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Índice

Tensão Pré-menstrual

Autores:

Alfonso Araujo Massaguer

Especialista em Ginecologia e Obstetrícia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Especialista em Reprodução Humana pelo Instituto Universitário Dexeus – Barcelona

Pedro Gomes de Alvarenga

Especialista em Psiquiatria pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP)

Paulo Cesar Serafini

Especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela University of Maryland School of Medicine - Baltimore
Especialização em Endocrinologia Reprodutiva (Fellowship). University of Southern California - USC, Los Angeles.
Doutorado em Medicina (Obstetrícia e Ginecologia). Universidade de São Paulo - USP, São Paulo.

Beny Lafer

Professor Doutor do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Coordenador do Programa de Transtorno Bipolar do Instituto de Psiquiatria do HC-FMUSP
Doutor em Psiquiatria pela Faculdade de Medicina da USP

Mara Solange Carvalho Diegoli

Coordenadora do Centro de Apoio à Mulher com Tensão Pré-Menstrual do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Última revisão: 27/07/2016

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Introdução e Definições

Tensão pré-menstrual, síndrome pré-menstrual ou simplesmente TPM é um conjunto de sinais e sintomas que aparecem de 1 a 15 dias antes da menstruação e desaparecem com o fluxo menstrual. Sintomas físicos e psíquicos afetam grande parcela das mulheres durante a menacme (vida reprodutiva), com diferentes graus de intensidade: 30 a 35% na forma moderada, e 5 a 10% intensamente. Entretanto, em muitos casos, a Tensão pré-menstrual (TPM) é negligenciada pelos médicos (que a julgam como “normal”), o que perpetua o prejuízo na qualidade de vida dessas mulheres. Mais de 150 sintomas foram relacionados à tensão pré menstrual, sendo os principais: irritabilidade, tensão, depressão, cefaleia, mastalgia, dor nas pernas, compulsão por doces etc., que começam dias antes da menstruação, melhorando rapidamente com seu início.

A síndrome varia entre as formas leve, moderada e intensa, esta última também denominada disforia pré-menstrual ou transtorno disfórico pré-menstrual (TDPM). Cabe ao médico identificar e quantificar cada sintoma tendo em mente, no entanto, que eles fazem parte de uma mesma síndrome. Neste texto, utilizaremos o termo TPM que, aqui, compreenderá todas essas formas.

A fisiopatogenia da TPM ainda não foi totalmente elucidada. Fatores hereditários, endógenos e externos atuam nessa síndrome. As alterações hormonais desse período influenciam o desequilíbrio em neurotransmissores (como a serotonina) e outras substâncias (como as prostaglandinas). A evidência terapêutica de que fármacos inibidores da recaptação de serotonina e agentes bloqueadores da ovulação trazem benefício em parcela significativa dos casos reforça essa hipótese. Além disso, estudos neuroquímicos mostram a modulação exercida pelo estrogênio sobre o sistema serotoninérgico cerebral. Alguns autores sugerem o envolvimento de genes específicos de vulnerabilidade à TPM.

 

Achados Clínicos

História Clínica

A anamnese deve ser feita em 3 etapas.

Na primeira etapa, a paciente descreve espontaneamente os seus sintomas. Nessa etapa, deve-se proceder à especificação e à caracterização objetiva dos sintomas. Para muitas pacientes, é importante a verbalização dos sintomas, para que eles possam ser avaliados separadamente. É frequente o uso de expressões genéricas como “fico insuportável” ou “sinto-me péssima”. É importante interrogar a paciente e os familiares quanto à intensidade do prejuízo e do sofrimento trazidos pelos sintomas e avaliar a interferência nas atividades habituais e relacionamentos interpessoais durante esse período.

