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ASMA NA EMERGÊNCIA

Asma na Emergência

A asma é uma doença inflamatória crônica das vias aéreas em que  muitas células e elementos celulares têm participação. A inflamação crônica está associada à hiper-responsividade das vias aéreas que leva a episódios recorrentes de sibilos, dispneia, opressão torácica e tosse, particularmente à noite ou no início da manhã. Esses episódios são uma consequência da obstrução ao fluxo aéreo intrapulmonar generalizada e variável, reversível espontaneamente ou com tratamento. A asma aguda é definida como exacerbação requerendo tratamento de urgência ou emergência.

 

Epidemiologia

É uma das doenças mais comuns em países desenvolvidos e tem uma prevalência mundial de 7 a 10%. No Brasil estima-se uma prevalência de asma de 10%, com cerca de 20 milhões de asmáticos no país. Ocorrem entre 300 a 350 mil internações hospitalares por asma, representando a terceira ou a quarta causa de hospitalização no SUS. A mortalidade da asma felizmente é baixa com cerca de 2.000 mortes ao ano.

 De 2001 a 2003, nos Estados Unidos a asma foi responsável por uma média de 4.210 mortes por ano e uma média total anual de aproximadamente 504.000 hospitalizações e 1,8 milhões de visitas no departamento de emergência. A taxa média anual de consultas de emergência para asma foi de 8,8 por 100 pessoas com asma. As taxas foram maiores entre as crianças do que entre os adultos (11,2 vs. 7,8 visitas a cada 100 pessoas), entre os negros do que entre os brancos (21 vs. 7 visitas a cada 100 pessoas), e entre os hispânicos do que entre os não hispânicos (12,4 vs. 8,4 visitas a cada 100 pessoas). Mulheres representaram duas vezes o número de visitas no serviço de urgência em relação aos homens. Aproximadamente 10% das visitas resultaram em hospitalização. Cerca de 60% dos gastos com asma nos EUA são relacionados com atendimentos de Asma na Emergência.

A asma é uma doença heterogênea com diferentes precipitantes, manifestações e respostas ao tratamento. Alguns pacientes com asma aguda grave respondem rapidamente à terapia agressiva e podem receber alta rapidamente; outros exigem a admissão ao hospital para tratamento prolongado. As razões para diferença de resposta ao tratamento inclui o grau de inflamação das vias aéreas, presença ou ausência de muco e resposta individual aos medicamentos p2-adrenérgicos e corticosteroides.

O grande desafio no departamento de emergência é determinar quais pacientes podem receber alta de forma rápida e quais precisam ser hospitalizados.

 

Fisiopatologia

A fisiopatologia da asma implica em diversos mecanismos, dentro desses provavelmente o mais importante é o da inflamação. A inflamação da submucosa, com hiperirritabilidade da musculatura lisa de vias aéreas pode ser precipitada por exposição a alérgenos, poeira, agentes químicos, infecções virais e fatores não identificados.

Os pacientes asmáticos apresentam dois padrões de resposta aos aeroalérgenos, uma resposta precoce e outra tardia. A resposta precoce tem início imediato se resolvendo em 1-2 horas. Em 50% dos pacientes essa resposta imediata é seguida de resposta tardia 3-12 horas após com hiper-responsividade e inflamação das vias aéreas. O mecanismo de ambos os tipos de resposta envolve ativação induzida pelo alérgeno dos mastócitos, ativação esta mediada por IgE, e dos linfócitos T, resultando em contração da musculatura lisa, aumento da permeabilidade vascular e acúmulo de eosinófilos e mastócitos.

Em pacientes com asma severa resistente ao tratamento com corticosteroides e principalmente nos casos de crises agudas severas de asma fatais ou quase fatais aparece um número aumentado de neutrófilos no tecido das vias aéreas desses pacientes, em contraste com os achados de pacientes com asma leve a moderada, o que sugere um substrato fisiopatológico diferente nesses pacientes. O papel desses neutrófilos na fisiopatologia da asma é ainda muito debatido.

