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Lúpus Eritematoso Sistêmico

INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES

O lúpus é uma doença sistêmica, de natureza auto-imune, caracterizada pela presença de diversos auto-anticorpos e considerada o protótipo das doenças por imune-complexos. Caracteriza-se por promover quadros inflamatórios em todos os órgãos, o que determina uma apresentação clínica polimórfica, que nas suas fases iniciais pode dificultar o diagnóstico preciso.

O conhecimento das principais características clínicas da doença é muito importante, pois auxilia sobremaneira o diagnóstico, uma vez que a primeira sintomatologia pode ocorrer num único órgão ou sistema, retardando a sua suspeita. As suas manifestações clínicas podem aparecer isoladamente, de forma consecutiva ou aditiva, principalmente nos primeiros cinco anos da doença, que é o período no qual ela habitualmente mostra os locais preferenciais de comprometimento.

Os critérios diagnósticos servem de guia na verificação dos diversos sistemas. Estes são constituídos de 11 parâmetros clínicos e laboratoriais, e devem estar presentes quatro destes de forma consecutiva ou seriada para se classificar um paciente com lúpus eritematoso sistêmico (LES) (tabela 1).

Cabe salientar ainda que existam sinais e sintomas que, embora não façam parte desses critérios, podem freqüentemente estar presentes no início da doença. Neste sentido, torna-se imperativo verificar minuciosamente o envolvimento pregresso dos sistemas, pesquisando principalmente os sintomas mais encontrados na doença na busca de pistas para o seu diagnóstico.

 

Tabela 1: Critérios revisados para a classificação de LES

Para o diagnóstico de LES, pelo menos quatro dos critérios abaixo devem estar presentes de forma consecutiva ou seriada

1. Rash malar

2. Lesão discóide

3. Fotossensibilidade

4. Úlceras orais

5. Artrite

Não erosiva de duas ou mais articulações

6. Serosite

Pleurite e/ou;

Pericardite

7. Renal

Proteirúria maior que 0,5 g/d e/ou;

Cilindros

8. Neurológico

Convulsão e/ou;

Psicose

9. Hematológico

Anemia hemolítica e/ou;

Leucopenia menor que 4.000/mm3 e/ou;

Linfopenia menor que 1.500/mm3 e/ou;

Plaquetopenia menor que 100.000/mm3

10. Alterações imunológicas

Anticorpos anti-DNA e/ou;

Anticorpos anti-SM e/ou;

Anticorpos antifosfolípide (anticardiolipina IgG/IgM; anticoagulante lúpico, VDRL falso positivo)

11. Anticorpos antinucleares (FAN)

Adaptada de Hochberg, 1997

 

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

O LES é uma doença inflamatória crônica cuja patogenia é multifatorial e ainda não foi completamente esclarecida. Dentre os fatores mais relevantes devemos citar:

 

         O componente genético, pela maior freqüência de certos haplótipos dos antígenos de histocompatibilidade (HLA), tanto de classe I (B8) como de classe II (DR3, DR2, DQw1 e DQw2), que se localizam no braço curto do cromossomo 6. Existe uma maior concordância da doença em gêmeos monozigóticos que não é total, o que reforça a influência de outros fatores;

         A participação hormonal, pois a doença é mais prevalente na população fértil feminina.

         Os fatores ambientais, visto que a exposição à luz solar agrava ou desencadeia a doença. A luz ultravioleta, em especial com a irradiação beta, é capaz de induzir e exacerbar a atividade inflamatória, tanto nos quadros cutâneos quanto sistêmicos do lúpus;

         A participação de diversos agentes infecciosos, particularmente virais, como o vírus da hepatite C, parvovírus e Epstein Barr (EBV);

         O papel de diversas substâncias químicas como desencadeantes do lúpus propriamente dito, incluindo determinados medicamentos que são associados a um subtipo da doença: o LES induzido por droga.

 

Apesar desses fatores, a produção anormal de auto-anticorpos pelas células B é a principal característica da doença. Alguns desses anticorpos são extremamente específicos do LES, como o anti-DNA de dupla hélice (anti-dsDNA), anti-Smith (anti-SM) e anti-P, mas outros anticorpos encontrados no LES, como o anti-RNP, anti-Ro/SSA, anti-La/SSB, também podem ser identificados em outras doenças auto-imunes.

 

ACHADOS CLÍNICOS

O LES é muito mais prevalente em mulheres na idade fértil, e os primeiros sinais e sintomas iniciam-se entre a segunda e terceira décadas de vida, quando o predomínio do sexo feminino é na proporção de 10:1.

O lúpus é uma doença pleomórfica que não apresenta um padrão típico de comprometimento sistêmico. O diagnóstico baseia-se fundamentalmente no quadro clínico, que, associado aos dados laboratoriais e sorológicos, favorecem a sua definição. Na fase inicial acomete com maior freqüência o sistema ósteo-articular e o cutâneo, e, de forma mais grave, o renal e o sistema nervoso central (SNC).

Sintomas gerais e constitucionais são extremamente freqüentes e inespecíficos, dentre os mais comuns devemos salientar anorexia e perda insidiosa de peso, que podem ser identificados no início e até preceder em meses o aparecimento das manifestações orgânicas. A febre como primeiro sinal clínico de LES pode ocorrer em cerca de 50% dos casos e geralmente é associada a sinais consumptivos.

