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Linfocitose

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 11/10/2017

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Os linfócitos são células brancas ou leucócitos que têm a função de facilitar a imunidade humoral e celular contra proteínas e patógenos. A linfocitose é a contagem aumentada de linfócitos, sendo definida como uma contagem absoluta de linfócitos superior a 4.000 células/mm3, embora, por vezes, sejam utilizados valores de limiar um pouco mais elevado, como 5.000 células/mm3.

Para a sua definição, é utilizado o número absoluto de linfócitos em vez da porcentagem relativa dos linfócitos em relação aos leucócitos totais. A contagem absoluta de linfócitos é bem maior na infância, sendo que, em neonatos, podem ser encontradas contagens superiores a 15.000 células/mm3 sem que isso represente anormalidade.

Os linfócitos podem ser divididos em:

               linfócitos T, que representam 70 a 80% dos linfócitos ? sendo, ainda, subdivididos em T helper ou CD4 (representando 60 a 70% dos linfócitos T) e linfócitos citotóxicos, ou supressores, ou CD8 (representando 30 a 40%);

               linfócitos B, que representam 10 a 20% dos linfócitos;

               células natural killer (NK), representando 5 a 10% dos linfócitos.

 

A linfocitose é dividida em:

               linfocitose reativa ou racional ? quando existe predomínio de linfócitos reativos associados a infecções como a mononucleose;

               linfocitose clonal ? que ocorre, em particular, em pacientes com doenças linfoproliferativas agudas ou crônicas.

A caracterização de marcadores de superfície celular é valiosa para distinguir a linfocitose primária (leucêmica) da linfocitose secundária (reativa). A melhora nas técnicas de citometria e nos reagentes permitiram que laboratórios clínicos realizassem imunofenotipagem por citometria para distinguir a doença linfoproliferativa benigna da neoplásica. A análise para imunoglobulina ou a reordenação de genes de receptores de células T também pode fornecer evidência de células B monoclonais ou proliferação de células T.

 

linfocitose Primária

 

A linfocitose primária ou clonal representa as condições associadas com um aumento no número absoluto de linfócitos secundário a um defeito intrínseco na população de linfócitos expandidos, representando causas malignas ou pré-malignas de linfocitose. Essas condições também são referidas como desordens linfoproliferativas, sendo, mais frequentemente, secundárias à acumulação neoplásica de células B monoclonais, células T, células NK ou células menos diferenciadas da linhagem linfoide.

Embora os pacientes com linfocitose secundária à doença linfoproliferativa, em geral, mantenham contagens anormais de linfócitos que aumentam ao longo do tempo, essa resposta não é universal. Os indivíduos com leucemia linfocítica granular podem ter apenas linfocitose transitória induzida pelo estresse ou pelo exercício.

O advento de técnicas de citometria e de diagnóstico por biologia molecular identificaram uma síndrome em pacientes que têm populações expandidas de células B monoclonais sem outros sinais ou sintomas clínicos associados. Essa condição é a linfocitose monoclonal de células B (LMB).

Utiliza-se uma contagem absoluta de células B inferior a 5.000 células/mm3 para distinguir a LMB da leucemia linfocítica crônica (LLC). O limiar é arbitrário e não é traçado com base em dados objetivos de desfechos clínicos diferentes entre as duas condições; para o diagnóstico, o ideal é documentar a persistência da linfocitose por, pelo menos, 3 meses consecutivos.

A LMB pode ser diagnosticada em duas situações: em pacientes com contagem de linfócitos através de um exame de triagem ou durante uma avaliação clínica de pacientes com linfocitose. Os pacientes com LMB detectada por exame de rastreamento normalmente têm menos de 500 células B/µL monoclonais, sendo diagnosticada a doença quando são utilizadas técnicas de citometria de alta sensibilidade em famílias com parentes de primeiro grau com LLC.

A prevalência de LMB aumenta com a idade ? de 2,1% em indivíduos entre 40 e 60 anos até 5% em indivíduos com mais de 60 anos, ocorrendo em cerca de 4% da população saudável. A análise celular desses pacientes mostrou oligoclonalidade, sugerindo um modelo de progressão gradual para LLC. A LMB também foi detectada em doadores de sangue, com uma prevalência de 6,0 a 8,3% em doadores com idade de 45 anos ou mais.