Na segunda etapa, a anmnese é mais objetiva e direcionada, para determinar os sintomas predominantes, se físicos ou psíquicos, mas também a intensidade deles. Para isso, a mulher deve responder um questionário (Tabela 1). No Hospital das Clínicas de São Paulo, utilizamos o gráfico de Abrahan modificado. Essa tabela contém os principais sintomas da TPM. A paciente deve responder se apresenta ou não aquele sintoma no período pré-menstrual e a intensidade dele, que varia de 0 a 3: 0 = quando ela não apresenta o sintoma; 1 = quando a sintomatologia for leve; 2 = se for moderada; e 3 = se for intenso. Essa tabela serve não somente para avaliar a intensidade do quadro, mas também para orientar o médico quanto à terapêutica que será instituída.

Na terceira etapa, a mulher deve preencher o gráfico de registro diário dos 8 sintomas selecionados por ela como os mais importantes (que mais interferem no seu dia-a-dia). Esse gráfico deve ser preenchido diariamente, por 2 meses consecutivos. Somente após a elaboração dele será possível diferenciar a TPM das demais doenças. A intensidade do respectivo sintoma é anotada segundo os critérios já adotados na Tabela 1: 0 = ausência de sintomas; 1 = leve; 2 = moderado; e 3 = intenso ou grave.

 

Tabela 1: Sintomas da TPM (Abraham modificada). Marcar a intensidade do respectivo sintoma, sendo: 0 = ausência de sintomas; 1 = leves; 2 = moderados; e 3 = graves

 

Data

Tensão nervosa

Labilidade emocional

Irritabilidade

Ansiedade

Agressividade

Aumento de peso

Tensão ou dor mamária

Inchaço nos membros

Inchaço abdominal

Dor de cabeça

Compulsão por doces

Aumento do apetite

Taquicardia

Fadiga

Tontura

Tristeza

Choro fácil

Esquecimento

Confusão

Insônia

Cólica

Dor nas costas

Mudança de libido

Acne

Outro sintoma (especifique)

 

O termo genérico TPM abrange todo o espectro de transtornos físicos e psíquicos comuns a esse período, desde as formas leves até a TDPM. Pontuamos, a seguir, dados relevantes na história clínica.

 

Período de Aparecimento e Remissão dos Sintomas

Os sintomas podem aparecer em qualquer momento da fase lútea (14 dias antes da menstruação) e desaparecem 1 ou do2is dias após o início do fluxo menstrual. Um diário de sintomas (Gráfico 1) auxilia e traz mais precisão aos relatos.

 

Caracterização dos Sintomas da TPM

Como mencionado, a especificação e a caracterização objetiva dos sintomas, assim como a quantificação de sua intensidade, auxiliam a conduta, bem como o acompanhamento terapêutico.

 

Qualidade de Vida

Interrogar a paciente e os familiares sobre o prejuízo e sofrimento trazido pelos sintomas e avaliar a interferência nas atividades habituais e os relacionamentos interpessoais durante esse período.

 

Ritmicidade

Avaliar a repetição ou mudança do padrão dos sintomas ao longo de vários ciclos menstruais.

 

Gráfico 1: Registro diário dos principais sintomas (que devem ser listados pela paciente) de TPM. Os dias da menstruação devem ser circulados. Em cada dia, deve ser marcada a intensidade do respectivo sintoma, sendo: 0 = ausência de sintomas; 1 = leve; 2 = moderado; 3 = grave.

Dia do mês

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

11

12

13

14

...

Sintoma

 

É imprescindível a sensibilidade do médico no reconhecimento das queixas da TPM, apresentadas muitas vezes como inespecíficas ou “normais”. Geralmente são sintomas com os quais as pacientes já se “acostumaram”, e até mesmo a família e os amigos já os consideram “traços da personalidade”. Sempre que possível, o médico deve nortear-se por critérios objetivos, direcionando a anamnese para a busca ativa dos sintomas. Deve-se auxiliar a paciente a verbalizar os seus sintomas, uma vez que muitos deles são reconhecidos apenas após o processo de nomeação. O diagnóstico definitivo estabelece-se preferencialmente de maneira prospectiva. Caso ocorra confirmação do diagnóstico, introduz-se a terapêutica.

 

Exame Físico

Não há achado de exame físico especifico da Tensão pré-menstrual. Esse exame deve excluir outras possíveis causas dos sintomas.

