FECHAR

MedicinaNET

Home

Hemofilia

QUADRO CLÍNICO

Paciente de 35 anos de idade do sexo masculino, antecedente de hemofilia, história de queda da própria altura sem trauma craniano, evoluindo com hemartrose bilateral. Qual é a conduta?

 

COMENTÁRIOS

A hemostasia é o conjunto de mecanismos fisiológicos que mantêm o sangue no estado fluido dentro dos vasos, evitando ou reduzindo seu extravasamento quando ocorre uma lesão vascular, e restabelecendo a luz do vaso após a reparação do tecido lesado. As alterações da hemostasia podem ser divididas em:

 

      alterações da hemostasia primária: relacionadas às alterações plaquetárias;

      alterações da hemostasia secundária: relacionadas às coagulopatias.

 

Entre as alterações da hemostasia primária, há condições como a doença de Von Willebrand. Aqui, temos um paciente com hemorragia importante, com hemartrose que não poderia ser justificada por uma alteração primária. A partir deste caso, será comentada a a abordagem do paciente com uma das formas de coagulopatias, que é são as hemofilias.

 

COAGULOPATIAS

As manifestações clínicas da doença dependem do tipo de coagulopatia. A Tabela 1 cita os exames utilizados para o diagnóstico e monitoração destes pacientes.

 

Tabela 1. Exames utilizados para diagnóstico e monitoração dos pacientes portadores de coagulopatias

Testes

Significado

Tempo de protrombina (TP)

Avalia a via extrínseca, alterando-se nas deficiências dos fatores VII, X, V, II ou fibrinogênio ou quando da presença de inibidores.

Tempo tromboplastina parcial ativado (TTPA)

Avalia a via intrínseca, alterando-se nas deficiências dos fatores XI, IX, VIII, X, V, II ou fibrinogênio ou quando da presença de inibidores. Sensível à presença de heparina.

Tempo de trombina (TT)

Prolongado nas deficiências de fibrinogênio e na presença dos produtos de degradação do fibrinogênio/fibrina. Muito sensível à presença de heparina.

Fibrinogênio

Fornece quantificação dos níveis plasmáticos do fibrinogênio.

Produtos de degradação fibrina/fibrinogênio (PDF)

Avalia a presença de fibrinólise e/ou fibrinogenólise

Dímero-D

Avalia a ocorrência de lise da fibrina estabilizada

 

HEMOFILIA A E HEMOFILIA B

A hemofilia A (hemofilia clássica) e a hemofilia B (doença de Christmas) são doenças hemorrágicas hereditárias, que decorrem de anormalidades quantitativas ou funcionais (moleculares) dos fatores VIII e IX, respectivamente. A hemofilia A corresponde a 80% dos casos.

As hemofilias caracterizam-se clinicamente pelo aparecimento de manifestações hemorrágicas que ocorrem após traumatismos de intensidade mínima. Contudo, muitos sangramentos peculiares das hemofilias, como as hemartroses e os sangramentos musculares, acontecem comumente sem associação com traumatismos evidentes. A frequência e a gravidade do quadro hemorrágico geralmente são proporcionais à intensidade da deficiência do fator VIII ou IX. Assim, as hemofilias A e B são classificadas em:

 

      graves: quando os níveis plasmáticos do fator VIII ou IX são inferiores a 1%;

      moderadas: quando estes valores encontram-se entre 1 e 5%;

      leves: quando os valores estão entre 5 e 30%.

 

A reposição com concentrados de fator da coagulação é o componente mais importante do tratamento do hemofílico, embora o emprego do DDAVP possa tornar desnecessária esta modalidade terapêutica, nos pacientes com hemofilia A leve ou moderada.

O tratamento, portanto, é realizado com a reposição do fator de coagulação deficiente. O uso de plasma fresco congelado apresenta como desvantagem a necessidade de infundir grandes volumes para obter e manter os níveis hemostáticos mínimos do fator VIII e do fator IX, além da possibilidade, embora pequena, da transmissão de doenças veiculadas pelo sangue e seus derivados. O crioprecipitado também pode ser empregado para a obtenção de níveis plasmáticos normais do fator VIII, porém apresenta os inconvenientes de precisar ser mantido congelado e de sua quantidade de fator VIII ser somente estimada.

Diferentes concentrados liofilizados comerciais de fator VIII são disponíveis na atualidade, obtidos a partir de plasma humano, os quais são submetidos a processos físicos e químicos (pasteurização, calor seco, calor úmido, solvente/detergente, nanofiltração), visando à inativação de vírus com e sem envelope lipídico.

O cálculo da dose necessária de fator para se obter o nível hemostático desejado é baseado na seguinte fórmula:

 

Dose de fator VIII (U) = - peso X aumento desejado do FVIII (U/dL)

2

 

A dose de fator IX a ser usada também é dependente de uma fórmula específica, conforme segue:

 

Dose de fator IX (U) = peso X aumento desejado no nível plasmático do fator IX (U/ dL).

 

A Tabela 2 sumariza a necessidade de reposição de fatores de coagulação em diferentes situações em pacientes hemofílicos.

 

Tabela 2.

Local da hemorragia

Nível de fator

(UI/dL)

Dose inicial

(UI/kg)

Frequência das doses (horas)

Duração (dias)

 

 

Fator VIII

Fator IX

 

 

Hemartrose

30 a 50

15 a 25

30 a 50

24

1 a 2

Hematoma muscular

30 a 50

15 a 25

30 a 50

24

1 a 2

Epistaxe

30 a 50

15 a 25

30 a 50

24

Até resolução

Hemorragia digestiva

50

15 a 25

30 a 50

12 a 24

Até resolução

Língua / Retrofaringe

80 a 100

40 a 50

80 a 100

12

7 a 10

Hemorragia SNC

80 a 100

40 a 50

80 a 100

12

7 a 10

Hematúria

30 a 50

15 a 25

30 a 50

24

Até resolução

Pequenas hemorragias

20 a 30

10 a 15

20 a 30

24

Até resolução

 

MEDICAÇÕES

DDAVP e medicações antifibrinolíticas também podem ser usadas nestes pacientes e em outras condições que serão discutidas oportunamente, em outros textos.

 

Fator VIII

Modo de Ação

Reposição dos fatores de coagulação em pacientes com deficiência.

 

Indicações

Tratamento da hemofilia A.

 

Posologia e Modo de Uso

Já especificados na Tabela 2.

 

Efeitos Adversos

Reações locais, como eritema, ocorrem em apenas 0,36% dos casos. Alterações sistêmicas, como tonturas e náuseas, também são raras.

 

Apresentações

Administrado por unidades.

 

Monitoração

Monitorar fator anti-hemofílico antes e depois da administração.

 

Classificação na Gravidez

Classe C.

 

Interações Medicamentosas

Nenhuma descrita.

 

Fator IX

Modo de Ação

Reposição dos fatores deficientes.

 

Indicações

Tratamento da hemofilia B.

 

Posologia e Modo de Uso

Já descrito na Tabela 2.

 

Efeitos Adversos

Cefaleia, tonturas, mal-estar inespecífico podem ocorrer. Reações urticariformes são raras.

 

Apresentações

Prescrito em unidades.

 

Monitoração

Sem indicações específicas.

 

Classificação na Gravidez

Classe C.

 

Interações Medicamentosas

Nenhuma significativa descrita.