Os neutrófilos parecem potencializar as crises de asma, em particular as exacerbações agudas destas. Substâncias como elastase neutrofílica, catepsina G e proteinase 3 são secretadas por neutrófilos, sendo mediadores inflamatórios e de degranulação das células glandulares da submucosa. A produção de muco encontra-se aumentada nesses pacientes, assim como a permeabilidade broncovascular.

O acúmulo de neutrófilos nas vias aéreas dos pacientes com exacerbações agudas de asma parece ser mediado por secreção de interleucina-8 pelas células epiteliais das vias aéreas, ativadas por vírus ou exposição a antígenos.

A suscetibilidade ao desenvolvimento de asma também parece estar associada com a colonização microbiana das vias respiratórias. Um estudo demonstrou aumento da detecção de bactérias patogênicas relatadas nas vias aéreas superiores de lactentes que mais tarde desenvolveram sintomas de asma em idade pré-escolar.

Os vírus, especialmente rinovírus, são muitas vezes isolados a partir das vias aéreas superiores de doentes com asma durante exacerbações. O rinovírus em pacientes asmáticos aumenta a chance de desenvolvimento de sintomas respiratórios. Os resultados de estudos longitudinais recentes sugeriram que a exposição a certos fungos, especificamente Aspergillus ochraceus, Aspergillus, penicillium durante os primeiros anos de vida está positivamente associada à incidência de asma por idade.

Em relação a crises agudas, o principal fator precipitante são as infecções virais representando cerca de 80% dos casos de exacerbação aguda. As infecções virais podem levar à reação inflamatória persistente nas vias aéreas, o que leva à necessidade do uso de corticosteroides por períodos maiores do que uma semana. Se essas infecções virais apresentam papel na evolução crônica dos pacientes com asma ainda é controverso.

A exposição a aeroalérgenos e mudanças climáticas também são fatores precipitantes de crise aguda de asma e podem desencadear uma crise asmática mais rapidamente (apenas algumas horas). Infecções bacterianas (Mycoplasma pneumoniae, C. pneumoniae e outras bactérias), uso de algumas medicações (em particular o ácido acetilsalicílico e betabloqueadores), estresse emocional e exercício físico também são causas bem descritas de exacerbação aguda de asma.

Durante a última década, a compreensão da patogênese da asma passou por uma mudança significativa. A visão clássica é de que a asma é uma doença com resposta Th2 dependente em grande parte medida por  IgE. Esse ponto de vista foi amplamente baseado na observação de que os doentes asmáticos são mais provavelmente sensibilizados por aeroalérgenos. Além disso, a patologia da asma (especialmente os casos mais graves) é caracterizada por hiperplasia de células mucoides e infiltração de células inflamatórias, dentre as quais os linfócitos T CD4, eosinófilos e mastócitos predominantemente.

As células Th2 secretam interleucinas como IL-13, IL-4 e IL-5 que coordenadamente regulam muitos aspectos da inflamação alérgica, mais recentemente esse paradigma de célula T foi reforçado pela identificação de células T reguladoras com a capacidade de controle de respostas Th2.

O processo inflamatório crônico de vias aéreas pode em longo prazo levar ao remodelamento das vias aéreas com fibrose e hipertrofia de musculatura lisa. Da mesma forma, alterações estruturais nas vias aéreas de indivíduos asmáticos contribuem para o desenvolvimento e progressão da doença; dentre os casos graves, a obstrução das vias respiratórias por hipertrofia de células mucoides é comum.  A membrana subepitelial é espessada e a massa do músculo liso é aumentada através de hipertrofia e hiperplasia, as vias aéreas são submetidas a um processo de fibrose com o aumento da deposição de tecido conjuntivo, fibroblasto e proliferação fibroblástica miofibrilar. Não está claro se inflamação precede ou coexiste com remodelamento das vias aéreas, mas remodelação pode ocorrer no início da doença, em alguns casos na ausência de inflamação. A investigação tem relações intrigantes entre estresse mecânico e remodelação das vias aéreas na via aérea de pacientes com asma.

