PCR: reação em cadeia da polimerase.

Obs.: As PCRs devem ser solicitadas de acordo com a indicação por ocasião da apresentação, epidemiologia, etc. Esse tipo de exame não é requisitado rotineiramente para todos os pacientes. A PCR bacteriana de faixa ampla (DNA ribossomal 16S) não está comercialmente disponível como teste clínico.

 

Em geral, a concentração de lactato no LCR é inespecífica e não se recomenda sua medição em pacientes com suspeita de meningite bacteriana adquirida na comunidade. Todavia, a concentração de lactato no LCR aparentemente não tem nenhum valor para o diagnóstico de meningite bacteriana em pacientes neurocirúrgicos no período pós-operatório.

Em pacientes neurocirúrgicos no período pós-operatório, a terapia antimicrobiana deverá ser iniciada somente nos casos em que a concentração de lactato no LCR for igual ou superior a 4,0mmol/L.30 Tipicamente, os resultados da coloração Gram no LCR são obtidos em 1 a 2 horas.

 

Estudos de Imagens

 

Nos casos de meningite bacteriana aguda, a tomografia computadorizada (TC) ou as imagens por ressonância magnética (IRMs) do crânio, após a administração de contraste, mostram um aumento meníngeo difuso. Uma das áreas com alguma controvérsia é a necessidade ou ausência de imagens neurológicas antes da punção lombar.

A finalidade da TC é indicar a presença de alguma lesão de massa que possa resultar em herniação cerebral nos casos de punção lombar. Em uma série de 113 adultos, que tinham necessidade urgente de punção lombar, foram identificados três preditores estatisticamente importantes de novas lesões intracranianas: nível alterado de consciência, déficit neurológico focal e papiledema.37

Nenhum deles isoladamente conseguiu prever adequadamente a presença de anormalidades na TC, embora os três, em conjunto, tenham conseguido prever os resultados de forma significativa (razão de probabilidade negativa: 0; limite superior de confiança de 95%: 0,6), além da opinião geral dos médicos.

Independentemente de punção lombar, há um grande risco de herniação cerebral nos casos de meningite bacteriana aguda. Conforme já mencionado, a meningite bacteriana aguda poderá ser complicada pela elevação na PIC.

Os sinais clínicos de elevação na PIC são papiledema, que se desenvolve em algumas horas, nível alterado de consciência e/ou paralisia unilateral ou bilateral no sexto nervo craniano. As varreduras por TC geralmente são normais em pacientes com PIC elevada ou que apresentam perdas de marcas nos sulcos.

O guia prático para gerenciamento de meningite bacteriana foi publicado em 2004 pela Infectious Diseases Society of America (IDSA).30 Essas orientações práticas foram redigidas por internistas, um neurologista e um pediatra. As orientações recomendam fazer TC antes da punção lombar em pacientes adultos que atenderem a qualquer um entre os seguintes critérios:

               estado imunocomprometido devido a infecção por vírus da imunodeficiência adquirida (HIV), terapia imunossupressiva e/ou transplante de medula óssea ou de órgãos sólidos;

               histórico de doença no sistema nervoso central (lesão de massa, acidente vascular cerebral [AVC] ou infecção focal);

               convulsão de novo início (1 semana após a apresentação);

               papiledema;

               nível anormal de consciência;

               déficit neurológico focal.

Os autores das orientações afirmaram também que “algumas autoridades costumam adiar a punção lombar por 30 minutos em pacientes com episódios convulsivos curtos, ou não fazem a punção lombar em convulsões prolongadas, porque poderão estar associadas a elevações transitórias na PIC”.30

O guia da European Federation of Neurological Societies (EFNS) de 2008 para gerenciamento de meningite bacteriana aguda em crianças mais velhas e adultos recomenda que “os pacientes façam imagens rápidas do cérebro antes [da punção lombar], porém o início da terapia antibiótica não poderá ser adiado além de três horas após o primeiro contato com o paciente”.38

 

Diagnóstico Diferencial

 

O diagnóstico diferencial da tríade febre, cefaleia e rigidez nucal é de meningite bacteriana ou viral, meningite fúngica, meningite tuberculosa, meningite “asséptica” induzida por medicamentos, meningite carcinomatosa ou linfomatosa e meningite “asséptica” associada a doenças inflamatórias (por exemplo, lúpus eritematoso sistêmico, sarcoidose, síndrome de Sjögren).