 

Diagnóstico Diferencial

Deve-se estar atento aos diagnósticos diferenciais que, muitas vezes, são ignorados em razão da grande variação de sintomas da TPM. O caráter remissivo dos sintomas é essencial para a caracterização da TPM. Não é incomum ocorrer uma sobreposição de doenças. Os seguintes diagnósticos diferenciais devem ser considerados.

 

Depressão, Distimia e Outros Transtornos de Humor

Alterações de humor são muito comuns em pacientes com TPM, porém deve-se atentar à manutenção desses sintomas fora do período de fase lútea. Muitas vezes, estabelece-se um falso diagnóstico de TPM em razão da exacerbação pré-menstrual de uma síndrome depressiva, até pelo fato de a TPM ser uma doença socialmente mais aceita. A síndrome depressiva pode estar presente em diversos transtornos do espectro de humor, como transtorno depressivo maior, distimia (sintomas depressivos presentes por pelo menos 2 anos), ciclotimia (oscilação de humor depressivo e expansivo) e, até mesmo, no transtorno bipolar do humor (outrora denominado psicose maníaco-depressiva – PMD). Devem-se questionar os sintomas durante a semana após a menstruação e utilizar o diário de sintomas para avaliar se eles ocorrem no período pré-menstrual ou constantemente, apenas se exacerbando durante o período pré-menstrual.

 

Transtornos de Ansiedade

Seguimos o mesmo raciocínio clinico referido anteriormente. Nos transtornos ansiosos (síndrome de pânico com e sem agorafobia, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de ansiedade generalizada, entre outros) ocorre uma exacerbação dos sintomas no período pré-menstrual. Nessa situação, buscam-se terapias específicas para tais transtornos, sempre atentando à ocorrência de outros sintomas pré-menstruais, considerando, assim, a concomitância entre ansiedade e TPM.

 

Mastalgia

Dor mamária (ou mastalgia) pode ocorrer de forma contínua ou cíclica. Esta última é um sintoma usual da TPM. Geralmente é leve e não necessita de terapia específica.

Sempre deve-se descartar a possibilidade de doença maligna. Na imensa maioria dos casos, há um grande benefício para a paciente apenas com a confirmação diagnóstica da doença benigna. Exames complementares são necessários na presença de massas palpáveis ou queixas focais.

 

Dismenorreia

Dismenorreia primária é caracterizada por cólica pélvica e lombalgia no 1º dia menstrual, relacionada a uma disfunção nas prostaglandinas. Muitas dessas pacientes apresentam cefaleia, fadiga, náusea e diarreia, que podem iniciar 1 ou 2 dias antes da menstruação. O tratamento da dismenorreia deve ser aplicado juntamente com o da TPM, sempre que houver concomitância de ambas. Da mesma maneira, devem-se excluir outras causas de dor pélvica, como a endometriose.

 

Enxaqueca

Na enxaqueca ou cefaleia associada à menstruação, ocorre aumento da intensidade e da frequência das crises de cefaleia durante o período pré-menstrual ou menstrual. Essa condição caracteriza-se por uma cefaleia unilateral, sem aura, com fotofobia, náusea, fonofobia e duração de 4 a 72 horas. O exame neurológico geralmente é normal, podendo encontrar histórico familiar para enxaqueca. O tratamento pode visar apenas às crises agudas (analgésicos, derivados do ergo ou anti-inflamatórios) ou, dependendo da frequência e da gravidade dos episódios, aos tratamentos de longo prazo (betabloqueadores, anti-inflamatórios, antidepressivos tricíclicos, bloqueadores de canal de cálcio e anticonvulsivantes).

 

Causas Orgânicas

Devem ser excluídas doenças que possam agir como fator agravante, como doenças da tireoide (hipo ou hipertireoidismo), síndrome de dependência ou abuso de álcool e drogas (considerar anfetaminas e benzodiazepínicos), síndrome do cólon irritável, entre outras. Muitas dessas doenças são exacerbadas pelas variações hormonais do período pré-menstrual, intensificando o desconforto nesse período.