Um outro mecanismo envolvido na crise asmática está relacionado à inervação autonômica das vias aéreas. Dados experimentais sugerem que a ativação de células inflamatórias e a liberação de mediadores inflamatórios como leucotrienos e bradicininas alteram o limiar de despolarização de neurônios dos brônquios e bronquíolos, o que pode causar aumento da irritabilidade das vias aéreas. O termo inflamação neurogênica é usado para descrever as respostas inflamatórias causadas pelas citocinas que ativam receptores neurais (adre­nérgicos, colinérgicos e outros). A neurocinina A e a substância P são alguns desses mediadores.

 

Avaliação Inicial do Departamento de Emergência

Pacientes que se apresentam ao departamento de emergência com asma devem ser avaliados e triados rapidamente para avaliar a gravidade da exacerbação e a necessidade de intervenção urgente. Uma breve história deve ser obtida e um exame físico limitado ser realizado. Essa avaliação não deve atrasar o tratamento; ela pode ser realizada enquanto os pacientes recebem tratamento inicial. Os clínicos devem procurar por sinais de asma com risco de vida (por exemplo, estado mental alterado, respiração paradoxal ou movimento abdominal ou ausência de sibilância), que exigem a admissão hospitalar. A retração do músculo esternocleidomastoídeo, por exemplo, parece ocorrer apenas em crises de asma muito severas, apresentando correlação com valores de PFR < 40l/min (o que corresponderia a 8-10% do valor predito) e VEF1<1l.

A presença de sinais clássicos de obstrução como sibilância são bons preditores de obstrução, mas a ausência destes pode ser enganadora. A presença de tórax com ausculta sem ruídos adventícios e diminuída ausculta do murmúrio vesicular pode, por exemplo, ser preditor de insuficiência respiratória ocasionada por severa obstrução ao fluxo aéreo ou por pneumotórax hipertensivo. Assim é difícil classificar a severidade da obstrução baseada em parâmetros clínicos isolados, a tabela 1 adaptada do consenso brasileiro de asma e do GINA( Global Initiativa Asthma Prevention) classifica a severidade das crises de asma.

 

Tabela 1: Classificação da severidade das crises de asma

 

Capacidade de falar

Fala frases

Fala palavras

Posição corporal

Prefere ficar sentado

Incapaz de deitar

Estado mental

Não está agitado

Agitado

Musculatura acessória

Não

Uso de musculatura acessória

Frequência cardíaca

Até 120 bpm

> 120 bpm

Frequência respiratória

Até 30 ipm

FR > 30 ipm

SatO2%

90% ou mais

< 90%

Peak Flow

>% 50 do predito

<= 50% do predito

 

E por final temos os pacientes com parada cardiorrespiratória eminente que apresentam os seguintes achados:

 

-Confusão mental;

-Rebaixamento do nível de consciência;

-Tórax silente.

 

Paciente com qualquer um dos três sinais descritos acima tem indicação formal de intubação orotraqueal e ventilação mecânica invasiva.

Deve ser dada atenção aos fatores que se associam com risco aumentado de morte, tais como intubação anterior ou admissão em UTI prévia, ou duas ou mais internações prévias devido à asma, baixo nível socioeconômico e comorbidades coexistentes. A medição da função pulmonar (por exemplo, forçado volume expiratório em 1 segundo [FEV1] ou pico expiratório peek flow [PFE]) pode ser útil para avaliar a gravidade da exacerbação e a resposta ao tratamento, mas não deve atrasar o início do tratamento. Estudos laboratoriais e de imagem devem ser realizados de forma seletiva para avaliar pacientes para insuficiência respiratória iminente (por exemplo, medindo a pressão parcial de dióxido de carbono arterial [PaCO2]), pneumonia associada (por exemplo, através da obtenção de um hemograma completo ou uma radiografia de tórax), ou certas condições coexistentes, como doença cardíaca (por exemplo, através da obtenção de um eletrocardiograma).