As meningites bacteriana e viral e alguns casos de meningite tuberculosa se apresentam com início agudo de febre e cefaleia, ao passo que a apresentação das meningites fúngica e carcinomatosa é mais insidiosa. Cefaleia e rigidez nucal podem ser sintomas sentinelas de algum aneurisma intracraniano e de hemorragia subaracnoideia.23

O diagnóstico diferencial inclui encefalite viral, infecções bacterianas causadas por carrapatos, trombose venosa intracraniana e lesões de massa intracranianas infecciosas nas situações em que problemas de consciência, déficits neurológicos focais e convulsões de novo início são adicionados à tríade clássica.

O Quadro 3 mostra a aparência do organismo na coloração Gram do LCR, tendo em vista que, geralmente, é o primeiro resultado do teste que os médicos recebem do laboratório.

 

Quadro 3

 

APARÊNCIA DOS ORGANISMOS NA COLORAÇÃO GRAM

Organismo

Coloração Gram

Neisseria meningitidis

Diplococos gram-negativos na forma de biscoito ou rim que se posicionam lado a lado.

 

Streptococcus pneumoniae

Diplococos gram-negativos na forma de lâmina de bisturi que tendem a se associar em pares alinhados de ponta a ponta.

 

Escherichia coli

Bacilos gram-negativos.

 

Pseudomonas aeruginosa

Bacilos gram-negativos.

 

Listeria monocytogenes

Bacilo gram-positivo.

 

Staphylococcus aureus

Cocos gram-positivos.

 

 

As duas doenças mais comuns consideradas no diagnóstico diferencial são meningite viral e encefalite causada pelo vírus de herpes simples (HSV) ? encefalite por HSV-1. Considera-se a hipótese de meningite viral porque seu diagnóstico permite a descontinuação das terapias adjuvante e antibiótica, enquanto se considera a encefalite por HSV-1, tendo em vista que esse tipo de doença precisa de tratamento urgente com terapia antiviral.

Os agentes etiológicos mais comuns da meningite viral são os enterovírus, o HSV-2, o HIV e os vírus transmitidos por artrópodos. Os pacientes com meningite viral têm cefaleia, febre, rigidez nucal e vômito, embora não apresentem condições como nível alterado de consciência, déficits neurológicos focais ou convulsões de novo início, que geralmente ocorrem nos casos de meningite bacteriana.

A PCR para o LCR é aplicável ao enterovírus, ao HSV-2 e ao HIV, sendo que os resultados geralmente são entregues em 24 a 48 horas. Existe um tipo de PCR para o LCR aplicável aos vírus transmitidos por artrópodos e ao vírus do Oeste do Nilo, embora essa PCR tenha baixa sensibilidade.

Nos casos de encefalite causada pelo HSV-1, em 48 horas após o início dos sintomas, a maior parte dos pacientes apresenta intensidade extrema no lobo temporal inferior e no lobo temporal médio no teste de recuperação de inversão com atenuação de líquidos (FLAIR) e nas sequências de IRM ponderada em difusão.39 A PCR para o LCR aplicável aos casos de encefalite causada pelo HSV-1 é o padrão de ouro para o diagnóstico desse tipo de doença.40

No entanto, vários estudos registraram resultados falsos negativos nas primeiras 24 a 72 horas a partir do início dos sintomas, levando à recomendação de reexaminar o LCR em pacientes que inicialmente haviam apresentado PCR negativa para encefalite causada pelo HSV-1, nos casos em que a apresentação clínica sugerir a presença desse tipo de doença.41?43

 

Tratamento

A Figura 8 apresenta a descrição da abordagem a um paciente com sintomas e sinais de meningite bacteriana.

LCR: líquido cefalorraquidiano; HSV: vírus de herpes simples; PCR: reação em cadeia da polimerase; TC: tomografia computadorizada.

 

Figura 8 - Algoritmo da abordagem a um paciente com sintomas e sinais meningite bacteriana.

 

O gerenciamento inicial de pacientes com suspeita de meningite bacteriana aguda consiste de terapia antimicrobiana empírica e terapia com dexametasona, administradas logo após o recebimento dos resultados dos testes sanguíneos para coloração Gram e das culturas bacterianas. Recomenda-se o isolamento respiratório nas primeiras 24 horas após a terapia antimicrobiana apenas para pacientes com suspeita de meningite meningocócica.