As Úlceras orais, apesar de inespecíficas, fazem parte dos critérios diagnósticos, geralmente não são dolorosas, relacionadas à atividade inflamatória da doença e encontradas em até 25% dos pacientes, o que justifica um exame clínico minucioso do paciente com a suspeita da doença.

 

Manifestações Cutâneas

As lesões cutâneas são de grande importância no reconhecimento do LES e possuem uma característica marcante, que é a Fotossensibilidade. No início da doença, as manifestações cutâneas são extremamente freqüentes, correspondendo a aproximadamente 70% dos casos, o que facilita a sua suspeita, e são observadas em mais de 90% dos pacientes lúpicos em algum momento da doença.

As principais lesões cutâneas conhecidas no LES estão na tabela 2.

 

Tabela 2: Classificação das lesões cutâneas específicas do LES

Lúpus eritematoso cutâneo agudo

         Localizado

         Generalizado

Lúpus eritematoso cutâneo subagudo

         Anular

         Pápulo-escamoso

Lúpus eritematoso cutâneo crônico

         Discóide “clássico”

o    localizado

o    generalizado

         Discóide hipertrófico (ou verrucoso)

         Discóide de mucosa

         Lúpus eritematoso profundo (paniculite lúpica)

         Lupus timidus

         Lúpus pérnio

 

A manifestação cutânea aguda é a mais conhecida no LES e sua forma localizada é descrita como rash malar ou rash em “asa de borboleta”, notadamente simétrica, poupando o sulco nasolabial. A lesão é encontrada em 20% a 60% dos pacientes. A forma cutânea generalizada é conhecida como rash máculo-papular ou dermatite lúpica e se apresenta como erupção exantematosa ou morbiliforme generalizada.

Entretanto, o lúpus eritematoso cutâneo crônico engloba uma série de lesões, dentre as quais a discóide é a mais conhecida. A Lesão discóide clássica é caracterizada inicialmente por placa eritematosa e hiperpigmentada que lentamente evolui na sua periferia, deixando uma cicatriz central hipopigmentada com atrofia. Na maioria das vezes, esta é única e preferencialmente encontrada em face, couro cabeludo, pavilhão auricular e pescoço. O lúpus eritematoso cutâneo subagudo é uma entidade à parte do LES, sendo caracterizado pela presença de lesões eritematosas pápulo-escamosas (tipo psoriasiformes) ou anulares (tipo placas policíclicas), localizadas principalmente em regiões de exposição solar (face, vespertílio e braços). Ambas as formas de lesão estão fortemente associadas à presença dos anticorpos anti-Ro/SSA. Embora aproximadamente metade desses pacientes preencha os critérios de classificação de LES, somente 10% a 15% evoluem para formas graves de comprometimento sistêmico. As lesões evoluem após o tratamento sem deixar cicatrizes profundas, mas produzem áreas de hipopigmentação, tipo vitiligóides, que podem se tornar perenes.

Ainda fazem parte do LES algumas outras lesões cutâneas não-específicas: a alopécia, a vasculite cutânea, e o livedo reticular. A alopécia difusa pode ser observada em até 50% dos casos, podendo inclusive ser o primeiro sinal clínico, e está diretamente relacionada com a sua atividade inflamatória, podendo inclusive anteceder outras manifestações de exacerbação da doença. Normalmente existe recuperação após a remissão do surto inflamatório, embora em casos mais graves e em formas mais agressivas esta possa se tornar definitiva.

A vasculite cutânea é identificada em 20% a 70% dos casos, variando desde lesões do tipo urticária até grandes úlceras necróticas. O padrão de vasculite é determinado pelo nível e intensidade do dano inflamatório dos vasos comprometidos. Além do processo inflamatório dos vasos, os pacientes com LES podem ainda apresentar quadro de vasculopatia trombótica decorrente da síndrome dos anticorpos antifosfolípides (SAF), caracterizada por formação de trombos recorrentes envolvendo vasos de todos os tamanhos, mas sem sinais significativos de inflamação.

 

Fenômeno de Raynoud

O fenômeno de Raynaud, fortemente associado à presença dos anticorpos anti-RNP, também pode ser a primeira manifestação da doença, e sua freqüência e intensidade estão associados à exposição ao frio.

 

Manifestações Músculo-esqueléticas

As manifestações músculo-esqueléticas são freqüentes nas fases iniciais da doença, podendo a artralgia e/ou Artrite ser a principal queixa em aproximadamente 75% a 80% no momento do diagnóstico e comprometer até 90% dos pacientes no curso da doença. O padrão articular predominante é de poliartrite simétrica episódica, de carácter migratório ou aditivo, e quase sempre não deformante. Na evolução da doença, cerca de 10% a 15% dos casos podem evoluir para uma artropatia crônica ou do tipo Jaccoud, que se caracteriza por desvio ulnar seguido de subluxação, deformidades do tipo pescoço-de-cisne e subluxação das interfalangianas do polegar. Essas deformidades são decorrentes da instabilidade provocada pelo processo inflamatório crônico da cápsula articular, ligamentos e tendões. Outro quadro articular importante no LES é a necrose avascular, que pode acometer vários sítios, sendo o mais freqüente a cabeça femoral, e na maioria dos casos associada tanto ao tratamento com corticosteróides quanto à atividade da doença.

