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Perda de Peso

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 02/11/2008

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INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES

            O peso corporal de um indivíduo, influenciado por um componente genético, é o resultado do balanço entre ingesta de calorias, níveis de atividade e gastos metabólicos. A perda de peso é uma queixa comum, principalmente entre pacientes idosos, cuja prevalência varia entre 10% e 20%, e constitui muitas vezes um desafio ao médico por ser uma manifestação inespecífica associada a diversas condições. A importância de se valorizar essa queixa pode ser demonstrada com dados de estudos retrospectivos, que mostram mortalidade variando entre 9% e 38% em dois a três anos para idosos com perda de peso significativa. Apenas um terço dos pacientes com perda de peso tende a relatar tal dado como uma queixa ao seu médico, o que nos mostra que se deve questionar ativamente os pacientes durante a consulta clínica.

            Definimos perda de peso clinicamente importante como uma diminuição de ao menos 5 kg ou maior do que 5% do peso de base, durante um período de seis a doze meses.  Os caminhos que levam à perda de peso incluem o aumento da demanda metabólica, a diminuição da ingesta calórica ou as perdas de energia (através das fezes ou da urina, por exemplo), sabendo que esses fatores podem estar superpostos.

            Didaticamente, podemos dividir a perda de peso em voluntária ou involuntária, sendo essa última quase sempre um sinal de doença que merece investigação, a despeito de estar ligada a aumento ou diminuição de apetite. Há um estudo prospectivo que aponta uma mortalidade de 25% em um ano para pacientes com perda de peso involuntária significativa. Já as perdas voluntárias, quando não ligadas a um paciente obeso ou com sobrepeso que sabidamente está fazendo dieta, devem remeter a problemas psiquiátricos ou à busca por modelos estéticos impostos pela sociedade.

 

ACHADOS CLÍNICOS

História clínica

 

Algumas perguntas devem nortear a anamnese quando se investiga perda de peso:

 

         Realmente houve perda de peso? 50% dos pacientes que relatam perda de peso não apresentam realmente nenhuma perda quando se faz uma medida objetiva. Se não houver uma medida de peso prévia, tentar usar dados como roupas que ficaram mais largas ou a comprovação de familiares.

 

         Como é o comportamento do peso do paciente normalmente? Pacientes que têm um peso estável devem ter sua queixa muito mais valorizada do que pacientes que têm períodos de flutuações de peso conforme ingesta alimentar e atividade física.

 

         A perda foi voluntária? As causas de perda de peso involuntária são mais relacionadas a doenças de maior gravidade como neoplasias, doenças crônicas (ICC, DPOC, IRC), endocrinopatias ou infecção por HIV.

 

         Houve alteração de apetite? Há muito mais causas de perda de peso com perda de apetite (neoplasias, doenças crônicas, DPOC, doença de trato gastrintestinal, depressão, uso de drogas) do que perda de peso com aumento do apetite (hipertiroidismo, diabetes, síndrome de má-absorção).

 

         O paciente é idoso? Esse é um ponto fundamental. A partir dos 60 anos passamos a ter uma perda natural de 0,5% do nosso peso corpóreo ao ano. Entretanto, é nos idosos que encontramos as maiores taxas de mortalidade associadas a perda de peso (até 38% em dois a três anos). Portanto, é preciso sempre ter cautela ao analisar esses casos.

 

            Para todos os pacientes deve ser feito um completo interrogatório, a começar pelos sintomas mais comumente associados a perda de peso: febre, dor, dispnéia, palpitação ou sinal de doença neurológica. Questionar também sintomas gastrintestinais: disfagia, anorexia, náuseas, alteração de hábito intestinal. Pesquisar sobre uso de cigarro, álcool, outras drogas e medicamentos, passado cirúrgico, história familiar de neoplasia, procedência remota de áreas de doenças endêmicas, contato com tuberculose e fatores de risco para HIV. Deve-se lembrar de realizar uma adequada anamnese psíquica em busca de sintomas de depressão, ansiedade ou sinais de demência. Sempre perguntar sobre o uso de medicações e questionar sobre uso de drogas, lícitas ou ilícitas.