Esse tipo de isolamento não é necessário em pacientes com meningite causada por outras bactérias. Essa decisão poderá ser tomada baseando-se na coloração Gram do LCR, que mostra diplococos gram-negativos na forma de biscoito ou rim. Os resultados da coloração Gram no LCR geralmente são recebidos em 1 a 2 horas, em comparação com as culturas de sangue ou LCR, cujos resultados são apresentados em 24 horas ou mais.

 

Terapia Empírica

 

A escolha da terapia empírica, ao invés da terapia antibiótica, se baseia na idade do paciente e em quaisquer condições associadas que possam predispor para meningite. A terapia empírica para meningite bacteriana em neonatos com idade inferior a 1 mês deverá incluir uma combinação de ampicilina e cefotaxima.

A terapia empírica em lactentes com mais de 1 mês de idade, crianças e adultos com idade até 55 anos deve se fundamentar na possibilidade de que os pneumococos resistentes à penicilina e à cefalosporina sejam os organismos causadores da doença e incluem a administração de uma cefalosporina de terceira ou quarta geração, ceftriaxona (dose pediátrica: 100mg/kg/dia com intervalo de dosagem de 12 horas; dose adulta: 2g a cada 12 horas) ou cefepima (dose pediátrica: 150mg/kg/dia com intervalo de dosagem de 8 horas; dose adulta: 2g a cada 8 horas) mais vancomicina (dose pediátrica: 40 a 60mg/kg/dia com intervalo de dosagem de 6 ou 12 horas; dose adulta: 45 a 60g com intervalo de dosagem de 8 horas).44?48

Deve-se adicionar ampicilina ao regime empírico contra o organismo L. monocytogenes em indivíduos com idade acima de 55 anos e com problemas de imunidade mediada por células causados por alguma enfermidade crônica, transplante de órgão, gravidez, síndrome da imunodeficiência adquirida (Aids), malignidade, ou terapia imunossupressiva em pessoas que estiverem fazendo terapia profilática com sulfametoxazol + trimetoprima.

Adiciona-se gentamicina em pacientes gravemente enfermos com meningite produzida pelo organismo L. monocytogenes. A terapia empírica em pacientes neurocirúrgicos na fase pós-operatória inclui uma combinação de vancomicina mais meropeném ou vancomicina mais ceftazidima.

O meropeném tem excelente atividade contra os bacilos gram-negativos, incluindo o Pseudomonas aeruginosa, porém não protege contra todas as bactérias anaeróbicas.48 O metronidazol deve ser adicionado ao regime empírico em pacientes com condições predisponentes ou associadas relacionadas a infecções anaeróbicas.

O Quadro 4 apresenta uma lista de recomendações para terapia empírica nos casos de meningite bacteriana.

 

Quadro 4

 

TERAPIA ANTIMICROBIANA EMPÍRICA COM EMBASAMENTO EM CONDIÇÕES PREDISPONENTES E ASSOCIADAS

Condição predisponente

Patógeno bacteriano

Antibiótico

Neonatos

Estreptococos do Grupo B, Escherichia coli, Listeria monocytogenes.

Ampicilina mais cefotaxima ou um aminoglicosídeo.

 

Crianças e adultos ? condição adquirida na comunidade.

Streptococcus pneumoniae e Neisseria meningitidis.

Terceira ou quarta geração de cefalosporinas mais vancomicina.

 

Otite, mastoidite, sinusite.

Streptococci spp., anaeróbios gram-negativos (Bacteroides sp., Fusobacterium sp.), Staphylococcus aureus, Haemophilus influenzae, Enterobacteriaceae.

 

Terceira ou quarta geração de cefalosporinas mais vancomicina mais metronidazol.

 

Adultos com mais de 55 anos e adultos com alguma enfermidade crônica.

S. pneumoniae, bacilos gram-negativos, N. meningitidis, L. monocytogenes, H. influenzae.

 

Terceira ou quarta geração de cefalosporinas mais vancomicina mais ampicilina.

Endocardite

Streptococci viridans, S. aureus, Streptococcus bovis, grupo HACEK, enterococos.

 

Terceira ou quarta geração de cefalosporinas mais vancomicina.

Imunossuprimida

S. pneumoniae, L. monocytogenes, H. influenzae.

 

Terceira ou quarta geração de cefalosporinas mais vancomicina mais ampicilina.

 

Depois de neurocirurgia

Staphylococci, bacilos gram-negativos.

 

Vancomicina mais meropeném ou vancomicina mais ceftazidima.

 

Dispositivo intraventricular

Staphylococci, bacilos gram-negativos, anaeróbios.