 

São consideradas indicações de exames:

-R-X de tórax: não indicado rotineiramente, apenas em uma minoria dos pacientes modifica o tratamento, deve ser realizado na suspeita de outras doenças pulmonares e cardíacas concomitantes, se sinais e sintomas sugestivos de pneumonia.

-Saturação arterial de oxigênio e gasometria arterial: a saturação de oxigênio deve ser realizada em todos os pacientes com desconforto respiratório e asma. A gasometria arterial não é necessária, por sua vez, deve ser realizada em todos os pacientes, entretanto a suspeita de hipoventilação, desconforto respiratório importante, VEF1 ou PFR<30% do predito são indicações para sua realização.

-Hemograma completo e eletrolitos: está indicada nos pacientes febris e com expectorado purulento, a determinação de eletrólitos, em particular do potássio, é interessante em pacientes internados como forma de monitorar complicações da terapêutica como a hipocalemia que ocorre em pacientes em uso constante de beta2-agonistas e altas doses de corticoesteroides.

-ECG: não é realizado de rotina nesses pacientes, porém em pacientes com doença cardíaca ou doença pulmonar obstrutiva crônica concomitante e pacientes maiores de 50 anos pode ser benéfico. O exame ocasionalmente demonstra padrão de strain ventricular direito, reversível muitas vezes com o tratamento da asma.

-Prova de função pulmonar e peak-flow: a prova de função pulmonar ou pelo menos do peak flow é de grande importância no manejo desses pacientes, sendo considerado seu uso uma recomendação de grau I segundo consensos da literatura.

 

A indicação de realização de outros exames dependerá  das condições associadas e características individuais de cada caso.

 

Tratamento no Departamento de Emergência

Todos os pacientes devem ser tratados inicialmente com oxigênio suplementar para manter uma saturação de oxigênio maior do que 90%, B-2 adrenérgicos de curta duração inalatórios e corticosteroides sistêmicos. A dose e o tempo desses agentes e a utilização de terapia farmacológica adicional depende da gravidade da exacerbação. O objetivo com o uso de oxigênio é manter a saturação de oxigênio > 92% e sua titulação é obtida com a oximetria de pulso e em geral 1 a 3 litros de fluxo são suficientes, sendo recomendado usar o menor fluxo possível que seja adequado para o paciente. Não é necessário oxigênio em pacientes com saturação de oxigênio adequado e sem desconforto respiratório.

 

-ß2-adrenérgicos agonistas

Os B-2-adrenérgicos de curta ação inalatórios devem ser administrados imediatamente após a apresentação, e a administração pode ser repetida até três vezes dentro da primeira hora após a apresentação, posteriormente as doses devem ser espaçadas com um período mínimo entre inalações de uma hora. O uso de um inalador com dose calibrada com um espaçador é tão eficaz quanto a utilização de um nebulizador pressurizado em estudos randomizados, mas a técnica adequada é muitas vezes difícil de garantir em pacientes com desconforto respiratório. A maioria das diretrizes recomenda o uso de nebulizadores para pacientes com exacerbações graves. Os inaladores de dose calibrada com espaçador podem ser usados para pacientes com crise leve e moderada. A dose nas exacerbações deve ser maior do que a utilizada rotineiramente para pioras que ocorrem rotineiramente durante o dia, em pacientes asmáticos com 4-8 puffs de salbutamol pode ser administrada a cada 20 minutos e depois a cada 1 a 4 horas, conforme necessário. Albuterol pode ser fornecido por meio de um nebulizador, quer de forma intermitente ou continuamente. Uma meta-análise de seis ensaios randomizados não mostrou  diferenças entre a administração intermitente e a administração contínua.