Um estudo prospectivo avaliou marcadores prognósticos clássicos e novos (estado mutacional e anomalias cromossômicas do IGHV). Não foram encontradas diferenças significativas em desfechos clínicos e no uso de ?-globulina venosa para infecções de repetição nesses pacientes.

Dada a gravidade de um diagnóstico de LLC, os pesquisadores têm procurado avaliar como o clone de células B se relaciona com o desfecho clínico de desenvolvimento em LLC 16,18, mostrando que o risco de progressão com necessidade de tratamento para LLC é de 1 a 2% ao ano, em comparação com 5 a 7% ao ano para indivíduos com LLC estágio 0 de RAI.

Em contraste com essa progressão quantitativa para LMB clínica, a progressão para LLC é extremamente rara entre os pacientes nos quais é realizado o rastreamento da LMB. Além disso, um estudo de coorte mostrou que a LMB clínica era um fator de risco independente para hospitalização por infecção e que controlava a idade e o gênero em comparação com uma coorte de controle.

Para os indivíduos com LMB sintomática, são indicados a realização de exame físico e contagens sanguíneas completas por um hematologista a cada 6 a 12 meses; indicados enquanto intervalos de seguimento mais longos de 12 a 18 meses, sendo recomendados na triagem para LMB assintomática.

São considerados critérios diagnósticos para a LMB sintomática:

               população monoclonal de linfócitos B <5.000 células/mm3;

               monoclonalidade determinada por dosagem de cadeias leve de imunoglobulinas, com relação k/? >3/1 ou <0,3/1;

               ausência de sintomas sistêmicos de doença linfoproliferativa, como linfadenomegalia; hepatoesplenomegalia, febre e sudorese noturna;

               ausência de doenças autoimunes ou infecciosas associadas.

 

A linfocitose persistente policlonal dos linfócitos B (PPBL) é definida como um aumento crônico e moderado na contagem absoluta de linfócitos policlonais, com mais de 4.000 células/mm3 sem evidência de infecção ou outras condições que poderiam aumentar a contagem de linfócitos.

A PPBL cursa também com aumento policlonal de imunoglobulina M (IgM). Esse tipo de linfocitose é um distúrbio raro que afeta, na maior parte, mulheres de meia-idade e está associado com o tabagismo; caracteriza-se pela expansão persistente das células B de imunoglobulina CD27 e pela presença de linfócitos binucleados circulantes. Esses pacientes têm um acúmulo de células B policlonais que apresentam aparência binucleada no sangue periférico.

As características morfológicas específicas preditivas do diagnóstico incluem citoplasma vacuolizado basofílico e alterações monocitoides. A contagem média de linfócitos é de 5.500 células/mm3, e a doença tem um curso estável por anos, tendo patogênese desconhecida. O gênero e o genótipo podem ser importantes na patogênese, já que os pacientes são, mais comumente, mulheres de meia-idade.

Além disso, há casos compartilhados entre gêmeos idênticos e em famílias. A avaliação de familiares de primeiro grau de indivíduos com esse tipo de linfocitose tem identificado novos pacientes com critérios para seu diagnóstico ou com aumento na IgM sérica, sugerindo uma possível contribuição hereditária para a patogênese. Os pacientes podem ter características semelhantes às dos indivíduos com várias malignidades de células B monoclonais.

Uma manifestação ocasional da PPBL é a presença de anemia, de trombocitopenia e de esplenomegalia com um excesso de linfócitos B policlonais que parecem semelhantes em morfologia e fenótipo imune às células B neoplásicas na leucemia de células pilosas. Ainda que a linfocitose, em geral, não seja progressiva, a maioria dos pacientes tem um pequeno número de células B sanguíneas com anormalidades cromossômicas.

Outras causas de linfocitose policlonal incluem a LLC, a doença linfoproliferativa com linfócitos granulares, o linfoma não-Hodgkin e a leucemia linfoblástica aguda, as quais devem ser abordadas em revisões específicas de doenças linfoproliferativas agudas ou crônicas.

