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hiperfosfatemia

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 05/02/2013

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Especialidades: Medicina de Emergência / Medicina Hospitalar / Medicina Intensiva

 

Resumo

         A fonte de fósforo para o ser humano é a alimentação, e sua concentração sérica é regulada pela excreção renal. Pequenas elevações séricas de fosfato levam a uma diminuição na reabsorção tubular proximal de fosfato no rim.

 

Introdução

Fisiologia do fósforo

         O fósforo circula no corpo humano por meio de moléculas inorgânicas de fosfato. Estas moléculas consistem de um átomo central de fósforo circundado por 4 átomos de oxigênio. O fosfato é o principal ânion intracelular.

         A fonte de fósforo para o ser humano é a alimentação, ou seja, é suprido por via digestiva, e sua concentração sérica é regulada pela excreção renal. Pequenas elevações séricas de fosfato levam a uma diminuição na reabsorção tubular proximal de fosfato no rim. Esse mecanismo é extremamente eficiente para regular o fosfato, uma vez que, mesmo em grandes ingestas, os níveis séricos podem ser controlados. Outra contribuição para o controle do fosfato no organismo se dá pelo aumento da secreção de PTH, uma vez que o cálcio sérico em elevação decorrente da atividade do PTH forma complexos com as moléculas de fosfato que estiverem em excesso na circulação.

 

Causas de hiperfosfatemia

         A base da abordagem diagnóstica se dá em função de se descobrir por que a entrada de fosfato em excesso na circulação consegue superar a taxa de excreção renal. Sendo assim, há 3 causas básicas para hiperfosfatemia: uma carga maciça de fosfato sendo liberada na circulação, insuficiência renal crônica e aumento na reabsorção proximal de fosfato no rim.

 

Liberação de fosfato na circulação

         Uma grande quantidade de fosfato sendo liberado na circulação e que possa superar a capacidade renal de excreção pode ter origem endógena ou exógena. Uma vez que o fosfato é o principal ânion intracelular, qualquer destruição celular de grande importância pode ser causa de liberação do fosfato intracelular na circulação. Uma das primeiras consequências deste grande aporte de fosfato na circulação é a formação de fosfato de cálcio, que se precipita nos tecidos e leva a uma hipocalcemia de forma secundária.

         Uma das causas mais importantes de destruição celular é a síndrome de lise tumoral (SLT). Normalmente, a SLT ocorre em pacientes com tumores de grande turnover celular, ocorrendo de forma espontânea, sobretudo no início do tratamento quimioterápico/citorredutor. Destacam-se os linfomas (em particular os linfomas de Burkitt e linfomas não Hodgkin) e certas leucemias. Normalmente, as SLT se caracterizam por achados adicionais de hipercalemia, hiperuricemia e hipocalcemia, com evolução para insuficiência renal aguda, arritmias e convulsões.

         Outra causa de destruição celular importante são as rabdomiólises. Uma grande diferença desta situação é a liberação de mioglobina e CPK na circulação, pois ambas nefrotóxicas e, por causa dessa nefrotoxicidade, podem agravar a hiperfosfatemia.

         Outras causas que mobilizam o fosfato do intracelular para o extracelular de forma importante são a acidose lática e a cetoacidose diabética (eventualmente até hiperglicemias importantes de forma isolada). O efeito da acidose metabólica é diminuir a glicólise e a utilização celular de fosfato. Fatores associados que pioram esse mecanismo são a hipóxia tecidual e a deficiência de insulina.

         Quando se pensa em causas exógenas de hiperfosfatemia, a principal causa é o excesso de ingesta de laxativos que contêm fosfato em sua formulação, algo que eventualmente é utilizado nos preparos de colonoscopia. Entretanto, é mais comum que pacientes que já tenham insuficiência renal desenvolvam hiperfosfatemia nessa situação.

 

Insuficiência renal crônica

         A quantidade de fosfato filtrado no rim diariamente varia de 4 a 8 g/dia. Desta quantidade, 5 a 20% são excretados, com o restante sendo reabsorvido no túbulo proximal. Quando ocorre diminuição do ritmo de filtração glomerular, principalmente em situações crônicas – mas também podendo ocorrer de forma aguda –, então ocorre hiperfosfatemia decorrente da diminuição da filtração e da excreção de fosfato.

         Em um primeiro momento, o organismo consegue manter o balanço de fosfato à custa de uma diminuição da reabsorção proximal. Como há menos fosfato sendo filtrado, uma maior quantidade chega a ser excretada por não ser reabsorvida no túbulo proximal. Entretanto, quando o ritmo de filtração glomerular cai abaixo de 20 a 25 mL/min, ocorre uma supressão na reabsorção de fosfato, ou seja, o único mecanismo compensatório entra em falência, levando a hiperfosfatemia.