 

Exame físico

 

            Os dados de exame físico são importantes para auxiliar no raciocínio etiológico da perda de peso ao fornecer informações sobre a possível causa. A postura do médico nesses casos deve ser a de um examinador ativo em busca de qualquer pista que o ajude. Alguns pontos devem ser lembrados:

 

         Pesar o paciente na primeira consulta e consecutivamente. Lembrar-se sempre de pesar e calcular o IMC do paciente, pois são as únicas formas objetivas de documentar a perda de peso, tanto para comparar com possíveis medidas prévias quanto para o seguimento evolutivo durante a investigação.

 

         Sinais gerais. Febre pode apontar infecção ou neoplasia. Taquicardia pode se relacionar a hipertiroidismo ou abuso de anfetaminas. Dispnéia é uma pista para ICC e DPOC. Descoramento e anemia podem ser sinais de uma neoplasia.

 

         Palpar a região cervical. Procure por aumento linfonodal e caracterize os linfonodos acometidos. Outro ponto a ressaltar é a palpação de tireóide, procurando por bócio ou nódulos.

 

         Exame do tórax. Crepitação e sibilância, sopros e terceira bulha devem ser procurados. Lembrar que podem sugerir doenças cardíacas ou pulmonares.

 

         Procurar por linfonodos aumentados em todas as cadeias do corpo. Diversas doenças neoplásicas e infecciosas estão relacionadas a linfonodomegalia.

 

         Procure massas abdominais. Hepatomegalia e esplenomegalia, bem como presença de massas são pistas para doenças crônicas, infeccioas e neoplásicas.

 

         Faça um exame neurológico, mesmo que sumário. Principalmente em pacientes idosos, usar um “mini-mental” pode ser útil para investigar demências.

 

Tabela 1: Dados de anamnese e exame físico relacionados a perda de peso

Dado de Anamnese e Exame Físico

Doenças Associadas

Exoftalmo, bócio

Hipertiroidismo

Poliúria, polidipsia

Diabetes

Linfonodomegalia

Linfoma, metástases de neoplasias, tuberculose, micoses sistêmicas, HIV agudo (diferencial de síndrome “mono-like”), doenças do conectivo, outras doenças infecciosas

Diarréia

Doenças inflamatórias intestinais, síndrome de má-absorção, pacreatite crônica, neoplasias de cólon, doença celíaca, parasitoses intestinais (giardíase, amebíase), diabetes, hipertiroidismo

Febre

Sintoma “B” de leucemia, endocardite, tuberculose, micoses sistêmicas, infecções oportunistas em AIDS, Doença de Whipple

Taquicardia, palpitações

Feocromocitoma, Hipertiroidismo, Sepse

disfagia

Neoplasia de cabeça-e-pescoço, neoplasia de esôfago, megaesôfago chagásico, Esclerodermia, CREST, seqüela de AVC

Dispnéia

ICC descompensada, DPOC exacerbada, tuberculose, Pneumocistose em pacientes com HIV, Fibrose pulmonar em doenças do conectivo

Hepatomegalia/esplenomegalia

Doenças linfoproliferativas, Esquistossomose, Leishmaniose visceral, ICC

Massa abdominal

Neoplasia do sistema digestório ou gênito-urinário

Ascite

ICC, Neoplasia de ovário, de fígado, Cirrose de qualquer etiologia.