A tenossinovite pode ocorrer em até 10% dos pacientes em qualquer fase da doença e ser independente do envolvimento articular. Mialgia generalizada é comum durante os episódios de atividade da doença, por isso pode ser a queixa inicial em 40% a 45% dos casos. Entretanto, a miosite inflamatória envolvendo musculatura proximal com elevação de enzimas musculares, como a creatinofosfoquinase (CPK) e a aldolase, ocorre numa porcentagem menor, em torno de 5% a 10%.

 

Envolvimento Cardiovascular

O envolvimento cardiovascular mais freqüente é a pericardite, sendo sintomática em 20% a 30% durante o curso da doença, podendo ser observada como primeira manifestação em 5% dos casos. O quadro agudo pode ser isolado ou fazer parte de Serosite generalizada, particularmente associada à pleurite. O ecocardiograma pode revelar derrame ou espessamento pericárdico em até 30% dos pacientes com lúpus, mesmo assintomáticos. Sua evolução é habitualmente subaguda ou crônica, explicando sua rara tendência ao tamponamento. A miocardite clínica é encontrada principalmente no decorrer do LES, sendo caracterizada por taquicardia persistente e sinais clínicos de insuficiência cardíaca de instalação aguda normalmente acompanhada de alterações no mapeamento cardíaco e em enzimas musculares. A endocardite de Libman-Sacks é classicamente descrita pela presença de vegetações verrucosas localizadas próximas das bordas valvares. Essas vegetações podem ser encontradas em até 50% dos casos autopsiados e desenvolvem-se em qualquer válvula, principalmente na mitral. Essas lesões normalmente não produzem repercussão clínica e são habitualmente diagnosticadas no ecocardiograma. A aterosclerose precoce nos pacientes lúpicos é atualmente uma importante causa de mortalidade na doença devido a infarto agudo do miocárdio em mulheres jovens. Esse processo é multifatorial, com a contribuição das lesões endoteliais, das dislipidemias, da menopausa precoce, da hipertensão arterial e da insuficiência renal, além da atividade da doença por si só.

 

Manifestações Pulmonares

A pleurite é a manifestação pulmonar mais freqüente, ocorrendo em 40% a 60% dos casos, assim como o derrame pleural em 16% a 40% durante o curso da doença. Outras manifestações pulmonares do LES são hipertensão pulmonar primária, que pode acontecer de forma leve em até 10% dos pacientes, doença intersticial, considerada rara no lúpus, e hemorragia alveolar.

 

Manifestações Neurológicas

O espectro dos quadros de sistema nervoso engloba uma série de condições neurológicas que são identificadas entre 25% e 70% dos pacientes. As síndromes neuropsiquiátricas no LES foram classificadas em 19 síndromes, subdivididas em dois grandes grupos: sistema nervoso central e sistema nervoso periférico (tabela 3). Didaticamente, essas condições podem ser subdivididas em difusas, em que identificamos a convulsão e a psicose que fazem parte dos critérios, e os quadros focais. A maioria dos quadros epilépticos é do tipo grande-mal, de eventos tônico-clônicos e associação temporal com a doença ou com períodos de exacerbação, o que reforça a hipótese de lúpus.

 

Tabela 3: Síndromes neuropsiquiátricas do LES (segundo o Comitê de Nomenclatura do Colégio Americano de Reumatologia)

Sistema nervoso central

         Meningite asséptica

         Doença cérebro-vascular

         Síndrome desmielinizante

         Cefaléia (incluindo enxaqueca e hipertensão intracraniana benigna)

         Desordem do movimento (coréia)

         Mielopatia

         Quadro convulsivas

         Estado confusional agudo

         Desordens de ansiedade

         Disfunção cognitiva

         Alterações do humor

         Psicose

Sistema nervoso periférico

         Poliradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória aguda (síndrome de Guillain-Barré)

         Desordens autonômicas

         Mononeuropatia

         Miastenia gravis

         Neuropatia craniana

         Plexopatia

         Polineuropatia

American College of Rheumatology, 1999

 

            Os distúrbios de comportamento também são muito freqüentes e podem ocorrer em aproximadamente metade dos pacientes. A psicose ocorre em até 10% dos casos e pode se manifestar nas suas diferentes formas, como esquizofrenia e distúrbios bipolares. Confusão diagnóstica pode ocorrer com quadros de psicose induzida pelo uso de corticóide para tratamento da doença. Os quadros difusos incluem ainda a cefaléia, o pseudotumor cerebral e a síndrome orgânica cerebral, caracterizada por distúrbio de função mental com delírio, inadequação emocional, prejuízo da memória ou concentração. Nos quadros focais encontram-se acidente vascular cerebral (AVC), mielite transversa, síndrome de Guillain-Barré, meningite asséptica, neuropatia craniana e periférica (mononeurite multiplex) e desordens de movimento, como tremores, coréia e parkinsonismo.

 

Manifestações Renais

A nefrite lúpica é uma das manifestações mais importantes da doença e exige uma maior atenção tanto no início como no seguimento dos pacientes. A maioria dos quadros renais apresenta-se nos primeiros cinco anos de LES, mas podem ser detectados em qualquer momento do seu curso, o que determina uma monitorização cuidadosa e regular no segmento desses pacientes. A identificação precoce do acometimento renal é extremamente importante para adequação e antecipação do tratamento. Deve-se ter sempre em mente que os sintomas e sinais específicos de nefrite só ocorrem quando de avançado grau de síndrome nefrótica ou de insuficiência renal.

