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Glomerulonefrite Pós-infecciosa

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 26/02/2018

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A infecção continua a ser uma causa comum de glomerulonefrite proliferativa (GNP). As biópsias renais demonstram que o mesmo agente pode induzir mais de um tipo histológico de GNP e que qualquer lesão glomerular pode ser consequência de um amplo número de patógenos microbianos. Na década de 1970, as glomerulonefrites pós-infecciosas (GNPIs) eram quase que exclusivamente associadas às glomerulonefrites agudas, complicando as infecções estreptocócicas da garganta ou da pele e a escarlatina.

No entanto, nas décadas seguintes, a epidemiologia da GNPI mudou de perfil no mundo ocidental. No entanto, em boa parte do mundo, a glomerulonefrite (GN) pós-estreptocócica continua a ser um problema de saúde pública bastante grave, sobretudo na América Latina, na África e na Europa Oriental. Qualquer GNP cuja etiologia não é clara pode ter uma origem infecciosa, mesmo que ela não seja prontamente sugerida pelo contexto clínico. Na maioria dos casos, o diagnóstico de GNPI depende de uma biópsia renal avaliada por microscopia óptica (MO), imunofluorescência (IF) e microscopia eletrônica (ME).

A glomerulonefrite pós-estreptocócica ainda continua como a maior causa de GNP no mundo, embora ocorra sobretudo em países em desenvolvimento (representando 97% dos casos), sendo em torno de 500 mil casos novos, no mundo, a cada ano. A GN pós-estreptocócica é rara antes dos 3 anos de idade, sendo duas vezes mais frequente em homens do que em mulheres.

 

Abordagem Diagnóstica

 

Uma causa bacteriana deve ser considerada em qualquer paciente com síndrome nefrítica aguda, GNP aguda ou GNP rapidamente progressiva, ou síndrome nefrótica com função renal progressivamente decrescente. Uma causa infecciosa é sugerida quando qualquer uma dessas síndromes glomerulares acompanha ou ocorre posteriormente a uma infecção bacteriana evidente.

Entretanto, a infecção pode ser oculta ou, ainda, negligenciada na história do paciente. Essas considerações justificam amplas indicações para a biópsia renal, porque os achados anatomopatológicos podem sugerir a presença de causa infecciosa.

Um exemplo é a biópsia realizada no decurso de um episódio febril que descreve lesões glomerulares fortemente sugestivas de endocardite infecciosa. A ME pode revelar lesões sugestivas de GNPI sobreposta em uma biópsia renal realizada em um paciente com outra doença glomerular identificada, por exemplo, com glomerulopatia diabética.

 

Síndrome Nefrítica Aguda

 

A síndrome nefrítica aguda é a apresentação clínica mais comum da GNPI, independentemente do organismo. Os estreptococos e estafilococos são os agentes mais comuns; mas, as síndromes nefríticas não são patognomônicas da GNPI e podem ser observadas na nefropatia por imunoglobulina A (IgA), na púrpura de Henoch-Schönlein, na glomerulonefrite membranoproliferativa idiopática (GNMP) e, algumas vezes, na GN crescêntica pauci-imune, entre outros diagnósticos.

Classicamente, a doença caracteriza-se pelo rápido aparecimento de edema, hipertensão, oligúria e urina escurecida e com baixa concentração de sódio urinário. A proteinúria significativa e a hematúria microscópica, ou macroscópica, acompanham o quadro. Em contraste com a síndrome nefrótica idiopática (doença de lesões mínimas e glomerulosclerose segmentar e focal), a expansão de volume envolve tanto os compartimentos intersticiais quanto os intravasculares.

Assim, hipertensão, aumento de tamanho cardíaco e edema pulmonar podem estar presentes, juntamente com o edema periférico. A função renal varia de normal para lesão aguda oligúrica renal. A apresentação clínica em crianças pode ser fulminante, com dor abdominal, edema cerebral agudo e convulsões.