Artrite, Artralgia

Doenças do conectivo: artrite reumatóide, lupus eritematoso sistêmico, Doença de Whipple

Crepitação pulmonar, sibilância

ICC, DPOC, Neoplasia de pulmão, tuberculose

3ª Bulha, Sopros cardíacos

ICC, Endocardite

Cirurgia Gastro-intestinal prévia

síndrome de má-absorção

Hálito Urêmico

IRC

Tremores

Parkinson, Hipertiroidismo, Feocromocitoma, Ansiedade

Disfunção do Cognitivo

Pós-AVC, quadros demenciais, etilismo crônico

Descoramento

Anemia relacionada a neoplasias sangrantes, hiperesplenismo, doenças do conectivo

Icterícia

Neoplasias obstrutivas das vias biliares

Empaxamento

Diabetes, neoplasias de estômago, pâncreas, vias biliares

Náuseas e vômitos

Bulimia, neoplasias de estômago, pâncreas, vias biliares, uso de quimioterápicos ou de anti-retrovirais

 

 

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

 

Para facilitar o raciocínio para o diagnóstico diferencial, dividiremos as causas da seguinte forma (Tabela 2):

 

1.     perda de peso involuntária com aumento de apetite.

2.     perda de peso involuntária com diminuição de apetite.

3.     perda de peso voluntária.

 

            As causas de perda de peso involuntárias são muito mais numerosas e freqüentes. Há seis trabalhos maiores publicados na literatura desde 1981, em que se afirma que as causas de perda involuntária de peso variam bastante. Entretanto, alguns dados podem ser extraídos dessas fontes:

 

         Câncer não é a causa mais importante (prevalência varia de 1% a 36% dos casos), mas é diagnosticada relativamente rápido pelo grau de suspeita que desperta. Em boa parte dos casos tem origem no trato digestório.

 

         Doenças psiquiátricas são as de maior importância (diagnóstico em 9% a 60% dos casos), principalmente em pacientes idosos, seguidas pelas doenças gastrintestinais (presentes em 11% a 30% casos).

 

         Todas as demais causas (infecciosas, endocrinológicas etc.) têm prevalência nesses estudos variando entre 0% e 9%.

 

            Pacientes idosos, em especial, podem ter sobreposição de fatores para perda de peso. A prevalência de doenças crônicas em associação a condições comuns no envelhecimento, como  perda dos dentes, uso de próteses dentárias, diminuição da sensibilidade do olfato e do paladar, contribuem em conjunto para o emagrecimento nessa faixa etária. Para muitos pacientes idosos, pesa também o isolamento social por morte do companheiro e distanciamento familiar.

 

Tabela 2: Diagnóstico Diferencial para perda de peso

perda de peso Involuntária com Aumento de Apetite

         Hipertiroidismo

         Diabetes mellitus descontrolado

         Feocromocitoma

         síndrome de má-absorção

         Grande aumento de atividade física

perda de peso Involuntária com Diminuição de Apetite

         Neoplasias/ Câncer

         Endocrinopatias (adrenal, tireóide, pâncreas)

         Doenças Crônicas (DPOC, ICC, IRC, Doenças do Conectivo, AVC, Demência, parkinsonismo)

         Infecções crônicas (HIV, tuberculose, micoses sistêmicas, endocardite, parasitoses)

         Doenças Gastro-intestinais (doença inflamatória intestinal, úlcera péptica, disfagia)

         depressão, Transtorno Bipolar, Distúrbio de Personalidade, Distúrbio de Ansiedade

         Álcool, Opióides, Anfetaminas, Cocaína, Cigarro

         Inibidores da recaptação de serotonina, levodopa, digoxina, metformin, AINH, quimioterápicos, anti-retrovirais, hormônio tiroidiano

perda de peso Voluntária

         Tratamento de obesidade

         Anorexia nervosa e Bulimia

         Anfetaminas e derivados

         Modelos, bailarinas, ginastas, corredores de longa distância

 

Perda de peso involuntária com aumento de apetite

 

         Hipertiroidismo: quadro mais dramático de perda de peso com aumento de apetite podendo ocorrer até 16% de queda no peso. Ocorre pelo aumento de gasto energético algumas vezes associado a má-absorção pelo aumento da motilidade intestinal. Em um estudo com 880 pacientes com doença de Graves, por exemplo, 61% tinham perda de peso e 42% tinham aumento de apetite.