Embora a proteinúria e a presença de cilindros façam parte dos critérios diagnósticos da doença (tabela 1), outros parâmetros como hematúria e aumento da creatinina devem ser considerados para o diagnóstico de glomerulonefrite e ajudam a diferenciar entre seus diferentes tipos; a proteinúria é, entretanto, manifestação universal, ocorrendo em quase 100% dos pacientes com atividade renal. O diagnóstico pode ser definido perante biópsia renal, de acordo com a classificação histológica proposta pelas Sociedades Internacionais de Nefrologia e Patologia Renal (tabela 4), sendo necessário para uma análise fidedigna do padrão de nefrite lúpica no mínimo de 10 a 15 glomérulos.

 

Tabela 4: Classificação das glomerulonefrites lúpicas (segundo as Sociedades de Nefrologia e Patologia Renal)

Classes de nefrite lúpica

I – Mesangial mínima

II – Mesangial proliferativa

III – Focal

IV – Segmentar difusa ou global

V – Membranosa

VI – Esclerose glomerular

Weening et al., 2004

 

A glomerulonefrite mesangial (classes I e II) são encontradas em aproximadamente 10% a 20% dos casos renais, sendo caracterizada por hematúria e proteinúria discretas (raramente excede 1 a 1,5 g nas 24 horas) com função renal preservada e na ausência de hipertensão arterial. A proliferativa focal (classe III) é encontrada em 10% a 20% e caracteriza-se por sedimento nefrítico acompanhado de proteinúria por vezes nefrótica (20% a 30%), com hematúria, cilindrúria, hipertensão e discreta perda de função renal. A proliferativa difusa segmentar e global (classe IV-S e IV-G), a mais grave das nefrites, corresponde a 40%-60% dos casos e é caracterizada por uma combinação de sedimento nefrítico e nefrótico, com proteinúria e hematúria mais significativas. A hipertensão arterial está invariavelmente presente e a insuficiência renal é marcante. A nefrite membranosa (classe V) é identificada por síndrome nefrótica e ocorre em 10% a 20% dos casos. Já na forma de estágio avançado, chamada nefrite esclerosante (classe VI), encontramos achados clínicos sugestivos de cronicidade com hipertensão e aumento nas escórias nitrogenadas. Na biópsia renal observamos glomeruloesclerose em ³ 90% dos glomérulos, sem evidência de lesão ativa. Essa forma de nefrite pode ser a evolução das formas crônicas das classes III, IV ou V.

A biópsia renal é de extrema valia tanto para a adequação do tratamento específico quanto para a exclusão de outros achados não relacionados ao LES.

A análise dos índices de atividade e cronicidade renais são úteis no delineamento da terapêutica dos pacientes. A tabela 5 descreve os principais parâmetros utilizados nessa graduação, em que a pontuação máxima de atividade é 24 e a da cronicidade é 12, que são determinados a partir da pontuação dos principais achados histológicos, com enfoque no processo de inflamação e de seqüela. A tabela 6 relata as características das diferentes formas da nefrite lúpica.

 

Tabela 5: Índices de atividade e cronicidade da nefrite lúpica

Índice de atividade (0 a 24)

         Hipercelularidade glomerular

         Exsudato de leucócitos

         Necrose fibrinóide/cariorrexis

         Crescentes celulares

         Trombos hialinos

         Inflamação túbulo-intersticial

Índice de cronicidade (0 a 12)

         Lesões glomerulares

o    Esclerose glomerular

o    Crescentes fibróticos

         Lesões túbulo intersticiais

o    Atrofia tubular

o    Fibrose intersticial

As lesões são pontuadas individualmente de 0 a 3 (ausente, leve, moderada, grave). Necrose, cariorrexis e crescentes celulares têm peso 2

Weening et al., 2004

 

Tabela 6: Características e tratamento da nefrite lúpica

Classe

Nomenclatura

Achados clínicos

Laboratório

Tratamento

I

Mesangial mínima

-

-

-

II

Mesangial proliferativa

 

Pode não ter nenhum sintoma; ocasionalmente, hipertensão

         Proteinúria discreta

         Hematúria discreta

         Creatinina normal

Depende dos outros orgãos acometidos. Pode necessitar de corticóide oral, mas na maioria dos casos não necessita tratamento

III

GN proliferativa focal

Pode haver hipertensão, síndrome nefrítica ou mesmo nefrótica

         Proteinúria aumentada

         Hematúria presente

         Creatinina normal a ?

         Pode evoluir para tipo IV

         Complemento baixo e DNA dupla fita (+)

Se evoluir com aumento de creatinina e sedimento ativo, pode necessitar de pulso de corticóide com ou sem azatioprina. Ciclofosfamida também é opção

IV

GN proliferativa difusa

Presença de hipertensão, edema; pode haver oligúria, síndrome nefrítica, nefrótica ou GNRP

         Proteinúria aumentada

         Hematúria intensa

         Creatinina ?

