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tabagismo

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 20/10/2017

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Entre todas as causas preveníveis de mortalidade, o tabagismo, certamente, é a maior delas. Nos EUA, cerca de 20% da população em geral usam o tabaco atualmente, em comparação com 47%, em 1965 - resultado do efeito das campanhas educacionais. O uso mais comum do tabaco é na forma de cigarros (>90%), embora haja outras formas, incluindo charutos e tabaco sem fumaça. A nicotina é o ingrediente ativo que atua como um reforço para uso repetido para todas as formas de tabaco.

Apesar das quedas na incidência do tabagismo desde 1965, quando os malefícios do tabagismo se tornaram mais evidentes, a prevalência do tabagismo foi substancialmente reduzida, mas essa redução parece ter diminuído nos últimos anos, provavelmente porque os restantes 20% dos fumantes são refratários ao tratamento do tabagismo.

Aproximadamente, 450 mil pessoas, nos EUA, morrem a cada ano como resultado do tabagismo, com doenças médicas evitáveis, incluindo câncer de pulmão, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), doença cardiovascular e acidente vascular cerebral. Os custos econômicos e de saúde do uso do tabaco excedem 400 bilhões de dólares anuais. Além disso, os riscos para a saúde do fumo ambiental do tabaco tornaram-se cada vez mais claros, levando ao desenvolvimento de proibições generalizadas de tabaco em lugares públicos.

Estima-se que cerca de 1,1 bilhão de pessoas usam tabaco regularmente no mundo. O tabagismo está aumentando rapidamente nos países em desenvolvimento, e calcula-se que o consumo de cigarros causará em torno de 450 milhões de mortes em todo o mundo nos próximos 50 anos. Nesse contexto, o tabagismo ocorre em uma idade mais jovem, estando em ascensão as taxas de tabagismo em mulheres e havendo um número maior de fumantes com um status socioeconômico menos favorecido.

Cerca de dois terços dos tabagistas referem que gostariam de interromper o hábito, e 50% admitem que tentaram interromper o hábito no último ano, o que mostra que intervenções podem ser bem-sucedidas; entretanto, apenas 3 a 6% dos tabagistas que tentaram fazê-lo sem assistência médica continuam abstinentes 1 ano após a tentativa; com o tratamento médico, esses índices aumentam para 25 a 35% em 6 meses.

 

Patologia

 

A nicotina é o principal componente aditivo do tabaco, com contribuições de cerca de 4 mil outros componentes não nicotínicos do cigarro. O principal sítio de ação da nicotina é o receptor de acetilcolina nicotínico a4ß2 (nAChR). A ativação desses receptores conduz canais de íons Na +/Ca2 + e leva à despolarização de membranas neuronais.

Em baixas concentrações de nicotina, predominam a estimulação do receptor e a liberação de dopamina. Em concentrações mais elevadas de nicotina, ocorre a dessensibilização a4ß2 nAChRs e a ativação predominante de receptores nas projeções glutamatérgicas. Dentro de milissegundos da ativação por nicotina, os receptores se dessensibilizam. Na abstinência durante a noite, o receptor nAChRs se reestrutura. Essas alterações podem explicar por que a maioria dos fumantes relatam que o primeiro cigarro pela manhã é o mais satisfatório.

 

Características Clínicas

 

A maioria dos fumantes consome cigarros diariamente e possui algum grau de dependência fisiológica da nicotina; outros não têm padrão de uso diário. Os usuários, normalmente, descrevem sentimentos de alerta, relaxamento e “satisfação” ao fumarem; além disso, sabe-se que a nicotina tem efeitos estimulantes e ansiolíticos. A estimulação das vias aéreas é um aspecto importante do comportamento do tabagismo, e os aditivos, como o mentol, aumentam a experiência aumentando o sabor.

Além do reforço positivo, retirada e ânsia, existem vários efeitos secundários da nicotina e do tabagismo que podem contribuir para manutenção do hábito, incluindo modulação do humor, redução do estresse e controle de peso. Além disso, esses condicionamentos podem induzir o desejo de fumar até mesmo por períodos prolongados de abstinência.

