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Síndrome dos Ovários Policísticos

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 07/10/2022

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A síndromedos ovários policísticos (SOP) é ??uma doença endócrina comum de etiologiadesconhecida com prevalência estimada de 6 a 10% das mulheres em idadereprodutiva, segundo dados de 2016, dependendo do critério utilizado para odiagnóstico. A SOP é caracterizada por ciclos menstruais irregulares, anovulação,ovários policísticos e hiperandrogenismo. Também está frequentemente associadaa hirsutismo, obesidade e aumento do risco de diabetes melito, doençascardiovasculares e síndrome metabólica. Acredita-se que a SOP seja uma dasendocrinopatias mais comuns em mulheres, afetando entre 5 e 10% delas,dependendo da população estudada.

 

Achados Clínicos

 

A SOPgeralmente se apresenta como um distúrbio menstrual (variando de

amenorreiaa sangramento menstrual intenso) e infertilidade. A irregularidade menstrualgeralmente começa no período peripuberal, e a menarca pode ser tardia. O padrãomenstrual é tipicamente de oligomenorreia (menos de nove períodos menstruais emum ano) e, menos frequentemente, amenorreia (ausência de períodos menstruaispor três ou mais meses consecutivos). As mulheres geralmente experimentamciclos mais regulares após os 40 anos de idade.

Alteraçõescutâneas podem ocorrer devido ao hiperandrogenismo periférico, com hirsutismoclínico, acne e queda de cabelo com padrão masculino. O hirsutismo é definidocomo excesso de pelos corporais terminais (espessos, pigmentados) emdistribuição masculina.

Cerca de40 a 85% das mulheres com SOP estão acima do peso ou preenchem critérios deobesidade. A resistência à insulina está presente em mulheres magras e obesascom SOP (30 e 70%, respectivamente). Mulheres com SOP também apresentam maiorrisco de desenvolver diabetes tipo 2 e provavelmente síndrome coronariana,independentemente dos fatores de risco cardiovasculares tradicionais.

Outrasmanifestações clínicas relacionadas à SOP incluem esteatose hepática nãoalcoólica e apneia do sono. A SOP está associada ainda a transtornos do humor(depressão e ansiedade), qualidade de vida prejudicada e transtornosalimentares (compulsão alimentar, mesmo quando em comparação com mulheres commesmo índice de massa corporal).

A maioriadas mulheres com SOP apresenta evidências clínicas e bioquímicas dehiperandrogenismo. Sinais de excesso mais grave de androgênio (virilização),como engrossamento da voz e clitoromegalia, ocorrem raramente e sugerem apossibilidade de hipertecose ovariana ou tumor secretor de androgênio.

Gestantescom SOP apresentam maior risco de complicações perinatais, como diabetesgestacional e pré-eclâmpsia. O risco de câncer de endométrio é aumentado nessaspacientes devido à exposição estrogênica crônica.

 

Diagnóstico Diferencial

 

A presençade anovulação durante os anos reprodutivos também pode ser causada por falênciaovariana prematura (FSH alto, estradiol baixo), amenorreia hipotalâmicafuncional, perda de peso rápida ou esforço físico extremo (FSH normal ou baixo paraidade) e interrupção do uso de anticoncepcionais hormonais (em geral o retornoà ovulação demora cerca de 90 dias), prolactinomas ou adenomas com aumento deprolactina por compressão de haste, hipertireoidismo ou hipotireoidismo.

 

Exames Complementares

 

Exames sãonecessários para descartar outras etiologias de anovulação em mulheres comsuspeita de SOP. Assim, deve-se solicitar FSH sérico, LH, prolactina e TSH. Devidoao alto risco de resistência à insulina e dislipidemia,

todas asmulheres com suspeita de SOP devem mensurar a hemoglobina A1C e glicemia dejejum juntamente com um perfil lipídico. Mulheres com evidência clínica deexcesso de andrógenos devem dosar a testosterona total, a testosterona livre(biodisponível) e a 17-hidroxiprogesterona. Mulheres com estigmas da síndromede Cushing devem realizar dosagem do cortisol urinário de 24 horas ou teste desupressão do cortisol com dexametasona 1 mg às 23 horas.

Hiperplasiaadrenal congênita, secreção androgênica e os tumores adrenais também podem aníveis elevados de andrógenos circulantes e anovulação com ovários policísticos.