Os fatores a seguir mostram a diferença da GNPI em idosos da doença em crianças:

               edema pulmonar agudo (causado pela sobrecarga de volume): 40% dos idosos; menos de 5% em crianças;

               proteinúria nefrótica: 20% dos idosos; menos de 5% em crianças;

               injúria renal aguda: 75% dos adultos; 35% das crianças;

               mortalidade precoce: 25% dos adultos; praticamente inexistente em crianças.

Em contraste com a nefropatia por IgA, em que a hematúria macroscópica segue imediatamente a infecção do trato respiratório superior (hematúria sinfaringítica), nas formas pós-faringite da GNPI, o episódio de hematúria é tipicamente retardado 10 a 20 dias após a infecção.

 

Glomerulonefrite Aguda ou Rapidamente Progressiva

 

A GNPI pode se manifestar como insuficiência renal aguda (IRA), que não está necessariamente correlacionada com uma lesão glomerular específica. Alguns casos com GN puramente proliferativa e exsudativa podem ser oligúricos na apresentação, embora se resolvam na grande maioria.

No entanto, a função renal severamente comprometida também pode indicar a presença de proliferação extracapilar (crescentes). Uma biópsia renal é quase sempre necessária nesse cenário, tanto para estabelecer o diagnóstico quanto para orientar o tratamento.

 

Síndrome Nefrótica e Doença Renal Progressiva

 

A hipertensão, edema na maioria dos casos, a proteinúria significativa (mais de 1,5g/dia) e a hematúria microscópica apontam para uma forma mais crônica de doença glomerular. Exceto quando a infecção causal é identificada, como na GN por shunts ou após uma doença definida, a data de início é, em geral, desconhecida.

A variante GNMP da GNPI muitas vezes leva à insuficiência renal crônica (IRC). A GN crônica com proteinúria nefrótica é uma indicação para biópsia renal quando os rins não são atróficos, pois a atrofia indica fibrose irreversível.

 

Patologia

 

As lesões glomerulares encontradas na GNPI se enquadram em três padrões microscópicos leves:

               GN exsudativa endocapilar aguda;

               GN endocapilar e extracapilar (crescêntica);

               GNMP.

 

A GN exsudativa endocapilar aguda é a clássica GN pós-estreptocócica aguda. No entanto, não há marcadores de rotina disponíveis para identificação histológica do microrganismo ofensivo, e as lesões são as mesmas na GN causada por Staphylococcus, outras bactérias e vírus. Muitos pediatras adiam uma biópsia quando o quadro clínico é típico. Essa abordagem não é padrão para adultos.

A hipercelularidade difusa envolve todos os glomérulos de modo que o diagnóstico pode ser feito em uma amostra contendo apenas alguns ou mesmo um único glomérulo. Os tufos glomerulares são muito ampliados, com poucos capilares não ocluídos e restando espaço urinário mínimo. A hipercelularidade resulta tanto da proliferação de células glomerulares residentes, sobretudo mesangiais, quanto do número de leucócitos polimorfonucleares, monócitos/macrófagos e células plasmáticas.

O antigo termo “exsudativo” refere-se à presença de abundantes células polimorfonucleares, algumas das quais podem ser eosinófilos. É possível, embora incomum, encontrar pequenas regiões focais de necrose em alguns glomérulos. Em geral, a proliferação celular pode variar desde a invasão maciça, obstruindo praticamente todo o lúmen capilar até inflamação leve, com um aumento moderado da celularidade mesangial e maior que o número normal de leucócitos polimorfonucleares (o normal é menor do que por glomérulo).

A presença de corcovas não é absolutamente patognomônica da GNPI, porém a ME pode eliminar outras etiologias como púrpura de Henoch-Schönlein e GNMP. As corcovas são especialmente proeminentes nas primeiras semanas de evolução. No entanto, as observações na MO podem ser ambíguas. A ME é, então, de valor diagnóstico, uma vez que demonstra depósitos subepiteliais e intramembranosos distintos indicativos de uma lesão glomerular pós-infecciosa.

