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Pericardite Constritiva

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 13/08/2018

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O pericárdio é um saco fibrocolágeno em forma de cone que reveste o coração e contém uma pequena quantidade de fluido seroso fisiológico em quantidades normalmente <50mL. O pericárdio parietal normal tem propriedades elásticas e se distende para acomodar aumento no volume do líquido intrapericárdico. Um aumento na quantidade de fluido com o saco pericárdio resulta em aumento da pressão intrapericárdica.

A porção inicial da curva volume-pressão pericárdica é plana; assim, aumentos de volume relativamente grandes resultam em mudanças comparativamente pequenas na pressão intrapericárdica. A curva torna-se mais pronunciada à medida que o pericárdio parietal atinge os limites de sua distensibilidade. Se o fluido continua a se acumular, a pressão intrapericárdica eleva-se a um nível maior que o das pressões normais de enchimento das câmaras cardíacas direitas. Quando isso ocorre, o enchimento ventricular é restrito e pode ocorrer o tamponamento cardíaco.

Outra consequência possível é a pericardite constritiva, que resulta de lesão pericárdica e inflamação, resultando em espessamento fibroso das camadas do pericárdio, o que impede o preenchimento diastólico passivo das câmaras cardíacas. Na pericardite constritiva, o pericárdio se torna inelástico e não permite o enchimento cardíaco adequado; em geral, as efusões são subagudas ou crônicas.

Nos pacientes com pericárdio normal, a pressão intratorácica diminui durante a inspiração, levando a um aumento do retorno venoso para o coração direito e um aumento no tamanho do coração direito; em condições normais com o pericárdio elástico, não ocorre comprometimento no coração esquerdo, mas, em pacientes com pericardite constritiva, o pericárdio não se expande e, assim, fica prejudicado o enchimento do ventrículo esquerdo.

Os pacientes com pericardite constritiva comumente não apresentam efusão pericárdica, mas, em alguns casos, há efusão. Nesse caso, o termo correto é pericardite efusivo-constritiva; a diferença entre a pericardite constritiva com a efusivo-constritiva é que, após a pericardiectomia na pericardite efusivo-constritiva, permanece a pressão atrial aumentada.

 

Etiologia

 

Entre as potenciais causas de pericardite constritiva, há o traumatismo cardíaco com hemorragia intrapericárdica, a pericardiotomia (cirurgia de coração aberto), as cirurgias incluindo revascularização coronariana, a pericardite fúngica ou tuberculosa e a insuficiência renal crônica (pericardite urêmica), mas, na maioria dos casos, uma causa específica não é determinada.

Em diferentes séries de casos de centros terciários, foram encontradas as seguintes causas de pericardite constritiva:

               Idiopática ou viral: 42 a 61%

               Pós-operatório de cirurgia cardíaca: 11 a 37%

               Radioterapia: 2 a 31%, principalmente após doença de Hodgkin ou câncer de mama

               Doença do tecido conectivo: 3 a 7%

               Pós-infecciosa: 3 a 15%, causada sobretudo por tuberculose ou pericardite purulenta

               Outras causas: 1 a 10% (incluindo trauma, malignidade, medicamentoso, asbestose, sarcoidose e pericardite urêmica)

 

Características Clínicas

 

Os sintomas da pericardite constritiva, em geral, se desenvolvem gradualmente e podem imitar os sintomas da insuficiência cardíaca (IC) e da miocardiopatia restritiva. No entanto, os sinais clínicos podem ocorrer precocemente se o líquido também se acumular dentro do saco pericárdico espesso e não complacente (pericardite constritiva efusiva). Sinais e sintomas comuns incluem dispneia aos esforços, edema periférico, hepatomegalia e ascite.

Dos pacientes com pericardite constritiva, 67% apresentam sintomas de IC; 8% apresentam dor torácica; 6%, dor abdominal; 4%, arritmias atriais; e 5%, sintomas sugestivos de tamponamento cardíaco. Dos pacientes com pericardite constritiva, 93% apresentam aumentam da pressão venosa jugular. O exame das veias do pescoço com o paciente em um decúbito de 45ºs revela, frequentemente, uma distensão venosa jugular e uma rápida descida em “y” do pulso venoso cervical.

A pressão venosa elevada também é observada na IC, mas uma rápida descida “y” raramente é encontrada. O sinal de Kussmaul (distensão da veia do pescoço inspiratória) é frequente na pericardite constritiva, mas é raro na IC. Um pulso paradoxal é incomum, ocorrendo apenas em 20% dos pacientes com pericardite constritiva, mas sua ausência não exclui a pericardite constritiva.

Na ausculta cardíaca, um atrito pericárdico diastólico precoce, que ocorre um pouco antes de uma terceira bulha cardíaca, que pode ser ouvida no ápice 60 a 120 milissegundos após a segunda bulha cardíaca. O atrito pericárdico soa como um galope ventricular, mas ocorre mais precocemente do que o S3 da IC, eventualmente palpável.