         Complemento consumido e DNA dupla fita (++++)

Necessita de pulso de corticóide com ciclofosfamida. Outra opção recentemente estudada com sucesso é o micofenolato mofetil

V

GN membranosa

Síndrome nefrótica

         Proteinúria nefrótica

         Pode evoluir com inflamação glomerular e hematúria

Corticosteróides

 

Manifestações Hematológicas

As alterações hematológicas são observadas nas fases precoces do LES, muitas vezes precedendo em anos o diagnóstico da doença. A série branca é a mais freqüentemente alterada, com leucopenia e linfopenia, isoladas ou associadas. Essas alterações ocorrem em até 70% dos casos e podem preceder as manifestações clínicas, sendo de grande auxílio diagnóstico. O monitoramento desses parâmetros é útil no acompanhamento de doença, pois a diminuição de seu número em geral reflete a atividade do lúpus, mas deve-se estar atento à possibilidade de essa queda ser relacionada aos imunossupressores em uso. A anemia pode ser identificada em até 80% dos pacientes com lúpus em alguma fase da doença e pode ser classificada em imune e não-imune. A mais comum das anemias não-imunes é a anemia da doença crônica (que na maioria das séries é também mais frequente que a Anemia hemolítica), seguida pela anemia ferropriva, e a anemia secundária à doença renal. A Anemia hemolítica com teste de Coombs positivo é a principal representante do grupo das anemias imunes e a única que faz parte dos critérios de classificação da doença, podendo preceder em anos outras manifestações clínicas desta. Uma outra forma de hemólise é a Anemia hemolítica micro-angiopática, caracteristicamente Coombs-negativa e com esquizócitos na periferia, normalmente relacionada à presença de vasculite sistêmica. A plaquetopenia, definida como menor que 150.000 cels/mm3, é encontrada em 15% dos casos de LES. O grau de plaquetopenia é bastante variável e formas graves são menos comuns.

 

LES Induzida por Drogas

Existe ainda uma forma especial de doença denominada lúpus induzido por drogas, que se distingue do LES idiopático, pela associação temporal do uso de determinadas drogas e pela apresentação de um quadro clínico mais leve (em geral sem acometimento renal e de SNC) e pela presença de altos títulos de anticorpos anti-histona de forma isolada. As principais drogas associadas com essa manifestação são clorpromazina, hidralazina, isoniazida, metildopa, minociclina, procainamida e quinidina.

 

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

O LES é uma doença que apresenta inúmeros diagnósticos diferenciais, dependendo da extensão e gravidade do acometimento sistêmico.

 

Sintomas Constitucionais

Na fase em que a febre predomina, o LES deve ser diferenciado de outras doenças sistêmicas ou mesmo infecções crônicas, e quando associada à linfoadenopatia deve ser diferenciado das doenças linfoproliferativas. É importante lembrar que a linfadenopatia no LES é encontrada em 30% a 80% dos pacientes com certo predomínio das cadeias cervical e axilar. Nesses casos, deve ser considerada a doença de Kikuchi devido à semelhança das manifestações clínicas, e a histopatologia do linfonodo examinado por patologista experiente é de grande auxílio na diferenciação. Da mesma forma, a hepatoesplenomegalia febril como apresentação inicial de LES exige diferencial com as doenças linfoproliferativas.

 

Manifestações Cutâneas

A evolução das lesões fotossensíveis para hiperpigmentação deve ser sempre diferenciada de cloasma, e as demais lesões ativas merecem ser diferenciadas de outras doenças dermatológicas localizadas ou sistêmicas, auto-imunes, infecciosas e idiopáticas.

 

Manifestações Músculo-esqueléticas

A rigidez matinal da Artrite no lúpus é bastante proeminente e pode ser facilmente confundida com a da Artrite reumatóide, visto que também compromete pequenas e grandes articulações, na maioria de vezes de forma simétrica. A presença de fator reumatóide em aproximadamente 25% dos pacientes com LES também contribui para essa dificuldade diagnóstica, o que determina uma atenção especial às pacientes femininas jovens que iniciam poliartrite com características clínicas de doença reumatóide.

Na fase tardia da doença, o quadro articular crônico com deformidades reversíveis pode ser confundido ao exame físico com o da Artrite reumatóide, cuja diferenciação está na possibilidade de redução e alinhamento ao exame clínico nos pacientes com LES.

O quadro de miosite associada ao LES deve ser diferenciado da miosite inflamatória, em que o acometimento será intenso, com recidivas freqüentes e com refratariedade ao tratamento farmacológico.

 

Manifestações Pulmonares

A doença intersticial pulmonar, apesar de muito comum nas demais colagenoses, é considerada rara no lúpus. Faz importante diferencial com infecções bacterianas ou oportunistas e, quando presente, deve-se afastar a possibilidade de processo secundário ou sobreposição com outra doença do colágeno. Nos casos com hipertensão pulmonar, sempre se deve afastar tromboembolismo pulmonar, principalmente relacionado à síndrome antifosfolípide e a outros estados de hipercoagulabilidade.

 

Manifestações Cardíacas

As manifestações cardíacas que devem ser consideradas no diagnóstico diferencial incluem principalmente outras causas de miocardite, Serosite, distúrbios de condução e causas atero-embólicas.

 

Manifestações Neurológicas

O mais importante no diagnóstico do lúpus como causa de alterações do sistema nervoso é afastar as demais condições que as justifiquem, como infecção, anormalidades metabólicas, hemorragias, tromboses, isquemias, distúrbios psiquiátricos não relacionados ao lúpus, hipertensão arterial e drogas.