 

Vancomicina mais meropeném ou vancomicina mais ceftazidima mais metronidazol.

 

HACEK inclui os organismos Haemophilus sp., Actinobacillus actinomycetemcomitans, Cardiobacterium hominis, Eikenella corrodens e Kingella kingae.

Em pacientes com suspeita de encefalite causada pelo HSV-1, devem ser adicionadas 10mg/kg de aciclovir ao regime empírico em intervalos de 8 horas. Recomenda-se adicionar 100mg de doxiciclina, em intervalos de 12 horas, ao regime empírico na época de carrapatos nos casos de suspeita de infecções bacterianas causadas por carrapatos. O uso de doxiciclina é relativamente contraindicado em mulheres grávidas e em mulheres no período de lactação, assim como em crianças com idade inferior a 8 anos.48

 

Terapia Antimicrobiana Específica

 

A terapia antimicrobiana deverá ser modificada após o isolamento do patógeno bacteriano e a confirmação da sensibilidade ao organismo por testes in vitro. Recentemente, despertou-se um grande interesse por infusões contínuas de antibióticos para tratamento de sepse e meningite bacteriana, ao invés da dosagem intermitente em bolo, que é a prática atual.49,50 Entretanto, até o presente momento, não há recomendações definitivas a respeito desse tema.

O tempo de duração da terapia para tratamento de meningoencefalite bacteriana depende do patógeno meníngeo. Normalmente, a meningite bacteriana causada pelos organismos S. pneumoniae, H. influenzae e pelos estreptococos do grupo B é tratada com administração intravenosa de antibióticos por um período que pode variar de 10 a 14 dias.

O tratamento de meningite causada pelos organismos L. monocytogenes e Enterobacteriaceae tem duração de 3 a 4 semanas. As recomendações atualmente em vigor são de que todos os pacientes com meningite pneumocócica façam reexame do LCR a cada 48 horas após o início da terapia antimicrobiana para confirmar se o organismo está sendo efetivamente tratado.

Os pacientes com suspeita clínica de meningite meningocócica devem ser isolados durante as primeiras 24 horas após o início da terapia antibiótica. Recomenda-se o uso de quimioprofilaxia para meningite meningocócica em todas as pessoas que mantenham contato direto com o primeiro paciente. O uso de rifampicina é recomendado na dose de 600mg a cada 12 horas por 2 dias em adultos. A rifampicina não deve ser prescrita durante a gravidez.

O Quadro 5 apresenta uma lista de terapias antibióticas recomendadas de acordo com o patógeno meníngeo.

 

Quadro 5

 

RECOMENDAÇÕES PARA TERAPIA ANTIBIÓTICA ESPECÍFICA EM CASOS DE MENINGITE BACTERIANA

Microrganismo

Antibiótico

Streptococcus pneumoniae

 

Suscetível à penicilina (CIM <0,1mg/L)

Penicilina G ou ceftriaxona (ou cefotaxima ou cefepima)

Tolerante à penicilina (CIM <0,1–1,0mg/L)

Ceftriaxona (ou cefotaxima ou cefepima ou meropeném)

Resistente à penicilina (CIM >1mg/L)

ou

Cefepima (ou cefotaxima ou ceftriaxona) mais vancomicina

 

Cefotaxima ou ceftriaxona (CIM =1mg/L)

 

 

Neisseria meningitidis

Penicilina G ou ampicilina

Ceftriaxona (ou cefotaxima para cepas resistentes à penicilina)

 

Listeria monocytogenes

Ampicilina

Ampicilina mais gentamicina (ver o texto)

 

Streptococcus agalactiae (grupo de estreptococos B)

 

Ampicilina ou penicilina G ou cefotaxima

 

Escherichia coli e outros Enterobacteriaceae

Ceftriaxona ou cefotaxima ou cefepima

 

Pseudomonas aeruginosa

Meropeném ou cefepima ou ceftazidima

 

Staphylococcus aureus

 

Suscetível à meticilina

Nafcilina ou oxacilina

Resistente à meticilina

Vancomicina

 

Staphylococcus epidermidis

Vancomicina ou linezolida

 

Haemophilus influenzae

Ceftriaxona ou cefotaxima ou cefepima

 

Bactérias anaeróbicas gram-positivas: espécies Actynomices, Propionibacterium

 

Metronidazol

Bactérias anaeróbicas gram-negativas: espécies Fusobacterium, Bacteroides

 

CIM: concentração inibitória mínima.

Os agentes antimicrobianos recomendados estão em negrito.