 

Tabela 2: Dados de anamnese e exame físico relacionados

 

Dado de anamnese e exame físico

Suspeita diagnóstica

Perda de prazer, tristeza, alterações do sono e do apetite, dores no corpo, fadiga, esquecimento.

Síndrome depressiva

Tensão muscular, medo, aflição, angústia, palpitações, irritabilidade, fadigabilidade e rituais (“manias”).

Transtornos ansiosos, dependência de substâncias

Ganho ou perda de peso, distúrbios do sono, palpitações, alterações de pulso e pressão arterial, massas cervicais.

Hipo ou hipertireoidismo

Mastalgia, massas palpáveis na mama.

Mastalgia e tumores

Dor pélvica, dispareunia, alteração urinária e/ou intestinal cíclica, infertilidade.

Dismenorreia, endometriose

Cefaleia, náuseas, foto ou fonofobia, parestesias, tontura e déficits neurológicos.

Enxaqueca e outras condições neurológicas

Fadiga, emagrecimento, infecções, alterações globais no exame físico.

Neoplasias, doenças endócrinas, dependência de substâncias

 

Exames Complementares

Exames Laboratoriais

Da mesma forma que o exame físico, não existe nenhum exame laboratorial para diagnóstico de TPM. Não há diferença entre os níveis hormonais de mulheres com e sem TPM. Os exames devem ser solicitados de forma individualizada, baseados nas hipóteses diagnósticas. Em grande parte, os diagnósticos diferenciais são doenças com diagnósticos eminentemente clínicos.

Anemia, hipotireoidismo, climatério (perimenopausa), abuso de drogas e diabetes podem contribuir ou ser diagnóstico diferencial para a TPM, e, em sua suspeita diagnóstica, solicitam-se exames específicos, como hemograma, TSH, T4 livre, glicemia de jejum, dosagem de álcool (sangue) e drogas (cabelo e urina).

 

Exames de Imagem

A mamografia deve ser indicada respeitando-se a indicação formal de screening para doença maligna, isto é, mulheres com mais de 40 anos ou com mais de 35 anos e antecedentes familiares. Em casos com massas palpáveis ou queixas focais (como mastalgia em região definida), indica-se mamografia e/ou ultrassonografia mamária.

A ultrassonografia pélvica é indicada em casos com dor pélvica crônica, objetivando excluir doenças orgânicas, como neoplasias e causas de dismenorreia secundária.

 

Tratamento Da TPM

O tratamento da TPM deve ser sempre individualizado e aplicado de acordo com a intensidade e o tipo de sintoma apresentado.

Embora a TPM não seja uma doença, seu tratamento beneficia a mulher, melhorando sua qualidade de vida e a qualidade da vida daqueles que convivem com ela. O tratamento visa não somente à melhoria do desempenho profissional, mas também social e sentimental.

Em todas as mulheres, a elaboração do gráfico é fundamental não somente para que elas aprendam a se conhecer, mas também para que possam comparar a intensidade dos sintomas antes e após as medidas adotadas.

 

Hábitos de Vida

Em casos de sintomatologia leve, inicia-se terapia não-medicamentosa, baseada em exercício físico regular e higiene do sono; se possível, eliminar cigarro, álcool ou outras drogas. Reduzir a ingestão de sal (sódio) pode reduzir o edema e a sensação de inchaço. Além disso, a diminuição da cafeína pode ajudar a reduzir irritabilidade, ansiedade, tensão e insônia. Refeições pequenas e mais frequentes podem contribuir para minimizar as variações de humor. Tais medidas devem ser sempre incentivadas em todas as terapias, assim como tudo que reduza o estresse, sendo também benéfico para toda saúde de maneira geral. É claro que introduzir mudanças de hábito é mais difícil do que parece.

 

Suplementos Nutricionais

Vitamina B (40 a 100 mg/dia), carbonato de cálcio (1.200 a 1.600 mg/dia), vitamina E (400 a 60 UI/dia) e magnésio (200 a 360 mg até 3 vezes/dia) são suplementos indicados nos casos leves ou como adjuvantes.