A dosagemde rotina de sulfato de dehidroepiandrosterona (DHEAS) em mulheres com suspeitade SOP não é recomendada, porque é improvável que níveis levemente elevados deDHEAS afetem o manejo. Em pacientes com

hiperandrogenismograve, a dosagem de DHEAS é útil, pois seus valores podem ser extremamentealtos no carcinoma adrenocortical.

Aaparência policística típica dos ovários pode ser vista na ultrassonografiatransvaginal na maioria das mulheres com menstruação irregular ehiperandrogenismo. No entanto, essa aparência ultrassonográfica é inespecíficae não confirma o diagnóstico isoladamente. Os critérios ultrassonográficos paraovários policísticos evoluíram desde a primeira descrição ultrassonográfica em1986. Os critérios de Rotterdam, considerados com especificidade esensibilidade suficientes para definir SOP, incluem a presença de 12 ou maisfolículos em qualquer ovário medindo de 2 a 9 mm de diâmetro e/ou volumeovariano > 10 mL.

Nopassado, muitos autores recomendavam mensurar o LH e o FSH e usar uma razãoLH:FSH elevada = 2 como evidência para o diagnóstico de SOP. No entanto, arelação LH:FSH pouco auxilia no diagnóstico e não é recomendada de rotina.

 

Diagnóstico

 

Odiagnóstico de SOP deve ser suspeitado em qualquer mulher em idade reprodutivaque apresente menstruação irregular e sintomas de hiperandrogenismo. Oscritérios diagnósticos de Rotterdam podem ser utilizados. São necessários doisdos três critérios a seguir para o diagnóstico:

 

1.     Oligo e/ou anovulação

2.     Sinais clínicos e/ou bioquímicos dehiperandrogenismo

3.     Ovários policísticos detectados emultrassonografia

 

Outro critériodiagnóstico é o da Androgen Excess Society de 2006, que utiliza como critériosdiagnósticos hiperandrogenismo com oligomenorreia e o achado de ováriospolicísticos em exame de imagem, ambos necessários para o diagnóstico. As trêsestratégias requerem a exclusão de outras causas.

Devemoslembrar que a avaliação da morfologia ovariana por ultrassom não é recomendadaaté a maturidade reprodutiva ser alcançada (oito anos pós-menarca). Faltamdados para padronizar achados ultrassonográficos em adolescentes, e achados deovários policísticos nesse grupo não devem ser utilizados para o diagnóstico deSOP, a menos que hiperandrogenismo e oligomenorreia também estejam presentes.

Muitasmulheres com menstruação irregular e sintomas hiperandrogênicos podem serdiagnosticadas com base apenas na história e no exame físico. No entanto, odiagnóstico de SOP só é confirmado quando outras condições que mimetizam SOPsão excluídas (por exemplo, distúrbios que causam oligo/anovulação e/ouhiperandrogenismo, como doença da tireoide, hiperplasia adrenal congênita nãoclássica [NCCAH], hiperprolactinemia e secreção de tumores andrógenos). Ohirsutismo pode ser avaliado por escores como o escore de Ferriman-Gallwey, umaescala visual que avalia nove áreas corporais em uma escala de 0 a 4. Umapontuação 6 ou maior indica a presença de hirsutismo.

 

Tratamento

 

Empacientes obesas com SOP, redução de peso e exercícios são frequentementeeficazes na reversão dos efeitos metabólicos e induzem a ovulação. Mesmo aperda de peso modesta (redução de 5 a 10% no peso corporal) em mulheres com SOPpode resultar na restauração dos ciclos ovulatórios normais e em melhores taxasde gravidez. Não existem estudos que mostrem benefício maior com tiposespecíficos de dieta para essas pacientes.

Emmulheres que não respondem a perda de peso e exercício, o uso deanticoncepcionais hormonais combinados é o tratamento de primeira linha paracontrolar o hiperandrogenismo e as irregularidades menstruais. Uma opçãoterapêutica é o uso de progestógenos ou um DIU liberador de progesterona paraproteção endometrial em mulheres que não podem ou escolhem não usar anticoncepcionaisorais combinados com estrógeno e progestógeno. Uma opção entre osanticoncepcionais orais é o etinilestradiol 20 mcg combinado com um progestógenocomo noretindrona ou acetato de noretindrona. O risco de tromboembolismo venososempre deve ser avaliado nessas pacientes. Em mulheres que optam por não tomaranticoncepcionais orais, tratamentos alternativos são a terapia com progestinaintermitente ou contínua ou um dispositivo intrauterino (DIU) liberador deprogestina. Opções nesse caso incluem acetato de medroxiprogesterona (5 a 10mg) por 10 a 14 dias a cada um ou dois meses. Outra opção são os DIUs comliberação de levonorgestrel.