 

         Diabete descompensado: causa mais comum de perda de peso com aumento de apetite. Ocorre pela hiperglicemia e pela acentuada glicosúria, que leva a uma perda calórica importante além de depleção do volume extracelular. Pode acontecer tanto na abertura do DM 1 (deficiência de insulina) quanto no DM 2 (resistência periférica aumentada à insulina) e pode aparecer no curso da doença em momentos de controle metabólico ruim, o que pode ser detectado pela medida de hemoglobina glicosilada (HbA1c).

 

         Feocromocitoma: ocorre perda de peso com aumento de apetite por aumento das taxas metabólicas pela atividade adrenérgica excessiva.

 

         síndrome de má-absorção: independentemente da etiologia (doença celíaca, doença de Whipple, deficiência de lactase, síndrome do intestino curto, pancreatite crônica, doença inflamatória intestinal), a má-absorção pode cursar com perda de peso e aumento de apetite. Nem sempre se encontra um quadro de diarréia ou mesmo ruídos hidroaéreos aumentados. Outro ponto importante é que quando cursa com doenças inflamatórias intestinais, costumam causar perda de peso com diminuição de apetite.

 

         Aumento de atividade física: pessoas que começam a fazer treinamento físico intenso passam a ter aumento de apetite, que nem sempre é capaz de compensar a quantidade de perdas calóricas geradas pelo exercício, levando a um desbalanço entre perdas e ingesta.

 

Perda de peso involuntária com diminuição de apetite

 

         Câncer: perda de peso involuntária pode ser a única manifestação da doença em muitos casos. Os gastos energéticos e a anorexia parecem ser mediados por citocinas como TNF-a, IL-6 e por proteína C-Reativa. Outros fatores contribuem para o quadro: o próprio tratamento com quimioterápicos e radioterapia que per si induzem anorexia, náuseas e vômitos, sintomas da própria doença como disfagia, dor abdominal, empaxamento por hepatoesplenomegalia ou massas abdominais, distensão abdominal por ascite, má-absorção por invasão tumoral ou ressecção cirúrgica de segmentos intestinais.

 

         Endocrinopatias: na insuficiência adrenal, a deficiência de glicocorticóides gera anorexia, náuseas e perda de peso; casos de hiperparatireoidismo que cursam com hipercalcemia levam a perda de peso por anorexia (porém, isso é mais freqüente em pacientes com câncer em que os níveis de cálcio tendem a ser maiores); pacientes idosos com hipertiroidismo podem, paradoxalmente, apresentar perda de apetite junto com a perda de peso; há casos de diabete com perda de apetite por gastroparesia diabética e por episódios de diarréia desencadeados por neuropatia autonômica intestinal; em gestantes pode ocorrer hiperêmese gravídica por aumento da secreção da gonadotropina coriônica humana.

 

         Infecções crônicas: pacientes com quadros febris persistentes têm aumento da demanda metabólica e, conseqüentemente, do consumo de energia. Parasitoses intestinais ainda são freqüentes nas áreas mais carentes de nosso país. Endocardite bacteriana, principalmente em apresentações subagudas, infecções com curso prolongado como tuberculose e micoses sistêmicas tipicamente vêm com perda de peso. Pacientes com HIV têm perda de massa corpórea pela própria doença, perdas mais pronunciadas na vigência de infecções oportunistas e ainda há os efeitos colaterais da terapia anti-retroviral, competindo para facilitar a perda de peso.

 

         Doenças crônicas: nesse grupo incluímos diversas doenças. Pacientes com insuficiência cardíaca e doença pulmonar obstrutiva crônica avançadas têm quadros de caquexia pelo aumento metabólico associado a níveis aumentados de TNF-a e da atividade autonômica simpática. Doenças do conectivo como lúpus e artrite reumatóide cursam com anorexia e esclerodermia podendo evoluir com dismotilidade esofágica. A uremia em pacientes renais crônicos leva a anorexia. Quadros neurológicos como seqüelas pós-AVC dificultando a ingesta ou a busca por alimento, quadros de parkinsonismo que cursam com disfagia, alteração da salivação e quadros demenciais como Alzheimer também são causas importantes de perda de peso com diminuição da ingesta.