O DSM-5 de 2013 da Associação Americana de Psiquiatria utiliza o termo transtorno do tabagismo. O transtorno do uso do tabaco é estabelecido clinicamente por documentação histórica de dois dos seguintes critérios:

-Uso do tabaco em grandes quantidades em um período determinado.

-Desejo persistente ou tentativas sem sucesso para reduzir ou controlar o uso do tabaco.

-Muito tempo gasto em atividades necessárias para obter ou usar tabaco.

-Presença de desejo, forte ou não, de usar tabaco.

-Uso recorrente, resultando em não cumprimento de obrigações importantes no trabalho, escola ou família.

-Consumo contínuo de tabaco, apesar de persistentes ou recorrentes problemas sociais ou interpessoais causados ou exacerbados pelos efeitos do tabaco.

-Importantes atividades sociais, ocupacionais ou recreativas não realizadas ou reduzidas por causa do uso do tabaco.

-Uso recorrente do tabaco em situações em que é fisicamente perigoso.

-Consumo contínuo de tabaco apesar do persistente ou recorrente efeito físico ou psicológico, problemas psicológicos causados ou exacerbados pelo seu uso.

-Tolerância, definida pela necessidade de quantidades marcadamente aumentadas de tabaco para atingir os efeitos desejados, ou efeitos marcadamente diminuídos com o uso continuado da mesma quantidade.

-Efeitos de abstinência determinados por sintomas característicos, incluindo quatro dos seguintes: irritabilidade, ansiedade, dificuldade de concentração, aumento do apetite, agitação, humor disfórico, insônia; uso do tabaco (ou nicotina) para aliviar ou evitar sintomas de abstinência.

Para os fumantes que interromperam o uso do tabaco, a remissão é classificada de inicial (entre 3 e 12 meses de abstinência) ou sustentada (>12 meses de abstinência). Além disso, a gravidade atual do transtorno do tabagismo é codificada como leve (2 ou 3 sintomas), moderada (4 ou 5 sintomas) ou grave (6 ou mais sintomas).

A maioria dos tabagistas fisiologicamente dependentes afirma que fuma seu primeiro cigarro do dia dentro dos primeiros 5 minutos do despertar. O Teste de Fagerstrom avalia o grau de dependência de nicotina. O desejo e a retirada de nicotina podem ser monitorados de forma confiável usando escalas validadas.

As complicações do tabagismo são bem conhecidas, sendo marcante o seu efeito para a aceleração da aterosclerose. Ainda assim, um estudo demonstrou que 60% dos tabagistas relataram que não acreditam que o tabaco faça mal a eles. Fumantes de mais de 20 cigarros ao dia têm risco 6 vezes maior em mulheres e 3 vezes maior em homens de apresentar eventos cardiovasculares, com o efeito protetor do estrógeno aparentemente desaparecendo em mulheres pré-menopausa tabagistas.

O tabagismo representa 36% do risco atribuível populacional de eventos cardiovasculares. O risco existe mesmo com consumo de pequenas doses do tabaco, com estudos demonstrando que fumantes de menos de 5 cigarros ao dia já apresentam risco bem maior de eventos cardiovasculares. A redução do risco cardiovascular diminui rapidamente com a abstinência do cigarro, e essa diminuição aumenta com o tempo de abstinência, com reduções do risco variando de 10 a 50%.

Em relação ao risco de doença pulmonar, sabe-se que o tabagismo é responsável direto por 70 a 80% dos casos de DPOC e os estudos mostram que o declínio da função pulmonar diminui com a interrupção do hábito, sendo que as provas de função pulmonar apresentam leve melhora no primeiro ano após a interrupção do tabagismo, e a curva de piora da função pulmonar esperada com o tempo diminui após a descontinuação do hábito de fumar. O tabagismo é ainda associado a um risco 20 vezes maior de morte por câncer de pulmão, além de outras neoplasias malignas e condições.

 

Medidas para a Interrupção do Hábito

 

A US Preventive Services Task Force recomenda que todos médicos aconselhem seus pacientes a interromperem o hábito do tabagismo e, se possível, realizarem intervenções que auxiliem na abstinência do tabagismo. Nem todos os indivíduos, quando aconselhados em relação à interrupção do hábito, estão preparados para tanto.