 

Manifestações Renais

A biópsia é de grande valia para a análise de outros fatores que podem interferir na análise da provável lesão histológica, como diabetes melito, hipertensão arterial, síndrome do anticorpo antifosfolípide, levando a trombose de artérias renais e uso de drogas nefrotóxicas.

 

Manifestações Hematológicas

Uma vez que também pode ocorrer de forma isolada, a trombocitopenia do lúpus pode ser diagnosticada como púrpura trombocitopênica imunológica (PTI) quando não são pesquisados fatores antinucleares (FAN) e demais auto-anticorpos próprios do LES. Os demais diagnósticos diferenciais devem considerar doenças infecciosas, efeitos colaterais a imunossupressores e associação com outras doenças auto-imunes.

Na fase em que a febre predomina, o LES deve ser diferenciado de outras doenças sistêmicas ou mesmo infecções crônicas, e quando associada à linfoadenopatia deve ser diferenciado das doenças linfoproliferativas.

 

EXAMES COMPLEMENTARES

 

Exames Laboratoriais

Os exames laboratoriais são muito importantes para o diagnóstico e seguimento desses pacientes. São capazes de avaliar as alterações primárias imunológicas e inflamatórias da doença, assim como o acometimento secundário dos órgãos.

As provas inflamatórias de fase aguda, como a velocidade de hemossedimentação (VHS) e a proteína C reativa (PCR), são úteis para o diagnóstico. A VHS geralmente está aumentada na atividade da doença, refletindo a fase aguda dos processos inflamatórios, porém pode persistir elevada mesmo após o controle da doença, não se correlacionando com sua atividade inflamatória. Entretanto, a PCR é geralmente baixa no LES e aumenta nos processos infecciosos, auxiliando por vezes no diagnóstico diferencial dessas duas condições.

A avaliação imunológica é fundamental para a caracterização da doença auto-imune. Os FANs detectados pela imunofluorescência indireta utilizando a célula HEp-2 é o primeiro teste a ser realizado, pois é positivo em mais de 98% dos casos e um dos critérios diagnósticos (tabela 1). Ressalta-se que a alta sensibilidade desse exame não reflete a sua especificidade, pois o FAN ocorre em um grande número de doenças crônicas (infecciosas, neoplásicas), auto-imunes e mesmo em indivíduos sadios (particularmente idosos).

Diante da suspeita de LES e a positividade do FAN, é fundamental tentar caracterizar os auto-anticorpos específicos da doença, particularmente o anti-DNA nativo (anti-dsDNA) e anti-SM, que são marcadores e suas detecções corroboram o diagnóstico. A positividade do anti-dsDNA chega a 40% e a determinação de seus títulos é útil no acompanhamento da atividade inflamatória da doença, particularmente na nefrite. Da mesma forma, os anticorpos antiproteína P ribossômica, presentes em apenas 10% dos casos de LES, podem, em alguns casos, ser os únicos marcadores de doença e também auxiliam no acompanhamento de pacientes com quadros graves de distúrbios psiquiátricos associados a essa doença. Os anticorpos anti-SM são identificados em aproximadamente 30% dos casos e auxiliam no diagnóstico por serem marcadores específicos.

Outros anticorpos também são detectados e caracterizam o padrão de resposta imune do LES, sendo freqüentes os anticorpos anti-RNP, anti-Ro/SS-A, anti-La/SS-B e os anticorpos antifosfolípide, que estão relacionados com trombose e/ou abortos de repetição, caracterizando a síndrome antifosfolípide (SAF) secundária. Aproximadamente 25% dos casos de LES apresentam positividade do fator reumatóide.

A determinação da atividade hemolítica do complemento e dos níveis séricos dos seus componentes C3 e C4 é extremamente útil na monitorização de doença e da resposta terapêutica. O algoritmo 1 resume os principais exames para o diagnóstico e acompanhamento do LES.

 

Algoritmo 1: Principais exames para o diagnóstico e acompanhamento do LES

 

Exames Radiológicos

O exame de raio X de mãos tem papel complementar na distinção do quadro articular entre o lúpus e a Artrite reumatóide, não sendo esperados no LES achados de erosões nos ossos do carpo, mas sim alterações secundárias ao processo articular inflamatório, como osteopenia peri-articular.

Os demais exames radiológicos como ultra-sonografia, tomografia computadorizada e ressonância magnética devem ser utilizados a fim de aumentar a sensibilidade diagnóstica do acometimento específico a ser analisado: quadro renal, pulmonar, neurológico, músculo-esquelético.

 

TRATAMENTO

O tratamento da doença na maioria das vezes é prolongado e complicado por inúmeros eventos adversos, que contribuem para baixa aderência e por vezes até abandono do tratamento. É papel do médico individualizá-lo ao máximo, para minimizar os riscos e aperfeiçoar o sucesso terapêutico.

Como medidas gerais, devemos orientar a proteção contra a luz solar ou outras formas de irradiação ultravioleta pelos riscos de exacerbação não só das lesões cutâneas, mas também dos quadros sistêmicos. Devemos ainda estar atentos para as doenças cardiovasculares, atuando na profilaxia e no tratamento, visto que esses pacientes possuem maiores risco de óbito por essas causas. O controle da hipertensão arterial sistêmica, da glicemia e da dislipidemia deve ser feito de maneira rigorosa, objetivando os alvos determinados para os pacientes com alto risco cardiovascular, portanto, a atividade física também deve ser estimulada.

