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Rastreamento do Câncer Colorretal

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 02/06/2017

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Rastreamento de Câncer Colorretal

 

O câncer colorretal é o terceiro câncer mais comum e a terceira causa de morte por câncer nos EUA; entretanto, pode ser detectado em pacientes assintomáticos em um estágio curável. Diversos estudos clínicos randomizados mostraram menor mortalidade entre os pacientes submetidos ao rastreamento, que também pode detectar pólipos pré-cancerosos que podem ser removidos durante a colonoscopia, reduzindo, assim, a incidência da doença.

A incidência de câncer colorretal é baixa antes dos 40 anos de idade, porém aumenta progressivamente, com risco durante a vida de 4,4%, sendo que 90% dos casos ocorrem antes dos 50 anos de idade. A maioria dos carcinomas colorretais se origina de pólipos adenomatosos, que podem progredir para displasia e câncer, em uma progressão que leva cerca de 10 anos.

Um dos fatores de risco para o desenvolvimento da doença é a história familiar; 20% dos pacientes com câncer colorretal possuem história familiar; o efeito desse fator, no entanto, diminui com o aumento da idade. O risco é maior em negros em comparação com caucasianos, e é cerca de duas vezes maior em homens do que em mulheres.

O sedentarismo, o consumo de carne vermelha, o tabagismo e o uso de álcool são fatores associados com aumento do risco de câncer colorretal ? o qual diminui com o consumo de vitaminas, frutas e vegetais, o uso de ácido acetilsalicílico e a suplementação de cálcio e selênio.

 

Opções de rastreamento

 

Várias estratégias estão disponíveis para o rastreamento de indivíduos com risco de desenvolvimento de câncer colorretal, incluindo a pesquisa de sangue oculto em fezes (com o uso de testes do guáiaco ou imunoquímicos) isoladamente ou em combinação com exame de DNA de fezes, endoscopia (sigmoidoscopia flexível ou colonoscopia), exame radiológico (colonografia computadorizada de tomografia computadorizada [TC]) e teste de marcadores moleculares com base no sangue, como o sept 9 DNA metilado (sept9).

Se a colonoscopia não for realizada como o teste de rastreamento primário, todas as outras estratégias de rastreio requerem colonoscopia como seguimento de um teste positivo. Um a cada 4 carcinomas colorretais se encontram no reto e estão ao alcance do toque retal, mas não existem evidências de que o toque digital aumenta a detecção do carcinoma colorretal; sendo assim, o exame não é recomendado.

Os exames fecais podem detectar o sangue da mucosa colônica ulcerada resultante de câncer ou grandes pólipos, e outros exames fecais detectam marcadores moleculares que são eliminados por células epiteliais colônicas cancerígenas. As análises de sangue oculto nas fezes incluem testes com base em guáiaco e testes imunoquímicos que utilizam anticorpos para detectar o sangue humano.

Os testes imunoquímicos fecais têm a vantagem de não exigir restrições dietéticas. Essas restrições são necessárias com testes feitos com base em guáiaco porque podem ser falsamente positivos na presença de sangue de carne vermelha ou alimento que reage com o guáiaco (por exemplo, raiz-forte, nabo ou brócolis). Deve ser evitado o uso de anti-inflamatórios não esteroidais por 7 dias. O teste imunoquímico fetal (TIF) deve ser realizado em casa em evacuações sucessivas.

O TIF tem uma sensibilidade de 79% e uma especificidade de 94% para a detecção de câncer; o uso de duas ou três amostras não aumentam significativamente a precisão em relação a uma única amostra. Evidências de alta qualidade apoiam uma estratégia de exames de sangue oculto fecal a cada ano ou a cada 2 anos para a pesquisa de câncer colorretal, com a coloscopia utilizada como seguimento de um teste positivo.

Vários estudos randomizados e controlados mostraram diminuição de mortalidade em cerca de 30% por câncer colorretal com essa estratégia do que sem rastreamento, com até 30 anos de seguimento. Os estudos usaram testes feitos com base em guáiaco, e quase todos os programas de rastreamento populacional atuais usam testes imunoquímicos porque sua precisão é maior e restrições dietéticas não são necessárias.

Os marcadores moleculares incluindo DNA anormal de células cancerosas podem ser detectados nas fezes. O TIF combinado com um teste de DNA de fezes foi aprovado pela Food and Drug Administration (FDA) para a pesquisa de câncer colorretal. Um estudo mostrou que essa combinação tinha maior sensibilidade para a detecção de neoplasia colorretal do que um único TIF isoladamente (92,3 versus 73,8%), mas a especificidade foi menor (86,6 versus 94,9%).

O intervalo de rastreamento difere entre o TIF (anual) e TIF-DNA (1 a 3 anos), o que dificulta uma comparação da eficácia do rastreamento. Faltam dados de estudos que avaliem o benefício da mortalidade por câncer colorretal na triagem com TIF-DNA.