 

Mulheres grávidas e em período de lactação, assim como crianças com idade inferior a 2 anos, poderão receber administração intravenosa ou intramuscular de ceftriaxona (uma única injeção de 250mg para adultos e de 125mg para crianças). Recomenda-se a quimioprofilaxia com rifampicina antes da alta hospitalar nas situações em que o paciente tenha sido tratado inicialmente com penicilina G.

 

Terapia com Dexametasona

 

Em modelos experimentais de meningite, a dexametasona inibe a síntese das citocinas inflamatórias, diminui a inflamação meníngea, diminui edema cerebral, abaixa a PIC e estabiliza a barreira hematoencefálica, diminuindo, consequentemente, o vazamento de proteínas séricas no LCR. Ao nível molecular, a dexametasona diminui a quantidade de TNF e do ácido ribonucleico (RNA) mensageiro da IL-1 produzida em resposta às moléculas de lipopolissacarídeos e inibe sua translação.51?53

Lebel e colaboradores fizeram os testes clínicos originais envolvendo a dexametasona em casos de meningite bacteriana.54 Esses investigadores fizeram posteriormente dois testes prospectivos consecutivos, duplos-cegos, controlados por placebo em 200 lactentes e crianças na Cidade de Dallas, no Estado do Texas, para verificar o efeito da terapia com dexametasona em complementação à terapia antibiótica (cefuroxima para o grupo 1 e ceftriaxona para o grupo 2) sobre o curso e o resultado da meningite bacteriana.

A maior parte dos lactentes e crianças tinha meningite causada pelo organismo H. influenzae tipo b, levando-se em conta que esses testes foram realizados antes do uso generalizado e do sucesso da vacina conjugada contra H. influenzae tipo b.

No grupo tratado com dexametasona, houve 79 casos de meningite causada pelo H. influenzae tipo b, oito casos de meningite causada por S. pneumoniae, nove casos de meningite causada por N. meningitidis, dois casos de meningite causada por estreptococos do grupo B e quatro casos em que o patógeno meníngeo não chegou a ser isolado.

A dexametasona foi administrada por via intravenosa na dose de 0,15mg/kg, em intervalos de 6 horas, nos primeiros 4 dias de terapia. A frequência de complicações como perdas auditivas sensorineurais bilaterais moderadas, graves ou profundas, nos pacientes que haviam recebido dexametasona foi reduzida de forma significativa. No grupo de placebo, 13 entre 84 pacientes (15,5%) apresentaram perda auditiva bilateral moderada ou mais grave, em comparação com três entre 92 (3,3%) no grupo que foi tratado com dexametasona (p <0,01).

Na Costa Rica, Odio e colaboradores realizaram um teste duplo-cego controlado por placebo envolvendo terapia com dexametasona em 101 lactentes e crianças com meningite bacteriana.55 No grupo tratado com dexametasona, a meningite havia sido causada pelo organismo H. influenzae tipo b em 39 casos, S. pneumoniae em quatro casos, N. meningitidis em dois casos e outros patógenos meníngeos em sete casos.

O Quadro 6 contém uma lista das doses recomendadas para os antibióticos geralmente utilizados no tratamento de meningite bacteriana.

 

Quadro 6

 

DOSES RECOMENDADAS PARA OS ANTIBIÓTICOS GERALMENTE UTILIZADOS NO TRATAMENTO DE MENINGITE BACTERIANA

Agente antibiótico

Dosagem diária (intervalo de dosagem em horas)

Ampicilina

Neonatos: 150mg/kg/dia (q. 8h)

Lactentes e crianças: 300mg/kg/dia (q. 6h)

Adultos: 12g/dia (q. 4?6h)

Cefepima

Lactentes e crianças: 150mg/kg/dia (q. 8h)

Adultos: 6g/dia (q. 8h)

Cefotaxima

Neonatos: 100?150mg/kg/dia (q. 8?12h)

Lactentes e crianças: 225?300mg/kg/dia (q. 6?8h)

Adultos: 8?12g/dia (q. 4?6h)

Ceftriaxona

Lactentes e crianças: 80?100mg/kg/dia (q. 12h)

Adultos: 4g/dia (q. 12h)

Gentamicina

Neonatos: 5mg/kg/dia (q. 12h)

Lactentes e crianças: 7,5mg/kg/dia (q. 8h)

Adultos: 5mg/kg/dia (q. 8h)

Meropeném

Lactentes e crianças: 120mg/kg/dia (q. 8h)