 

         Doenças gastrintestinais: sintomas associados a diversas doenças gastrintestinais podem se relacionar a queda na ingesta, como disfagia, empaxamento, náuseas e vômitos, dor abdominal. Doenças inflamatórias intestinais podem cursar com dor abdominal, gerando desconforto e perdas por má-absorção. Doença péptica cursa muitas vezes com dores importantes que levam a diminuição na ingesta. disfagia pode ter origem em tumores de cavidade oral, neoplasia esofágica ou por dismotilidade secundária a megaesôfago chagásico. Náuseas e vômitos são comuns com doença calculosa biliar crônica, úlcera péptica e neoplasias compressivas de estômago, pâncreas ou vias biliares. Gastrite atrófica é outra causa de perda de apetite. Pacientes com ressecção de segmentos do trato gastrintestinal também tendem a perder peso.

 

         Doenças psiquiátricas: perda de mais de 5% do peso em um mês sem outra explicação é um dos critérios para diagnóstico de depressão, pacientes em mania podem simplesmente esquecer de comer pela hiperatividade, quadros psicóticos, esquizofrenia e catatonia podem gerar perda de peso por falta de procura por alimento. Há quadros de caquexia desencadeados por parada no uso crônico de neurolépticos.

 

         Drogas e medicações: etilistas crônicos diminuem a ingesta de alimento seja pela carga calórica fornecida pelo álcool seja por condições psiquiátricas e gastrintestinais associadas. Fumantes tendem a ter baixo peso, tanto por inibição do apetite quanto por perda no prazer de comer por inibição das fibras olfatórias pela fumaça. Usuários de opióides também têm seus centros do apetite inibidos, bem como diminuição da motilidade intestinal e das secreções gástrica, biliar e pancreática. Anfetamina e Cocaína são anorexígenos por ação no centro da saciedade. Inibidores da recaptação de serotonina como fluoxetina e sertralina, biguanidas (metformin), digoxina, levodopa, antiinflamatórios não-hormonais, quimioterápicos e anti-retrovirais são outros exemplos de medicamentos ligados à perda de peso.

 

Perda de peso voluntária

 

         Pacientes que fazem controle dietético: pacientes obesos ou com sobrepeso devem ser encorajados a manter suas dietas com o objetivo de chegar ao seu peso ideal. Pacientes que se submetem a cirurgias bariátricas tendem a ter grandes perdas de peso em pouco espaço de tempo.

 

         Anorexia nervosa e Bulimia nervosa: são condições mais freqüentes em mulheres jovens. Na anorexia ocorre uma busca incessante por uma imagem corporal distorcida muito abaixo do peso esperado para a pessoa, além de uma recusa muito grande em ganhar qualquer peso. Na Bulimia ocorrem episódios de ingesta abundante e descontrolada de alimentos, seguidos de atitudes compensatórias purgativas como indução de vômitos. A perda de peso é importante nas duas condições, mais pronunciada na anorexia.

 

EXAMES COMPLEMENTARES

            No momento de se pensar quais exames complementares podem auxiliar no raciocínio clínico ou diagnóstico da perda de peso, é importante ter em mente alguns pontos:

 

1.     50% dos pacientes trazem uma queixa principal que já aponta para o possível órgão acometido.

2.     História clínica e exame físico associados a exames complementares direcionados trazem um diagnóstico em cerca de 75% dos casos. Os 25% restantes podem ficar sem etiologia definida apesar de se insistir em testes laboratoriais; porém, a mortalidade nesse grupo é muito menor.

 

            Sendo assim, direcionar os exames às hipóteses diagnósticas com maior probabilidade pré-teste de se confirmarem. Entretanto, nem sempre essa abordagem é tão fácil; então, apresentamos aqui o que seria um screening recomendável para perda de peso, de forma que esses exames podem fornecer pistas, não necessariamente fechando o diagnóstico (Tabelas 3, 4 e 5).