Os estudos clínicos randomizados demonstraram que o rastreamento com sigmoidoscopia flexível, seguido de colonoscopia se forem detectados pólipos pré-cancerígenos, reduz a mortalidade por câncer colorretal ? embora nem todos os estudos tenham demonstrado um benefício significativo com relação à redução da mortalidade, com uma mortalidade de 26 a 31% menor de câncer colorretal em pacientes submetidos ao rastreamento com sigmoidoscopia flexível em comparação com aqueles que não foram submetidos a rastreamento.

A sigmoidoscopia flexível detecta neoplasias distantes a 60cm do ânus, mas exige pouca preparação em comparação com a colonoscopia, sendo uma boa opção para rastreamento. A colonoscopia, por sua vez, tem altas sensibilidade e especificidade, e permite intervenção terapêutica com retirada de pólipos, sendo recomendada a remoção de todos os pólipos com mais de 6mm.

Não está definido se existe uma estratégia “melhor” para o rastreamento do câncer colorretal; portanto, a estratégia mais eficaz é a que o paciente pode aderir de forma consistente; assim, as preferências do paciente devem ser consideradas ao se indicar uma estratégia de rastreamento.

 

Hipóteses de indicação de rastreamento

 

Os pacientes com risco intermediário para o desenvolvimento de câncer colorretal devem começar a triagem aos 50 anos de idade. O rastreamento entre 76 e 85 anos de idade deve ser adaptado, e deve parar após os 85 anos de idade ou se a expectativa de vida do paciente for inferior a 10 anos.

As estratégias de triagem para câncer colorretal entre pacientes com risco intermediário incluem exames anuais de sangue oculto nas fezes (com o uso de testes altamente sensíveis à base de guáiaco ou imunoquímicos) ou colonoscopia a cada 10 anos. Se essas estratégias não forem aceitas pelo paciente, outras opções de triagem podem incluir sigmoidoscopia flexível, colonografia por TC ou teste de DNA de sangue ou fezes.

Os riscos globais de complicações decorrentes do rastreio estão relacionados sobretudo com colonoscopias e polipectomias. Esses riscos são baixos e semelhantes entre todas as estratégias. Embora o TIF seja mais preciso do que a pesquisa de sangue oculto com guáiaco, não existem estudos suficientes para uma recomendação precisa.

Os estudos demonstram benefício com a sigmoidoscopia flexível, seguida por colonoscopia caso as lesões pré-malignas sejam detectadas com diminuição da mortalidade. No entanto, o benefício da sigmoidoscopia é limitado ao câncer no colo distal (reto, sigmoide e colo descendente), para o qual a redução da mortalidade foi relatada em 46%.

Estudos de caso-controle e coorte prospectivos estimam que a mortalidade por câncer colorretal seja entre 75 a 80% menor entre as pessoas submetidas à colonoscopia de rastreamento do que entre aquelas não submetidas ao exame. Uma metanálise de estudos observacionais mostrou que, apesar da mortalidade menor globalmente, não foi observado benefício significativo da mortalidade da colonoscopia em relação ao câncer de colo proximal.

A discrepância pode ser explicada pela qualidade da colonoscopia (coloscopia incompleta, preparo intestinal mais pobre ou remoção mais difícil do pólipo no colo proximal) ou diferenças nas características biológicas do câncer colorretal proximal e distal. Os pólipos sésseis serrilhados são, com frequência, planos ou minimamente levantados, tornando-os mais difíceis de serem detectados por colonoscopia que outros pólipos e mais comuns no colo proximal, o que pode contribuir para o maior risco de câncer proximal do que câncer distal após colonoscopia.

Os dados publicados dos estudos que avaliam o efeito da colonoscopia virtual ou tomocolonografia sobre a incidência e a mortalidade do câncer colorretal são limitados. A sensibilidade e a especificidade relatadas da TC para detectar adenomas de 1cm de diâmetro ou mais variam de 67 a 93% e de 86 a 98%, respectivamente. Como os pólipos serrilhados são planos, a tomocolonografia é inferior à colonoscopia para detecção deles.

Um pólipo de 6mm de diâmetro ou mais indica a necessidade de se realizar colonoscopia. As desvantagens da tomocolonografia incluem a exposição à radiação, as preocupações associadas com cânceres induzidos por radiação e a necessidade potencial de testes adicionais e cuidados para lesões fora do colo descobertas incidentalmente.

Recentemente, a pesquisa do sept9 DNA, um exame que detecta o DNA SEPT9 metilado circulante, mostrou ter uma sensibilidade de 48% e um valor preditivo negativo de 99,5% para detecção de câncer colorretal; ainda faltam dados para indicar seu exame de rotina.

A US Preventive Services Task Force avaliou quando seria o melhor momento para iniciar o rastreamento. O início do rastreamento aos 45 anos de idade em vez de aos 50 poderia aumentar os anos de vida e reduzir a mortalidade por neoplasia maligna, mas também poderia aumentar os potenciais danos causados pelo aumento da carga de colonoscopia; Por isso, as recomendações da US Preventive Services Task Force são de iniciar o rastreamento aos 50 anos de idade em pacientes com risco intermediário de câncer colorretal.