A dose de fenoterol e albuterol é de 2,5 mg a 5 mg em cada inalação, o que corresponde a 10 a 20 gotas de fenoterol. O fenoterol em comparação com o albuterol é associado ao maior número de complicações, sendo assim indicado de preferência o uso do albuterol. O levalbuterol, que é um derivado do albuterol, demonstrou ser eficaz em metade da dose do albuterol, mas estudos randomizados realizados no departamento de emergência não têm consistentemente mostrado vantagem clínica do levalbuterol. O pirbuterol e o bitolterol são eficazes para exacerbações leves ou moderadas, mas uma dose mais elevada do que é necessária com o albuterol ou levalbuterol é necessária e sua utilização para exacerbações graves não foi estudada.

A administração oral ou parenteral de ß2-agonistas adrenérgicos não é recomendada, uma vez que não se mostrou mais eficaz do que agonistas beta-2 inalatórios, e são ambos associados ao aumento da frequência cardíaca. Os ß2-adrenérgicos de longa ação como o salmeterol não foram estudados para o tratamento de exacerbações, apesar de alguns estudos com o formoterol, ainda assim eles não podem ser recomendados de rotina para o manejo desses pacientes.

 

-Agentes anticolinérgicos

Por causa de seu início relativamente lento de ação, o ipratrópio inalatório não é recomendado como monoterapia no departamento de emergência, mas pode ser adicionado a um agonista ß2-adrenérgicos de ação curta para aumentar o efeito broncodilatador com uma resposta mais duradoura. Em pacientes com obstrução grave ao fluxo aéreo, o uso de ipratrópio em conjunto com um ß2-adrenérgico no departamento de emergência, em comparação com um agonista ß2-adrenérgico isoladamente,  reduz as taxas de hospitalização em cerca de 25%, embora não exista nenhum benefício aparente da continuação do uso de ipratrópio após a hospitalização. A recomendação de seu uso é nas seguintes situações:

1-O uso de múltiplas doses de brometo de ipatrópio é indicado em crianças e adultos com ataque agudo severo de asma, definido por VEF1<60%.

2-O uso de dose única de anticolinérgico associado ao beta-2 agonistas é associado com modesta melhora de função pulmonar, mas sem diminuição de taxas de admissão hospitalar.

3-O uso de sulfato de atropina como anticolinérgico não foi associado à melhora de desfechos clínicos e aumenta substancialmente os efeitos colaterais.

4-Considerando o baixo preço do brometo de ipatrópio, a adição destes para tratamento de crises severas resulta em diminuição de custos de saúde, conforme a análise realizada por Lord e colaboradores.

 

-Corticoesteroides

Os corticosteroides sistêmicos são indicados na maioria dos pacientes com exacerbações que precisam de tratamento no departamento de emergência. A exceção é o paciente que tem uma resposta rápida à terapia inicial com um ß2-adrenérgico inalado. Embora a dose ótima de corticosteroide não seja conhecida. Estudos envolvendo pacientes vistos no departamento de emergência não demonstraram nenhuma vantagem significativa de doses maiores do que 100 mg por dia ou equivalente de prednisona. As diretrizes mais recentes recomendam a utilização de 40 a 80 mg por dia em uma dose ou dividida em duas doses.

Apesar de os corticosteroides inalatórios  serem muito utilizados para o controle da asma, a evidência não suporta o uso de corticosteroides inalatórios como um substituto para corticosteroides sistêmicos na emergência. No momento da alta no departamento de emergência, esses agentes deverão ser continuados para o controle em longo prazo e devem ser prescritos para pacientes que não tenham tomado anteriormente. Em um estudo randomizado, controlado de 1.006 pacientes consecutivos com asma aguda tratados em um departamento de emergência do Canadá, o uso na alta de budesonida inalatória (por 21 dias) para o tratamento com corticosteroides orais (durante 5 a 10 dias) foi associado com uma redução de 48% na taxa de recidiva em 21 dias e com melhora da qualidade de vida com respeito à asma em questionários de sintomas.