 

Tabela 3: Exames Complementares Iniciais para investigar perda de peso:

  • Hemograma Completo
  • Glicemia de Jejum
  • Na+, K+, Ca2+
  • Proteínas Totais e Frações
  • TSH
  • Urina tipo 1
  • Função Renal
  • Enzimas Hepáticas e canaliculares
  • Radiografia (PA e Perfil) de Tórax
  • Provas de atividade inflamatória (VHS, PCR)
  •  

    Tabela 4: pesquisa para neoplasia e HIV

    Pesquisa para Neoplasia conforme Sexo e Idade:

    Para pacientes com fatores de risco:

  • Pesquisa de Sangue Oculto nas Fezes e/ou Retossigmoidoscopia  ou Colonoscopia(> 50 anos)
  • Mamografia (mulher, >40 anos)
  • Papanicolaou (mulher)
  • PSA (homem, >50 anos)
  • HIV
  •  

    Lembrar sempre:

    Pesquisa para tuberculose (PBAAR, exames de imagem, biópsia)

     

    Tabela 5: Algumas causas específicas e exames laboratoriais direcionados

    Causas

    Exame

    Diabetes

    Glicemia de jejum?³ 126mg/dl ou TTOG 2h ³ 200mg/dl

    Hipertiroidismo

    TSH suprimido, T4 livre e T3 aumentados

    Feocromocitoma

    Urina de 24h com >2.2 µg de metanefrina por mg de creatinina ou >135 µg de catecolaminas por g de creatinina

    Doença Celíaca

    Teste de Sudan + nas fezes, anticorpos anti-endomísio e anti-gliadina +

    Doença de Whipple

    Biópsia de Duodeno com macrófagos PAS + e bacilos característicos

    DPOC

    Prova de função pulmonar com VEF1/ CVF <70%

    HIV

    ELISA, Western Blot +

    tuberculose

    PBAAR  +

    Doenças do Conectivo (Lupus, Artrite reumatóide, espondiloartropatias, etc)

    Provas de Atividade Inflamatória alteradas, Auto-anticorpos +

    Endocardite

    Hemoculturas positivas, ecocardiograma sugestivo de acometimento valvar

     

                Na ausência de sinais e sintomas característicos, bem como testes iniciais negativos, rastrear neoplasias passa a ser de grande importância, lembrando que, se necessário, deve-se proceder a um exame de imagem como radiografia simples, exames de ultra-sonografia, tomografia computadorizada, endoscopias e biópsias direcionadas. Não se deve esquecer também que pacientes com fatores de risco (usuários de drogas injetáveis ou com comportamento sexual de risco) devem fazer pesquisa para HIV e, no Brasil, sempre lembrar de tuberculose como diagnóstico diferencial.

     

    TRATAMENTO

                O tratamento da perda de peso deve incluir um plano dietético para o paciente, mas sobretudo deve-se tratar a causa de base. Apresentamos na tabela 6 um sumário do tratamento de diversas causas de perda de peso.

     

    Tabela 6: Tratamento sumarizado de causas de perda de peso.

    Causas

    Tratamento

    Hipertiroidismo

    Para os sintomas: propranolol de 20mg 2x/dia a 80 mg 4x/dia, atenolol de 25 a 200mg/dia

    Tratamento da doença: metimazol 30-60mg 1x/dia ou propiltiouracil 100 a 200mg 8/8h, Iodo radioativo ou tiroidectomia.