Ainda que o risco de câncer colorretal cresça com a idade, o risco competitivo de morte por outras doenças e o de complicações graves da colonoscopia também aumentam com a idade. Várias organizações recomendam que o rastreamento para pacientes entre 76 e 85 anos de idade seja adaptado com base na presença de doenças coexistentes e seja interrompido após eles chegarem aos 85 anos de idade.

Um modelo de simulação sugeriu que a intensidade da triagem prévia e o risco individual de câncer colorretal também deveriam ser considerados na determinação da idade para parar a triagem. Espera-se que os pacientes sem alto risco de câncer colorretal e que não tenham sido submetidos a rastreamento prévio se beneficiem do rastreamento até os 80 anos.

O rastreamento do carcinoma colorretal é custo-eficaz, com gasto de 15 mil dólares por vida salva ao ano, o que é considerado uma boa relação custo-benefício. A adesão aos testes de rastreamento varia de acordo com as estratégias, e a preferência da estratégia varia de acordo com a raça e o grupo étnico. Os participantes brancos preferem a colonoscopia e os não brancos, os testes fecais. Para alcançar o nível mais alto de adesão ao exame do câncer colorretal, os participantes devem ser incentivados a fazer uma escolha, já que a melhor estratégia será aquela a que eles irão aderir de forma consistente.

Deve-se identificar os pacientes com um teste negativo para segui-los para rastreamento repetido em intervalos apropriados e fornecer cirurgia oportuna para cânceres. A taxa de detecção de adenoma difere substancialmente entre os endoscopistas, e pode ser utilizada como uma medida da capacidade de rastreamento para prevenir o câncer colorretal. Um estudo retrospectivo mostrou que há uma diminuição de 3% na taxa de câncer que se desenvolve após a colonoscopia.

Os danos dos testes de rastreamento não colonoscópicos são relativamente baixos. No entanto, todas as estratégias requerem colonoscopia como seguimento de um teste positivo. Como resultado, os danos programáticos do rastreamento são proporcionais ao número de colonoscopias e, em particular, às polipectomias realizadas ao longo da vida da população rastreada.

O número de complicações (perfurações, sangramento gastrintestinal, náuseas e vômitos, íleo paralítico, infarto do miocárdio, entre outras) em uma população de mil pessoas selecionadas, entre 50 e 75 anos de idade, pode ser avaliado com colonoscopia em intervalos de 10 anos, com sigmoidoscopia flexível em intervalos de 5 anos, com TIF-DNA em intervalos de 3 anos e com TIF anual.

Modelos de custo-efetividade há mais de uma década sugerem que a triagem programática com exames de sangue oculto, a sigmoidoscopia flexível ou a colonoscopia reduziram a mortalidade do câncer colorretal em uma sociedade disposta a pagar o custo.

A colonoscopia costuma ser a estratégia preferida, sendo mais eficaz na redução da mortalidade por câncer e menos dispendiosa do que o rastreamento com TIF-DNA ou colonografia por TC. Em indivíduos com risco elevado de câncer colorretal, recomenda-se uma triagem mais precoce e mais frequente em pacientes com risco mais elevado.

Pacientes com um parente de primeiro grau em quem o câncer colorretal se desenvolveu antes dos 60 anos de idade devem ser submetidos à colonoscopia aos 40 anos de idade ou em uma idade 10 anos mais jovem do que àquela do parente cujo câncer se desenvolveu, o que ocorrer antes.

O Quadro 1 sumariza as estratégias para o rastreamento de câncer colorretal.

 

Quadro 1

ESTRATÉGIAS PARA O RASTREAMENTO DE CÂNCER COLORRETAL

               Colonoscopia a cada 10 anos, após uma colonoscopia inicial negativa

               Tomocolonografia a cada 5 anos

               TIF anual

               Retosigmoidoscopia flexível com TIF anual

               FIT-DNA a cada 1?3 anos

               Pesquisa de sangue oculto fecal anual com 3 amostras

               Retosimoidoscopia flexível anual

 

A obesidade, o tabagismo, a baixa atividade física, o consumo elevado de álcool, o alto consumo de carne vermelha ou processada e o baixo consumo de frutas e legumes estão associados ao aumento do risco de câncer colorretal, e o uso regular de ácido acetilsalicílico tem sido associado com risco reduzido. Sendo assim, os pacientes devem ser orientados a realizar modificações no estilo de vida para diminuir o risco de desenvolver a doença.

 

Referências

1-Inadomi JM. Screening for colorrectal neoplasia. New Eng J Med 2017; 376: 149-156.

2- Lin JS, Piper M, Perdue LA et al. Screening for colorectal cancer: A systematic review for the US Preventive Services Task Force: Evidence synthesis no. 135. AHRQ publication 14-05203-EF-1, Agency for Healthcare Research and Quality, Rockville, MD, 2016.

3- Chan AT, Giovannucci EL. Primary prevention of colorectal cancer. Gastroenterology 2010; 138:2029.

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