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Nova Diretriz do Tratamento da Doença de Crohn

Contexto Clínico

          Recentes evidências de estudos controlados e randomizados trouxeram novo corpo de informações que levou a Associação Americana de Gastroenterologia (AGA) a refinar a visão sobre o uso de imunomoduladores (tiopurinas e metotrexato) e fator antinecrose tumoral (TNF-alfa) no tratamento da doença de Crohn de moderada a grave. A AGA sintetizou estes resultados em uma nova diretriz, dividida em recomendações para a indução da remissão e manutenção da remissão.

 

Recomendações

Para Indução da Remissão:

         (1) Sugere-se não usar tiopurina (6-mercaptopurina ou azatioprina) como monoterapia para induzir a remissão em pacientes com doença moderadamente grave (Recomendação fraca, evidência de qualidade moderada). Elas demoram a ter ação, e, portanto, a terapia concomitante com corticosteroides sistêmicos ou uma droga anti-TNF-alfa é necessária para proporcionar alívio dos sintomas rápido entre os pacientes com doença moderada a grave. Um detalhe é que a adição de tiopurinas aos corticosteroides faz a indução da remissão não mais provável do que com corticoterapia sozinha. No entanto, as tiopurinas podem manter uma remissão induzida por corticosteroide (ver recomendação 7).

         (2) Sugere-se não usar metotrexato para induzir a remissão em pacientes com doença moderadamente grave (Recomendação fraca, evidência de baixa qualidade). Tal como acontece com as tiopurinas, os dados mostram que o metotrexato não é melhor do que o placebo em induzir a remissão de doença moderada a grave tratados com corticosteroides. Embora os estudos não demonstrem que o metotrexato é eficaz em induzir a remissão, com base na experiência clínica, é provável que o metotrexato em doses altas o suficiente possa induzir remissão. Tal como acontece com as tiopurinas, o metotrexato pode manter uma remissão induzida por corticosteroide (ver recomendação 8).

         (3) Recomenda-se o uso de drogas anti-TNF-alfa para induzir a remissão em pacientes com doença moderada a grave (Forte recomendação, evidência de qualidade moderada). As drogas anti-TNF-alfa, como infliximabe ou adalimumabe, são melhores do que placebo para induzir a remissão em pacientes com doença refratária a outras terapias, incluindo mesalazina, antibióticos, corticosteroides e imunomoduladores. A capacidade de induzir a remissão em pacientes que não responderam ao tratamento com corticosteroides ou imunomoduladores é uma característica importante destas drogas. A taxa de infecções graves não é maior entre os pacientes que receberam drogas anti-TNF-alfa. Conclui-se que os benefícios destas drogas superam os malefícios, mesmo levando em conta o alto custo.

         (4) Recomenda-se o uso de anti-TNF-alfa como monoterapia no lugar de monoterapia com tiopurina para induzir a remissão em pacientes que tenham doença de moderada a grave (Forte recomendação, evidência de qualidade moderada). Há apenas um estudo (SONIC) que comparou uma droga anti-TNF-alfa (infliximabe) com uma droga tiopurina (azatioprina) para a indução da remissão em pacientes com doença moderada a grave. Infliximabe foi superior à azatioprina neste estudo. Nesta pesquisa, não houve mais infecções graves com infliximabe em comparação com a terapia com azatioprina. As conclusões tiradas a partir de SONIC podem ser extrapolados para adalimumabe também.

         (5) Recomenda-se o uso de drogas anti-TNF-alfa em combinação com tiopurinas ao invés de monoterapia com tiopurinas para induzir a remissão em pacientes que tenham doença de moderada a grave (forte recomendação, evidência de alta qualidade). A terapia combinada não é associada com qualquer aumento de infecções graves.

         (6) Sugere-se o uso de drogas anti-TNF-alfa em combinação com tiopurinas ao invés de monoterapia com anti-TNF-alfa para induzir a remissão em pacientes com doença moderada a grave (Recomendação fraca, evidência de qualidade moderada). Os resultados do estudo SONIC mostraram que a combinação de infliximabe e azatioprina foi superior ao infliximabe sozinho em induzir remissão. Além disso, a terapia de combinação não foi associada com um risco aumentado de infecções graves. No entanto, os benefícios da terapia combinada contra infliximabe sozinho permanecem incertas em pacientes que têm a doença moderada a grave e que anteriormente não tenham respondido ao uso de tiopurinas. Para este cenário clínico não há dados de alta qualidade que mostram a superioridade da terapia combinada.