Foram descritos dois padrões de IF:

               Padrão de guirlanda ? segue o contorno da parede capilar, com numerosas corcovas brilhantes. Essa aparência é bastante associada com proteinúria pesada;

               Padrão céu estrelado ? consiste em depósitos mais grossos, com predominância mesangial, e compreende menos corcovas. A proteinúria é menos abundante do que no tipo de guirlanda.

Ressalta-se que a ausência de componentes do complemento sobre as preparações de IF levanta fortes dúvidas sobre a origem infecciosa de uma glomerulopatia.

 

Glomerulonefrites Crescênticas

 

O quadro clássico de GN associado à infecção bacteriana sistêmica consiste de GN focal com lesões celulares e necróticas em alguns tufos glomerulares. Foi descrita inicialmente em 1900, como no curso de endocardites bacterianas subagudas. No entanto, o quadro mais comum que complica a endocardite e outras formas de septicemia, bem como os abscessos viscerais com hemoculturas negativas, consiste na proliferação endocapilar e na extracapilar.

A formação do crescente é acompanhada por edema intersticial, inflamação significativa e atrofia tubular. Os crescentes aparecem como camadas de células inflamatórias compreendendo células epiteliais parietais e macrófagos. A necrose é caracterizada pela presença de fibrina. O tamanho e a distribuição dos crescentes podem variar de um glomérulo para o outro. A IF mostra depósitos de imunoglobulina G (IgG) e C3, bem como fibrina dentro dos crescentes.

 

Glomerulonefrite Membranoproliferativa Idiopática

 

A GNMP pode ser consequência de infecção, como no caso da glomerulonefrite por shunts. As lesões compreendem a proliferação mesangial, as células polimorfonucleares exsudativas e as alterações características da membrana basal glomerular (MBG), as quais consistem nos contornos duplos causados pela interposição de células mesangiais sob a MBG, elaborando uma camada adicional de matriz mesangial manchada de prata. A presença de corcovas e os abundantes depósitos de C3 são fortemente sugestivos de uma origem pós-infecciosa desse tipo de glomerulopatia.

 

Glomerulonefrite Aguda Pós-Estreptocócica

 

A GN aguda pós-estreptocócica, ocorre devido a cepas nefritogênicas de Streptococcus pyogenes do grupo. Ela afeta sobretudo crianças e outros adultos saudáveis, incluindo os idosos. A doença é contagiosa e pode ser epidêmica. A cepa nefritogênica induz a produção de imunocomplexos com ativação de complemento e da cascata inflamatória.

O Quadro 1 mostra os três mecanismos propostos para a fisiopatologia desse tipo de GN.

 

Quadro 1

 

MECANISMOS PARA A FISIOPATOLOGIA DA GLOMERULONEFRITE AGUDA PÓS-ESTREPTOCÓCICA

                    Deposição de imunocomplexos circulantes com os antígenos bacterianos

                    Formação de imunocomplexos in situ resultantes da deposição de antígenos estreptocócicos na MBG

                    Formação de imunocomplexos in situ na MBG devido a antígenos estreptocócicos que reagem com componentes glomerulares por causa da semelhança molecular (à cardite reumática)

MBG: membrana basal glomerular.

 

Os antígenos nefritogênicos incluem o receptor de plasmina associado à nefrite (NAPIr) e a exotoxina pirogênica estreptocócica, sendo o mais provável fator envolvido.

A GN pós-estreptocócica é, na maioria das vezes, assintomática, mas a sua apresentação característica é de início rápido de síndrome nefrítica aguda de 10 a 20 dias após a infecção faríngea ou cutânea, com período latente usual de 1 a 3 semanas após faringite e 3 a 6 semanas com as infecções cutâneas. O microrganismo ofensivo nem sempre é identificado, porém os marcadores sorológicos, em geral, confirmam que o agente etiológico é o estreptococo.

A doença é caracterizada por hipocomplementemia em 90% dos casos, com ativação das vias clássicas e alternativas, levando a diminuição dos níveis de C3 e C4, seguido de normalização dentro de, aproximadamente, 4 a 8 semanas. A recuperação espontânea é a regra. A proteinúria diminui ao longo de semanas, mas a hematúria microscópica pode durar alguns meses. A GN pós-estreptocócica é, na maioria das vezes, uma doença benigna, especialmente em crianças.