Apesar disso, estudos mostram que o simples aconselhamento médico de menos de 5 minutos de tempo consegue aumentar as taxas de abstinência em números absolutos que podem chegar a 5%. Para uma orientação adequada, é fundamental que o médico saiba o tipo de uso (cigarro, charuto, entre outros), a quantidade e o comportamento do paciente em relação ao hábito do tabagismo.

Os tratamentos comportamentais podem facilitar a motivação para interrupção do tabagismo; é importante dar ênfase aos aspectos sociais e contextuais do tabagismo. Com o uso de terapia comportamental, as taxas de abandono em 6 meses podem chegar a 20 a 25%, apresentando aumento de até duas vezes em relação ao aconselhamento médico padrão.

O aconselhamento médico, idealmente, deve utilizar uma abordagem que é definida como a dos “5 As”. Em primeiro lugar, se verifica se os pacientes apresentam o hábito e qual a sua intensidade, por quanto tempo e se desejam parar de fumar (ASK); posteriormente, deve-se avaliar a intensidade do hábito, em que momento acende o primeiro cigarro (Acess). O próximo passo é aconselhar em relação à interrupção do hábito, discutindo os riscos do tabagismo e os benefícios com sua interrupção (Advice).

Posteriormente, os pacientes devem ser preparados para interrupção do hábito (Assist). Uma medida que pode ser adotada é o fornecimento de material de autoajuda ? uma forma de intervenção breve que pode aumentar a motivação para parar de fumar. Vários estudos recentes documentaram que intervenções comportamentais mínimas, tais como grupos de apoio comunitário, consultoria telefônica e materiais de autoajuda personalizados, podem aumentar as taxas de cessação do tabagismo.

Há algumas mudanças pequenas de hábitos que podem ser bastante úteis, como, por exemplo, no caso do paciente que costuma fumar após tomar café, propor que ele substitua o café por suco. Essas, entre outras, pequenas intervenções podem aumentar de forma significativa as taxas de abstinência. Os pacientes devem ser avaliados em relação a que estágios estão em relação à possibilidade de parar de fumar.

O Quadro 1 mostra os estágios dos pacientes na interrupção do hábito de fumar.

 

Quadro 1

 

ESTÁGIOS DOS PACIENTES NA INTERRUPÇÃO DO HÁBITO DO tabagismo

1

Pré-contemplativo (não considera parar de fumar)

2

Contemplativo (considerando uma tentativa de parar de fumar)

3

Preparação (já fazendo preparativos para uma tentativa de parar de fumar)

4

Ação (já em tentativa de parar de fumar)

5

Manutenção (adotando medidas para a não recorrência do tabagismo)

 

Estabelecer uma data para parar de fumar em 2 a 4 semanas é uma medida recomendada, e pode-se iniciar uma redução progressiva do número de cigarros nesse período. Nesse período, o médico deve fazer seguimento próximo (Arrange), se possível, com contatos próximos pessoais ou por telefone e, idealmente, com contato na primeira semana após a data estipulada para parar de fumar. Caso o paciente não tenha tido sucesso, é fundamental estabelecer os motivos e obstáculos do processo, bem como uma data para outra tentativa.

A terapia cognitivo-comportamental (TCC), por meio da qual os pacientes aprendem a antecipar situações nas quais eles são susceptíveis de fumar para poder planejar como lidar com elas usando técnicas comportamentais e cognitivas, tem alguma eficácia em contribuir para a abstinência ao tabaco.

Um grande número de tabagistas apresenta recidiva do uso do tabaco em prazo de 6 meses após o abandono. Essa é a fase de manutenção, que é particularmente difícil; alguns podem apresentar sintomas de abstinência da nicotina; esses sintomas têm um pico com 3 dias após a interrupção do tabaco. Os sintomas incluem aumento de apetite e peso, alterações de humor, insônia, irritabilidade e ansiedade, que podem ser mitigados com aconselhamento, terapia comportamental e tratamentos farmacológicos.

A acupuntura é uma opção para controlar sintomas de abstinência e aumentar as taxas de sucesso da interrupção do hábito, mostrando alguma eficácia. A hipnose, por sua vez, ainda é uma abordagem sem evidências suficientes para ser recomendada como estratégia nesses casos.

