A Linfopenia é definida como uma contagem de linfócitos totais inferior a 1.000 células/mm3, lembrando que alguns autores utilizam como definição um limite inferior a 1.500 células/mm3 e esses pontos de corte podem variar com a idade. Como, aproximadamente, 80% dos linfócitos normais do sangue em adultos são linfócitos T e quase dois terços dos linfócitos T sanguíneos são linfócitos T CD4 + (helper), a maioria dos pacientes com Linfopenia tem reduções nos números absolutos de linfócitos T, sobretudo linfócitos T CD4 +.
O número absoluto médio de linfócitos T no sangue adulto normal é de 1.900 células/mm3, variando de 1.000 a 2.300 células/mm3. O número absoluto médio de linfócitos T CD4 + é de 1.100 células/mm3, variando de 720 a 1.400 células/mm3; o número absoluto médio de linfócitos T CD8 + é de 650 células/mm3, variando, normalmente, de 380 a 970 células/mm3.
As etiologias das linfopenias variam bastante, incluindo infecções como o vírus da imunodeficiência adquirida (HIV), desnutrição proteico-calórica, doenças sistêmicas, imunodeficiências congênitas como a síndrome de Wiskott-Aldrich, além do uso de terapia imunossupressora e corticosteroides. O mecanismo da Linfopenia é variável em cada uma de suas diferentes etiologias e, em muitos desses distúrbios, a fisiopatologia não é estabelecida.
Etiologia
A incidência relativa de cada uma dessas condições varia de acordo com a população de pacientes. Em um estudo com mais de 1.000 indivíduos com Linfopenia definida por linfócitos em número inferir a 600 células/mm3, os pacientes apresentaram, em ordem decrescente de frequência, os seguintes fatores associados à Linfopenia:
infecção bacteriana ou fúngica (24%);
pós-operatório de cirurgia de grande porte (22%);
neoplasias malignas (17%);
terapia com glicocorticoides (15%);
quimioterapia (Qt) citotóxica e/ou radioterapia (Rtx) ? 9%;
trauma ou hemorragia recente (8%);
transplante alogênico de medula (7%);
infecções virais que não o HIV (5%);
infecção pelo HIV (3%).
Pacientes com imunodeficiências hereditárias podem ter linfocitopenia associada. Esses indivíduos podem ter uma anormalidade quantitativa ou qualitativa das células-tronco, resultando em linfopoiese ineficaz, e costumam apresentar outras alterações que causam imunodeficiências. Além disso, mutações nos genes envolvidos no desenvolvimento das células T ocorrem em muitas dessas imunodeficiências.
Os pacientes com imunodeficiências adquiridas podem ter infecções recorrentes, bem como doenças autoimunes, e têm um aumento do risco de malignidades como linfoma em doentes com imunodeficiência comum variada. Além disso, apresentam risco aumentado de doenças alérgicas. Além da diminuição do número de linfócitos, a deficiência no número de um subtipo de linfócitos, como os linfócitos CD4, pode causar infecções específicas, como as por deficiência de imunidade celular, que ocorrem em pacientes com HIV.
As deficiências imunológicas, como a síndrome de Wiskott-Aldrich, têm Linfopenia associada por destruição prematura de células T secundária a um defeito no citoesqueleto linfocítico. Estudos têm relatado que certos grupos étnicos têm menor contagem de células T CD4 + na ausência de outros fatores identificados. A doença infecciosa mais comum associada à Linfopenia é a síndrome da imunodeficiência adquirida (Sida) causada pelo HIV.
A Linfopenia resulta, em parte, da destruição e/ou depuração de células T CD4 + infectadas com HIV-1 ou HIV-2. Outras doenças virais e bacterianas também podem estar associadas à Linfopenia. Os portadores de tuberculose ativa e de Linfopenia, mesmo que sejam HIV negativos, apresentam, em geral, melhora até 2 semanas após o início da terapia antimicrobiana apropriada.
Os pacientes com síndrome respiratória aguda resultante de infecção com coronavírus costumam ter linfocitopenia, que se resolve após a melhora do quadro infeccioso. Várias outras doenças virais comuns como o sarampo estão, tipicamente, associadas à Linfopenia transitória durante as fases agudas da infecção. As principais causas da Linfopenia estão sumarizadas no Quadro 1.
Quadro 1
CAUSAS DA Linfopenia | |||
Causas hereditárias |
Imunodeficiências congênitas |
Imunodeficiência combinada variada grave e suas variações Imunodeficiência comum variada Ataxia-telangiectasia Síndrome de Wiskott-Aldrich Imunodeficiência com dwarfismo de extremidades curtas (hipoplasia cartilagem-cabelo) Imunodeficiência com timoma Imunodeficiência com doença veno-oclusiva do fígado | |
Linfopenia resultante de polimorfismo genético | |||
Causas adquiridas |
Anemia aplásica | ||
Doenças infecciosas |
Doenças virais |
HIV Síndrome respiratória aguda grave Encefalite do Nilo Ocidental Hepatites Influenzavírus Infecções herpéticas Sarampo | |
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Doenças bacterianas |
Tuberculose Febre tifoide Pneumonia Rickettsiose Erlichiose Sepse | |
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Doenças parasitárias |
Fase aguda da infecção por malária
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Condições iatrogênicas |
Agentes imunossupressores Terapia com globulina antilinfocítica Alemtuzumabe Glicocorticoides Doses altas de psoralens mais tratamento com ultravioleta Síndrome de Stevens-Johnson Qt Transplante renal Rtx Cirurgia com circulação extracorpórea Transplante de células-tronco hematopoiéticas Drenagem do ducto torácico Hemodiálise | |
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Doenças sistêmicas associadas |
LES Síndrome de Sjögren Miastenia grave Vasculite sistêmica Síndrome de Behçet Dermatomiosite Granulomatose de Wegener Linfoma de Hodgkin Carcinomas Mielofibrose idiopática Enteropatia perdedora de proteínas IC Sarcoidose Lesão térmica Pancreatite aguda grave Exercício extenuante Silicose Doença celíaca Doação de sangue para realização de aférese de plaquetas Abuso de etanol Deficiência de zinco Linfocitopenia T CD4 + idiopática |
HIV: vírus da imunodeficiência adquirida; IC: insuficiência cardíaca; LES: lúpus eritematoso sistêmico; Qt: quimioterapia; Rtx: radioterapia.