Um quadro edematoso é descrito em cerca de 70% dos indivíduos, com hematúria macroscópica em 40% dos casos e hipertensão em 70% dos pacientes sintomáticos. A encefalopatia hipertensiva é incomum, embora tenha sido relatada em alguns casos. A GN com um aspecto histológico inicialmente benigno pode progredir sem remissão para GN crescêntica.

Os níveis persistentemente baixos de complemento levam semanas e meses após o episódio inicial, juntamente com a proteinúria pesada; a hematúria e a diminuição da função renal indicam que a doença não está seguindo seu curso autolimitado e está progredindo para GN crônica. Tal progressão é uma indicação para realizar biópsia renal. O exame de urina revela hematúria na maioria dos casos; a proteinúria ocorre praticamente em todos os casos, mas a proteinúria nefrótica é rara. A pesquisa de anticorpos antiestreptocócicos inclui Aslo e o anticorpo anti-hialuronidase.

Embora o prognóstico seja considerado bom, dados de estudos mostram que a GN pós-estreptocócica infantil é um fator de risco para IRC na vida adulta. O curso parece ser mais benigno em crianças do que em adultos. Estudos realizados durante epidemias determinaram que, em um número substancial de crianças afetadas, a doença renal é clinicamente silenciosa com GN detectada apenas com proteinúria e hematúria microscópica na triagem urinária.

Ainda não se sabe quantos desses casos clinicamente silenciosos podem resultar em GN crônica. O paciente que tiver sofrido um episódio de GN deve ser aconselhado a submeter-se a um exame médico anual que inclua uma avaliação mínima da pressão arterial, da proteinúria, da hematúria e da função renal.

Em caso de dúvida sobre a doença glomerular em curso, podem-se realizar exames adicionais, incluindo a biópsia renal. A GN aguda pode acompanhar a infecção com uma série de microrganismos. A GN aguda que complica a infecção estafilocócica é praticamente indistinguível da GN pós-estreptocócica ? o que se estende também para a GN causada pela maioria dos agentes etiológicos encontrados.

Conforme observado, a GN endocapilar exsudativa nem sempre resolve-se de forma espontânea. Os agentes infecciosos com mais frequência associados com GNPI são estreptococo, hepatite B, estafilococo, hepatite C, pneumococo, echovírus, Enterobacteriaceae, adenovírus, Salmonella typhi Coxsackievirus, meningococo, citomegalovírus, Treponema pallidum, vírus Ebstein-Barr, vírus Brucella, enterovírus, leptospira, vírus do sarampo, Yersinia, vírus da caxumba, Rickettsia Varicela Legionella, vírus da rubéola.

Em um estudo americano, as bactérias mais identificadas, causando glomerulonefrite, foram: estafilococo (46%), estreptococo (16%) e organismos gram-negativos. Os locais mais comuns de infecção foram: trato respiratório superior (23%), pele (17%), pulmão (17%) e válvulas cardíacas (11,6%). A glomerulonefrite crônica desenvolveu-se em 25% dos pacientes.

A GN crescêntica após sepse por endocardite infecciosa por Staphylococcus aureus tem sido reconhecida por quase um século. No entanto, sua frequência relativa, pelo menos nos países industrializados, cresceu em proporção inversa à da GN pós-estreptocócica aguda. Seu modo de aparecimento e as características clínicas são mais variadas, e a GN por estafilococos normalmente atinge pacientes de meia-idade ou idosos, sendo que 40% deles têm imunossupressão.

Os pacientes com GN por Staphylococcus aureus, em geral, apresentam as manifestações renais enquanto têm os sintomas da infecção como febre; o sítio da infecção é variável, podendo envolver pele, endocardite ou cateter venoso, mas raramente as vias respiratórias. O início pode ser anunciado pelas manifestações de síndrome nefrítica aguda ou perda rápida da taxa de filtração glomerular rápida (TFG).