Os antiinflamatórios não-hormonais devem ser utilizados com cautela na doença, particularmente nos pacientes com envolvimento renal, pois podem agravar essa disfunção ou mesmo dificultar o monitoramento dos quadros renais. O seu uso está indicado para o controle do quadro articular crônico, serosites leves a moderadas e febre associada à doença.

Os corticosteróides também devem sempre ser utilizados sob muita cautela devido à miríade de efeitos colaterais, entretanto como costumam controlar sobremaneira as manifestações iniciais do quadro agudo da doença são uma ótima opção nessa fase. A gravidade e a rapidez de progressão do processo determinam a dose inicial a ser utilizada. Doses muito altas (1 mg/kg/dia para adultos e de 1-2 mg/kg/dia para crianças/adolescentes) estariam indicadas nos casos graves, como manifestações renais, hematológicas (plaquetopenia e Anemia hemolítica) e de SNC.

Em casos com evolução desfavorável ou rápida, pode-se utilizar a pulsoterapia de glicocorticóides com dose intravenosa de 1 g por dia em três dias consecutivos de metilprednisolona (15-20 mg/kg/dia por dose). Doses baixas a moderadas são usadas para o controle inicial de manifestações mais brandas. A suplementação com cálcio e vitamina D é sempre instituída quando da utilização de corticosteróides ou quando há previsão da sua manutenção por longos períodos. Quando existe uma previsão do uso de corticosteróides por tempo prolongado, procura-se associar uma segunda droga que possibilite a redução da sua dose diária.

Dessa forma, os antimaláricos são habitualmente prescritos, independentemente do órgão ou sistema acometido, embora sejam considerados de primeira escolha nos quadros cutâneos e/ou articulares da doença. O difosfato de cloroquina (4 mg/kg/dia) e a hidroxicloroquina (6 mg/kg/dia) mostraram-se efetivos em controlar a atividade inflamatória da doença, reduzir o tempo da corticoterapia, diminuir o número de flares e promover um melhor controle das dislipidemias. Alguns estudos demonstraram que essa medicação está associada com a manutenção de pacientes em remissão da doença, de forma que alguns autores sugerem manutenção prolongada desta, mesmo em pacientes em que as manifestações foram controladas.

A talidomida (100-200 mg/dia), a dapsona (100 mg/dia), o metotrexate (10-20 mg/semana) e a azatioprina (1-2 mg/kg/dia) são uma ótima opção no caso de lesões cutâneas não-responsivas aos antimaláricos. A talidomida promove resposta em até 75% dos casos, mas só deve ser utilizada quando não há risco de concepção (menopausa ou anticoncepção definitiva). O principal efeito colateral é o aparecimento de neuropatia periférica, o que limita o seu uso mais prolongado. A recidiva dos quadros cutâneos é freqüente após a sua retirada, portanto uma redução lenta e gradativa até a menor dose se faz necessária. A dapsona é efetiva nas lesões bolhosas e no lúpus discóide, e possui como principal efeito colateral a hemólise, por isso é contra-indicada na deficiência de G6PD. O uso da azatioprina deve ser considerado nos quadros cutâneos mais graves, mas está particularmente indicado quando existe vasculite associada. O metotrexate é uma excelente indicação na existência de quadros cutâneos e articulares.

Os quadros hematológicos como plaquetopenia e hemólise requerem doses altas (de 0,6 a 1 mg/kg/dia) de prednisona nas fases iniciais. Nos casos refratários após a associação com os antimaláricos, deve-se considerar o uso de azatioprina (1-3 mg/kg/dia), esteróides androgênicos e ciclofosfamida endovenosa. A gamaglobulina está particularmente indicada para o rápido controle de sangramento diante de plaquetopenia. As plaquetopenias leves (> 50.000) em geral não necessitam de tratamento, mas em casos graves o tratamento é semelhante ao dos pacientes com púrpura trombocitopênica idiopática, inclusive com esplenectomia. A neutropenia, por sua vez, raramente requer tratamento, exceto em pacientes com infecções de repetição.

A ciclofosfamida é a mais efetiva para as nefrites proliferativas do LES, e na fase inicial do tratamento deve ser utilizada associada à prednisona em altas doses por período mínimo de 6 a 8 semanas. Os pulsos endovenosos mensais de ciclofosfamida (0,5 a 1,0 g/m2/dose) são utilizados para a indução de remissão (6-8 pulsos) (algoritmo 2). Posteriormente, pode-se prosseguir com o esquema bimensal até completar um ano. Alternativamente, pode-se utilizar a azatioprina ou o micofenolato de mofetil por dois anos para manutenção da remissão, que são esquemas menos tóxicos e aparentemente tão efetivos após a indução com ciclofosfamida. Importante salientar que é de suma importância o controle rigoroso dos níveis pressóricos, pois a hipertensão arterial é um determinante para insuficiência renal e mortalidade no LES.