 

Aumento da reabsorção tubular de fosfato

         Normalmente ocorre em pacientes com certas condições clínicas, algumas endocrinológicas. A primeira que deve ser citada é o hipoparatireoidismo. Tanto a deficiência de secreção de PTH quanto a resistência renal ao PTH (pseudo-hipoparatireoidismo) resultam em aumento da reabsorção tubular de fosfato. Esses pacientes têm hipocalcemia de forma associada por conta da diminuição da reabsorção óssea. Outra situação onde pode ocorrer hiperfosfatemia é a acromegalia. Nesta situação, presume-se que há um estímulo na reabsorção de fosfato causada por hormônios de crescimento ou fator de crescimento insulina-like.

         Existe uma variedade de outras situações. Uma delas é a hiperfosfatemia causada por bifosfonados, especificamente o etidronato que estimula a reabsorção renal. Outra situação é a toxicidade por vitamina D, que aumenta a absorção de cálcio e fosfato, e o aumento sérico de cálcio, que diminui a excreção de fosfato tanto por inibir a secreção de PTH quanto por diminuir a função renal devido à vasoconstrição renal direta.

         Uma doença genética a ser citada é a calcinose tumoral familiar. É uma rara condição de caráter autossômico recessivo, caracterizada por hiperfosfatemia causada por aumento no transporte de fosfato no túbulo proximal, muitas vezes em associação com aumento do calcitriol sérico. Estes pacientes acabam tendo uma combinação de hiperfosfatemia com níveis normais de cálcio resultando em um alto produto cálcio X fósforo, o que leva a um maior depósito de fosfato de cálcio na pele e no subcutâneo.

 

Pseudo-hiperfosfatemia

         Pseudo-hiperfosfatemia pode ser causada por interferentes na análise laboratorial. As causas mais importantes são hiperglobulinemia, hiperlipidemia, hemólise e hiperbilirrubinemia. Algumas drogas associadas são a anfotericina B lipossomal, rt-PA e heparina. A causa mais comum é hiperglobulinemia, que ocorre em casos de mieloma múltiplo, macroglobulinemia de Waldenström e gamopatia monoclonal.

 

Tratamento

         Existe uma variação na conduta relacionada a casos crônicos e agudos.

         Em casos agudos, a hiperfosfatemia tende a se resolver em até 12 horas com restrição dietética e antiácidos (hidróxido de alumínio), desde que a função renal esteja preservada. Outra opção é aumentar a excreção renal fazendo uma hiper-hidratação do doente. Em casos de disfunção renal, principalmente se o paciente tiver uma hipocalcemia sintomática associada, é possível indicar hemodiálise.

         Para situações crônicas, o que é mais comum em doentes com insuficiência renal crônica e com calcinose tumoral familiar, o tratamento consiste em diminuir a absorção intestinal de fosfato utilizando um quelante de fósforo, sendo o mais usado em nosso meio o sevelamer.

         As formas de uso do sevelamer são mostradas nas Tabelas 1 e 2.

 

Tabela 1. Dose inicial em adultos (administrar junto às refeições)

Concentração sérica de fósforo (mg/dL)

Dose inicial de sevelamer

> 5,5 e < 7,5

800 mg, 3 vezes/dia

> 7,5 e < 9

1,2 a 1,6 g, 3 vezes/dia

> 9

1,6 g, 3 vezes/dia

 

Tabela 2. Dose ajustada em pacientes em hemodiálise

Concentração sérica de fósforo (mg/dL)

Dose inicial de sevelamer

< 3,5

Diminuir a dose em 400 ou 800 mg por refeição

3,5 a 5,5

Manter a dose

> 5,5

Aumentar a dose em 400 ou 800 mg por refeição

A dose deve ser ajustada até que se atinja a concentração < 5,5 mg/dL. Aumentar ou reduzir as doses em 400 ou 800 mg (1 comprimido ou cápsula) por refeição, em intervalos de 2 semanas.

 

         Para o hipoparatireoidismo, recomenda-se tratamento com reposição oral de cálcio e vitamina D (ou calcitriol), que levam à diminuição do fosfato sérico por um mecanismo pouco compreendido. Nos casos de calcinose tumoral familiar, além de tentar diminuir a absorção intestinal de fósforo, recomenda-se aumentar a excreção urinária de fosfato por meio da administração diária de acetazolamida.

 

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