A vasculite cutânea pode estar presente e o edema periférico ocorre em cerca de 50% dos pacientes, enquanto HAs de início recente em cerca de 20% dos casos. A hematúria ocorre em 98% dos pacientes, porém apenas em 15% deles é macroscópica; a leucocitúria ocorre em 65% dos indivíduos. O distúrbio pode não ser realizado até o desenvolvimento de IRC. A maioria das infecções cutâneas, dentárias e viscerais pode ser complicada por GN endocapilar e extracapilar.

Podem encontrar-se vários focos candidatos simultâneos em um paciente, cultivando organismos gram-positivos e gram-negativos. Em contraste com a GN pós-estreptocócica aguda, podem estar presentes manifestações extrarrenais, especialmente púrpura. Em um paciente febril com GN e púrpura, uma pesquisa de endocardite por ecografia transesofágica e hemoculturas repetidas é obrigatória.

Baixos níveis de complemento sérico foram encontrados em apenas 24% de 25 casos em um estudo com GN crescêntica, provavelmente indicando que a fase inicial aguda da doença tinha ocorrido no passado. Os fatores de risco para essa forma de GNPI incluem alcoolismo, abuso de substâncias tóxicas, desnutrição e baixo nível socioeconômico. Esses fatores estão associados à má higiene dentária e cutânea e à falta de acesso à assistência médica.

O prognóstico depende da gravidade da infecção, do estado imunológico e da idade do hospedeiro e dos achados na biópsia renal. A extensão da proliferação crescêntica em uma biópsia compreendendo um número suficiente de glomérulos é o melhor preditor de progressão para a doença renal terminal.

O reconhecimento precoce e a erradicação dos focos infecciosos com tratamento antibiótico e, se necessário, a cirurgia visceral ou dentária são os melhores meios de prevenir a progressão da doença renal. Ao contrário da GN pós-estreptocócica, não existem marcadores sorológicos fidedignos como o Aslo para a infecção estreptocócica.

 

Glomerulonefrite Membranoproliferativa

 

A GNMP foi considerada, por muito tempo, idiopática na maioria dos casos. Entretanto, algumas formas são evidentemente pós-infecciosas, como a nefrite por shunts. O material protético de derivações ventriculares para hidrocefalia pode ter colonização por Staphylococcus epidermidis ou, mais raramente, com outros organismos.

Entre as cepas incomuns que podem colonizar o shunt e induzir a GNMP MPGN, encontra-se o Propionibacterium - uma bactéria gram-positiva anaeróbica, de crescimento relativamente lento, tipicamente aeróbia, ligada à acne. Menos de 200 casos de nefrite por shunts foram publicados até hoje. A febre, as artralgias, a púrpura e a anemia grave caracterizam a doença.

Os exames complementares sugerem uma doença por imunocomplexos com baixos níveis de complemento sérico, anemia hemolítica induzida pelo complemento, anticorpos antinucleares, fator reumatoide e crioglobulinas. Os achados renais incluem proteinúria, hematúria microscópica e perda de TFG que pode ser rapidamente progressiva.

A biópsia renal, em geral, revela GNMP tipo I, muitas vezes com numerosas células polimorfonucleares endocapilares e abundantes depósitos de C3. A GN endocapilar e extracapilar também tem sido observada. A remoção do shunt (que é um procedimento neurocirúrgico difícil e muitas vezes complicado) e o tratamento antibiótico podem ser seguidos pela estabilização e até a regressão das lesões glomerulares.

No entanto, apenas metade dos pacientes experimenta uma remissão completa. Níveis de complemento sérico baixos estão quase sempre presentes durante a fase inicial aguda do GNPI por estafilococos, indicando o envolvimento precoce da via clássica. Na GN pós-estreptocócica, os níveis baixos de C3 caracterizam essa fase inicial, com C4 com níveis maiores do que C3. A proteína H, uma proteína de superfície de Streptococcus pyogenes, em associação com IgG, também é capaz de ativar a via de complemento clássica.