A metforminapode ser usada como terapia de segunda linha para melhorar a função menstrual.A metformina tem pouco ou nenhum benefício no tratamento de hirsutismo, acne ouinfertilidade. As tiazolidinedionas foram menos estudadas do que a metformina,mas parecem melhorar a sensibilidade à insulina e a hiperandrogenemia, mas,devido a potenciais eventos adversos cardiovasculares, seu uso não é recomendado.As diretrizes atuais não recomendam o uso rotineiro de metformina em mulheresobesas com SOP (incluindo indução da ovulação), exceto em mulheres comintolerância à glicose que não responderam às intervenções no estilo de vida.

Em mulheresque pretendem ter filhos e permanecem anovulatórias, o uso do clomifeno,letrozol ou outros medicamentos para estimulação ovariana é uma opção. Historicamente,o citrato de clomifeno era a droga de escolha nessas pacientes, mas atualmenteo letrozol é considerado a terapia de primeira linha sobre o citrato declomifeno, independentemente do índice de massa corporal (IMC) da paciente. Ametformina pode ser utilizada como medicação adjuvante nessas pacientes. Outrométodo para induzir a ovulação é a administração de gonadotrofinas exógenas. Umestudo com 225 mulheres com SOP tratadas por um período de 10 anos em um centroencontrou taxas de ovulação e gravidez de 72% e 45%, respectivamente, após a administraçãode baixas doses de gonadotrofinas.

A ressecçãoem cunha dos ovários era um tratamento padrão para infertilidade em mulherescom SOP, mas nos dias atuais é raramente indicada. Para mulheres que nãorespondem à indução da ovulação com letrozol ou citrato de clomifeno, aperfuração ovariana laparoscópica (também chamada de diatermia ovarianalaparoscópica ou eletrocoagulação) é uma opção cirúrgica para tratamento desegunda linha. Se todas essas medidas não forem eficazes, a fertilização invitro é uma opção.

Otratamento inicial do hirsutismo em pacientes com SOP consiste em mudanças deestilo de vida e anticoncepcionais orais. Em pacientes sem melhora dohirsutismo após seis meses de tratamento, uma medicação antiandrogênica, como aespironolactona 50 a 100 mg ao dia, pode ser utilizada. A espironolactonaisoladamente não regulariza e pode até aumentar a irregularidade dos ciclosmenstruais. Outras medicações antiandrogênicas disponíveis incluem finasteridae dutasterida. Essas medicações nunca devem ser usadas ??por mulheres que nãoestejam usando métodos contraceptivos. O acetato de ciproterona e a flutamidatambém são eficazes, mas seu uso de rotina não é recomendado devido àhepatotoxicidade potencial. Os agonistas do hormônio liberador de gonadotrofinas(GnRH) também são usados ??algumas vezes para suprimir a produção de andrógenosovarianos, mas essa abordagem é limitada devido a complexidade e custo.

O creme deeflornitina, aplicado nas áreas faciais afetadas duas vezes diariamente por seismeses, pode ser útil na maioria das mulheres. O hirsutismo também pode ser tratadocom cremes depilatórios, eletrólise e terapia a laser. A combinação de lasere eflornitina tópica pode ser eficaz.

Mulherescom SOP devem ter seus fatores de risco cardiovascular tratados agressivamentee realizar monitoramento regular do perfil lipídico e da glicemia. As medidaspara risco cardiovascular nessas pacientes não serão discutidas nesta revisão.

 

Bibliografia

 

1-Huddleston HG, Dokras A. Diagnosis and treatment ofPolycistic Ovary Syndrome. JAMA 2022; 327 (3): 274-275.

2-Legro RS, Arslanian SA, Ehrmann DA, et al. Diagnosis andtreatment of polycystic ovary syndrome: an Endocrine Society clinical practiceguideline. J Clin Endocrinol Metab 2013; 98:4565.

3-Teede HJ, Misso ML, Costello MF, et al. Recommendationsfrom the international evidence-based guideline for the assessment andmanagement of polycystic ovary syndrome. Fertil Steril 2018; 110:364.

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