Adultos: 6g/dia (q. 8h)

Metronidazol

Lactentes e crianças: 30mg/kg/dia (q. 6h)

Adultos: 2.000mg/dia (q. 6h)

Nafcilina

Neonatos: 75mg/kg/dia (q. 8?12h)

Lactentes e crianças: 200mg/kg/dia (q. 6h)

Adultos: 9?12mg/kg/dia (q. 4h)

Penicilina G

Neonatos: 0,15?0.2mU/kg/dia (q. 8?12h)

Lactentes e crianças: 0,3mU/kg/dia (q. 4?6h)

Adultos: 24 milhões de unidades/dia (q. 4?6h)

Rifampicina

Lactentes e crianças: 10-20mg/kg/dia (q. 12?24h)

Adultos: 600?1.200mg/dia (q. 12h)

Vancomicina*

Neonatos: 20?30mg/kg/dia (q. 8?12h)

Lactentes e crianças: 60mg/kg/dia (q. 6h)

Adultos: 45?60mg/kg/dia (q. 6?12h)

Quimioprofilaxia para Neisseria meningitidis

Rifampicina: 600mg, 2x/dia, por 2 dias ou

Ciprofloxacina: 500mg, 1x/dia ou

Ceftriaxona: 250mg, por via intramuscular

 

*Administração intramuscular de vancomicina: crianças: 10mg/dia; adultos: 20mg/dia.

 

A dexametasona foi administrada por via intravenosa na dose de 0,15mg/kg em intervalos de 6 horas. A dose inicial foi administrada no período de 15 a 20 minutos antes da primeira dose de cefotaxima.

No grupo tratado com dexametasona, variáveis como lactato no LCR, contagem de leucócitos, nível de glicose e concentrações proteicas; pressão lombar de abertura no LCR; pressão de perfusão cerebral estimada; e concentrações de citocinas no LCR, melhoraram de forma significativa em 12 horas, em comparação com as mesmas medições feitas em pacientes que haviam recebido apenas a terapia antibiótica.

As sequelas neurológicas ocorreram com muito mais frequência nos pacientes que haviam recebido placebo. Todas as culturas no LCR foram estéreis, tanto nos testes de Dallas como nos testes da Costa Rica que foram feitos 48 horas após o início da terapia; portanto, a terapia com dexametasona não foi associada à esterilização tardia de culturas do LCR. Ocorreram pouquíssimas complicações na terapia com dexametasona. Apenas dois lactentes que haviam sido tratados com dexametasona tiveram hemorragia gastrintestinal.

Com base nesses estudos, a American Academy of Pediatrics passou a recomendar o uso de dexametasona em lactentes com 2 meses de idade e em crianças com suspeita ou confirmação de meningite bacteriana. A dose recomendada foi de 0,15mg/kg, a cada 6 horas, nos primeiros 4 dias após a terapia. A dose inicial de dexametasona deve ser administrada juntamente com a dose inicial da terapia antimicrobiana.56

Logo em seguida, foi feita uma metanálise de testes randomizados controlados da terapia com dexametasona, em casos de meningite bacteriana na infância, publicada de 1988 a 1996.57 Os autores dessa metanálise chegaram à conclusão de que a terapia adjuvante com dexametasona pode ser eficaz no tratamento de meningite causada pelo organismo H. influenzae tipo b se iniciada juntamente com os antibióticos, ou antes deles, e sugeriram que pode gerar benefícios nos casos de meningite pneumocócica em crianças.

Um estudo realizado no Egito foi o primeiro a investigar se a dexametasona era realmente eficaz no tratamento de meningite bacteriana em adultos; esse estudo encontrou uma redução significativa na mortalidade em pacientes de todas as idades com meningite pneumocócica que haviam sido tratados com dexametasona.58

Houve 7 mortes entre os 52 pacientes tratados com dexametasona, em comparação com 22 entre 54 que não foram tratados com a medicação. A perda auditiva também foi bem menor em pacientes com meningite pneumocócica que haviam sido tratados com dexametasona, em comparação com os que não foram tratados com esse medicamento. As limitações desse estudo incluíam o fato de os antibióticos terem sido administrados por via intramuscular e 60% dos pacientes estavam em estado de coma no momento da admissão.

Em 2002, de Gans e colaboradores publicaram os resultados do teste prospectivo, randomizado, duplo-cego e multicentro, envolvendo o uso de dexametasona em adultos com meningite bacteriana aguda.59 Um total de 301 pacientes, todos com idade igual ou superior a 17 anos, foi distribuído aleatoriamente para o grupo de dexametasona (157) ou para o grupo de placebo (144).