 

Para Manutenção da Remissão

         (7) Recomenda-se o uso de tiopurinas ao invés de nenhum imunomodulador para manter uma remissão induzida por corticosteroides em pacientes com Doença de Crohn (Forte recomendação, evidência de qualidade moderada). Um cenário clínico comum em pacientes com doença moderada a grave envolve remissão induzida por corticosteroide. Entre esses pacientes, a descontinuação de corticosteroides está associado com altas taxas de recaída. Neste cenário, as tiopurinas são significativamente mais propensas a manter a remissão clínica do que placebo. Embora dados de alta qualidade não existam sobre este assunto, o uso em longo prazo de tiopurinas está associada com um risco de 1,5 a 5 vezes maior de linfoma e com um risco possivelmente ligeiramente superior de infecção grave, embora as taxas absolutas destes eventos adversos sejam baixas e os benefícios de manter a remissão com tiopurinas superem os riscos associados. Embora as tiopurinas não aumentem a probabilidade de que um paciente com doença moderada a grave entre em  remissão, é apropriado iniciar o tratamento com tiopurinas ao mesmo tempo em que se inicia a terapia de indução com corticosteroides, se a intenção é, em última instância, manter a remissão com tiopurinas.

         (8) Sugere-se o uso de metotrexato ao invés de nenhum imunomodulador para manter uma remissão induzida por corticosteroides em pacientes com Doença de Crohn (Recomendação fraca, evidência de baixa qualidade). Os dados existentes indicam que o metotrexato é provavelmente, mas não definitivamente, superior ao placebo na manutenção da remissão em pacientes com doença de moderada a grave.  A dose e a via de administração ótima são incertas, mas os dados disponíveis sugerem que o metotrexato parenteral pode ser superior ao metotrexato oral para esta finalidade. O metotrexato é considerado seguro para uso em longo prazo, e há apenas relatos muito raros de que o uso de metotrexato se associa com um risco aumentado de linfoma. No entanto, não há dados publicados sobre o risco de infecção em pacientes em terapia de manutenção com metotrexato. As pacientes que querem engravidar não podem usar metotrexato, e esta é uma grande barreira para o uso em longo prazo em adultos jovens. A má qualidade da evidência sobre a eficácia, e a falta de dados de segurança leva a incertezas substanciais sobre o equilíbrio de benefícios versus riscos com esta terapia.

         (9) Recomenda-se o uso de drogas anti-TNF-alfa para manter a remissão induzida com corticosteroides ou anti-TNF-alfa em pacientes com Doença de Crohn (Forte recomendação, evidência de alta qualidade). As drogas anti-TNF-alfa são superiores ao placebo na manutenção da remissão em pacientes com doença moderada a grave, com remissão induzida por estas drogas. Em contraste com os dados individuais das drogas sobre a indução de remissão, há dados de estimativas de efeito para todas as três drogas anti-TNF-alfa testadas (infliximabe, adalimumabe e certolizumabe). Embora não haja dados diretos, acredita-se que as drogas anti-TNF-alfa sejam capazes de manter remissões induzidas por corticosteroides. A manutenção do uso das drogas anti-TNF-alfa não está associada com um aumento da taxa global de infecção grave, e não há um aumento do risco de linfoma. No entanto, infecções oportunistas como tuberculose ou infecções fúngicas podem ocorrer como uma consequência direta do uso dessas drogas. A não observância de um aumento da taxa destas  infecções nos ensaios pode ser secundária ao período relativamente curto de seguimento. Além disso, é importante notar que os dados relativos ao risco de linfoma são de baixa qualidade, e o risco de linfoma com o uso continuado destes medicamentos por si só ou em combinação com tiopurinas permanece incerto. O uso em longo prazo destas drogas é caro, mas há uma redução de custos diretos e indiretos associados à prevenção da recidiva da doença. No geral, podemos concluir que os benefícios do tratamento de pacientes com esses medicamentos para manter a remissão superam os danos ou encargos que estas terapias podem causar para a maioria dos pacientes.

         (10) Não há recomendação a favor ou contra a combinação de uma droga anti-TNF-alfa e uma tiopurina contra uma droga anti-TNF-alfa sozinha para manter a remissão induzida por uma combinação dessas drogas em pacientes com Doença de Crohn (Sem Recomendação, baixa qualidade de evidências). Os dados sobre os benefícios da terapia combinada contra o uso de somente uma droga anti-TNF-alfa são conflitantes. No estudo SONIC, os benefícios da terapia combinada contra monoterapia com infliximabe ainda estavam presentes após um ano de tratamento. No entanto, o SONIC não foi projetado para estudar a manutenção da remissão, mas sim  uma tentativa de indução da remissão em longo prazo de seguimento. Os dados sobre a segurança relativa da terapia de combinação em longo prazo contra o uso de somente uma droga anti-TNF-alfa são de baixa qualidade, mas não sugerem que a terapia de combinação aumente o risco de infecção grave. No entanto, a terapia de combinação está associada com um aumento na taxa de linfoma.

 

Bibliografia

Terdiman JP et al. American Gastroenterological Association Institute guideline on the use of thiopurines, methotrexate, and anti-TNF-a biologic drugs for the induction and maintenance of remission in inflammatory Crohn's disease. Gastroenterology 2013 Dec; 145:1459 (link para o artigo).