Eletrocardiograma
Você está de plantão na emergência de um hospital público. A ambulância do SAMU traz um paciente do sexo masculino, aparentando 60 anos de idade, negro, que foi encontrado caído na rua. Apresentava os seguintes sinais à chegada ao PS:
PA: 80/60 mmHg;
pulso: 30/40 btmin;
SatO2: 88% em máscara com 5 L/min;
pele fria, sudorética, pulsos filiformes, fístula em membro superior direito;
Glasgow – 5;
ritmo cardíaco regular, com bulhas hipofonéticas;
MV+, com ruídos diminuídos em base.
O eletrocardiograma realizado está demonstrado na Figura 1.
Figura 1. Eletrocardiograma do paciente.
O ritmo é bradicárdico (30 a 40 bpm) e irregular com “estranhos complexos QRS”. À primeira vista, é difícil distinguir complexos QRS de onda T. Parece um ritmo pré-morte (Figura 2).
Figura 2.
Analisando-se atentamente, verifica-se que os complexos QRS em DI, DII e DIII são quase isoelétricos. Note o tamanho da onda T (fusão do segmento S do QRS – Figura 3).
Figura 3.
O paciente foi intubado, recebeu vasopressores e foi ligado o marca-passo transcutâneo, conforme mostra a Figura 4.
Figura 4.
No primeiro segmento do ECG, verifica-se a “captura” pelo marca-passo. Em seguida, perde-se a estimulação e o paciente volta ao ritmo bradicárdico. Veja o QRS com pequena amplitude.
O paciente apresentou PCR em assistolia e foi a óbito.
Hipercalemia é uma condição comum, causada por um elevado nível de potássio no sangue. Os níveis normais de potássio estão na faixa 3,5 a 5 mEq/L. A Hipercalemia grave ocorre com níveis de potássio > 7 mEq/L.
O diagnóstico de Hipercalemia pode ser difícil, já que muitos pacientes não apresentam sintomas. Ocasionalmente, os pacientes exibirão náuseas. O eletrocardiograma pode demonstrar alterações leves a arritmias potencialmente perigosas. Parada cardíaca pode ocorrer a qualquer momento durante o tratamento da Hipercalemia, portanto, monitoração cardíaca é fundamental.
A manifestação eletrocardiográfica mais precoce é uma grande onda T, em tenda, apiculada, de base estreita (modificações mais evidentes nas derivações DII, DIII e em V2- V4), tipicamente vista com níveis séricos entre 5,5 e 6,5 mEq/L.
O tecido atrial é mais sensível a estas modificações e o achatamento da onda P, o aumento do segmento PR e até o desaparecimento da onda P podem preceder o alargamento do QRS. Estas alterações são, em geral, notadas a partir de 6,5 mEq/L.
Com o potássio sérico muito elevado, há alargamento do QRS e eventualmente sua fusão com a onda T, causando uma onda sinusoidal. Este é um achado pré-terminal se não for tratado de imediato. O evento fatal é assistolia, já que ocorre bloqueio completo na condução ventricular, ou fibrilação ventricular.
ECG de Hipercalemia (padrão sinusoidal): K = 9 mEq/L (resultado chegou após o óbito).