O óleo de prímula é rico em ácido gamalinoleico, envolvido na síntese de prostaglandina E, que é uma prostaglandina anti-inflamatória, podendo ser útil nos sintomas mamários da TPM, na dosagem de 500 mg a 3 g divididos em 3 vezes/dia, do 17º ao 28º dias do ciclo menstrual.

 

Diuréticos

A espironolactona, na dosagem de 25 a 100 mg/dia durante a fase lútea, pode ajudar a reduzir o edema, a sensação de “inchaço” e a turgidez mamária. Atenção ao risco de hipercalemia.

 

Anti-inflamatórios Não-hormonais (AINH)

Os anti-inflamatórios aliviam diversos sintomas físicos, principalmente a dor (dor pélvica, mastalgia, cefaleia). Podem ser utilizados: meloxicam (15 mg/dia), cetoprofeno (50 a 150 mg/dia) ácido mefenâmico (500 mg 3 vezes/dia), diclofenaco sódico (150 mg/dia). Piroxicam (20 a 40 mg/dia) e naproxeno (250 a 500 mg 2 vezes/dia) são boas opções. Deve-se atentar aos riscos potenciais de úlcera gástrica e lesão renal.

 

Pílula Anticoncepcional

Estudos mostraram que a pílula anticoncepcional tem pouca influência sobre os sintomas de TPM, apesar do suposto benefício gerado pela inibição da ovulação. O uso de tal medicação pode trazer alívio para alguns sintomas físicos, como edema, cefaleia, desconforto mamário e dor abdominal. Em contrapartida, deve-se atentar para a exacerbação desses sintomas pelo próprio uso da pílula.

 

Psicoterapia

Muitas pacientes relatam melhora de sua sintomatologia após se submeterem a diversas modalidades psicoterapêuticas. Entretanto, não há estudos bem desenhados comprovando o seu benefício para alívio dos sintomas de TPM. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) tem eficácia bem documentada na Tensão pré-menstrual e visa ao esclarecimento da paciente sobre sua condição, auxiliando-a a reconhecer seus sintomas. A TCC visa conferir estratégias para a paciente lidar melhor com as suas dificuldades de relacionamento, sentimentos de menos-valia, autorrecriminação e apreensão vivenciados nesse período.

 

Antidepressivos

Estudos duplo-cegos randomizados sugerem que inibidores da recaptação da serotonina e a supressão da ovulação são as terapêuticas mais efetivas. Apesar desses dados, sabe-se que a TPM é uma doença crônica e que desaparece apenas com a menopausa. Portanto, devem-se considerar os ganhos, assim como potenciais efeitos colaterais, do uso crônico das medicações. A gravidade dos sintomas e a sua interferência na qualidade de vida da paciente devem nortear a decisão terapêutica.

A terapêutica deve ser iniciada após uma explicação sobre a doença, mostrando sua grande incidência e o seu caráter cíclico. Deve explanar o grande espectro de terapias, ressaltando que é um tratamento por um longo período, porém com alta eficiência e impacto na qualidade de vida. O envolvimento do cônjuge e dos familiares pode contribuir para melhor evolução terapêutica.

O tratamento deve visar ao alívio de sintomas que mais afetam a qualidade de vida da paciente. Não existe regra, a não ser individualizar o tratamento. Atualmente, é comum o uso de fórmulas pelas pacientes, porém tais preparados são “coquetéis” com diversos agentes e, dessa maneira, estão presentes ingredientes desnecessários e outros com dose reduzida ou excessiva. O uso de monoterapia implica menor custo e menos efeitos colaterais para a paciente.

Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) trazem melhora dos sintomas em mais de 60% dos casos. Para aquelas pacientes em que predominam os sintomas psíquicos, os ISRS trazem excelentes resultados. Fluoxetina, sertralina e paroxetina são as medicações mais estudadas na TPM, e foram consideradas superiores ao placebo em diversos estudos controlados (não havendo diferença significativa entre elas). Citalopram, escitalopram e fluvoxamina foram menos estudados, porém ensaios clínicos recentes sugerem que tenham eficácia semelhante. Antidepressivos de “ação-dupla”, como venlafaxina e mirtazapina (serotoninérgico e noradrenégico) e bupropiona (noradrenérgico e dopaminérgico), vêm apresentando resultados promissores em diversos estudos abertos e alguns ensaios controlados, mas são menos usados que os ISRS.

