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Stents revestidos com drogas

Autores:

Euclides F. de A. Cavalcanti

Médico Colaborador da Disciplina de Clínica Médica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Leonardo Vieira da Rosa

Médico Cardiologista pelo Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Médico Assistente da Unidade de Terapia Intensiva do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Doutorando em Cardiologia do InCor-HC-FMUSP. Médico Cardiologista da Unidade Coronariana do Hospital Sírio Libanês.

Última revisão: 03/07/2009

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Na angioplastia coronária o uso de stents recobertos por drogas oferece poucos benefícios em comparação aos stents comuns.

 

Desfechos Clínicos das angioplastias coronárias na era dos stents comuns versus na era dos stents recobertos por drogas

Malenka DJ et al. Outcomes Following Coronary Stenting in the Era of Bare-Metal vs the Era of Drug-Eluting stents JAMA. 2008;299(24):2868-2876 [link livre para o Pubmed]

 

Fator de Impacto da Revista: 23,175

 

Contexto Clínico

            Os stents recobertos com drogas (sirulimus ou paclitaxel) surgiram como uma grande promessa no tratamento das síndromes coronarianas agudas. Estas drogas inibem a hiperplasia neointimal relacionada ao stent e, portanto, as reestenoses das artérias coronárias. No entanto, este mesmo efeito também é responsável pela diminuição da epitelização do stent pela camada neointimal e estudos recentes têm evidenciado um maior risco de trombose nestes stents, principalmente se a dupla terapia antitrombótica (aspirina + clopidogrel) for suspensa1. De fato, as recomendações atuais recomendam terapia com aspirina + clopidogrel por, no mínimo, um ano após a colocação de um stent com droga, e persiste a dúvida se este período não deve ser ainda mais longo.

            Além disso, os estudos não demonstraram até o momento haver diferença em desfechos clínicos de maior relevância. Uma meta-análise que avaliou 10 estudos randomizados, e um outro estudo que analisou os desfechos de 14 estudos com stents recobertos por Sirulimus não mostraram haver diferença em eventos como mortalidade e infarto agudo do miocárdio2,3.

            Desta forma, a real utilidade destes novos stents permanece duvidosa. De um lado os novos stents são associados a um menor risco de reestenoses e novos procedimentos de revascularização mas, por outro lado temos um maior risco de tromboses (costumam ser mais graves do que as reestenoses, que evoluem de forma mais insidiosa), necessidade de dupla terapia antitrombótica por tempo prolongado (o que pode aumentar os riscos de sangramento), ausência de benefício em desfechos clínicos mais relevantes (mortalidade e infarto agudo do miocárdio) e maiores custos.

 

Estudo

            Estudo observacional, que utilizou um grande banco de dados do Medicare - sistema de seguros de saúde gerido pelo governo dos Estados Unidos destinado à pessoas idosas ou que verifiquem certos critérios de rendimento.

            O estudo comparou os dados referentes ao período de outubro de 2002 a março de 2003, quando os stents com drogas não eram disponíveis, com o período de setembro a dezembro de 2003, quando 61,5% dos pacientes receberam stents com drogas e os demais stents comuns. No primeiro período foram analisados os dados de 38.917 pacientes e no segundo período de 28.086 pacientes. Dados de acompanhamento até dezembro de 2005 foram analisados.

            Como se trata de um banco de dados do governo, que não foi estruturado para fornecer dados mais detalhados do seguimento destes doentes, o estudo não apresentou maiores detalhes sobre as causas dos desfechos clínicos. Não estavam disponíveis, por exemplo, dados que permitissem inferir se os desfechos clínicos estudados ocorreram devido a trombose (possivelmente mais frequente nos stents com drogas) ou reestenose (possivelmente mais frequente nos stents comuns).

 

Resultados

            O estudo mostrou que houve diminuição de alguns eventos clínicos quando se comparou um período quando não se usavam stents revestidos com drogas com um período mais recente no qual 61% dos stents colocados foram revestidos. Os pacientes submetidos a angioplastia na era dos stents com droga tiveram um menor risco de novas intervenções percutâneas (17,1% versus 20%; p <0,001), cirurgias de revascularização miocárdica (2,7% versus 4,2%p<0,01) e novos IAMs (2% versus 2,4%p<0,01). No entanto, estes benefícios não se traduziram em menor mortalidade geral.

 

Aplicação para a Prática Clínica

             Como crítica ao estudo, podemos dizer que tem importantes limitações por se tratar de um Estudo observacional e, portanto, sujeito a vieses. Por exemplo, os benefícios encontrados poderiam ser atribuídos ao fenômeno que ocorre com controles históricos deste tipo – as diferenças poderiam ser decorrentes não apenas do tipo de stents, mas de um melhor cuidado geral com os pacientes - por exemplo, uso mais intensivo de terapia antiplaquetária dupla, uso mais intensivo de estatinas, controle mais rigoroso de outros fatores de risco, etc.

            Por outro lado, podemos dizer que é um estudo importante pelo grande número de pacientes analisado e porque estudou o assunto na “vida real”, ou seja, fora do contexto de ensaios clínicos, nos quais os pacientes são muito mais selecionados.

