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Criptococose Pulmonar

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 06/02/2020

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O Cryptococcus neoformans tem umadistribuição global e pode ser isolado do solo e excrementos de aves comopombos, causando principalmente infecção no sistema nervoso central. As infecçõescriptocócicas são comumente observadas em pacientes imunocomprometidos,incluindo pacientes com infecção avançada por vírus da imunodeficiência humana(HIV), neoplasias malignas, transplantes de órgãos sólidos e outras condições.

A criptococose é uma das infecções fúngicasgraves mais comuns em pacientes infectados pelo HIV, sendo o terceiro patógenofúngico invasivo mais comum (depois de cândida e Aspergillus) em pacientessubmetidos a transplantes de órgãos sólidos. O Cryptococcus afeta o transplantede células-tronco hematopoiéticas com menos frequência, provocando 0,6% dasinfecções.

 

Patogênese

 

As infecções pulmonares secundárias ao Cryptococcusse iniciam pela inalação de leveduras ou esporos pequenos (produzidos por meio deacasalamento). Uma vez nos alvéolos, a infecção pode ocorrer devido àvirulência da cepa infectante, por polimorfismos genéticos do hospedeiro, por respostasimunes inatas e adaptativas e pela presença de comorbidades. A virulência doCryptococcus é relacionada com a sua cápsula polissacarídica, bem como apresença de enzimas específicas, incluindo lacase (necessária para a produção demelanina fúngica), fosfolipase B e inositol fosfosfolipase.

Os Cryptococcus encontram diversos elementosda resposta imune inata, incluindo neutrófilos polimorfonucleares, macrófagos ecélulas dendríticas, que produzem as citocinas que dirigem uma resposta decélulas T CD4 helper tipo 1; defeitos na imunidade facilitam odesenvolvimento de infecção pulmonar. Os defeitos na imunidade humoral sãomenos comumente associados a infecções criptocócicas do que os defeitos naimunidade celular.

A maior parte dos casos, em pacientesimunocomprometidos, ocorre por reativação de infecção latente, mas também porinfecção primária. As condições mais associadas com criptococose pulmonar sãoinfecção pelo HIV, neoplasias malignas, transplante de medula óssea ou órgãossólidos, diabetes melito e síndrome de Cushing.

 

Manifestações Clínicas

 

A apresentação clínica das infecçõescriptocócicas é determinada pelo estado imunológico do hospedeiro, as espéciesde Cryptococcus e o local da infecção. Os pulmões são o local primáriocomumente envolvido, sendo o sistema nervoso central o local mais comum dedisseminação.

O envolvimento pulmonar varia de colonizaçãoassintomática à consolidação multifocal até síndrome do desconfortorespiratório agudo, sendo esta última mais comum em pacientes recipientes detransplante de órgãos. A maioria das infecções pulmonares é assintomática oulevemente sintomática em hospedeiros imunocompetentes, e pode ser descoberta incidentalmenteem imagem radiográfica. Em uma série de casos, a maioria dos pacientes comcriptococose pulmonar apresentava manifestações de infecção criptocócica emoutros órgãos.

Os sintomas mais comumente descritos nacriptococose pulmonar são:

·              febre: 63% dos casos;

·              dor torácica: 44% dos casos;

·              dispneia: 27% dos casos;

·              tosse: 17% dos casos;

·              hemoptise: 7% dos casos.

A disseminação pode se desenvolver durante ainfecção primária ou reativação. A infecção aguda no hospedeiro imunocompetentepode se manifestar com febre, fadiga, tosse e produção de escarro. Em pacientesimunocomprometidos, os sintomas graves podem progredir rapidamente parainsuficiência respiratória e síndrome do desconforto respiratório.

Em um estudo retrospectivo internacionalmulticêntrico com 11 pacientes submetidos a transplantes de órgãos sólidos,infecções criptocócicas ocorreram depois de uma mediana de 21 meses após otransplante, com comprometimento pulmonar em 60% dos casos e comprometimento doSNC em 58%.

Em pacientes com infecção avançada pelo HIV, ameningoencefalite é a apresentação predominante. Os sintomas em pacientes comHIV tendem a ser mais agudos que em outras populações. Febre ocorre em 80 a 95%;tosse, em 63 a 71% dos pacientes; dispneia, em 5 a 50% dos casos; e cefaleia,em 40% dos pacientes.

 

Exames Complementares

 

Os achados radiográficos em criptococosepulmonar incluem infecções pulmonares focais ou difusas, com nódulos ouconsolidação de espaço aéreo irregular. Outros achados incluem cavitação,lesões de massa, que são os criptococomas e padrões reticulonodulares,atenuação em vidro fosco e efusões ou linfadenopatias associadas.

Em um estudo com tomografia computadorizada(TC), achados radiográficos de criptococose em pacientes imunocomprometidostiveram maior envolvimento pulmonar com cavitação e consolidação parenquimatosado que em pacientes imunocompetentes, um achado que contrasta com o que ocorrena tuberculose.