 

Outras medicações: embora as metilxantinas tenham sido uma vez o padrão de tratamento para a asma no departamento de emergência, hoje é claro que seu uso aumenta o risco de eventos adversos, sem melhorar os desfechos.

Os antibióticos não devem ser usados rotineiramente, mas devem ser reservados para pacientes nos quais a infecção bacteriana (por exemplo, pneumonia ou sinusite) esteja associada. Da mesma forma, nem a hidratação agressiva nem a administração de agentes mucolíticos é recomendada para exacerbações agudas.

 

Avaliação da Resposta ao Tratamento

Os pacientes devem ser reavaliados após o tratamento inicial com broncodilatadores inalatórios e novamente em 60 a 90 minutos (isto é, após três tratamentos). Isso deve incluir uma pesquisa de avaliação de sintomas, um exame físico e mensuração de VEF1 ou PFE. Para as exacerbações mais graves esta avaliação provavelmente deve ser repetida e inclui gasometria arterial. A maioria dos pacientes terá melhora significativa após uma dose de broncodilatadores inalatórios e 60 a 70% irá satisfazer os critérios para a alta do departamento de emergência após três doses. O grau de melhora objetiva e subjetiva prevê a necessidade de internação. Em um estudo com 720 pacientes no departamento de emergência verificou-se que a avaliação após uma hora de tratamento é uma melhor preditora do que a avaliação inicial no departamento de emergência.

Em pacientes com asma grave refratária ao tratamento padrão, o uso de sulfato de magnésio intravenoso é amplamente utilizado, mas existe controvérsia quanto à sua eficácia. Uma meta-análise de 1.669 pacientes em 24 estudos que receberam sulfato de magnésio intravenoso ou nebulização com sulfato de magnésio (9 estudos) mostrou que o tratamento intravenoso foi fracamente associado com melhora da função pulmonar em adultos, mas não teve efeito significativo sobre internações hospitalares. Nas crianças, o uso de sulfato de magnésio intravenoso melhorou a função pulmonar significativamente e reduziu as taxas de admissão hospitalar. O efeito do sulfato de magnésio nebulizado é menos definido e não pode ser recomendado de rotina.

Os resultados de um grande estudo multicêntrico nos Estados Unidos compararam o tratamento com sulfato de magnésio intravenoso ou em nebulização com tratamento padrão em pacientes com asma grave e não encontraram diferenças significativas.

O heliox é uma mistura de hélio e oxigênio, geralmente na proporção 79% e 21%, respectivamente, com uma densidade de cerca de um terço de ar quereduz a resistência ao fluxo aéreo. Dentro das regiões da árvore brônquica onde o fluxo turbulento predomina a medicação pode reduzir o trabalho da respiração e pode melhorar a entrega de medicamentos em aerossol. No entanto, o seu papel no manejo da asma aguda grave não é evidente . Uma análise da Cochrane de 544 pacientes conduziram à conclusão de que o heliox pode ser benéfico em pacientes com obstrução grave ao fluxo aéreo que não tiveram uma resposta ao tratamento inicial.

A administração de inibidores dos leucotrienos por via oral resulta em aumentos no FEV1 dentro de 1 a 2 horas. Tem havido interesse em utilizar esses agentes no departamento de emergência, mas a sua utilidade não é evidente, um estudo randomizado, controlado com montelucaste mostrou melhora significativa do FEV1 em 60 minutos, mas não reduziu a taxa de hospitalização.