O som ocorre devido à entrada acelerada de sangue no VD no início da diástole e à distensão miocárdica precoce, seguida por uma abrupta diminuição da expansão ventricular. Outros achados frequentemente descritos são caquexia, edema periférico, hepatomegalia pulsátil e derrame pleural.

 

Diagnóstico

 

O eletrocardiograma (ECG) pode demonstrar complexos QRS de baixa voltagem, que ocorrem em 27% dos pacientes; ondas T invertidas e taquicardia sinusal são frequentes; já a fibrilação atrial ocorre em 22% dos pacientes, mas não há sinais diagnósticos específicos no ECG para o diagnóstico de pericardite constritiva eletrocardiograma.

As radiografias de tórax demonstram mais comumente uma silhueta cardíaca normal ou levemente aumentada, campos pulmonares limpos e pouca ou nenhuma evidência de congestão venosa pulmonar. A calcificação pericárdica pode ser vista na radiografia torácica, principalmente em imagens laterais e oblíquas; as calcificações pericárdicas são particularmente associadas com pericardite virais ou idiopáticas, que são a etiologia da pericardite constritiva em 67% dos casos com calcificação pericárdica.

A tomografia computadorizada (TC) e a ressonância nuclear magnética (RNM) cardíaca também podem demonstrar um pericárdio espessado, e a TC também consegue ver a calcificação pericárdica de forma mais acurada de que o ecocardiograma (ECO); já a RNM consegue ver um sinal do pericárdio afetado de maior intensidade que o pericárdio normal.

Ocasionalmente, o ECO bidimensional pode demonstrar espessamento pericárdico e movimento de septo ventricular anormal em 40% dos pacientes com suspeita de pericardite constritiva e cerca de 50%. No entanto, sua utilidade diagnóstica é muito menor do que em um paciente com pericardite aguda.

Em muitos casos, principalmente se houver achados ecocardiográficos subótimos, o cateterismo cardíaco com medição de pressões intraventriculares será necessário para confirmar o diagnóstico. A avaliação hemodinâmica pode demonstrar aumento da pressão atrial direita. O paciente apresenta significativos descensos “x” e “ÿ” da pressão venosa, o que, em contraste, não ocorre em pacientes com tamponamento cardíaco.

Um mergulho de pressão diastólica seguido por um platô característico (o “sinal da raiz quadrada”) do traçado de pressão do ventrículo direito é característico da doença. Ocorre, ainda, aumento na pressão diastólica final do ventrículo direito. O BNP pode estar aumentado, mas implica em pior prognóstico para os pacientes com nível aumentado.

O Quadro 1 sumariza as diferenças hemodinâmicas entre pacientes com tamponamento cardíaco ou pericardite constritiva.

 

Quadro 1

 

Diferenças Hemodinâmicas Entre pericardite constritiva e Tamponamento Cardíaco

Características

Tamponamento cardíaco

pericardite constritiva

Pulso paradoxal

Normalmente presente

Presente em 20 a 30% dos pacientes

Pressões similares em VD e VE

Presente

Presente

Morfologia de ondas venosas de pulso

Descenso y ausente

Descenso Y proeminente

Mudanças inspiratórias de pressão venosa

Diminuída ou normal

Aumentada ou normal (sinal de Kusmaull)

Sinal da “raiz quadrada”

Ausente

Presente

 

Tratamento

 

Nos casos de constrição significativa e enchimento ventricular prejudicado, a pericardiectomia é o tratamento de escolha; caso contrário, os pacientes evoluem com sintomas de constrição, com uma minoria dos pacientes apresentando melhora sem cirurgia.

Nos pacientes com melhora clínica sem cirurgia, foram descritos tratamentos como anti-inflamatórios não esteroidais, corticosteroides, quimioterapia, entre outros tratamentos dependendo da etiologia da constrição. A pericardiectomia tem de ser considerada com cuidado em pacientes gravemente doentes ou com prognóstico ruim.

 

Referências

 

1-Jouriles NJ. Pericardial and myocardial diseases in Rosen’s Emergency Medicine 2018.

2-Klein AL, Abbara S, Agler DA, et al. American Society of Echocardiography clinical recommendations for multimodality cardiovascular imaging of patients with pericardial disease: endorsed by the Society for Cardiovascular Magnetic Resonance and Society of Cardiovascular Computed Tomography. J Am Soc Echocardiogr 2013; 26:965.

3-Little WC, Freeman GL. Pericardial disease. Circulation 2006; 113:1622.

4-Adler Y, Charron P, Imazio M, et al. 2015 ESC Guidelines for the diagnosis and management of pericardial diseases: The Task Force for the Diagnosis and Management of Pericardial Diseases of the European Society of Cardiology (ESC)Endorsed by: The European Association for Cardio-Thoracic Surgery (EACTS). Eur Heart J 2015; 36:2921.

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