 

Diagnóstico

 

O diagnóstico de criptococose pulmonar é feitocom base em sintomas, radiografia de tórax, cultura e histologia e testes deantígeno criptocócico. O antígeno criptocócico sérico é positivo empraticamente todos os pacientes com HIV positivo e em 56 a 70% dos pacientescom outras formas de imunocomprometimento. Os títulos de antígeno criptocócicosérico foram maiores naqueles pacientes com infecção extrapulmonarconcomitante.

O Cryptococcus pode ser cultivado a partir deespécimes respiratórios, incluindo expectorado e lavado broncoalveolar (LBA); abroncoscopia com LBA também pode descartar outras infecções oportunistas. Ashemoculturas só são positivas em infecções disseminadas. O Cryptococcus éfacilmente identificado sob o microscópio como 5 a 10µm de células de leveduraesféricas a ovais com uma cápsula. O teste bioquímico é usado para confirmar aidentificação. A biópsia de tecido é sempre indicada se existe suspeita deneoplasia associada.

Deve-se determinar se existe a presença deinfecção disseminada, e a extensão do envolvimento de órgãos é crucial paradecidir o regime de tratamento. Assim, a avaliação do líquido cefalorraquidianodeve ser realizada em todos os pacientes imunossuprimidos com criptococosepulmonar.

Fatores associados com maior probabilidade dedoença disseminada e necessidade para análise do líquido cefalorraquidianoincluem achados neurológicos, sinais de infecção sistêmica, como febre e perdade peso e títulos de antígenos criptocócicos séricos de, pelo menos, 1/64;quando os títulos de antígenos criptocócicos séricos são maiores que 1/512, ospacientes apresentam prognóstico pior.

 

Tratamento

 

A escolha do tratamento depende do estadoimunológico do hospedeiro e da presença de infecção extrapulmonar. Em pacientesimunocompetentes, o tratamento pode ser realizado com fluconazol, 400mg/dia por6 a 12 meses. Alternativas incluem itraconazol e voriconazol. Em pacientesimunodeprimidos, existem recomendações de diretrizes da American ThoracicSociety e da Infectious Disease Society of America (IDSA).

Para a criptococose pulmonar em pacientes comevidência de infecção disseminada, acometimento de SNC ou pneumonia grave, otratamento é separado em fase de indução, consolidação e manutenção. A terapiade indução é tipicamente realizada com anfotericina B em dose de 0,7 a1mg/kg/dia, mais flucitosina, 100mg/kg/dia. Em pacientes transplantados epacientes com disfunção renal, formulações lipídicas de anfotericina B podemser usadas para minimizar a nefrotoxicidade.

O fluconazol é utilizado para consolidação eterapia de manutenção com doses variando de 400 a 800mg/dia e 200 a 400mg/dia,respectivamente. Infecção leve a moderada isolada nos pulmões é tratada comfluconazol, 400mg/dia por um período mínimo de 6 a 12 meses, mesmo emimunodeprimidos. Pacientes assintomáticos com nódulos solitários ressecados, antígenocriptocócico sérico indetectável e nenhuma evidência de infecção extrapulmonar podemser observados sem terapia antifúngica específica.

A síndrome inflamatória de reconstituiçãoimune (Siri) pode complicar o tratamento de qualquer micose oportunista, mas émais comum na criptococose. A Siri é, geralmente, caracterizada peloagravamento dos sinais e sintomas clínicos da infecção original, que pode ser malinterpretada como progressão da infecção. A Siri surge mais comumente com oinício de terapia antirretroviral potente na infecção pelo HIV e com melhoraabrupta na competência imunológica em transplantados por órgãos sólidos.

Embora seja menos comum, a Siri também podeacontecer em pacientes com neoplasias hematológicas e recuperação de monócitose neutrófilos após quimioterapia mieloablativa, com a recuperação linfocitáriaapós o recebimento de anticorpos monoclonais, como alemtuzumab. Asmanifestações da Siri na doença pulmonar podem ser graves e incluem síndrome dodesconforto respiratório agudo.

Pacientes transplantados que desenvolvem Siriassociada à criptococose têm potencial aumentado para perda de aloenxerto. Otratamento da Siri em receptores de transplante inclui ajuste das medicações imunossupressoraspara moderar os sintomas sem promover a progressão da infecção. Os anti-inflamatóriosnão esteroidais são, frequentemente, suficientes para melhorar os sintomas da Siri,porém doses elevadas de corticosteroides podem ser necessárias para manejar ascomplicações da Siri grave.

 

Referências

 

1-Horan-Saullo J,Alexander BD. Opportunistic mycoses in Murray And Nadels Respiratory Medicine2016.

2-Campbell GD. Primary pulmonary cryptococcosis. Am Rev Respir Dis 1966;94:236.

3- Chu HQ, Li HP, He GJ. Analysis of 23 cases of pulmonary cryptococcosis.Chin Med J (Engl) 2004; 117:1425.

4- Pappas PG, Perfect JR, Cloud GA, et al. Cryptococcosis in humanimmunodeficiency virus-negative patients in the era of effective azole therapy.Clin Infect Dis 2001; 33:690.

5- Shirley RM, Baddley JW. Cryptococcal lung disease. Curr Opin Pulm Med2009; 15:254.


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