A particularização dos sintomas da TPM e a identificação de comorbidades podem direcionar a escolha do antidepressivo. A paroxetina pode ser eleita quando predominarem insônia e ansiedade. Entretanto, assim como os outros ISRS, pode ocasionar tontura, vertigem, cefaleia, sintomas gastrintestinais e disfunção sexual. A fluoxetina e a sertralina geralmente são anorexígenas nos primeiros meses de uso, e podem ser administradas na presença de obesidade ou sobrepeso. Deve-se evitar fluoxetina e paroxetina para pacientes em uso de dicumarínicos, glibenclamida, entre outras medicações, em razão do maior potencial de interações. Citalopram e escitalopram apresentam pouca interação medicamentosa. A bupropiona tem efeito adicional antitabagismo e não causa diminuição da libido. A mirtazapina também costuma poupar a paciente de efeitos colaterais indesejáveis na esfera sexual e auxilia a conciliar o sono. Entretanto, costuma ocasionar ganho ponderal.

Não é raro depararmos com preconceito e resistência das pacientes em utilizarem antidepressivos. Cabe ressaltar que tais medicações, apesar de sua classificação, apresentam várias outras indicações (cefaleia, dores crônicas, ansiedade e tabagismo), entre elas a TPM. Devem ser ressaltados também seus benefícios indiscutíveis na TPM e melhor perfil de efeitos colaterais quando administrada apenas nos 14 dias que precedem a menstruação. Recentemente foi lançada no mercado a fluoxetina de liberação lenta, que corresponde a 20 mg/dia pelo período de 7 dias. Apesar de pouco estudada em TPM, apresenta posologia bastante confortável. Devemos alertar a paciente quanto à possível piora da ansiedade durante os primeiros 15 dias do tratamento com antidepressivos, bem como afastar antecedente pessoal e familiar de transtorno bipolar do humor antes de iniciarmos a medicação, pelo risco de indução de virada maníaca. O hábito sexual das pacientes após a introdução de antidepressivos deve ser investigado ativamente para afastar disfunção sexual medicamentosa.

 

Ansiolíticos

Há relato de benefício dos benzodiazepínicos na TPM. O agente mais estudado foi o alprazolam, que pode ser utilizado quando se apresentam insônia, tensão e ansiedade. Seu emprego restringe-se pelo potencial de desenvolvimento de tolerância e dependência, uma vez que a TPM apresenta curso crônico e, portanto, necessidade de longos períodos de tratamento. Déficits cognitivos também foram relacionados ao uso crônico dessas medicações. A buspirona, ansiolítico não-benzodiazepínico e agonista parcial da serotonina, apresentou discreto benefício no alívio dos sintomas da TPM em alguns estudos.

 

Acetato de Medroxiprogesterona, Implante de Progesterona e Dispositivo Intrauterino com Progestagênio

O acetato de medroxiprogesterona de depósito (Depoprovera®), na dosagem de 150 mg intramuscular a cada 3 meses, é um método de anticoncepção eficaz e de baixo custo. Há indícios de eficácia no alívio da TPM. Significativo porcentual de pacientes se queixa de irregularidade menstrual e ganho de peso, porém trata-se de uma alternativa considerável em pacientes de baixa renda que desejam anticoncepção em longo prazo e apresentam sintomatologia importante. Com menos efeitos colaterais podem ser usados o implante (Implanon®) ou o dispositivo intrauterino com progestagênio (Mirena®). O implante contém etonorgestrel, que é colocado no antebraço da paciente, e dura aproximadamente 3 anos. O dispositivo intrauterino contém levonorgestrel e dura 5 anos. O sangramento contínuo ou irregular é a principal causa de suspensão ou retirada do método adotado.

