Paciente de 84 anos em pós-operatório de cirurgia de revascularização do miocárdio apresentou fibrilação atrial (Figura 1). Iniciada amiodarona e digitálico IV, houve reversão para ritmo sinusal. Após 1 dia, apresentou vômitos e dor epigástrica, realizando-se outro ECG (Figura 2).
Figura 1. Fibrilação atrial.
Figura 2. ECG realizado no período em que o paciente apresentava vômitos.
Ritmo sinusal, bloqueio atrioventricular de 1º grau (PR 184 ms), alteração da repolarização ventricular, QT longo (QTc = 517).
A fibrilação atrial é comum no pós-operatório de cirurgia cardíaca, ocorrendo em
Em pacientes estáveis e com boa tolerância, tenta-se a reversão com antiarrítmicos e a amiodarona é a droga de escolha (Tabela 1). Neste caso, o paciente recebeu amiodarona e digitálico (deslanosídeo) com reversão para o ritmo sinusal. Além disso, deve-se investigar e corrigir fatores precipitantes nesta fase de pós-operatório, como hipoxemia, distúrbios hidreletrolíticos (principalmente hipocalemia) e distúrbios do equilíbrio ácido-base.
Tabela 1. Medicações para reversão de fibrilação atrial no Brasil
Medicação |
Via |
Dosagem |
Efeitos colaterais |
Amiodarona |
Oral |
Internados: 1,2 a 1,8 g/dia em doses divididas até o total de 10 g ou 30 mg/kg em dose única. Manutenção: 200 a 400 mg/dia Ambulatoriais: 600 a 800 mg/dia em doses divididas até o total de 10 g. Manutenção: 200 a 400 mg/dia |
Hipotensão, bradicardia, prolongamento do QT, torsades de pointes, elevação da glicemia, obstipação, flebite |
IV |
5 a 7 mg/kg em 30 a 60 min, seguidos de 1,2 a 1,8 g/dia e infusão contínua até o total de 10 g. Manutenção: 200 a 400 mg/dia |
| |
Propaferona |
Oral |
600 mg IV 1,5 a 2 mg/kg em 10 a 20 min |
Hipotensão, flutter atrial com alta resposta ventricular |
Quinidina |
Oral |
0,75 a 1,5 g em doses divididas durante 6 a 12 h, associada a um medicamento para diminuir a frequência cardíaca |
Prolongamento do QT, torsades de pointes, hiperglicemia, hipotensão |
Devemos sempre analisar os medicamentos em uso pelo paciente, pois há diversas interações e alguns levam a maior risco de prolongamento de QT (Tabela 2) e posterior arritmia, como torsades de pointes. Este paciente vinha em uso de furosemida (risco de hipocalemia), atorvastatina, azitromicina (interação com amiodarona) e sertralina. Provavelmente ocorreu intoxicação digitálica (maior risco pela idade e por estar com insuficiência renal) e alargamento de QT por amiodarona e interação medicamentosa.
Tabela 2. Fármacos que afetam a repolarização, prolongam o intervalo QT e têm casos documentados de torsades de pointes
Tipo de fármaco |
Exemplo |
Antidisrítmico da classe Ia |
Quinidina, disopiramida, procainamida |
Antidisrítmico da classe Ic |
Flecainida |
Antidisrítmico classe III |
Sotalol, amiodarona |
Antipsicóticos |
Droperidol, haloperidol, fenotiazida |
Antispicóticis |
Tioridazina |
Antipsicóticos “atípicos” |
Pimozideb, quetiopina, risperidona, zotepina |
Inibidores da captação da serotonina |
Fluozetina, paroxetina, sertralina |
Antibióticos macrolídeo |
Eritromicina, claritromicina, azitromicina |
Agonistas 5-HT1 |
Zolmitriptano, naratriptano |
Agentes antimaláricos |
Halofantrínea |
Anti-histamínicos |
Terfenadrina |
Agentes pró-cinéticos |
Cisaprida |
3. ECG – Intoxicação digitálica
4. Informações sobre deslanosídeo
5. Pós-operatório de cirurgia cardíaca
1. Drogas que podem prolongar QT
"ADORO, QUANDO O ASSUNTO É PACIENTE CARDIACO, GOSTARIA MUITO DE FICAR SABENDO MAIS DO ASSUNTO;"