 

linfocitose Secundária (Reativa)

 

A linfocitose pode ser secundária a diversas condições com uma resposta fisiológica ou patológica à infecção, a toxinas, citocinas ou fatores desconhecidos. As causas de linfocitose reativa mais comuns são as infecções virais, dentre as quais a principal é a mononucleose infecciosa. Nos casos de mononucleose secundária à infecção pelo vírus Epstein-Barr (EBV), os linfócitos atípicos consistem, normalmente, em populações policlonais de células T CD8, que são estimuladas em resposta a células B infectadas com EBV.

Um estudo prospectivo avaliou estudantes universitários para determinar a incidência, os fatores de risco e os correlatos virológicos e imunológicos da gravidade da infecção por EBV. Durante um seguimento de 3 anos, dos estudantes com sorologia negativa para EBV, 77% dos que apresentaram infecção com linfocitose tinham mononucleose infecciosa. A gravidade da doença correlacionou-se tanto com a carga de EBV no sangue quanto com a linfocitose.

Outras doenças virais que cursam comumente com linfocitose incluem a infecção pelo vírus da imunodeficiência adquirida (HIV), citomegalovírus, sarampo, influenzavírus, hepatites virais, adenovírus, vírus Cocksackie, poliovírus e vírus T linfotrópico humano (HTLV-1).

A linfocitose infecciosa aguda é uma síndrome que ocorre em crianças com idades entre 2 e 10 anos. Caracteriza-se pelo aumento dos linfócitos sanguíneos de 20 a 30.000 células/mm3 e, ocasionalmente, até 100.000 células/mm3, podendo ser confundida com leucemia aguda. Os linfócitos podem variar de tamanho, mas são semelhantes aos linfócitos normais do sangue. Os pacientes geralmente são assintomáticos, mas podem apresentar febre, dor abdominal ou diarreia.

A linfonodomegalia e a esplenomegalia não ocorrem, e o soro do doente é, em geral, negativo para os anticorpos heterófilos encontrados em pacientes com mononucleose infecciosa causada pelo EBV. A doença assemelha-se à mononucleose infecciosa causada por outros vírus que não o EBV, como o citomegalovírus. Os sintomas clínicos duram alguns dias, mas a linfocitose pode persistir por várias semanas.

A eosinofilia pode estar presente. O exame da medula óssea de alguns pacientes tem mostrado aumentos mínimos nos linfócitos em alguns casos; entretanto, uma infiltração significativa por linfócitos também tem sido observada. Em alguns casos, a linfocitose foi encontrada em associação com a infecção aguda por vírus Cocksackie.

Um aumento acentuado no número de linfócitos ocorre em pacientes infectados com a bactéria gram-negativa Bordetella pertussis, que causa a coqueluche. Apesar de ser uma infecção bacteriana, a doença cursa com linfocitose com contagens de linfócitos absolutos variando de 8.000 células/mm3 até mais de 50.000 células/mm3, envolvendo todos os subgrupos de linfócitos, com uma média de 5.000 a 6.000 células/mm3.

Uma proporção notável de linfócitos tem núcleos clivados, característicos das células em casos de coqueluche. A linfocitose resulta sobretudo da falha dos linfócitos em deixar o sangue por causa da toxina pertussis, que é liberada pela bactéria. A toxina pertussis é uma adenosina difosfato ribosilase que modifica as proteínas G em linfócitos inibindo as citocinas que fazem a migração dos linfócitos para tecidos linfoides. A linfocitose granular de células grandes resulta de expansões de células NK, células T CD8+ ou, mais raramente, células T CD4+.

A forma mais comum, a linfocitose, é secundária às células CD3-CD16 + CD56 + NK, e é denominada linfocitose NK, na qual a contagem de células NK aproxima-se de 4.000 células/mm3. Todavia, às vezes, pode ser superior a 15.000 células/mm3 ? caso existam rearranjos celulares, a doença é denominada de leucemia granular (LG), que é uma desordem heterogênea caracterizada por um aumento no número de linfócitos granulares grandes do sangue entre 2.000 e 20.000 células/mm3 por mais de 6 meses sem uma causa claramente identificada.