    Diabetes mellitus

    Hipoglicemiantes orais: ex.: glibenclamida de 2,5 a 20mg /dia ou metformin de 500 a 2550mg /dia (sulfoniuréias, biguanidas, meglitinidas, tiazolidinedionas, inibidores da alfa-glucosidase)

    Insulina: de ação rápida, de ação lenta, associada ou não a hipoglicemiantes orais

    Feocromocitoma

    Taquicardia e Hipertensão: beta-bloqueadores

    Tratamento de escolha: remoção cirúrgica laparoscópica do tumor (na maior parte dos casos localizado nas próprias glândulas adrenais)

    síndrome de má-absorção

    Remover Glúten da dieta (Doença celíaca), antibioticoterapia com ceftriaxone e sulfametoxazol+trimetoprim (doença de Whipple), restringir lactose (Deficiência de lactase)

    DPOC

    Cessar tabagismo, oxigenioterapia quando indicado (hipoxemia/ cor pulmonale), broncodilatadores e corticóides inalatórios

    ICC

    Beta-bloqueadores, inibidores de ECA, diuréticos, digitálicos, transplante cardíaco

    IRC

    Diálise quando indicado, tratamento das causas (HAS, DM, etc), transplante renal

    Neoplasias

    Em geral: tratamento cirúrgico, quimioterapia, radioterapia e hormonioterapia conforme as indicações e o estadiamento

    HIV

    Terapia Anti-retroviral quando houver indicação

    tuberculose

    “Esquema 1”: Rifampicina 600mg, Isoniazida 400mg, Pirazinamida 2g ao dia, mínimo de 6 meses, esquemas alternativos em casos selecionados

    Doença de Crohn  e Retocolite

    Metronidazol ou Ciprofloxacino, Corticosteróides, Sulfassalazina, Imunomoduladores (Azatioprina, Metotrexato), tratamento cirúrgico

    Esclerose Múltipla

    Pulsos de Corticosteróides

    Parkinsonismo

    Amantadina, Biperideno, Levodopa

    depressão, Transtorno Bipolar, Ansiedade, distúrbios psiquiátricos outros

    Psicoterapia, antidepressivos tricíclicos ou inibidores seletivos da recaptação da serotonina, Litium, benzodiazepínicos, anti-psicóticos

     

    TÓPICOS IMPORTANTES E RECOMENDAÇÕES

             perda de peso inexplicada deve ser sempre investigada. Mais importante do que usar uma definição fechada para caracterizar perda de peso é ter sensibilidade para valorizar a queixa ativa de um paciente que procura ajuda.

             Sempre se certificar de que a perda de peso realmente ocorreu. Se houver dúvida quanto à real existência do quadro, lembre-se sempre de que sua melhor arma é PESAR o paciente em consultas seriadas, pois é o único dado realmente objetivo que podemos ter. Procurar averiguar sobre a veracidade da queixa com familiares ou com pessoas que convivam com o paciente também é uma forma de ter maior certeza do que está acontecendo.

             Paciente idosos devem receber especial atenção. Seja pelas condições inerentes ao envelhecimento seja pelo aumento da prevalência de doenças psiquiátricas, neoplasias e diversas doenças crônicas, conforme vai ocorrendo aumento na idade.

             Procure se basear na anamnese e no exame físico para tentar chegar a um diagnóstico. Se mesmo após os exames complementares não for possível fechar o quadro, lembre-se de que a mortalidade associada a esse grupo sem diagnóstico concluído é muito menor.

             As causas mais importantes e mais associadas a complicações e morte estão incluídas nas “perdas de peso involuntárias com diminuição de apetite”. Nesses casos é que devemos insistir na busca da etiologia da perda de peso.

             Sempre trabalhar com seus conhecimentos epidemiológicos sobre prevalência e incidência das doenças. Em uma mulher jovem, por exemplo, é muito mais importante suspeitar de hipertiroidismo, anorexia, Bulimia ou um quadro de ansiedade. Em idosos, dar mais atenção a neoplasias e doenças neuropsiquiátricas. Use o bom senso.

     

    BIBLIOGRAFIA

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    12.  Thompson MP, Morris LK. Unexplained weight loss in the ambulatory elderly. J Am Geriatr Soc 1991; 39: 497.

     

    Adaptado, com autorização, do livro Clinica Médica: dos Sinais e Sintomas ao Diagnóstico e Tratamento – Editora Manole 2007

     

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