Administrou-se dexametasona (10mg) ou placebo em período de 15 a 20 minutos antes ou juntamente com a primeira dose de antibiótico e, a seguir, o medicamento foi administrado a cada 6 horas por 4 dias. O organismo S. pneumoniae foi o causador da doença em 58 pacientes do grupo de dexametasona e em 50 pacientes do grupo de placebo. N. meningitidis foi o organismo causador da doença em 50 pacientes do grupo de dexametasona e em 47 pacientes do grupo de placebo.

Outras bactérias foram identificadas em 31 pacientes. Entre os pacientes com meningite pneumocócica, 26% no grupo de dexametasona apresentaram resultados desfavoráveis em comparação com 52% no grupo de placebo. Em torno de 14% de pacientes com meningite pneumocócica que receberam dexametasona morreram, em comparação com 34% daqueles com meningite pneumocócica que receberam placebo.

Dois pacientes sofreram hemorragia gastrintestinal no grupo de dexametasona e 5 pacientes no grupo de placebo. Qualquer efeito benéfico na meningite meningocócica não poderia ter sido excluído pelos investigadores, pois eles constataram que o número de pacientes com esse tipo doença era muito pequeno.

Em uma metanálise de testes randomizados controlados sobre o uso adjuvante de corticosteroides no tratamento de meningite bacteriana aguda (18 estudos envolvendo 2.750 pacientes foram incluídos nessa metanálise), feitos pelo Cochrane Central Register of Controlled Trials, Medline (1966 a julho de 2006), EMBASE (1974 a junho de 2006) e Current Contents (2001 a junho de 2006), os seguintes fatos foram constatados pelos investigadores:

               Em crianças de países de renda elevada, os corticosteroides apresentaram efeitos protetores na perda auditiva grave, estimativas de pontos favoráveis para perda auditiva grave em casos de meningite que não havia sido causada pelo organismo H. influenzae e em sequelas neurológicas de curto prazo.

               Em adultos com meningite bacteriana aguda, 36 entre 308 pacientes (11,7%) que receberam corticosteroides morreram, em comparação com 69 entre 315 pacientes (21,9%) no grupo de placebo.60

As crianças com meningite pneumocócica que haviam sido tratadas com corticosteroides apresentaram melhor resultado acadêmico, em comparação com as crianças com meningite pneumocócica que não foram tratadas com terapia à base de corticosteroides.61

Ainda não há um consenso sobre a eficácia da terapia com dexametasona para impedir a ocorrência de sequelas neurológicas e morte em países de baixa renda. Três testes randomizados de grande porte realizados em países de baixa renda não conseguiram mostrar os benefícios da terapia com dexametasona; um teste comprovou por meios microbiológicos que houve benefícios em adultos com meningite bacteriana.62?65

O tempo mediano de duração dos sintomas em um estudo realizado na África Subsaariana foi de 72 horas, em comparação com 24 horas no teste europeu equivalente.59,62 No estudo feito em Malawi, 90% dos 454 pacientes eram HIV positivos e, na maioria deles, a doença estava em estado avançado.63

Um teste randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, no qual participaram 341 pacientes com meningite bacteriana confirmada, demonstrou que houve uma redução significativa na mortalidade no grupo que havia sido tratado com dexametasona em comparação com o grupo de placebo entre pacientes vietnamitas adultos HIV negativos com idade ao redor de 14 anos.66

Sempre houve uma grande preocupação em torno da possibilidade de a dexametasona diminuir a penetração da vancomicina no LCR e, consequentemente, retardar a sensibilização do LCR em casos de meningite, por causa do organismo S. pneumoniae resistente à penicilina e à cefalosporina.

Ocorreram quatro falhas terapêuticas em um estudo prospectivo de 11 adultos com meningite pneumocócica que haviam sido tratados com dexametasona e vancomicina à dose de 15mg/kg a cada 8 horas ou 7,5mg/kg a cada 6 horas.67 A dose de vancomicina ficou bem abaixo da recomendação de 60mg/kg/dia.