A doença da arranhadura do gato também é associada à linfocitose significativa; ocorre secundária à bactéria Bartonella henselae e cursa com uma lesão por inoculação e linfonodomegalia local; apresenta linfócitos atípicos grandes e cursa associada com eosinofilia leve e, ocasionalmente, com anemia e monocitose.

A linfocitose por estresse tem sido identificada como uma causa comum de linfocitose em pacientes admitidos em hospital e é um indicador de alta mortalidade (até 50% em algumas séries). Tanto o trauma quanto o estresse não traumático têm sido associados à linfocitose.

O trauma, a cirurgia, a insuficiência cardíaca aguda, o choque séptico, o infarto agudo do miocárdio, a crise álgica em pacientes com anemia falciforme ou o estado de mal epilético podem estar associados a uma contagem elevada de linfócitos, ou superior a 5.000 células/mm3, podendo reverter ao normal ou para níveis abaixo do normal dentro de horas.

O aumento da contagem de linfócitos aparece imediatamente após o evento e parece secundário à redistribuição de linfócitos aos principais subgrupos de linfócitos. Uma linfocitose transitória pode ser induzida pela redistribuição de subgrupos de leucócitos tanto física quanto psíquica.

Caracteristicamente, duas fases são reconhecidas: na primeira, com uma descarga de catecolaminas, ocorre uma rápida mobilização de linfócitos (<30min), seguida por um aumento no número de granulócitos com diminuição do número de linfócitos. Reações de hipersensibilidade tardia, como no caso de picadas de insetos, especialmente mosquitos, podem estar associadas a uma grande linfocitose linfocítica granular e adenopatia.

As reações a medicamentos idiossincráticos também podem estar associadas à linfocitose subaguda 2 a 8 semanas antes da administração do fármaco responsável. Pode ser induzida uma síndrome de tipo mononucleose infecciosa em alguns pacientes por sulfapiridina ou sulfassalazina. A síndrome da reação a medicações com eosinofilia e sintomas sistêmicos (em inglês, drug rash with eosinophilia and systemic symptoms [DRESS]), que é associada à eosinofilia e ao rash cutâneo, também pode cursar com linfocitose significativa.

Os pacientes com linfocitose podem ter uma doença neoplásica subjacente, sobretudo aqueles com timoma maligno; podem ter uma linfocitose policlonal de células T, que se considera secundária à liberação aberrante de hormônios tímicos pelo epitélio tímico neoplásico. Uma linfocitose ou plasmocitose reativa pode ser detectada em pacientes com leucemia mieloide aguda ou mastocitose sistêmica.

Os pacientes com tumores sólidos também podem desenvolver linfocitose após a quimioterapia do câncer; podem desenvolver linfocitose policlonal após a esplenectomia. Uma contagem absoluta de linfócitos variando de 4.000 a 8.000 células/mm3, o que é observado meses após a esplenectomia e pode persistir por períodos prolongados (por exemplo, mais de 50 meses).

Uma linfocitose reativa costuma estar associada a muitas infecções virais e certas infecções bacterianas que, se prolongadas, podem resultar em linfocitose subaguda ou crônica. A toxoplasmose é, em particular, associada à linfocitose. Após a esplenectomia, um aumento no número de linfócitos com contagens entre 5.000 e 9.000 células/mm3 tem sido descrita com frequência.

Os indivíduos com linfocitose significativa, isto é, acima de 4.000 células/mm3, são avaliados apenas com história e exame físico. A presença de fatores como aumento de risco para doenças potencialmente graves inclui contagens de linfócitos >5.000 células/mm3, aumento progressivo da contagem de linfócitos, morfologia sugestiva de malignidade, citopenias e hepatoesplenomegalia.

Na presença desses achados, a avaliação citológica e a realização de citometria de fluxo podem ajudar no diagnóstico diferencial, sendo que a avaliação de linfonodos e da medula óssea deve ser reservada para os casos duvidosos.

 

Referências

 

1-Vasu S, Caligiuri MA. Lymphocytosis and Lymphocytopenia in Williams Hematology 2016.

 

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