 

Tratamentos Farmacológicos para Interromper o tabagismo

 

Existem três tipos de tratamentos farmacológicos para a cessação do tabagismo aprovados nos EUA pela Food and Drug Administration (FDA), incluindo a terapia de reposição de nicotina (TRN), o uso de bupropiona de libertação sustentada e de vareniclina.

O objetivo da TRN é aliviar os sintomas de abstinência da nicotina em pacientes que param de fumar ou diminuem o número de cigarros; ela depende da absorção sistêmica e, portanto, não produz altos níveis séricos de nicotina rapidamente da mesma forma que os alcançados quando a fumaça do cigarro é inalada. Assim, é improvável que os indivíduos se tornem adictos pela TRN.

As evidências sugerem que o tratamento com TRN aumenta a chance de interromper o tabagismo em 2 vezes. A utilização do adesivo com nicotina, enquanto o paciente ainda faz uso de cigarro, não parece aumentar o risco de complicações.

Assim, o uso da TRN antes da data firmada de abandono do hábito pode realmente facilitar a cessação do tabagismo em comparação com a administração no momento do abandono do tabagismo. Todas as formas comercialmente disponíveis de TRN aumentam as taxas de abandono de, aproximadamente, 1,5 a 2,5 vezes em comparação com o placebo.

A nicotina ingerida por via oral é altamente metabolizada na primeira passagem através do fígado. A goma de nicotina evita esse problema através da absorção bucal; ela contém 2 ou 4mg de nicotina que podem ser liberadas de uma resina por mastigação, com dose de 4mg recomendada para fumantes de mais de 1 maço/dia e de 2mg para aqueles de menos de 1 maço/dia (20 cigarros).

A duração original recomendada do tratamento é de 3 meses, embora, de acordo com muitos especialistas, o tratamento mais longo seja mais eficiente. A absorção de nicotina pela goma ocorre 30 minutos após o início da sua utilização. A absorção de nicotina na mucosa bucal é diminuída por um ambiente ácido, e os pacientes não devem ingerir líquidos (por exemplo, soda, suco) antes, durante ou após o uso de goma.

Vários estudos controlados com placebo estabeleceram a segurança e a eficácia da goma de nicotina para parar de fumar. Os efeitos secundários são raros e incluem aqueles de origem mecânica (por exemplo, mastigação dificultada, maxilar dolorido) ou de origem farmacológica local (queimação oral, irritação da garganta). A tolerância se desenvolve, para a maioria dos efeitos colaterais, durante a primeira semana.

As pastilhas fornecem nicotina (preparações de 2 e 4mg) por absorção oral. Pode ocorrer irritação leve da garganta. As pastilhas de nicotina foram superiores ao placebo, com uma redução significativa do desejo de fumar, e em sintomas de abstinência de nicotina. Além disso, as doses elevadas de pastilhas podem ser mais significativas em fumantes altamente dependentes.

Curiosamente, a combinação de pastilhas de nicotina e adesivo transdérmico de nicotina pode levar a maiores taxas de abandono a longo prazo em comparação com monoterapia NRT e bupropiona. A dose de 4mg é recomendada para aqueles que costumam fumar seu primeiro cigarro até 30 minutos depois de acordar e a dose de 2mg, para os demais casos.

As formulações de adesivos transdérmicos de nicotina são a forma mais simples e contínua de reposição de nicotina, aproveitando a rápida absorção pela pele. Três das formulações são para uso de 24 horas, e uma é para uso de 16 horas. As doses iniciais são de 21mg/24h e 14mg/24h. A dose de 21mg/24h é, normalmente, utilizada em pacientes que fumam mais de 10 cigarros/dia; para os que fumam menos de 10 cigarros/dia e pesam menos de 45kg, a dose recomendada é de 14mg/24h.

Os adesivos são aplicados todas as manhãs. A nicotina administrada por adesivos é lentamente absorvida de modo que, no primeiro dia, os níveis de nicotina venosa aumentam 6 a 10 horas após a administração. Após 4 a 6 semanas do uso de alta dose, as doses são diminuídas para em média 14mg em 24 horas com diminuição progressiva da dose.