A Linfopenia em pacientes com sepse é associada com diminuição da sobrevida em 1 mês e 1 ano. A Linfopenia é considerada um marcador da presença da imunossupressão induzida pela sepse. Em hospitalizados com insuficiência cardíaca descompensada (ICD), a Linfopenia relativa é bastante comum.
A Rtx, a Qt citotóxica, o uso de glicocorticoides ou a administração de globulina antilinfócitos ou alemtuzumabe podem levar à Linfopenia, destruindo os linfócitos circulantes. O tratamento a longo prazo da psoríase com radiação ultravioleta pode resultar em Linfopenia de linfócitos T por destruição de células circulantes na vascularização cutânea. O mecanismo por meio do qual os glicocorticoides causam Linfopenia não está claro, mas pode ser secundário a uma redistribuição de linfócitos induzida pelo glicocorticoide.
Os procedimentos cirúrgicos também são associados à redistribuição de linfócitos, podendo causar destruição celular direta. Na drenagem do ducto torácico, os linfócitos são perdidos da circulação. A realização de aférese de plaquetas ou de células estaminais reduz de forma similar a contagem de linfócitos devido à remoção inadvertida de linfócitos com as plaquetas.
Os pacientes com doença autoimune podem ter Linfopenia secundária tanto à doença sistêmica quanto ao tratamento. Os indivíduos que apresentam lúpus eritematoso sistêmico (LES) podem ter Linfopenia mediada por autoanticorpos antes do tratamento, e a presença de anticorpos antilinfócitos foi associada com a atividade da doença e a nefrite lúpica.
Da mesma forma, os pacientes com síndrome primária de Sjögren, às vezes, têm Linfopenia mesmo antes da terapia, e uma associação entre Linfopenia e risco de desenvolver linfoma foi observada. Em outras condições como a enteropatia perdedora de proteínas, os linfócitos podem ser perdidos com outras proteínas pela mucosa enteral. A lesão térmica grave pode resultar em profunda Linfopenia de células T secundária à redistribuição das células T do sangue para os tecidos.
A Linfopenia também tem sido considerada um preditor independente de desfechos ruins em pacientes com IC que necessitam de hospitalização, ocorrendo em indivíduos com mais idade, portadores de comorbidades como diabetes melito, doença renal e cardiovascular, e com altos níveis de peptídeos natriuréticos do tipo B (BNPs) e intervalos QRS amplos no eletrocardiograma. Em alguns estudos, mesmo após a correção de fatores de confusão, a Linfopenia continua a ser um forte preditor de qualquer causa ou mortalidade cardiovascular.
O zinco é essencial para o desenvolvimento e a função normais das células T. Foram observados baixos níveis de zinco em crianças criticamente doentes dentro de 72 horas após a admissão em uma unidade de terapia intensiva, e a Linfopenia pode se manifestar nesses casos. A terapia com zinco corrige a Linfopenia, e a função linfocítica é restaurada. A ingestão excessiva de etanol e/ou o uso crônico de etanol podem resultar em respostas proliferativas de linfócitos prejudicadas e Linfopenia, o que se resolveria com a abstinência de álcool.
A Linfopenia T CD4 + idiopática é uma doença reconhecida apenas recentemente. Em 1993, foi definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma contagem de linfócitos T CD4 + inferior a 300 células/mm3, em duas ocasiões separadas, em pacientes sem evidência sorológica ou virológica de infecção por HIV-1 ou HIV-2. Em indivíduos com linfocitopenia T CD4 + idiopática, o desenvolvimento da Linfopenia é, em geral, lento. É importante excluir as imunodeficiências congênitas, como a imunodeficiência comum variada, o que pode levar a contagens de células T CD4 + alteradas, que são reconhecidas tardiamente.
Embora alguns pacientes com Linfopenia T CD4 + idiopática não tenham quaisquer manifestações clínicas, mais da metade dos casos relatados apresentaram infecções oportunistas anteriores indicativas de imunossupressão celular (por exemplo, herpes-zóster recidivante, Mycobacterium avium pulmonar, Mycobacterium tuberculosis, Pneumocystis carinii).
Manejo
O manejo da Linfopenia depende de sua causa etiológica. Em pacientes com hipogamaglobulinemia associada, a reposição de imunoglobulina venosa hiperimune pode ser benéfica. Naqueles com imunodeficiências congênitas, o transplante de células hematopoiéticas pode ser considerado. A investigação etiológica e os exames a serem solicitados são dependentes dos dados de história e do exame físico. Em geral, se a Linfopenia não é associada a infecções recorrentes e é assintomática, não existe a necessidade de intervenção terapêutica.
Referências
1-Vasu S, Caligiuri MA. Lymphocytosis and lymphocitopenia in Williams Hematology 2016.