            No entanto, apesar do estudo mostrar alguns benefícios dos stents com drogas, observamos que este benefício é pequeno. Fazendo-se um cálculo do Número Necessário Para Tratar (NNT), observamos que temos que tratar 34 pacientes para se prevenir uma nova intervenção percutânea, 66 pacientes para se prevenir uma intervenção cirúrgica e 250 pacientes para se prevenir um único infarto, sem impacto na mortalidade geral.

                       

Além disso, devemos pesar que:

         Nos stents com drogas estão presentes drogas antineoplásicas, e não sabemos se existem efeitos colaterais relacionados a elas no longo prazo.

         Há um aumento da taxa de trombose com o uso dos stents revestidos. Portanto, o paciente que receber um destes stents terá que receber dupla terapia antitrombótica (aspirina + clopidogrel) por, no mínimo, um ano e, não está estabelecido em literatura quando ou se o clopidogrel poderá ser suspenso após este período.

         Apesar da rápida incorporação de stents eluídos na prática intervencionista, os dados são pobres na vigência de IAM com supra. Existe o medo teórico de que o uso desses devices na vigência do IAM aumente a trombogenecidade e o risco de trombose aguda de stents.

         Os estudos anteriores a este foram consistentes em demonstrar que não há diferença em termos de eventos clínicos significativos como mortalidade geral e infarto agudo do miocárdio 2,3.

         Devido ao maior risco de trombose principalmente se a dupla terapia antitrombótica for suspensa, sempre devemos considerar a não utilização de stents farmacológicos em pacientes que poderão ser submetidos a cirurgia dentro de 1 ano do procedimento.

         O custo dos stents revestidos com drogas é muito mais elevado, em torno de 3 a 4 vezes superior ao dos stents convencionais, cujo valor oscila entre R$ 1.500 e 2.000. Em uma análise grosseira de custo-efetividade, se atribuirmos, por exemplo, um custo adicional de 5000 reais por paciente tratado com stent revestido com drogas, teríamos que para se prevenir uma nova intervenção percutânea seria necessário gastar 170.000 reais, para se prevenir uma cirurgia de revascularização seria necessário um gasto de 330.000 reais e para se prevenir um único infarto seria necessário um gasto de 1.250.000 reais, de acordo com os dados deste estudo.

 

            Portanto, é opinião destes editores que o valor gasto com stents revestidos nestes pacientes seria mais bem empregado em medidas de prevenção secundária, como controle intensivo dos fatores de risco (hipertensão, diabetes, dislipidemia, tabagismo, sedentarismo e dieta inadequada), medidas estas com benefício muito mais evidente e com menor custo. Caso se opte pelo uso dos stents farmacológicos, provavelmente os doentes que mais se beneficiam são aqueles com maior risco de reestenose, que são os diabéticos, aqueles com lesões longas > 30 mm, com vaso de pequeno diâmetro < 3mm, com lesões em enxerto de safena e aqueles com oclusão total crônica.

 

Dicas de Medicina Baseada em Evidências e Epidemiologia

Risco Relativo: definições, limitações e importância do NNT

            Risco relativo (RR) é uma relação da probabilidade de um evento clínico ocorrer no grupo exposto a uma determinada intervenção em relação ao grupo não exposto a intervenção (grupo controle). Por exemplo, se o risco de um determinado evento em pacientes submetidos a um novo tratamento for de 10% e o dos pacientes controles for de 15%, temos que o Risco relativo é de 10%/15% = 0,66, logo o RR = 0,66. Em outras palavras, podemos dizer que o evento ocorreu 34% menos no grupo submetido a nova intervenção.

            A análise do Risco relativo pode levar a conclusões enganosas. Quando analisamos desfechos clínicos pouco freqüentes, como no caso de infartos agudos do miocárdio no estudo acima, podemos ter uma percepção distorcida do benefício. Temos que o grupo tratado com stents com drogas teve 2% de eventos versus 2,4% de eventos no grupo de stents comuns, o que nos dá um RR = 0,83, ou seja, uma diminuição de 17% em novos eventos, o que seria interessante. No entanto, como os eventos foram infreqüentes, o Número Necessário Para Tratar (NNT) é muito alto. Lembrando, o cálculo do NNT é o seguinte: 100/ redução do risco absoluto = 100/2,4-2,0 = 250. Ou seja, neste caso, precisaríamos tratar 250 pacientes para se prevenir um único infarto. Se os eventos fossem de 20% no grupo intervenção e 24% no grupo controle teríamos o mesmo Risco relativo, mas um NNT de apenas 25. Logo, é importante sempre se calcular o NNT e analisá-lo juntamente com o RR.

 

Bibliografia

  1. Stone GW et alSafety and Efficacy of Sirolimus- and Paclitaxel-Eluting Coronary stents. N engl J Med 2007; 356:998-1008 [link livre para o pubmed]
  2. Katrisis DG et al. Meta-analysis comparing drug-eluting stents with bare metal stents. Am J Cardiol 2005; 95(5):640-643 [link livre para o pubmed].
  3. Kastrati A et al. Analysis of 14 Trials Comparing Sirolimus-Eluting stents with Bare-Metal stents N Engl J Med 356:1030, March 8, 2007 [link livre para o pubmed]

 

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