A maioria dos estudos sugere que a cessação abrupta do tratamento não causa abstinência significativa. Assim, diminuir a dose pode não ser necessário. A duração total recomendada do tratamento é de 6 a 12 semanas, sendo que, de acordo com alguns estudos, a terapia mais prolongada aumenta as taxas de sucesso.

O spray nasal de nicotina é uma solução de nicotina utilizada por jato nasal. Cada jato entrega cerca de 1mg de nicotina por administração, e a dose inicial é de 1 a 2 jatos/h, por 3 meses. Essa formulação produz um aumento mais rápido nos níveis de nicotina do que a goma de nicotina. O pico sérico de nicotina ocorre dentro de 10 minutos, e os níveis de nicotina são cerca de dois terços dos níveis entre cigarros.

Os fumantes podem usar o spray nasal conforme necessário até 30 vezes/dia durante 12 semanas. Estudos controlados estabeleceram a segurança e a eficácia do spray nasal para a cessação do tabagismo. Recomenda-se o uso por 3 a 6 meses. Os principais efeitos colaterais são irritação nasal e da garganta, rinite, espirros e tosse.

Os inaladores de nicotina são outra opção terapêutica, tendo efeitos mais rápidos do que a goma, mas menos rápidos do que o spray nasal de nicotina, com níveis de nicotina no sangue de um terço dos níveis entre cigarros. A dosagem recomendada é de 6 a 16 cartuchos/dia, por 6 a 12 semanas, com redução gradual após esse período.

Desde a sua introdução em 2004, os cigarros eletrônicos são outra opção para a TRN. Seu papel no controle do tabagismo tem sido controverso, e há uma escassez de dados fortes para apoiar ou refutar a sua eficácia na retirada do tabaco e na assistência a tentativas de abandono por fumantes. Um estudo controlado randomizado recente descobriu que 13 semanas de uso de cigarro com nicotina resultaram em abstinência de tabagismo aumentada aos 6 meses, em comparação com o uso de adesivos ou placebo, embora essas diferenças não fossem significativas estatisticamente.

A literatura em geral recomenda o uso de terapia combinada de reposição de nicotina, utilizando uma combinação de reposição de nicotina de rápida com longa ação. Uma metanálise mostrou que a combinação de reposição de nicotina de rápida com a de longa ação aumenta em 30% o sucesso do tratamento.

Outra opção validada pela literatura é o uso da bupropiona, em particular nas formulações de liberação prolongada (Zyban). A medicação bloqueia a recaptação de dopamina e norepinefrina, causa um antagonismo não competitivo do receptor de acetilcolina, reduzindo os sintomas de abstinência e o desejo pelo tabaco. O mecanismo exato da ação da bupropiona no tabagismo ainda não está claro.

A dose-alvo da bupropiona na dependência de nicotina é de 300mg/dia e, em geral, é iniciada 5 a 7 dias antes da data-alvo de abandono do tabaco em dose de 150mg/dia, depois aumentada para 150mg, 2x/dia, após 3 ou 4 dias; depois desse período, o medicamento atinge níveis estáveis, podendo ser realizada a tentativa de parar de fumar.

Ao contrário da TRN, não há necessidade de os tabagistas interromperem completamente o hábito de fumar, embora muitos fumantes relatem uma redução significativa nos desejos de fumar, bem como a sensação de fissura que facilita a interrupção do tabaco no momento em que os níveis do fármaco atingem a estabilidade. Alguns reduzem gradualmente o consumo de cigarro durante várias semanas antes de deixarem de fumar com o uso da bupropiona.

Um estudo multicêntrico duplo-cego, placebo-controlado, de duração de 7 semanas, avaliou diferentes doses de bupropiona (100, 150 e 300mg/dia, 2x/dia), em combinação com aconselhamento semanal de interrupção do hábito. No seguimento de 1 ano, as taxas de interrupção foram de 11% em números absolutos maiores nos pacientes que usaram a bupropiona, ou seja, um paciente a cada 9 tratados abandona mais o hábito em comparação com o placebo em 1 ano (23% versus 12%).