O melhor imunossupressor para a glomerulonefrite membranosa é ainda controverso. Na fase inicial, a corticoterapia em altas doses e os inibidores de enzima de conversão com efeito antiproteinúrico são particularmente indicados. Nos casos refratários podem-se indicar micofenolato mofetil, ciclosporina, azatioprina e até mesmo ciclofosfamida, porém não existem estudos controlados na literatura (algoritmo 2).

 

Algoritmo 2: Esquema resumido de tratamento da nefrite lúpica

 

De forma geral, os imunossupressores também podem ser indicados quando da gravidade de outras manifestações do LES. A ciclofosfamida estaria indicada nos casos mais graves, enquanto nos casos leves a moderados utilizam-se azatioprina, ciclosporina e micofenolato mofetil.

Uma vez que muitas pacientes com lúpus apresentam fertilidade normal, deve-se considerar a anticoncepção com agentes contendo progesterona quando da utilização dessas drogas. Outros métodos, como o estrógeno e o DIU, têm suas limitações pelo risco de ativação da doença e de infecção. A gestação deve ser planejada em conjunto com a paciente, devendo-se evitar a gravidez na fase em que doença estiver ativa e, se possível, após o clareamento de drogas tóxicas ao feto.

Os recursos atuais da genômica humana têm permitido o reconhecimento de novos alvos terapêuticos devido ao melhor entendimento da patogenia do lúpus. O aprimoramento das modalidades terapêuticas promoveu aumento significativo na sobrevida dos pacientes com LES nas últimas décadas.

 

TÓPICOS IMPORTANTES E RECOMENDAÇÕES

         O LES é uma doença auto-imune cujo diagnóstico baseia-se em critérios clínicos e laboratoriais. Pode promover quadros inflamatórios em todos os órgãos e, portanto, tem uma apresentação clínica polimórfica.

         O LES é uma doença inflamatória em que multifatorial; genética, infecções e fatores hormonais influenciam no seu aparecimento.

         A presença de anti-DNA de dupla-hélice, anti-SM e anti-P são específicas para o diagnóstico da doença, mas outros auto-anticorpos podem estar presentes.

         As manifestações mais comuns do LES são articulares e cutâneas.

         A Fotossensibilidade é uma característica marcante das lesões cutâneas.

         O quadro articular é em geral de poliartrite simétrica episódica, de carácter migratório ou aditivo, e quase sempre não deformante.

         A pleurite com ou sem derrame pleural é a manifestação pulmonar mais freqüente na doença, embora manifestações mais graves como pneumonite e hemorragia alveolar possam ocorrer.

         As manifestações neurológicas da doença são variadas e incluem psicose, epilepsia e alteração de comportamento.

         A nefrite lúpica do tipo proliferativa difusa (tipo IV) apresenta pior prognóstico, e a utilização dos critérios de atividade e cronicidade ajudam a tomar a decisão terapêutica.

         As manifestações hematológicas incluem linfopenia, neutropenia, plaquetopenia e anemia.

         O LES induzido por droga não costuma cursar com acometimento renal e de SNC e tem como marcador característico a presença do Ac anti-histona.

         As manifestações do LES podem ser inespecíficas e o diagnóstico diferencial irá incluir doenças inflamatórias, infecciosas e, quando associadas a linfadenomegalia e hepatoeplenomegalia, deve ser diferenciado das doenças linfoproliferativas.

         Os pacientes podem ter rigidez matinal e fator reumatóide positivo, o que torna difícil a diferenciação com a Artrite reumatóide.

         Pacientes com LES podem apresentar hipertensão pulmonar, mas, nesses casos, deve ser descartado tromboembolismo pulmonar, que pode ocorrer associado a síndrome do anticorpo antifosfolípide.

         O FAN é fundamental para o diagnóstico de LES, sendo positivo em cerca de 98% dos pacientes. No entanto, não é um exame específico, se elevando também em um grande número de doenças crônicas (infecciosas, neoplásicas), auto-imunes e mesmo em indivíduos sadios (particularmente idosos).

         O anti-dsDNA e anti-SM são altamente específicos de LES. A determinação dos títulos de anti-dsDNA é também útil no acompanhamento da atividade inflamatória da doença.

         O exame de X de mãos em pacientes com LES pode apresentar osteopenia peri-articular, como ocorre na Artrite reumatóide, mas não cursa com alterações erosivas.

         Proteção contra luz solar protege contra aparecimento de exacerbações tanto cutâneas como sistêmicas.

         Os antiinflamatórios não-hormonais devem ser utilizados com cautela na doença, particularmente nos pacientes com envolvimento renal, mas podem ser utilizados se não houver contra-indicações para controle de manifestações articulares, Serosite e febre associada a doença.

         Os antimaláricos são utilizados independente da manifestação, pois induzem mais freqüentemente remissões prolongadas. São drogas de primeira escolha em pacientes com manifestações cutâneas e articulares.

         Os quadros hematológicos como plaquetopenia e hemólise requerem doses altas de prednisona nas fases iniciais. Nos casos refratários após a associação com os antimaláricos, deve-se considerar o uso de azatioprina, esteróides androgênicos e ciclofosfamida endovenosa.

         Nas nefrites proliferativas, a utilização de pulsoterapia com metilprednisolona e ciclofosfamida mensal costuma ser necessária. Em casos em que remissão foi induzida pode-se considerar manutenção com micofenolato, que apresenta menor toxicidade.

 

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