A GNPI aguda é uma doença imunológica. Um bom argumento clínico para essa afirmação é o intervalo latente entre os sinais clínicos de infecção e o aparecimento de GN, pelo menos quando o início da infecção pode ser identificado. Esse intervalo (similar ao da doença do soro) costuma ser fácil de determinar na GN aguda - o que não sucede com as formas endocapilar e extracapilar, sendo raramente aparente nos casos de GNMP.

Tem havido vários relatos de GN com depósitos de imunocomplexos contendo IgA e, muitas vezes, IgA-dominante em associação com infecções por Staphylococcus aureus e Staphylococcus epidermidis. O paciente tipicamente apresenta-se com GN aguda e proteinúria maciça. A biópsia renal com frequência mostra formação de crescentes. Alguns pacientes com infecção por agentes Staphylococcus aureus resistentes à meticilina (MRSAs) podem ter um quadro clínico menos grave.

A característica é o predomínio de IgA nos depósitos imunes na biópsia. Os níveis séricos de IgA costumam ser aumentados. Os níveis de complemento podem ser baixos ou normais. Quando a infecção estafilocócica não é comprovada, essas formas podem representar um problema na distinção da GN pós-estafilocócica da GN por IgA.

Os indicadores prognósticos dependem da gravidade do foco infeccioso, bem como das características da glomerulopatia. Pacientes com má saúde geral por causa de desnutrição ou cirrose são mais propensos a seguir um curso desfavorável. Pacientes com sepse e aqueles cujos sítios de infecção incluem abscessos viscerais, empiema, meningite ou endocardite são mais propensos a morrer do transtorno primário do que em consequência da glomerulopatia.

O risco de morte é significativamente maior em idosos e com púrpura. A apresentação inicial com síndrome nefrótica, creatinina sérica acima de 2,7mg/dL e a presença de crescentes e fibrose intersticial na biópsia renal, em geral, representam danos renais irreversíveis.

Outros fatores na apresentação predizem um prognóstico favorável: o trato respiratório superior como local inicial da infecção e a proliferação endocapilar pura com uma IF com padrão de céu estrelado. A proteinúria abaixo de 1,5 g/dia está bem correlacionada com a recuperação em pacientes com proliferação endocapilar pura, enquanto a síndrome nefrótica na apresentação é com frequência seguida por GN crônica persistente.

O complemento sérico persistentemente baixo está associado a piores desfechos. Nos casos de GN endocapilar pura, a experiência de séries antigas indica um curso quase uniformemente favorável. Estudos mais recentes indicam que a localização do foco infeccioso é mais variada do que a garganta e a pele, e esse foco de infecção, muitas vezes, ainda está presente no momento da biópsia renal.

Os meses de seguimento da biópsia renal, ou até mesmo anos após o quadro inicial, podem revelar um curso de lesões em pacientes cuja infecção persiste. Isso reforça a necessidade de erradicar qualquer infecção persistente com terapia antibiótica apropriada e, se necessário, com um procedimento cirúrgico ou odontológico.

Pouco se sabe sobre o tratamento ideal desses pacientes. Existe experiência descrita não comparativa com corticosteroides; a ciclofosfamida e a plasmaférese têm um efeito favorável na função renal após a erradicação da infecção. Embora não controladas, essas observações sugerem que o prognóstico da GN crescêntica pós-infecciosa não é necessariamente desastroso quando um regime anti-inflamatório e imunossupressor é utilizado após a erradicação da infecção.

A GN pós-infecciosa é um problema crítico de saúde pública com implicações significativas nos custos. Para reduzir a incidência dessa doença, deveriam ser implementadas medidas como o acesso precoce e facilitado aos cuidados médicos e odontológicos, o controle da toxicodependência e as mesmas medidas profiláticas que se mostraram eficazes na prevenção da endocardite bacteriana.

 

Referências

 

1-Meyrier A. Postinfectious glomerulonephritis in Primer of Kidney Diseases 2013.

2-Nadasdy T, Hebert LA. Infection-related glomerulonephritis: understanding mechanisms. Semin Nephrol 2011; 31:369.

3- Rodriguez-Iturbe B, Musser JM. The current state of poststreptococcal glomerulonephritis. J Am Soc Nephrol 2008.

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