O tratamento com bupropiona reduz, de forma dependente da dose, o ganho de peso associado à cessação do tabagismo e diminui bastante os sintomas de abstinência de nicotina nas doses de 150 e 300mg/dia; outros estudos mostraram resultados semelhantes. Os efeitos secundários colaterais da medicação incluem cefaleia, náuseas e vômitos, boca seca, insônia, a maioria ocorrendo durante a primeira semana de tratamento. A principal contraindicação para o uso de bupropiona é o antecedente de epilepsia, pois a medicação diminui o limiar convulsivo.

A vareniclina é outra opção de medicamento para esses pacientes, tendo ação como agonista parcial do receptor de acetilcolina, que é o maior responsável pela dependência. O tartarato de vareniclina foi aprovado como agente para interrupção do tabagismo de primeira linha pelo FDA em 2006, e no Canadá e Europa, em 2007. A dose de 2mg tem eficácia semelhante ou maior que a bupropiona em dose de 300mg/dia.

A vareniclina reduz o desejo exacerbado pelo tabaco e a satisfação com o hábito. A medicação é iniciada em dose de 0,5mg/dia, por 3 dias; posteriormente, sendo aumentada para a dose de 0,5mg, 4x/dia, por 4 dias; depois, para 1mg, 2x/dia, pelo restante das 12 semanas de tratamento. A medicação pode ser continuada por mais 12 semanas nos pacientes que tiveram sucesso em parar de fumar.

A vareniclina, em geral, é bem tolerada. Os eventos adversos mais comuns relatados foram náuseas e insônia. No entanto, desde a aprovação do medicamento, surgiram preocupações sobre os eventos neuropsiquiátricos, incluindo agitação, ideação suicida e homicida, mania e psicose. Assim, o acompanhamento próximo dos tabagistas, sobretudo aqueles com histórico de doenças psiquiátricas, era recomendado ao prescrever esse agente, mas evidências recentes indicam que o medicamento é seguro no subgrupo de pacientes com doenças psiquiátricas.

A combinação de reposição de nicotina com a vareniclina ou a bupropiona, ou a bupropiona combinada com vareniclina, pode levar a resultados de interrupção do tabagismo melhores do que a monoterapia isolada. Outras medicações podem ser utilizadas, mas com menor benefício. A nortriptilina, por exemplo, bloqueia a receptação de noradrenalina e serotonina, e reduz discretamente os sintomas de abstinência e os sintomas depressivos associados.

A clonidina também tem ação em reduzir os sintomas de abstinência da nicotina. A mecamilamina é uma medicação que antagoniza o receptor de acetilcolina e pode aumentar as taxas de cessação do tabagismo comparada à reposição de nicotina isoladamente. O naltrexona também já foi utilizado para ajudar na síndrome de abstinência de nicotina, mas há pouca evidência de seu benefício.

A cistina, que é um agonista parcial do receptor nicotínico, parece ser segura para a cessação do tabagismo, mas também há pouca evidência de benefício com o seu uso, embora uma metanálise de 2013 tenha sugerido que a medicação aumenta as taxas de abstinência em 6 meses; os seus principais efeitos colaterais são náuseas e alterações do sono. Para finalizar, pode-se dizer que o prognóstico para os pacientes que interrompem o uso do tabaco é excelente em termos de anos de vida e qualidade de vida adquirida.

 

Referências

 

1-George T. Nicottine and tobacco in Cecil medicine 25 ed 2016.

2-Babb S, Malarcher A, Schauer G, et al. Quitting Smoking Among Adults - United States, 2000-2015. MMWR Morb Mortal Wkly Rep 2017; 65:1457.

3-Rigotti NA. Strategies to help a smoker who is struggling to quit. JAMA 2012; 308:1573.

4- Behavioral and Pharmacotherapy Interventions for Tobacco Smoking Cessation in Adults, Including Pregnant Women: U.S. Preventive Services Task Force Recommendation Statement. Available at: http://annals.org/article.aspx?articleid=2443060 acessado em 22/06/2017.

5-Patel MS, Steinberg MB. In the Clinic. Smoking Cessation. Ann Intern Med 2016; 164:ITC33.

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