 

-Indicações para admissão

Após o tratamento no departamento de emergência por 1 a 3 horas, os pacientes que têm uma resposta ruim ou incompleta, definida como um FEV1 ou PFE de menos de 70% do valor previsto, devem ser avaliados para a admissão no hospital. Os pacientes que têm um VEF1 menor do que 40%, sintomas moderados ou graves persistentes, sonolência, confusão mental, ou uma PaCO2 de 42 mm Hg ou maior devem ser internados. Os pacientes que têm FEV1 entre 40 a 69% e sintomas leves devem ser avaliados individualmente para os fatores de risco para óbito, capacidade de aderir a um regime prescrito e a presença de desencadeante de asma em casa. Idealmente a decisão da admissão de um paciente deve ser realizada dentro de 4 horas após a apresentação no departamento de emergência.

 

-Manejo da insuficiência respiratória

Pacientes com estado mental alterado, exaustão, ou hipercapnia devem ser considerados para imediata intubação e suporte ventilatório. Por causa de altas pressões intratorácicas positivas, intubação e ventilação podem causar hipotensão e barotrauma. Cuidados devem ser tomados para assegurar a adequação do volume intravascular e para evitar altas pressões nas vias aéreas. A estratégia de "hipercapnia permissiva" pode ser obtida ajustando o ventilador, corrigindo hipoxemia, evitando altas pressões nas vias aéreas; foi associada em um estudo observacional com diminuição na mortalidade entre os pacientes com estado de mal asmático e essa abordagem tem se tornado padrão. Diretrizes sugerem que uma vez que a decisão de intubação for realizada, o procedimento deve ser semieletivo e executado sob condições controladas. Estudos clínicos randomizados têm demonstrado um benefício da ventilação não invasiva em exacerbações agudas da doença pulmonar obstrutiva crônica, mas a maioria das informações utilizadas para orientar a estratégia de ventilação para o tratamento da asma aguda vem de relatos de casos ou estudos não controlados. Um estudo randomizado comparou o uso de dois níveis de pressão positiva durante 2 horas com padrão de ventilação protetora em crianças com asma aguda mostrando uma taxa significativamente menor de sintomas, mas não houve diferença significativa na saturação de oxigênio arterial, os níveis de dióxido de carbono e outros desfechos. O uso da pressão positiva não invasiva pode ser considerado para pacientes que recusam a intubação e para pacientes selecionados que estão propensos a cooperar com a terapia com máscara, mas estudos são necessários para essa abordagem ser recomendada.

 

-Alta do Departamento de Emergência

Os pacientes podem receber alta se o FEV1 ou PFE após o tratamento for de 70% ou mais do previsto e se as melhoras na função pulmonar e ausência de sintomas for de pelo menos 60 minutos. Após a alta, os pacientes devem continuar utilizando ß2-agonistas de curta duração, conforme necessidade, e devem ser utilizados corticosteroides orais por 3 a 10 dias. Os corticoesteroides inalatórios podem ser iniciados a qualquer momento. Durante o tratamento da exacerbação, mas no início no momento da alta, se não antes, é prudente para reduzir o risco de recidiva.

A necessidade de tratamento no departamento de emergência muitas vezes reflete a terapia de manutenção inadequada e insuficiente conhecimento de como lidar com a piora do controle da asma. O departamento de emergência é uma oportunidade única para educar os pacientes sobre os medicamentos, a técnica de inalação e as etapas que podem reduzir a exposição aos desencadeantes para assegurar que não ocorram recidivas. Os pacientes devem ter um plano de ação e instruções,  acompanhamento para os sintomas e implementação desses planos. Uma consulta de acompanhamento deve ser agendada com o médico do paciente ou com um especialista em asma de 1 a 4 semanas após a alta. As diretrizes recomendam que os pacientes devem ser incentivados a contatar seu médico dentro de 3 a 5 dias após a alta, quando o risco de recidiva é maior.

 

Referências

1-Lazarus LC. Emergency tratment of asthma 2010; 363: 755-764.

 

2- Global Initiative for Asthma (GINA). Global Burden of Asthma Report. www.ginasthma.org acesso março 2016.

 

3- British Thoracic Society, Scottish Intercollegiate Guidelines Network. British guideline on the management of asthma. Thorax 2014; 69 Suppl 1:1.