Em um teste clínico prospectivo randomizado sobre o uso de dexametasona e vancomicina em crianças com meningite bacteriana aguda causada por pneumococos resistentes à cefalosporina, a vancomicina na dose de 60mg/kg/dia penetrou de forma confiável no LCR nas crianças que haviam sido tratadas concomitantemente com 0,6mg/kg/dia de dexametasona, em 4 doses diárias divididas durante 4 dias.68

As recomendações atuais sugerem que crianças e adultos sejam tratados com vancomicina, na dose de 45 a 60mg/kg/dia, para assegurar a penetração confiável do medicamento no LCR. Nas situações em que a vancomicina foi aplicada na dose de 60mg/kg/dia, juntamente com dexametasona (10mg, a cada 6 horas), em adultos com meningite pneumocócica, as concentrações de vancomicina foram demonstradas continuamente no LCR.69

De acordo com as orientações práticas da Infectious Diseases Society of America (IDSA) para o gerenciamento de meningite bacteriana30 e a orientação da European Federation of Neurological Societies (EFNS) para o gerenciamento de meningite bacteriana adquirida na comunidade,38 é recomendado o uso de dexametasona (0,15mg/kg, a cada 6 horas, por 2 a 4 dias) nos casos de suspeita ou confirmação de meningite pneumocócica.

Deve-se administrar a primeira dose 10 a 20 minutos antes ou, pelo menos, concomitantemente com a primeira dose do agente antimicrobiano. Além disso, a força tarefa da EFNS recomenda a administração de dexametasona em crianças com suspeita de meningite pneumocócica causada pelo organismo H. influenzae tipo b.

As orientações práticas da IDSA recomendam a aplicação de terapia adjuvante com dexametasona em lactentes e crianças com meningite causada pelo organismo H. influenzae tipo b, mas reconhecem que há controvérsias sobre o uso desse tipo de terapia em lactentes e crianças com meningite pneumocócica.

A recomendação é que os benefícios potenciais sejam equalizados contra os riscos potenciais. As orientações práticas da IDSA reconhecem também que “algumas autoridades deveriam iniciar o uso de dexametasona em todos os adultos com suspeita de meningite bacteriana porque a etiologia da doença nem sempre é confirmada na avaliação inicial”.30

Dois estudos recentes dão suporte adicional a essas recomendações. Após a introdução da terapia com dexametasona em adultos com meningite pneumocócica em todos os Países Baixos, houve um declínio da taxa de fatalidade de casos de 30 para 20%. Ocorreram 787 episódios de meningite bacteriana, entre os quais 357 episódios foram de meningite pneumocócica.70

As orientações anteriores recomendavam a descontinuação no uso de dexametasona nos casos em que o organismo N. meningitidis fosse identificado como patógeno meníngeo,30,38 embora um estudo recente tenha demonstrado uma tendência favorável na redução nas taxas de mortalidade e nas perdas auditivas e que não há evidências de que a dexametasona tenha causado danos em pacientes com meningite pneumocócica.71

 

Complicações

 

Conforme já mencionado neste artigo, a meningite bacteriana aguda poderá ser complicada por edema cerebral, elevação na PIC, complicações cerebrovasculares, hidrocefalia obstrutiva e/ou comunicante, perda auditiva, problemas cognitivos e convulsões. As complicações cerebrovasculares incluem isquemia cerebral produzida por arterite e autorregulação cerebral alterada, hemorragia cerebral, tromboflebite e trombose no seio dural.72

O reconhecimento imediato da doença, a terapia adjuvante com dexametasona e o gerenciamento da complicação de edema cerebral em uma unidade de terapia intensiva, elevação na PIC, convulsões e complicações cerebrovasculares são as únicas formas de minimizar a ocorrência de complicações.

 

Prognóstico

 

A terapia antimicrobiana empírica deve ser administrada o quanto antes nos casos em que houver suspeita de meningite bacteriana aguda. Um estudo demonstrou que houve alguma melhora no resultado neurológico e na sobrevida em pacientes que haviam recebido terapia antimicrobiana antes da deterioração do nível de consciência e uma pontuação abaixo de 10 na Escala de Coma de Glasgow.73

Reduções na mortalidade foram demonstradas com administração imediata da terapia antimicrobiana.74 Além da administração da terapia antibiótica em tempo hábil, um passo extremamente importante para diminuir a mortalidade e as sequelas neurológicas é o uso de terapia adjuvante para impedir ou diminuir a cascata inflamatória, que poderá resultar em edema cerebral, convulsões, AVC e apoptose neuronal como resultado da presença de citocinas inflamatórias no LCR.

 

Informações Financeiras: Karen L. Roos, MD, não possui informações financeiras relevantes a declarar.

 

Referências

 

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