 

Agonista de GNRH

O uso de agonista de GnRH (hormônio liberador de gonadotrofina) inibe a hipófise e, portanto, a estimulação ovariana, gerando anovulação e grande melhoria da sintomatologia. Os agentes mais utilizados são leuprolida depot (Lupron®) ou goserrelina (Zoladex®) que, conforme a dosagem, podem ser aplicados por via subcutânea em intervalo mensal, trimestral e semestral. O grande problema de tal terapia é o estado de hipoestrogenismo induzido (“menopausa medicamentosa” com secura vaginal, ondas de calor, osteoporose e aumento de peso). O emprego concomitante de estrorgênio e progestagênio (add-back therapy), como em uma reposição hormonal convencional, aliviaria tais efeitos colaterais sem trazer prejuízo à terapêutica, devendo ser introduzida se utilizados os agonistas por um período superior a 6 meses. O alto custo também dificulta o emprego de tal medicação.

 

Fitoterápicos

O uso de fitoterápicos, tais como a passiflora, a erva-de-são-joão ou extrato de agnus castus, pode ser útil nas pacientes com sintomatologia leve ou que prefiram tratar-se com medicações naturais.

 

Acupuntura

Algumas mulheres referem alívio de sintomas físicos e psíquicos da TPM após sessões de acupuntura, o que ainda permanece bastante controverso na literatura.

 

Tabela 3: Agentes mais utilizados

 

Medicação

Dose preconizada

Efeitos desejáveis

Efeitos indesejáveis

Fluoxetina

Fluoxetina CR

10 a 60 mg/dia, 1 vez/dia ou 7 dias

Anorexia, longa meia-vida, maior evidência na literatura

Interações medicamentosas, irritabilidade, tontura, cefaleia

Sertralina

50 a 150 mg/dia, 1 vez/dia

Anorexia, poucas interações medicamentosas

Disfunção sexual, efeitos gastrintestinais, tontura

Paroxetina

20 a 60 mg/dia, 1 vez/dia (noite)

Melhora do padrão de sono, ansiolítico

Disfunção sexual, efeitos gastrintestinais, interação medicamentosa

Citalopram

20 a 60 mg/dia, 1 vez/dia

Poucas interações medicamentosas

Disfunção sexual, efeitos gastrintestinais, tontura, cefaleia

Escitalopram

10 a 30 mg/dia, 1 vez/dia

Pouca ou nenhuma interação medicamentosa

Disfunção sexual, efeitos gastrintestinais, tontura, cefaleia

Fluvoxamina

100 a 200 mg/dia, 1 vez/dia

Sintomas obsessivo-compulsivos, ansiolítico

Disfunção sexual, efeitos gastrintestinais, cefaleia, tontura

Venlafaxina

Venlafaxina XR

75 a 225 mg/dia, 2 ou 1 vez/dia (XR)

Ansiolítico, alívio das dores pelo corpo

Disfunção sexual, sudorese, tontura, retirada gradual

Mirtazapina

15 a -45 mg/dia, 1 vez/dia (noite)

Ansiolítico, melhora do sono, alívio da dor, não causa disfunção sexual

Ganho de peso, sedação

Bupropiona

150 a 300 mg, 1 vez/dia

Antitabagismo; sem disfunção sexual associada

Diminuição do limiar convulsivo

Alprazolam

0,25 a 4 mg/dia, 2 a 3 vezes/dia

Sedativo, ansiolítico, relaxamento muscular

Retirada gradual, dependência, tolerância, prejuízos cognitivos

Buspirona

10 a 60 mg/dia, 1 a 3 vezes/dia

Ansiolítico, melhora das dores musculares

Cefaleia, efeitos gastrintestinais, dose fracionada (2 a 3 vezes)

Medroxiprogesterona

150 mg IM trimestral

Anticoncepção, baixo custo, fácil posologia

Irregularidade menstrual, ganho de peso

Danazol

200 a 800 mg/dia

Melhora de letargia, irritabilidade e ansiedade

Hirsutismo, androgenismo, relatos de precipitar depressão

Leuprolide

7,5/11,25/22,5 mg (bi, tri e semestral)

Grande melhora dos sintomas físicos e psíquicos

Hipoestrogenismo (ondas de calor, secura vaginal)

Goserrelin

3,6 e 10,8 mg (mensal/trimestral)

Grande melhora dos sintomas físicos e psíquicos

Hipoestrogenismo (ondas de calor, secura vaginal)

 

Tópicos Importantes

-O diagnóstico da TPM é eminentemente clínico. Devemos investigar minuciosamente o maior número possível de sintomas da TPM, sempre avaliando o grau de desconforto causado por cada um deles. Lembrar que muitas pacientes já se “acostumaram” com a doença.

-A realização de um diário de sintomas, podendo ser de forma simplificada (os 5 principais sintomas com a respectiva intensidade), ajudaá muito não só no diagnóstico, como no controle terapêutico. Priorizar o diagnóstico prospectivo.

-Atenção ao diagnóstico diferencial ou às doenças associadas, como depressão, transtornos ansiosos, abuso e dependência de substâncias, dismenorreia, mastalgia cíclica, doenças endocrinológicas e neoplasias.

-Valorizar sintomas que persistam mesmo após terapêutica adequada, descartando doenças “orgânicas”. Por exemplo: dor pélvica e cefaleia – descartar respectivamente endometriose e enxaqueca. Lembrar sempre que doenças muito prevalentes podem estar presentes em conjunto.

-Buscar a melhoria da qualidade de vida da paciente, não permitindo que ela “aceite” a TPM. Identificar objetivamente os sintomas e tratá-los de forma efetiva, por meio de medicações comprovadas e seguindo-se um plano terapêutico hierarquizado.

-Deve sempre ser orientado (isoladamente ou como adjuvante) o tratamento não-farmacológico, que inclui exercícios, dieta, explicação sobre a doença e outras medidas comportamentais.

-Se ocorrerem apenas sintomas isolados, pode-se optar pelo tratamento especifico. Por exemplo: dor (cefaleia, mastalgia) – analgésicos ou anti-inflamatórios não-hormonais; edema – aldactona; fadiga e insônia – restringir cafeína e higiene do sono.

-Os agentes com comprovada eficácia no tratamento de TPM intensa são antidepressivos, alprazolam e agonistas de GNRH.

-A forma mais grave de TPM recebe o nome de síndrome disfórica pré-menstrual e tem seu tratamento iniciado com inibidores da recaptação de serotonina durante a fase lútea (14 dias antes da menstruação). Utilizar a medicação apenas nesse período reduz os efeitos adversos e os custos para a paciente, além de diminuir o risco de abandono do tratamento.

-Optar, sempre que possível, por monoterapia. A avaliação das comorbidades pode direcionar a escolha terapêutica.

-Não se contentar com apenas uma redução dos sintomas. Caso se mantenha algum prejuízo na qualidade de vida da paciente, deve-se buscar a remissão. Avaliar perfil de efeitos colaterais.

 

Algoritmo - Abordatem da Tensão Pré Menstrual – TPM

 

Algoritmo 1: Conduta em Tensão pré-menstrual.

 

 

Bibliografia

Adaptado, com autorização, do livro Clínica Médica: dos Sinais e Sintomas ao Diagnóstico e Tratamento. Barueri: Manole, 2007.

1. American Psychiatric Association (APA). Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 4. ed. Washington, DC: American Psychiatric Association; 1994.

 

2. American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG). Clinical management guidelines for obstetricians-gynecologists: premenstrual syndrome. ACOG Practice Bulletin 15. Washington, DC: ACOG; 2000.

 

3. Cohen LS, Soares CN, Lyster A, Cassano P, Brandes M, Leblanc GA. Efficacy and tolerability of premenstrual use of venlafaxine (flexible dose) in the treatment of premenstrual dysphoric disorder. J Clin Psychopharmacol. 2004;24(5):540-3.

 

4. Dickerson LM, Mazyck PJ, Hunter MH. Premenstrual syndrome. American Familiy Physisian. 2003;67(8):1743-52.

 

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